Textos Acadêmicos





-   “Redescobrindo” a Santa Isabel : Um Estudo Antropológico sobre a Região da Grande Santa Isabel (4º Distrito do Município de Viamão)  -   

INTRODUÇÃO


Esta monografia propõe estudar a Região da Grande Santa Isabel, a partir das noções de regionalização, identidade cultural e dinâmica de organização espacial. Percebendo esta região com características potencialmente diferenciadas daquelas observadas no Município em que se situa, proponho realizar uma análise etnográfica e historiográfica que subsidiem esta hipótese inicial de trabalho: a diferença cultural entre a sede do município e a região da Santa Isabel. Segundo uma perspectiva relacional e dialética, proponho também investigar  o processo de construção social da memória desta população, bem como os aspectos do imaginário que são apropriados por viamonenses e isabelenses que na sua tensão diária e recíproca estabelecem pontos de aproximação e afastamento.
Historicamente tem se observado tensões de interação social, administrativa e política entre a sede do Município de Viamão e a Região[1] da Santa Isabel. Fatos históricos do século passado remontam um processo distinto de ocupação destas duas localidades.
 Segundo alguns historiadores como Clóvis Silveira de Oliveira, o surgimento da “Freguesia de Viamão” está ligada às viagens que João de Magalhães faz por volta de 1714 por orientação do então Governador do Rio de Janeiro D. Francisco de Távora que pretendia “fazer vistorias nos lados do sul”[2].  O povoamento do extremo sul do Brasil acontece, segundo o historiador Walter Spalding, com a chegada de Dona Ana da Guerra, irmã do Capitão-mor Francisco de Brito Peixoto, fundador de Laguna e um dos grandes tropeiros da época, mais seu genro, João de Magalhães, que estabeleceram-se nos “Campos de Viamão” [3]. Ali, em terras de Dona Ana, foi erguida uma capelinha em louvor de Nossa Senhora da Conceição e Santana e, ao seu redor, logo se formaria uma pequena localidade que ficou conhecida por Lombas de Santana[4].
Em meados  de 1740, fato semelhante provocaria o surgimento de um outro povoado. Francisco Carvalho da Cunha doaria uma légua de terra para a construção de uma outra capela, a de Nossa Senhora da Conceição do Viamão, que logo se transformaria em uma igreja. Em volta desta igreja fundou-se um grande  povoado, povoado de Viamão, que já em 1747 era elevado à categoria de freguesia.
O povoado de Viamão estava distante do mar (cerca de 120 Km) e sem possibilidade de erguer qualquer tipo de porto na sua costa,  só possuía comunicação com o restante do Brasil por terra. Porém, em determinado momento, descobriram, a mais ou menos 60 Km de distancia da sede do povoado, uma grande lagoa denominada de “Guaybe” pelos indígenas. Este fato levou os habitantes de Viamão a criarem um porto naquele local, o Porto de Viamão. Este mesmo porto passaria a ser denominado Porto do D’Ornelas ou Porto do Dorneles, quando da radicação de Jerônimo de Ornelas (mais seus agregados e parentes) naquele mesmo local e de Porto do Dionísio, quando utilizado como escoadouro da estância de Dionísio Rodrigues Mendes (Fundador da Capela de Nossa Senhora de Belém, hoje Belém Velho). A chegada dos casais açorianos, em 1752, marca o início da   colonização do então Porto de Viamão (nome dado a um ancoradouro nos fundos da Sesmaria de Jerônimo de Ornellas, onde está agora a Praça da Alfândega). Instalados em casas de palha no local onde encontramos hoje a atual Praça da Alfândega, os casais vindos das Ilhas dos Açores inauguravam o que viria a ser “um arraial bastante fértil”. [5]
A ocupação efetiva do primeiro trecho do eixo “Porto de Viamão” – “Freguesia de Viamão” (Rio Guaiba até a atual divisa dos Municípios de Viamão e Porto Alegre) acontece no momento em que Jerônimo de Ornelas se estabelece no Porto de Viamão e escolhe o Morro Santana para construir a sede da sua sesmaria (Segundo Oliveira nas imediações da atual Escola de Agronomia da UFRGS). Nas medidas atuais, essa sesmaria teria uma área de aproximadamente 14.000 hectares, abrangendo assim a atual área da Santa Isabel [6]

A  SANTA  ISABEL  HOJE


A Santa Isabel é uma das regiões da Cidade de Viamão que mais tem se destacado pelo seu potencial econômico, social, político e humano. A proposta da atual Administração Pública Municipal denominada de Orçamento Participativo possibilitou que os moradores do 4º Distrito chegassem a uma conclusão que já estava construída geograficamente: a Santa Isabel é o centro de uma região composta por mais de 20 vilas.
Durante o processo de escolha dos representantes (Delegados) das comunidades junto ao O . P . e das discussões sobre as suas prioridades, reuniram-se mais de 200 pessoas no Salão Paroquial da Igreja da Santa Isabel, local definido para a realização destas assembléias. Foi a partir deste momento que os cidadãos desta região, encontrando os seus pares, perceberam (talvez pela primeira vez) que ali se encontravam pessoas das seguintes localidades: Campos da Colina, Condomínio Horizontal da Lomba do Sabão, Diamantina, Irma, Jardim Lacy, Jardim Universitário, Lanza, Luciana, Medianeira, Monte Alegre, Monte Castelo, Morro Santana, Nossa Senhora Aparecida, Passo do Sabão, Represa, Santa Miguelina, Sítio Lomba do Sabão, USBEE e União. Desta forma a Comunidade da Grande Santa Isabel, como alguns denominam a região, ganha a visibilidade do seu todo, da sua força de barganha política, do seu poder de organização popular, enfim adquire uma nova fisionomia social, econômica e política.
Considerada como zona estratégica para as atividades políticas da maioria dos partidos políticos de Viamão, sondada por redes de lojas comerciais de diversos tipos que começam ali a se instalar, olhada e pesquisada pelos técnicos que investigam o crescimento da região metropolitana de Porto Alegre, almejada por moradores de classe média de Porto Alegre que buscam um local de residência alternativa ao que a capital dos gaúchos oferece, querida e amada pelos seus admiradores mais entusiastas, assim a Santa Isabel demonstra suas especificidades urbanas. Mas o que existe de fato na Santa Isabel ou quais os elementos que a diferenciam sobremaneira das demais localidades de Viamão ??  
Mais do que vila ? Um pouco menos  que cidade ? O que é de fato a Santa Isabel ???
A resposta final e acabada para esta pergunta está longe de ser construída, no entanto, já temos alguns elementos, fruto de investigações científicas que temos realizado na cidade, que contribuem para esta reflexão sobre o processo de construção urbana aqui referido.
ALGUNS  PRESSUPOSTOS  TEÓRICOS

Para a noção de Cidade
 Definir o que é uma cidade, de fato, não é uma atividade fácil, diante das inúmeras concepções e noções do que realmente venha a ser uma cidade em toda a extensão do termo. O urbanista e pesquisador FERNANDO GOITIA em uma BREVE HISTÓRIA DO URBANISMO afirma que “o estudo da cidade é um tema tão sugestivo como amplo e difuso; impossível de abordar para um homem só, se levarmos em conta a quantidade de saberes que haverá de acumular.” Seguindo a sua sugestão de que “não devemos perder de vista, ao estudar as cidades, as valiosas fontes que a literatura nos oferece”, trazemos alguns conceitos de cidade construídos por alguns pensadores que nos antecederam sobre este tipo de estudo.
ARISTÓTELES trabalha com um conceito político de cidade, no momento em que sugere uma noção de diferenciação entre dois tipos de cidadãos que compõe as cidades. Neste sentido ele disse que “uma cidade é um certo número de cidadãos, de modo que devemos considerar a quem devemos chamar cidadãos e quem de fato é um cidadão (...) Chamamos, pois, cidadãos de uma cidade aos que tem a faculdade de intervir nas funções deliberativas e judiciais da mesma e cidadão em geral, ao contrário são aqueles cidadãos que tem a cidade apenas para a realização da sua vida.” Excluindo a discussão política colocada na definição de Aristóteles que traz a noção de cidade-estado da Grécia (o Estado é a Cidade e a Cidade é o Estado) entendemos que, para ele, uma vez reunidos um determinado número de cidadãos, teríamos uma cidade.
AFONSO, outro pensador das cidades,  referindo-se às cidades medievais que não se concebe sem a proteção de muros ao seu entorno como defesa das ameaças exteriores, define a cidade como “todo aquele lugar que é fechado com muros, com arrabaldes e edifícios que se tem com eles”.
CANTILLON, pensador e estudioso do século XVIII, imagina assim a origem de uma cidade: “Se um príncipe ou um senhor fixa a sua residência em um lugar que o agrada e se outros senhores o acompanham e ali se estabelecem para um convívio mútuo e social, este lugar se converterá em uma cidade.” Neste conceito temos a concepção de uma cidade Barroca, de caráter senhorial e eminentemente consumidora, onde reina o luxo que foi a origem das grandes cidades do Ocidente antes do advento da era industrial.
  Para os que preferem uma distinção entre cidade e natureza, considerando a cidade como uma criação abstrata e artificial do homem, destacamos a concepção de ORTEGA e GASSET: “A Cidade é um ensaio da sucessão que o homem faz para viver fora e frente ao cosmos, tomando dele porções seletas e previamente escolhidas.”
A opção que fiz, enquanto pesquisador em ciências sociais, foi pela análise qualitativa do social, através da proposta e das ferramentas que a antropologia social oferece para a análise da dinâmica social urbana. Portanto, mais do que me debruçar sobre uma grande quantidade de dados estatísticos, tabelas quantitativas e números exatos, proponho perceber a cidade através do que consigo extrair da sua essência qualitativa, ou seja, a sua cultura, o seu imaginário, os sentimentos que a permeiam, enfim a sua alma. Digo isto para introduzir uma outra concepção de cidade, difundida por SPENGLER para quem a alma (ou o espírito, como preferir) sustenta a dialética da cidade clássica.
Segundo SPENGLER “o que distingue a cidade de uma aldeia (ou vila) não é a sua extensão, não é o seu tamanho, se não a presença de uma alma citadina (...) O Verdadeiro milagre é quando nasce a alma de uma cidade. Subitamente sobre a espiritualidade geral da cultura, destaca-se a alma da cidade como uma alma coletiva de uma nova espécie, cujos últimos fundamentos permanecem para os outros em eterno mistério. E uma vez desperta, se forma um corpo visível. A coleção de casas da aldeias (ou vila), cada uma das quais com sua própria história, se converte em um único conjunto. E este conjunto vive, respira, cresce, adquire um rosto familiar e uma forma e uma história internas. A partir deste momento, apesar das casas em separado, do tempo, da catedral e do palácio (do governo), constitui a imagem urbana em sua unidade o objeto de um idioma de formas e de uma história específica que acompanha em seu curso todo o ciclo vital de uma cultura ”

Para a Dinâmica da Organização Espacial

As duas grandes categorias de análise científica em ciências sociais são, inevitavelmente, tempo e espaço, conforme a afirmação de vários autores que trabalhamos. Elas podem estar tão intimamente relacionadas que, algumas vezes, é quase impossível desconsiderar uma em detrimento de outra. Neste sentido, nos ensina Bachelard: “É pelo espaço, é no espaço que encontramos os belos fósseis de duração concretizados por longas permanências.”  (Bachelard, 1993)
Em função disso, além das representações que remontam o tempo vivido e o tempo lembrado, presentes nesta monografia, considero a questão espacial como um outro eixo inevitável de apreensão e análise.
Para esta “caminhada” e essa “descoberta” sobre a dinâmica espacial que estamos investigando, escolhemos três autores em especial. A incursão pela espacialidade de alguns perímetros urbanos nos faz dialogar com Schulz, para quem “el interés del hombre pur el espacio tiene raíces existenciales: deriva de una necessidad de adquirir relaciones vitales en el ambiente que le rodea para aportar sentido y ordem a um mundo de acontecimentos y acciones” (Norberg-Schulz, 1975). O segundo autor, como já sinalizamos anteriormente, é Bachelard que contribui sobremaneira para algumas interpretações que somente são possíveis dentro do campo da Fenomenologia da Imaginação (ou arqueologia do imaginário). Neste sentido, ele nos incita à algumas ponderações do tipo: “o espaço convida à ação, e antes da ação a imaginação trabalha” (Bachelard, 1993). O terceiro autor contribui para uma análise mais específica do fenômeno que estou tentando interpretar como um tipo de “Regionalismo” no sentido de que “O Regionalismo aponta para as diferenças que existem entre regiões e utiliza estas diferenças na construção de identidades próprias” (OLIVEN, 1992).
O esforço de trabalhar com estes autores e seus pressupostos vai no sentido de tentar perceber as características e especificidades do campo trabalhado, bem como dos atores sociais e da dinâmica social colocada neste campo, a partir de  um “olhar vibrátil” (Rolnik, 1997) sobre o espaço e as relações de espacialidade que envolvem, delimitam e, porque não dizer, definem este universo simbólico e cultural trabalhados.

Para a questão de Identidade Cultural
Os pressupostos básicos para a discussão da temática da identidade são oriundos de Renato Ortiz que afirma: “A rigor, faz pouco sentido buscar a existência de ‘uma’ identidade; seria mais correto pensá-la na sua interação com outras identidades, construídas segundo outros pontos de vista.” (ORTIZ, 1994). As noções tomadas por Ortiz de Lévi-Strauss também são de suma importância para este estudo, por exemplo: “A identidade é uma espécie de lugar virtual, o qual nos é indispensável para nos referirmos e explicarmos um certo número de coisas, mas que não possui na verdade, uma existência real.” (ORTIZ, 1994)

Para as questões de Método de Pesquisa
A  pesquisa qualitativa e, em especial, o método etnográfico e etnológico, nos estudos de ciências sociais voltados a pesquisa de sociedades complexas do tipo urbano-contemporaneo-capitalista é aqui o centro da nossa construção científica. No meu entendimento, é através deste tipo de trabalho que podemos desenvolver a “ação” e a “imaginação” de que Bachelard nos falou em seus escritos.
Para a metodologia do trabalho de campo, utilizaremos as principais técnicas do método etnográfico, como a observação participante, realização de entrevistas com o uso de gravador, análise de contexto do campo pesquisado e análise de conteúdo de documentos históricos, reportagens de jornais e revistas.
Etnografar o campo estudado, representa para nós, destacar os principais atores sociais, suas características principais, enfim nos mover no sentido de realizar uma tarefa que se assemelha com o esforço de “tentar ler um manuscrito estranho, desbotado, cheio de elipses, incoerências, emendas suspeitas e comentários tendenciosos, escrito não com os sinais convencionais do som, mas com exemplos transitórios de comportamento modelado.” (Geertz, 1978)




CONCLUSÃO



Um aspecto que me parece interessante chamar para este momento do nosso texto é do desafio que sempre está colocado para nós, quando tentamos “estranhar o familiar”, através de uma pesquisa voltado para um espaço social que é o nosso próprio, ou seja, o espaço urbano contemporâneo. Aceitando o convite de Gilberto Velho: “(...) Não há como fugir, nem retardar mais o processo de assumir o estudo antropológico da nossa sociedade e cultura como tarefa fundamental.” (Velho, 1980), nos embrenhamos nesta atividade que muito nos satisfaz intelectualmente.
SPENGLER fala de um processo que culmina com “o nascimento da alma da cidade” na configuração de uma localidade na sua trajetória até à conquista do estatuto de cidade. Portanto, segundo este pensador, existe um momento muito especial e significativo que é “um verdadeiro milagre” e que define o surgimento da Cidade como tal, a partir do nascimento da sua alma.
Tomando esta concepção de SPENGLER, passamos a analisar o caso da Santa Isabel, no sentido de perceber qual teria sido este momento em que de fato nasce (ou não) a alma da  cidade, ou seja, a partir de que momento de sua história a dinâmica social e urbana local dá a luz à esta “nova cidade”. Vivendo a quase três décadas nesta região e, portanto, tendo acompanhado os principais acontecimentos que marcaram a estruturação da Santa Isabel, partimos para a análise do fato ou dos fatos que teriam definido a sua concepção enquanto cidade. A resposta seria: A conjugação de dois processos sócio-urbanístico  iniciados no intervalo de 1994 / 1996. O Reordenamento e revitalização urbana que a “cidade” recebeu a partir do final do ano de 1994 com a construção da Avenida do Trabalhador, associado ao processo de resgate da cidadania através do “Orçamento Participativo” implementado a partir de 1996, redefine e revitaliza  a essência da organização urbana local, transformando estruturalmente a  Santa Isabel e inserindo-a em uma nova realidade e uma nova fase do seu desenvolvimento político, econômico e social.



























BIBLIOGRAFIA


              BACHELARD, Gaston. A Poética do Espaço. São Paulo: Martins Fontes, 1993.

              GEERTZ, Clifford. A Interpretação das Culturas. Rio de Janeiro: Zahar Ed. , 1978.
              MACEDO, Francisco Riopardense de. Porto Alegre: origem e crescimento. Porto Alegre: Ed. Sulina, 1968.

              PESAVENTO, Sandra Jatahy. O Espetáculo de Rua. Porto Alegre: Ed. da UFRGS, 1992.

              OLIVEN, Ruben George. “Nação e Tradição na Virada do Milênio.” In. A Parte e o Todo: a diversidade cultural no Brasil-Nação. Porto Alegre, Vozes, 1992, p.13

              ORTIZ, Renato. “Modernidade-Mundo e identidades.” In: Um Outro Território. Ensaios sobre a Mundialização. São Paulo. Olho D’Água, s/d. p. 67-89

              ROLNIK, Suely. Uma Insólita Viagem à Subjetividade. São Paulo: Ed. Papirus, 1997. In LINS, Daniel. Cultura e Subjetividade.

              VELHO, Gilberto. O Desafio da Cidade. Novas Perspectivas da Antropologia Brasileira. Rio de Janeiro: Ed. Campus, 1980.

              NORBERG-SCHULZ, Christian. Nuevos Caminhos De La Arquitectura - Existencia, Espacio y Arquitectura. Barcelona: Ed. Blume, 1975.






[1] Adoto o termo região, reproduzindo uma tendência de alguns informantes, na sua maioria moradores da Vila Santa Isabel, que utilizam este termo  para denominarem o lugar que percebem como um local que representa algo que é um pouco mais do que uma vila e um pouco menos que uma cidade. Representantes do Poder Público Municipal, especialmente os ligados ao “Orçamento Participativo”, adotaram esta terminologia (Região da Santa Isabel), de alguma forma legitimando-a, pois utilizam um mapeamento da Cidade de Viamão onde a Santa Isabel figura como núcleo urbano de cerca de 18 vilas que a circundam. Portanto, durante o processo de discussão e deliberação sobre os recursos públicos municipais, a comunidade da Região da Santa Isabel (Reunião da Santa Isabel mais as 18 vilas do seu entorno) se reúne no Salão Paroquial da Igreja da Santa Isabel para discutir e deliberar sobre as suas prioridades.
[2] Grifo do historiador citado.
[3] Campos de Viamão: nome genérico utilizado na época para referir toda a área que conhecemos hoje no entorno da Cidade de Viamão (Palmares do Sul, Águas Claras, Tavares, Itapuã e alguns municípios da Grande Porto Alegre como Alvorada, Gravatai, Cachoeirinha, ...)

[4] Onde atualmente se encontra o Distrito de Águas Claras / Município de Viamão.
[5] Expressão usada na primeira referencia registrada em documento sobre a povoação que se formava no então Porto de Viamão, a qual se desenvolvia rapidamente para os padrões da época.
[6] Investigações arqueológicas do Museu Joaquim José Felizardo em parceria com o Núcleo de História da UFRGS, apontam para a confirmação desta hipótese.











UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS
CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ANTROPOLOGIA SOCIAL
Disciplina: Individualismo, Sociabilidade e Memória
Professora: CORNELIA ECKERT

Semestre 99/1















- Estudo  Antropológico  de  um  Espaço  Urbano  Singular: Cais  do  Porto  da  Cidade  de  Porto  Alegre  (ou da Cidade que tem porto até no nome)  -














Aluno: JAQUES XAVIER JACOMINI





 



“(...) O Porto, em que acreditávamos tanto, terminou em frustração, com o projeto de transformar-se em área de lazer. Os barcos e os trens nos abandonaram, dando lugar aos caminhões. A indústria fabril, depois de um ciclo de prosperidade, migrou para outras paragens. O capital internacional não acha muitos atrativos numa área de caminhos estrangulados e de comunicações roucas.(...)”  (Franco, 1997) Sérgio da Costa Franco






-  Estudo  Antropológico  de  um  Espaço  Urbano  Singular: Cais  do  Porto  da  Cidade  de  Porto  Alegre  (ou da Cidade que tem porto até no nome)  -





Monografia de Avaliação Final da
Disciplina: Individualismo, Sociabilidade e Memória
Professora: Cornelia  Eckert
Semestre 99/1









“Neste teatro do passado que é a memória, o cenário mantém os personagens em seu papel dominante”. Gaston Bachelard




RESUMO











Esta monografia tem por objetivo trabalhar com o depoimento de dois informantes, a fim de proceder a análise e a compreensão das suas relações de pertencimento que  constróem com o Cais do Porto de Porto Alegre. Sendo trabalhadores (um aposentado e outro ainda em atividade) deste espaço urbano, a sua relação com o Cais está voltada especialmente para uma atividade laboral que exerceram (ou que exercem) neste local. Eles lembram e recuperam informações de diferentes camadas e instantes de tempo que viveram no Cais do Porto. A análise destas informações também nos permite perceber importantes aspectos da dinâmica social e da organização físico-espacial deste espaço urbano, sendo este também um dos objetivos desta pesquisa. Dito de outra forma, pretendemos, entre outras coisas, caracterizar a singularidade deste espaço urbano, investigando as suas especificidades (arquitetônicas, urbanísticas, sociais e econômicas), a partir das construções mnemônicas e relatos dos informantes, bem como das suas observações sobre a organização físico-espacial deste espaço urbano.























INDICE








Resumo .................................................................................................................................... 03

Introdução ................................................................................................................................ 05


1.      O Cais do Porto da Cidade de Porto Alegre ...................................................................... 08
1.1  A Atual organização Físico-Espacial do Cais do Porto de Porto Alegre ........................... 09

2.      Revisão Crítica da Bibliografia .......................................................................................... 12

3.      O que dizem os informantes sobre o Cais do Porto de Porto Alegre ................................. 22


Conclusão ................................................................................................................................. 30

Bibliografia .............................................................................................................................. 33















 
INTRODUÇÃO


O Cais do Porto de Porto Alegre já foi a principal porta de entrada para a cidade. Viveu momentos de intensa atividade comercial, fluvial e social. Atualmente o cenário, a dinâmica social e a organização espacial naquele local demonstram que o Cais vive um outro período da sua história. Várias transformações ali ocorreram e outras tantas virão a ocorrer, diante de algumas propostas de reestruturação e reorganização arquitetônicas, urbanísticas e comerciais do atual Cais do Porto de Porto Alegre.
Independente da sua condição de maior ou menor atividade econômica, o Cais do Porto de Porto Alegre está presente no imaginário do portalegrense como uma referência forte presente no seu dia a dia. Isto acontece porque freqüentemente temos a  história do porto, a cultura do porto, o trabalho do porto, (...) ressurgindo com novas roupagens, em novas situações, sobre os mais diferentes aspectos. É a situação em que se grava um novo comercial de televisão, é o momento em que a cidade recebe uma nova atração cultural como um imenso navio-biblioteca que ali atracou recentemente ou mesmo quando o Sr. Beto Albuquerque, Secretário dos Transportes, vai para a imprensa noticiar que dará prioridade para a navegação, para o transporte hidroviário e para a recuperação do Porto. Por estes e por outros motivos afirmamos:  o Cais do Porto de Porto Alegre é um espaço urbano singular. Contudo, a imagem que o cidadão desta cidade constroe do seu porto se altera e se renova constantemente, entre outras coisas, segundo o seu tipo de relação com este espaço ou conforme a maneira como interage neste espaço.
A minha inserção, como pesquisador de iniciação científica, no Projeto Integrado / CNPq  “Estudo Antropológico de Itinerários Urbanos, Memória Coletiva e Formas de Sociabilidade no Meio Urbano Contemporâneo”[1], me levou a um primeiro contato com o Cais do Porto. Proponho, hoje na condição de aluno do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social (PPGAS), continuar esta investigação científica, agregando novos elementos colhidos nas atividades de campo, bem como, acrescentando novos pressupostos teóricos trabalhados nas disciplinas curriculares do curso mencionado.
Diante do universo mais geral, que é toda a cidade, o projeto supra mencionado  propunha trabalhar com alguns micro-universos, fundamentais para o entendimento e a reconstrução etnográfica da cidade como um todo. O Cais do Porto de Porto Alegre foi um destes micro-universos selecionados para esta pesquisa e coube a este pesquisador  desenvolver as atividades de pesquisa e análises naquele local.
Comecei a realizar esta investigação em novembro de 1997, quando passei a realizar várias idas a campo, a fim de etnografar o Cais do Porto, ou seja, a partir deste momento, me dispus a “estabelecer relações, selecionar informantes, transcrever textos, levantar genealogias, mapear campos, manter um diário e assim por diante” (GEERTZ, 1988)
Abordo o meu objeto de estudo através  do método etnográfico,  (pesquisa qualitativa), incorporando as técnicas de observação direta e participante e pesquisa direta e não participante, complementadas com a realização de entrevistas e com a produção de imagens fotográficas e  iconográficas. Destaco que entendo a observação participante como uma importante técnica de pesquisa, pois trata-se de “um processo pelo qual mantém-se a presença do observador numa situação social com a finalidade de realizar uma investigação científica. O Observador está em relação face-a-face com os observados e, ao participar da vida deles no seu cenário natural, colhe dados. Assim, o observador é parte do contexto sob observação, ao mesmo tempo modificando e sendo modificado por este contexto.”[2] 
Para esta monografia[3], o principal objetivo é  trabalhar com o depoimento de dois informantes, a fim de proceder a análise e a compreensão das suas relações de pertencimento que  constróem com o Cais do Porto de Porto Alegre. Sendo trabalhadores (um aposentado e outro ainda em atividade) deste espaço urbano, a sua relação com o Cais está voltada especialmente para uma atividade laboral que exerceram (ou que exercem) neste local. Eles lembram e recuperam informações de diferentes camadas e instantes de tempo que viveram no Cais do Porto. A análise destas informações também nos permite perceber importantes aspectos da dinâmica social e da organização físico-espacial deste espaço urbano, sendo este também um dos objetivos desta pesquisa. Dito de outra forma, pretendemos, entre outras coisas, caracterizar a singularidade deste espaço urbano, investigando as suas especificidades (arquitetônicas, urbanísticas, sociais e econômicas), a partir das construções mnemônicas e relatos dos informantes, bem como das suas observações sobre a organização físico-espacial, deste espaço urbano.
Esta monografia está dividida da seguinte forma.  Em um primeiro momento,  trago algumas informações introdutórias sobre o Cais do Porto de Porto Alegre e a sua atual organização físico-espacial. Trata-se de recuperar alguns aspectos históricos e sociais da configuração da cidade e do seu porto, conjugando-os com pressupostos teóricos que nos orientam na parte da investigação da espacialidade deste espaço urbano. O segundo momento deste trabalho está cunhado em cima de um esforço analítico sobre as prinicpais teorias e  autores que norteiam esta investigação científica. No momento seguinte a este, debruço-me especificamente sobre as informações trazidas pelos informantes, tentando fazer um esforço de análise e compreensão, além de descrevê-las.
Nos anexos, trago algumas imagens fotográficas que produzi durante as atividades de campo e que colaboram para o entendimento de alguns aspectos trabalhados no corpo textual desta monografia.











                              










1. O  CAIS  DO  PORTO  DE  PORTO  ALEGRE

A fim de introduzir algumas informações disponibilizadas pela historiografia sobre Porto Alegre e seus equipamentos urbanos, faremos aqui uma breve e rápida contextualização do aparecimento do Cais do Porto de Porto Alegre.
A proposta de se construir o Cais do Porto de Porto Alegre surgiu em 1911 e estava inserida no seguinte contexto sócio-ambiental: Com o crescimento da cidade e a necessidade crescente de se incrementar a infra estrutura que permitisse desenvolver as atividades econômicas e comerciais por vias fluviais, vieram os primeiros problemas ambientais observados já em 1866. Nesta época foi proibida a coleta de água no canal do Guaiba [4] que começava a ter as suas margens poluídas pelos excrementos da população depositados diariamente pelos cubeiros[5] e por outros dejetos produzidos a partir das inúmeras atividades ribeirinhas.
Juntamente com estes problemas ambientais, surgem as primeiras ocorrências de doenças contagiosas e pestes, como a epidemia de cólera que se abateu sobre a cidade entre 1875 e 1876. Assim passam a ser pensadas alternativas que colaborassem para o saneamento e a melhoria das condições de higiene do rio e das suas ribeiras.
Em conseqüência da reunião destes fatores,  surge uma alternativa, entendida na época como uma proposta ideal para estas necessidades de melhoramento e saneamento da cidade, a construção do Caís do Porto. Assim, no mesmo ano, começa a ser construído o atual Caís do Porto de Porto Alegre que tinha dois objetivos em especial:
1 - Unificar a porta de entrada da cidade, melhorando o aspecto para quem aportava em Porto Alegre, dado que na época, a maior parte do transporte de passageiros e de cargas acontecia por hidrovias e ferrovias.
2 -  Higienizar e normalizar [6]   [7] as atividades econômicas locais, uma vez que nesta época, por volta de 1900, existiam mais de 30 trapiches na área central da cidade, onde eram desenvolvidas inúmeras atividades comerciais.
   Ao ser concluído, o novo porto, além de melhorar o escoamento da produção industrial crescente, enfim podia ser considerado como uma nova e ampliada porta de entrada da cidade que se construía e se pretendia grande e desenvolvida.


1.1 A Atual Organização Físico-Espacial do Cais do Porto da Cidade de Porto  Alegre 
“Não podemos situar o homem e o espaço um do lado do outro. Não podemos dissociar o homem do espaço”  HEIDEGGER


As duas grandes categorias sempre em pauta para os cientistas sociais, espaço e tempo, dificilmente podem ser isoladas ou consideradas de forma parcial. Bachelard cita Gaston Roupnel neste sentido, afirmando que este último o fez entender “o lento ajuste das coisas e dos tempos, a ação do espaço sobre o tempo e a reação do tempo sobre o espaço. Com a mesma clareza com que delineia figuras no espaço, a planície arada nos delineia figuras de duração.” (BACHELARD, 1988) Portanto, mesmo tendo a ênfase deste estudo repousada nas noções de temporalidade trazidas pelos informantes, não poderia deixar de também repousar a minha atenção analítica sobre a espacialidade de Cais do Porto. E se houver o problema de as categorias tempo e espaço se confundirem ou se perpassarem de forma equivocada, recorre-se a topoanálise, proposta de Bachelard que ensina: “Por vezes acreditamos conhecer-nos no tempo, ao passo que se conhece apenas uma série de fixações no espaço da estabilidade do ser, de um ser que não quer passar no tempo, que no próprio passado, quando sai em busca do tempo perdido, quer ‘suspender’ o vôo do tempo. Em seus mil alvéolos, o espaço retém o tempo comprimido. É essa a função do espaço.”(BACHELARD, 1993)
 Na contextualização do surgimento do Cais do Porto de Porto Alegre é possível perceber alguns aspectos da interação do porto-alegrense com o seu rio e a sua estrutura portuária. Neste sentido, a contribuição teórica e metodológica de arquitetos, urbanistas e outros profissionais de áreas afins colaboram na intervenção antropológica em espaços urbanos singulares como o que aqui investigamos. Schulz[8] é um destes profissionais que por intermédio da arquitetura propõe uma nova maneira de abordar o problema do espaço arquitetônico baseado em três pressupostos básicos: I – O Espaço Arquitetônico pode ser interpretado como uma concretização de esquemas ambientais ou imagens que são uma parte necessária da orientação geral do homem ou de “seu estar no mundo.”; II –  O interesse do homem pelo espaço tem raízes existenciais, ou seja, deriva de uma necessidade de adquirir relações vitais com o ambiente que o rodeia para colocar sentido e ordem a um mundo de acontecimentos e ações; III – Sua orientação para os diferentes objetos pode ser cognitiva ou afetiva. (Norberg-Schulz, 1975)
Coletei várias evidencias físicas, interacionais e institucionais que me levam a demarcar, dentro deste espaço físico estudado, perímetros que delineiam o centro do Cais do Porto em contraste com outros perímetros que delineiam os lugares (periféricos) do Cais do Porto. A inspiração vem novamente de Schulz que ensina  “en lo que se refiere a la percepción espontánea, el espacio del hombre está ‘subjetivamente centrado’”(NORBERG-SCHULZ, 1975).
O centro do Caís do Porto é compreendido pela área que envolve o Pórtico Central, mais os Armazéns A, A1, B e B1. Os lugares (periféricos) estão no eixo que foge deste centro, ou seja, para a direita de quem entra pelo portão central, pela área compreendida entre os Armazéns B2 e B3, para a esquerda de quem entra pelo portão central, pela área compreendida entre os Armazéns A2 e A7.
Rio Guaiba
 




Centro
 
                                              Lugares                                    Lugares

Entrada Central
Do Cais do Porto

Avenida Mauá

No que se refere as suas principais características, poderíamos dizer que o centro do Cais é bastante vigiado, observado, cuidado e normalizado. Neste setor circulam diariamente diversas pessoas e automóveis, funcionários permanecem trabalhando, especialmente os que encarregam-se do controle e da vigilância dos espaços e dos prédios. O estado de conservação dos prédios, muros, cercas e portões é razoável e a iluminação é boa. Os lugares são marcados pela inexistência total de circulação de pessoas ou automóveis, estão totalmente desguarnecidos de qualquer tipo de aparatos de vigilância e observação. O estado de conservação dos prédios, muros, cercas e portões é deplorável e a iluminação é precária.









































2.  Revisão Crítica da Bibliografia

Neste segmento do texto tentarei, de forma sucinta, sistematizar os estudos teóricos dos autores pertinentes à temática desta monografia. O centro desta preocupação teórica está nas concepções de memória e de tempo-espaço, tendo em Bachelard a ênfase destas noções, por entender que o estudo da memória, mais do que a busca da rememoração, é a análise das superposições temporais, da percepção dos ritmos ordenados nas narrativas dos sujeitos que relacionam o pensamento dramático ao reconhecimento de si e de sua identidade.
A construção social da memória moderna tem intima relação com o idealismo que teve a sua contribuição para o  progresso do conhecimento, bem como para a construção dos instrumentos e concepções que foram penetrantes para esta análise. O idealismo, diz Lefebvre, se fecha sobre o EU, “Ele porta ao absoluto, uma pequena experiência fortemente suspeita: a consciência puramente subjetiva”.  Depois da Antigüidade, resgato Aristóteles e a sua “Teoria da Alma” para fazer a primeira referencia ao estudo da memória contemporânea.
A Teoria da Alma de Aristóteles começa com uma interessante definição. A Alma é todo o princípio vital de qualquer organismo, a soma de seus poderes e processos. Nas plantas, a alma é meramente uma força nutritiva e reprodutora; nos animais, é também a força sensitiva e locomotora; no homem, é também a força da razão e do pensamento. A Alma, como a soma das forças do corpo, não pode existir sem ele; os dois são separáveis apenas em pensamento, mas na realidade um todo orgânico. Uma alma pessoal e particular só pode existir no seu próprio corpo. Apesar disso, a alma não é material, tampouco morre por inteiro. Uma parte do poder tradicional da alma humana é passiva: está vinculada a memória e morre com o corpo que continha esta, mas a razão ativa, o puro poder de pensamento, é independente da memória, não sendo tocado pela decadência. A razão ativa é o universal, que se distingue do elemento individual do homem; o que sobrevive não é a personalidade, com suas afetações e desejos transitórios, mas a mente em sua forma mais abstrata e impessoal.
Buscando uma referência mais contemporânea sobre o estudo da memória, é inevitável a presença de Henri Bergson (1859-1941) em qualquer investigação neste campo de conhecimento. O próprio Bachelard vai afirmar que de Bergson ele tomará quase tudo com uma  exceção para a concepção bergsoniana da continuidade.
 Filósofo, autor de “Essai sur les données immédiates de la conscience(1889), Matière et mémoire (1896), Le Rire (1900), L’évolution créatrice (1907), tem o seu trabalho voltado para uma construção do conhecimento do tipo espiritualista.
Para Bergson, lembrar significa um movimento de vir de baixo, isto é, vir à tona o que estava submerso, sendo que essa volta ao passado combina-se com o momento atual e o presente. São portanto, pormenores da nossa experiência passada que perpassam as lembranças e trazem à tona um momento único já vivido. É um processo evocativo por meio da memória e refere-se a uma situação definida e individualizada [9].
O mundo exterior se impondo a todos como uma evidência,  ao menos nos seus começos, poderia reconhecer a supremacia do objeto e se orientar em direção de uma interpretação materialista. Mas justamente, a evidência e a importância dos fenômenos da natureza, obrigam a colocar as questões, ou seja, para explicar o real, o homem inventou o sobrenatural. Os espíritos  são no início mais forte que a matéria que lhes comanda.
A concepção de Memória em Bergson é a de uma memória pura, ou seja, o passado inteiro está no nosso inconsciente. Temos então a memória como conservação do passado, este sobrevive, quer chamado pelo presente sob as formas da lembrança, quer em si mesmo, em estado inconsciente.
Em Bergson, o método introspectivo conduz a uma reflexão sobre a memória em si mesma, como subjetividade livre e conservação espiritual do passado, sem que lhe parecesse pertinente fazer intervir quadros condicionantes de teor social ou cultural. A memória é uma força espiritual prévia a que se opõe a substância material, seu limite e obstáculo. A matéria seria, na verdade, a única fronteira que o espírito pode conhecer. A matéria levaria ao esquecimento. Ela bloqueia o curso da memória. Nessa grande oposição de memória e matéria, a última aparece como algo genérico, indiferenciado, espesso, opaco. Em um ponto, entretanto, esse obstáculo é vencido: naquele vértice do cone[10] invertido, ponto móvel da percepção que avança no presente do corpo, mas entreabre a porta às pressões da memória.
No estudo de Bergson defrontam-se, portanto, a subjetividade pura (o espírito) e a pura exterioridade (a matéria). A primeira filia-se a memória, à segunda, a percepção. Não há, no texto de Bergson, uma tematização dos sujeitos que lembram, nem das relações entre os sujeitos e as coisas lembradas: como um sociólogo para se propor a preencher esse vazio. (Bosi p 16).
Matéria e Memória é uma das primeiras obras de Bergson, esta destaca-se pela relação com a investigação científica: orienta-se pela biologia.
Seu título demonstra que a estrutura da memória é considerada como decisiva para a estrutura filosófica da experiência. Na verdade, a experiência é matéria da tradição, tanto na vida privada quanto na coletiva. Forma-se menos com dados isolados e rigorosamente fixados na memória, do que com dados acumulados, e com freqüência inconscientes, que afluem à memória. Bergson não tem, por certo, qualquer intenção de especificar historicamente a memória. Ao contrário, rejeita qualquer determinação histórica da experiência, evitando com isto, acima de tudo, se aproximar daquela experiência, da qual se originou sua própria filosofia, ou melhor, contra a qual ela foi remetida. É a experiência inóspita, ofuscante da época da industrialização em grande escala. Os olhos que se fecham diante desta experiência confrontam outra de natureza complementar na forma de sua reprodução espontânea. A filosofia de Bergson é uma tentativa de detalhar e fixar esta imagem reproduzida.
Segundo Bergson, para medir o tempo, a ciência fabrica o verdadeiro dado temporal, ou seja, a duração. Ao contrário do tempo da ciência, a duração não é quantitativa, mas apenas qualitativa. A mesma hora do relógio pode parecer interminável, se vazia ou se ocupada pelo tédio ou pela espera, e pode parecer um instante, se preenchida por uma vida psicológica intensa.
 Para Bergson, a consciência deriva de um processo inibidor da condução do estímulo à ação respectiva. Ação e percepção dependem do esquema corporal, do presente e do ambiente. Na percepção existe o vazio entre a ação e a reação, povoado de imagens que, trabalhadas, tornar-se-ão signos da consciência. Abre-se a possibilidade da indeterminação da ação consecutiva, complexificação e matização do pensamento. Bergson opõe percepção atual à lembrança. Este universo último não se constituiria da mesma forma que se disse se constituem as percepções e idéias.
A fim de ilustrar o que está afirmando, Bergson propõe “O cone da memória”[11]. A proposta é mostrar que, entre outras coisas, existe uma diferença evidente entre o espaço profundo e cumulativo da memória e o espaço raso e pontual da percepção imediata..
Na análise interna e diferencial da memória o passado conservado não atua no presente de forma homogênea. Bosi, trabalhando com Bergson, destaca que temos aqui dois tipos de memória, a memória hábito e a memória lembrança. A  Memória hábito é referente aos mecanismos motores, esquemas de comportamento guardados pelo corpo, dos quais se vale, muitas vezes, automaticamente. Adquire-se pelo esforço da atenção e pela repetição. Se dá pelas exigências da socialização, parte de nosso adestramento cultural e uma outra memória – referente à lembranças independentes de quaisquer hábitos, isoladas, singulares, ressurreições do passado. Caráter não mecânico, mas evocativo. Lembrança pura se atualiza na imagem-lembrança. Matéria latente nas zonas profundas do psiquismo (inconsciente). Não raro, a relação entre as duas memórias é conflitiva. A imagem lembrança se refere a uma situação definida e única, ao passo que a memória hábito já se incorporou às práticas do dia-a-dia, parecendo fazer um só com a percepção do presente.

Pensador presente em muitos dos  estudos de memória (obrigatório para uns, dispensável para outros), Maurice Halbwachs é o autor que passamos a contemplar a partir deste momento. Halbwachs, estudioso das relações entre memória e história pública, relativiza a ênfase na pureza da memória e propõe uma a Teoria Psicossocial no contexto do estudo da memória. Se, para Bergson, o confronto se dá entre a subjetividade do espírito (memória) e a exterioridade da matéria (percepção pura), Halbwachs vai afirmar que lhe falta uma tematização do sujeito que lembra, dos nexos interpessoais, das relações entre os sujeitos e as coisas lembradas, enfim, o tratamento da memória como fenômeno social. 
Halbwachs não vai estudar a memória em si, mas os quadros sociais da memória. A memória do indivíduo depende de seu relacionamento com seus grupos de convívio e referência. Dando relevo às Instituições Formadoras do Sujeito, relativiza o princípio caro a Bergson de conservação do passado inteiro pelo espírito. Ao contrário, realça a iniciativa da vida atual, das representações que povoam a consciência atual do sujeito no desencadeamento do curso da memória. Na maioria das vezes, lembrar é reconstruir com imagens de hoje as experiências do passado, sendo a lembrança só excepcionalmente onírica. “A Memória não é sonho, é trabalho” (BOSI, 1994). Lembrar o passado no presente exclui a identidade entre imagens de um e de outro, propondo sua diferença em termos de ponto de vista.
Halbwachs amarra a memória da pessoa à do grupo, e esta à memória coletiva de cada sociedade. As imagens oníricas também não tem caráter puro. Sua aparente indeterminação  pelo presente que se deve à frouxidão relativa da consciência que os acompanha é compensada  pela intervenção constante que a auto-imagem do eu faz sempre que o passado remoto é sonhado ou evocado. De qualquer forma, é no sonho que o espírito está mais afastado da sociedade.
O instrumento socializador da memória é a linguagem. Aproxima e unifica no mesmo espaço histórico-cultural diversas dimensões de imagem. Espaço, tempo, causa e conseqüência, entre outras noções gerais coletivas e inerentes à língua estão presentes em todo tipo de representação, não havendo, assim, criações puramente individuais. As convenções verbais constituem o quadro mais estável e elementar da memória coletiva.
A interpretação social de Halbwachs à capacidade de lembrar é radical. Não se trata apenas de um condicionamento externo de fenômenos internos. Já no interior da lembrança trabalham noções gerais de filiação institucional, veiculadas pela linguagem.
Graças às noções gerais, imagens resistem e transformam-se em lembranças. Só se tornam imagens evocáveis as imagens do sonho sobre as quais nossa atenção e reflexão se fixaram quando acordados, enfeixadas antes que se esvaíssem.
O estudo das lembranças de pessoas idosas é um verdadeiro teste para a hipótese psicossocial da memória. Nelas é possível encontrar uma história social bem desenvolvida:  já atravessaram determinado tipo de sociedade, com características bem marcadas e conhecidas;  já viveram quadros de referência familiar e cultural igualmente reconhecíveis, enfim, sua memória atual pode ser desenhada sobre um pano de fundo mais definido do que o de quem ainda está absorvido nas contradições de um presente que solicita mais intensamente do que a uma pessoa de idade.
Halbwachs  opõe o sentido da evocação do velho ao do adulto: este, entretido nas tarefas do presente, não procura habitualmente na infância imagens relacionadas com sua vida cotidiana, sendo a hora de evocação a do repouso. Para ele, memória é fuga. O velho, ao lembrar do passado, não está descansando das lides cotidianas, mas se ocupando consciente e atentamente do próprio passado, da substância mesma de sua vida. O que rege a atividade mnemônica é a  função social exercida atualmente por quem lembra. No momento em que o homem maduro deixa de ser membro ativo da sociedade, resta-lhe a função de lembrar, de ser a memória do grupo, da família, da instituição e da sociedade. Espécie singular de obrigação social que não pesa sobre indivíduos de outras idades. A pressão dos preconceitos e as preferências da sociedade dos velhos podem recompor a biografia individual e grupal ideologicamente.


Como citei no início deste trabalho, Bachelard representa uma referência especial para este estudo, em função da particularidade da sua proposta analítica e da sua expressividade intelectual. Portanto, vamos acompanhar agora alguns dos principais aspectos que recolhemos da sua vida e obra.
Gaston Bachelard (1884-1962), docente na Sorbonne (Prosa filosófica e historiador das ciências do conhecimento), autor de “A formação do espírito científico”, inova, revoluciona e altera significativamente as bases do pensamento científico ao escrever a “A dialética da duração”[12] e ao defender pressupostos como “ A continuidade psíquica não é um dado, mas uma obra”[13].
Bachelard, mais do que um filósofo, pois foi um fenomenólogo ou um arqueólogo da vida humana, propõe um estudo dos níveis de simbolização do real, das camadas das lembranças e associações. Portanto, pode ser nominado também como um “geólogo da imaginação” ou “alquimista da alma humana”. Epistemologicamente é adversário dos que chama “continuistas da cultura”,  ou seja dos que queriam que a passagem seja insensível do conhecimento comum ao conhecimento científico, do empirismo ingênuo ao racionalismo, da observação fortuita à experimentação calculada.  Ele critica aos continuistas históricos, que crêem facilmente reviver os eventos na continuidade do tempo, dando insensivelmente a toda história a unidade e a continuidade de um livro.  O tempo histórico é identificado como o tempo da leitura, e a realidade histórica ao livro que a descreve, a história da ciência se torna a experiência imaginário de um leitor.
Longe das concepções de continuidade bergsoniana, concebe o tempo como algo que se perde e nos perde, numa fragmentação incessante de instantes. Bachelard e Proust, analisam a descontinuidade temporal, pois o tempo é ritmo, camada, censura infinitamente reconduzida.  O tempo é vibração e exige uma análise ela mesma vibrante,  de maneira que seja uma simples tradução desta oscilação dos instantes em nós, sem  portar nenhuma restruturação conceptual. A análise do tempo deve ser uma ritmanálise[14], um ensaio de adequação jamais alcançada entre a palavra que resta e o momento que passa, uma simples relação de frases em fuga.
A ritmanálise é a harmonia do segundo, construção de uma harmonia explicativa que se superpõe à harmonia quase melódica do tempo e de sua descontinuidade.  A vida, nos seus progressos, é feita de tempos bem ordenados, ela é feita verticalmente, de instantes superpostos ricamente orquestrados, ela se re-liga a ela mesma, horizontalmente, pela ajusta cadencia dos instantes sucessivos unificados no papel. A linguagem fixa o movimento em estática, reduz a descontinuidade em frases bem ordenadas, impõe ao ritmo dos instantes o ritmo das palavras.
Critica a história normalizada representada por uma linha progressiva, símbolo da continuidade. Sim, existe uma continuidade que deve ser apreendida entre a razão e o imaginário.  Há uma continuidade que é uma ilusão, ela nos parece ser espontânea e de legitimidade.  E são nossas certezas imediatas que projetamos sobre a história para lermos no desenvolvimento da história a mesma continuidade que pensamos ter.  Para Bachelard a verdadeira prudência metodológica é de postular uma descontinuidade desde que estejamos certo que uma mudança se produz, enquanto que a tendência habitual é de postular uma continuidade subjacente.
Bachelard vai  propor uma filosofia do repouso, pois admiti o repouso como direito do pensamento e um dos elementos do devir. Em “A Dialética da Duração” externa a convicção de que o repouso está no âmago do ser, mesclado ao devir compartilhado deste último, deve ser sentido no nível da realidade temporal que fundamenta a consciência e a pessoa. Sendo que é na parte impessoal da pessoa que o filósofo deve buscar zonas e razões do repouso, para com elas fazer um sistema filosófico deste. A inteligência aparecerá como uma função que cria lazeres e os fortalece. A consciência pura aparecerá como potência de espera e guarda, como liberdade e vontade de nada fazer.
Poderes negadores do espírito, dialética do ser na duração: o espírito poderia chocar-se com a vida, opor-se a hábitos inveterados, fazer o tempo refluir sobre si mesmo para suscitar renovações do ser, retornos a condições iniciais. Ações positivas e negativas do tempo como igualmente importantes.
Ao esvaziar o tempo vivido daquilo que tem de excessivo, na tarefa de seriar os diversos planos de fenômenos temporais, se descobre que os fenômenos não duram do mesmo modo. A diversidade temporal dos fenômenos é imperfeitamente resumida numa concepção de tempo único e contínuo. Não há nenhum sincronismo entre a passagem das coisas e a fuga abstrata do tempo. É necessário estudar os fenômenos temporais cada qual segundo um ritmo apropriado e um ponto de vista particular.
A postulação metafísica da existência de lacunas na duração é tarefa do estudo, e opõe-se a concepção contínua de Bergson. Examinando os diversos planos do encadeamento do psiquismo, percebemos as descontinuidades de sua produção. Assim, a continuidade psíquica não é um dado, mas uma obra.
De Roupnel toma a noção que ensina sobre “o lento a ajuste das coisas e dos tempos” e a ação do espaço sobre o tempo e a reação do tempo sobre o espaço. A concepção de Roupnel - A noção de ritmo exprimiria melhor o que se passa – vai influir significativamente a obra de Bachelard. A noção de ritmo exprimiria melhor o que se passa. O que dura, permanece, é  o que tem razões para recomeçar. Ao lado da duração pelas coisas há a duração pela razão. Toda duração verdadeira é essencialmente polimorfa; a ação real do tempo reclama a riqueza das coincidências, a sintonia dos esforços rítmicos.
Bachelard critica duramente a concepção tradicional da historiografia, pois considera que a  continuidade que os historiadores comprovam ao lerem os eventos num ato continuo, não é nada mais que nossa emoção, nosso tormento, nossa melancolia e o papel da emoção não é talvez que de acalmar a novidade sempre hostil.  Dessa forma podemos supor que a vontade de postular um continuum subjacente não é outra coisa que o desejo de deixar subsistir no presente alguma coisa do passado que assegura, diminuindo o aporte da mudança observada afim que ela não pareça como total.  Este desejo pode ter o nome de medo. Medo do novo, medo da mudança, meda da mobilidade, a mobilidade estando indissociável da transformação.   É necessário de colocar em relevo aqui a presença de um julgamento moral, aliás confessado por Bachelard em outros lugares. A distinção que nos avançamos entre uma boa e uma ma continuidade ia neste sentido. O bem, termo assim freqüente sob forma adverbial em sua obra, é ligada ao movimento.  Igualmente ligado ao leve (leveza, superficial). De fato a má continuidade é introduzida pelo sentimento, a emoção, a alma. “A alma coloca a confusão desses sentimentos sob as determinações descontínua do espírito”.  Mas não devemos nos deixar  prender nessas fantasias morais ou imaginárias, esta má continuidade é também contrária a um só método. O medo do novo é uma vontade de fechar o sistema dos conhecimentos, de lhes fixar uma vez por todas, entretanto que lhe pesando sua aparência à mania não científica de colecionar as observações sem procurar a distinguir aquelas que podem ser significativa.
Existe a boa continuidade que encontramos no domínio científico. O pensamento científico é o princípio que dá o plus de continuidade a uma vida, ele é, entre tudo, rica de uma potência de coerência temporal ou, para empregar um conceito de Korzybski, o pensamento científico é eminentemente time-binding.  Nos reencontramos aqui, uma vez mais ao mesmo tempo, os termos de continuidade e de vida. Acrescenta-se aqui o verbo “ligar” e propõe a superposição seguinte: contra a ilusão continuista e o realismo  que o sustenta, parece que o tempo e o discurso cientifico são descontínuos. Conceito e instante jogam o mesmo papel.  É sobre o fundo dessa descontinuidade que pode se estabelecer, pela ligação, uma continuidade verdadeira e não ilusória, que esta continuidade comanda a vida do saber ou a linha geral da história das ciências.
O instante não é para ele de nenhuma forma a fronteira indiferente entre o passado e o futuro. Ao contrário, é o instante presente que funda ao mesmo tempo o passado e o futuro porque ele é pura passagem, puro movimento. “O passado se hierarquiza no presente sob a forma de um desenho, nesse desenho as lembranças decididamente envelhecidas são eliminadas. E o desenho projeto no futuro uma vontade já formada, já desenhada. O ser duradouro, tem bem no instante presente onde se decide o cumprimento de um desenho, o benefício de uma verdadeira presença” (BACHELARD, 1994).  O ser que vive o instante de forma dinâmica é justamente o que dura.  O movimento é possível graças a uma hierarquização,  a colocada em ordem do passado.  O tempo é uma ordem e não é outra coisa, e toda ordem é um tempo. O instante real supõe uma multiplicidade de elementos ligados segundo uma hierarquia. O desenho que faz do ser um ser duradouro procede, em engajando um psiquismo polimorfo numa ação escolhida com discernimento. A necessidade da pluralidade é regularmente afirmada nos contextos mais diversos. Assim é sempre a mesma conclusão: um processo homogêneo não é jamais evolutivo. Só uma pluralidade pode durar, pode evoluir, pode almejar o devir. E o devir  é uma pluralidade polimorfa. Se nossas tentativas de superposição são alguma coisa de ser admissível, é preciso deduzir que o conceito é ele mesmo uma multiplicidade ordenada, de mesmo que ele é dado na hierarquia em uma ordem mais geral.
A boa continuidade é então possível a partir de uma descontinuidade que não isola os elementos estáticos, mas dinâmicos.  E se o pensamento científico pode dar a vida uma continuidade é bem por que os conceitos não se cimentarão.  O Instante verdadeiro  é um tempo e cria uma verdadeira duração e a imagem verdadeira obra de continuidade. A palavra não existe em si, mas tem sentido num sistema que porta em poética o nome de complexos. A poética é sem dúvida uma disciplina, ela é talvez uma ciência. Ela  tem o rigor e a exigência, que é de testemunho e de purificação.
Para encerrar, reforçaria mais uma vez que, em Bachelard, a noção de ritmo é a noção temporal fundamental, pois os fenômenos da duração são construídos com ritmos  que não estão fundados numa base temporal regular e uniforme. Ensina Bachelard: “Para durarmos, é preciso então que confiemos em ritmos, ou seja, em sistema de instantes. (...) ”













































3.  O  QUE  DIZEM  OS   INFORMANTES  SOBRE  O  CAIS  DO  PORTO


“O velho não se contenta, em geral, de guardar passivamente que as lembranças o desperte, ele procura precisá-las, ele interroga outros velhos, compulsa seus velhos papéis, suas antigas cartas e, principalmente, conta aquilo de que se lembra quando não cuida de fixá-lo por escrito. Em suma, o velho se interessa pelo passado bem mais que o adulto, mas daí não se segue que esteja em condições de evocar mais lembranças desse passado do que quando era adulto, nem, sobretudo, que imagens antigas, sepultadas no inconsciente desde sua infância, ‘recobrem a força de transpor o limiar da consciência’ só então.”[15]

Em um outro momento desta pesquisa[16], optei por trabalhar com os depoimentos dos  entrevistados que, a partir das suas lembranças, construíam referências de pertencimento afetivo e social ao espaço do Cais do Porto de Porto Alegre, destacando o tempo vivido no passado a partir de um porto vivo (o porto antigo), rememorado diante da situação atual de um porto morto (o porto atual). Naquele momento, destaquei depoimentos do tipo: “ Ta morto!  Isso aqui morreu! Eu sou do tempo em que isso vivia cheio de navios, tinha uns ancorados aguardando espaço pra encostar pra carregar ou descarregar.”  (C. D.)
Destaquei que a memória do  porto vivo (antigo) remetia às lembranças das inúmeras atividades comerciais, econômicas e sociais ali vivenciadas pelos entrevistados. O Porto Antigo está articulado minemonicamente ao movimento de pessoas, a ocupação dos espaços, a produção de serviços, enfim aos símbolos - mitos da vida. Naquelas entrevistas, foi relatado, com um imenso sentimento de saudade, o tempo em que o cais recebia diariamente inúmeros navios de cargas e de passageiros, configurando assim uma dinâmica portuária intensa e bem articulada com a dinâmica social da cidade de Porto Alegre. Metáforas muito interessantes são utilizadas para lembrar deste período de intensa atividade do porto vivo como, por exemplo, a que fala de “uma plantação de navios”: “ A gente olhava assim aquela plantação de navio! Parecia uma plantação... tudo ancorado..., um batendo do lado do outro, esperando a hora de encostar no cais prá descarregar ou carregar. Navios estrangeiros, de toda nacionalidade! Navios grandes. Hoje só vem caíque, naviozinho pequeno, barquinho pequeno.” (M. C.)
Em um contraste direto com a referencia ao porto vivo, havia a referencia ao porto morto. A memória do  porto morto  remetia às lembranças das exíguas atividades comerciais, econômicas e sociais  vivenciadas atualmente. Destacava que o Porto, no seu formato atual, estáva articulado minemonicamente a inexistência de movimento de pessoas, a desocupação dos espaços, a ociosidade e a decrepitude dos equipamentos e das instalações, a apatia dos poucos trabalhadores que ainda permanecem atuando, enfim aos símbolos - mitos da morte. Agregava a isto as expressões “isto aqui morreu”, “o cais está morto”, pois eram utilizadas diversas vezes pelos entrevistados para falar da atual dinâmica do cais do porto e remete a estas características de não vida[17].
Para esta monografia, selecionamos apenas dois informantes, a fim de proceder a análise e a compreensão das suas relações de pertencimento que  constróem com o Cais do Porto de Porto Alegre. Sendo trabalhadores (um aposentado e outro ainda em atividade) deste espaço urbano, a sua relação com o Cais está voltada especialmente para uma atividade laboral que exerceram (ou que exercem) neste local. Eles lembram e recuperam informações de diferentes camadas e instantes de tempo que viveram no Cais do Porto.
O Engenheiro Abreu Lima possui 31 anos de trabalho no setor portuário, tendo sido subdiretor geral, diretor geral interino e administrador do Porto de Porto Alegre. Começou as suas atividades em 1952 como funcionário do DEPREC (Departamento Estadual de Portos, Rios e Canais), tendo trabalhado alguns anos também na PORTOBRAS em Brasília. Além disso foi um dos fundadores do Instituto de Pesquisas Hidráulicas (IPH) da UFRGS, onde lecionou por vários anos. Possuía um grande acervo de mapas, plantas, livros e demais materiais informativos sobre pesquisas hidráulicas, história de construção e desenvolvimento do Porto de Porto Alegre, projetos sobre enchentes e inundações, entre outros temas desta área. Não tendo mais espaço e condições de armazenamento para este acervo, decidiu doar para a biblioteca do IPH, onde se encontra até hoje. Apesar de já estar aposentado a muito tempo, ainda demonstra estar atualizado sobre os assuntos da sua área, através de contatos com colegas engenheiros do Brasil e do exterior e também através das pesquisas que faz na Internet.
Apesar de ter a idade bastante avançada (cerca de 70 anos), demonstra total lucidez e plena condição de lembrar de situações muito específicas e pontuais da sua carreira profissional. Cita, por exemplo, com muita satisfação uma intervenção (uma das mais importantes) da sua administração que perdura até hoje:
“Lembro da situação em que eu introduzi uma melhoria no sistema de balizamento da lagoa (rio), com uma modificação no sistema de lanternas que antes eram todas abastecidas com acetileno. Um sistema muito bem bolado, sabe ?! e feito aqui, aqui em São Leopoldo por este rapaz que está ai muito popularizado por este aéromovel, o Coester. Fez um sistema espetacular. É o sistema que ainda está sendo usado.”

Abreu Lima refere o tempo tendo como  referência a sua condição de trabalhador da área portuária, utilizando algumas expressões do tipo:
“Só para te dar uma idéia do tempo em que eu trabalhava (...)”

Durante toda a sua fala, destacou e até me solicitou que não aderisse a “uma visão saudosista” do Cais do Porto, pois considera que o porto deve ser avaliado a partir da sua principal função: transporte. Isto não remete a uma posição desprovida de sentimentos e emoções fortes, porém são emoções e sentimentos percebidos através de uma relação essencialmente de trabalho com o Porto. A sua atividade profissional, ou seja, a sua intervenção técnica neste local, que o diferencia de qualquer outra intervenção mais humanista, esta muito presente na sua fala. Neste sentido afirmou:
“Porto nenhum morre, essa coisa que o porto morreu é besteira. (...)
Qual era o interesse das pessoas ali no porto? Transporte, transporte de passageiros. Isto não existe mais. Agora, o que realmente interessa para o porto, para o navio? Carga. A carga existe, ela está aí, ela precisa ser buscada, estimulada, aparecendo carga no porto o navio vem.”

Em determinado momento fala do corporativismo das categorias profissionais da sua área de atuação, destacando:

“Qual o problema de ser corporativo ? Existem tantas corporações no Brasil”


   O assunto que mais o motivou foi a questão das cheias e os sistemas de proteção contra enchentes adotados em Porto Alegre e em outros países como os Estados Unidos. Lançou mão de materiais (relatórios, plantas e pesquisas da Internet) para falar da sua posição favorável quanto a permanência do Muro da Mauá como um dos instrumentos de proteção da cidade contra as cheias. Pelo menos até o momento em que ele possa ser substituído por um outro dispositivo tão eficaz quanto o atual. Demonstra total conhecimento de todo o sistema de contenção de cheias de Porto Alegre, citando, além do muro, os demais dispositivos de segurança com os seus respectivos fins (reservatórios nos Rios Jacuí e Taquari, aterros como o da Avenida Beira Rio, dicks de contenção, comportas, etc.). Afirma:
“Creio que um dispositivo sozinho não dê conta do recado, então eu acho que o sistema tem que ser uma combinação de vários dispositivos, além de estimular o reflorestamento nas cabeceiras, evitar o açoriamento dos canais (...) são uma série de coisas que devem ser trabalhadas em conjunto (...)”

 Salienta que o problema das enchentes está presente em todo o mundo e está intimamente relacionado com a relação do homem e o seu meio ambiente (rios, mares, córregos, etc.), pois a agressão ao meio é recorrente em todas as partes do globo, então o rio “diz”: 
“Mexeste no meu plano de cheias, agora vou voltar para ele.”

Destaca um engenheiro dos EUA (Corpo de Engenheiros do Exército Americano de onde recebe alguns relatórios) que trabalha no monitoramento de enchentes para o século 21, de onde tira inspiração para a sua própria tese que está baseada na idéia de que o procedimento mais adequado para evitar novas catástrofes no mundo inteiro, provocado por cheias e enchentes, seria a adoção de um procedimento (relativamente) simples: devolver para os rios o seu plano de cheias. Diz que o maior erro da intervenção humana nas áreas de ribeiras de rio foi a ocupação do plano de cheias, portanto o mais sensato seria devolver esta área para os rios.




 


                                                       Plano de Cheias

                                                                    Leito Normal do Rio




Valdemir Lima Fernandes tem 36 anos, é servidor público estadual, policial civil, (Departamento Estadual de Investigações Criminais) e trabalha em turnos de 24 horas (plantões alternados que divide com mais três colegas) no cais do porto no atendimento à ocorrências policiais. Diz que, além de a sua área de intervenção ser toda a extensão do Rio Guaiba, também possui outras atividades como  professor de mergulho, entre outras atividades que cita mais adiante:
“Trabalho no porto na área de combate ao crime na água ou sobre a água ou até debaixo d’água.(...)
Nós estamos aqui a muito tempo por causa da ilha do presídio. Nós somos os egressos da ilha do presídio. A ilha do presídio era do controle da polícia civil. Com o encerramento das atividades lá, viemos para cá com a atribuição de patrulhar toda a bacia (...)
Se houver crimes nas ilhas, nós atendemos. Se necessário, solicitamos apoio do DEPREC.”

Valdemir exalta as suas potencialidades e qualidades profissionais, afirmando que possui vários cursos profissionalizantes que o qualificam para esta atividade no porto (mecânico de embarcações, motorista profissional, instrutor de mergulho e pára-quedismo, etc.) e que, além disso, possui outras habilidades nas áreas dos esportes aquáticos e náuticos. Devido a esta sua qualificação, afirma que até já tentou sair deste local de trabalho, porém não existe outro profissional com a sua qualificação profissional para substitui-lo. Neste sentido, afirma:
“Trabalho aqui a 12 anos, mas estou a disposição (do Estado do RS) para operações em todo o Estado, já trabalhei em todo o Estado, onde tem calamidades e situações de emergência.”
Quando pergunto sobre a sua sensação de trabalhar no porto, relata:
“A navegação no inverno é ruim, por que tem vento e tem chuva, ai da vontade de não fazer, porque é frio, né ! Aqui tem dias que o vento arranca as telhas (aponta para o telhado de um galpão).”

Relata as enchentes que presenciou, destacando que as mais fortes foram as de 1983 e 1986, situação em que trabalhou intensamente no socorro aos flagelados oriundos das ilhas do Guaiba:
“Minha função é coordenar o recolhimento de flagelados em toda a bacia. Buscando gente, levando ranchos, trazendo doentes, transportando pessoas com dificuldades, (...) Em 83 trabalhamos dez meses sem parar. Sábado, Domingo, direto, sem parar, sem folga em nenhum dia. Em 83 a água passava por cima desta pedras aqui (aponta para a beira do rio). Também coordenei aqui no Delta muitas campanhas de vacinação ”

O informante demonstra que percebe a sua atividade profissional como fato definidor da sua relação com o rio e com o porto e é através desta atividade que ele constroe as suas impressões deste espaço urbano:
“Então eu conheço a bacia (e o porto) desta forma, né !  Vacinando o pessoal, atendendo ocorrência, buscando algum crime nas ilhas. Derrepente alguém mata alguém, arrombamento de residências, furtos em casas, já deu também furto de gado nas ilhas. Dá de tudo um pouco, agora as ocorrências estão mais calmas. O acesso por terra para as ilhas está mais facilitado, então diminuiu o nosso trabalho por água. (...)
Só existe um posto policial na Ilha da Pintada, então nós tínhamos  um posto policial ambulante (flutuante) instalado em uma lancha que visitava as ilhas regularmente, averiguando os problemas.”

Fala com tranqüilidade da freqüência com que aparecem cadáveres boiando no rio, afirmando que entre os meses de janeiro e fevereiro a incidência aumenta. Diz que o porto é muito procurado por pessoas com problemas psíquicos e suicidas que freqüentemente aparecem caminhando sem destino certo até a beira do rio e que alguns tentam a morte lançando-se ao rio.
Perguntado sobre qual das atividades que realiza com maior satisfação, responde:
“A atividade mais prazerosa é a busca de provas de crimes em baixo da água. Só para descobrir uma quadrilha de ladrões de carros, eu mergulhei durante 15 dias e encontrei vários chassis de carros e motos que foram jogados no rio.”

Demonstra amplo conhecimento da dinâmica local em terra, água e ar, ao comentar aspectos das embarcações que passavam por nós durante a entrevista, destacando o nome dos barcos, a sua função (carga, rebocadores, turismo, etc.), falando dos acidentes em terra com automóveis e pessoas que já cairam no rio e conversando sobre as manobras dos aviões que decolavam do Aeroporto Salgado Filho e faziam as suas manobras por sobre as nossas cabeças.

Tomando os dois depoimentos em um todo, podemos verificar claramente aspectos comuns entre as falas de Valdemir Fernandes e Abreu Lima e outros aspectos que estão presentes em um e não em outro e vice versa.
A forma e o tipo de relacionamento que ambos constróem com o Cais do Porto de Porto Alegre é a mesma, ou seja, possuem uma relação com este local dada segundo as especificidades das suas atividades de trabalho que desenvolvem ( ou desenvolveram) neste local. Relativizadas, com as devidas proporções, em função das diferentes carreiras e qualidades profissionais que possuem, Abreu Lima é um engenheiro civil e Valdemir é um policial, os dois informantes referem sempre que a sua impressão e o seu conhecimento do Cais do Porto é dada por esta sua interação essencialmente laborial com este espaço da cidade. Situação totalmente antagônica teríamos, por exemplo, se um deles fosse engenheiro e o outro artista plástico, poeta, escritor ou outra coisa do gênero.
A posição diante desta experiência relacional com o Cais do Porto é diferente no depoimento de Abreu Lima, quando relacionado com o depoimento de Valdemir Fernandes. Lima vive com a situação de quem já encerrou a sua carreira, externa a posição do dever cumprido e a sua fala vai sempre no sentido: “eu fiz ...”, “eu realize ....”, “no meu tempo de trabalho ....” Fernandes, profissional ainda em atividade na área portuária, fala de seu cotidiano de trabalho, das sensações de atividades que ainda realiza e que pretende ainda aperfeiçoar, ampliar ou simplesmente perpetuar. Neste sentido, Bosi, trabalhando com a concepção psicossocial de Halbwachs, destaca:
“Para o adulto ativo, vida prática é vida prática, e memória é fuga, arte, lazer, contemplação. É o momento em que as águas se separam com maior nitidez. Bem outra seria a situação do velho, do homem que já viveu sua vida. Ao lembrar o passado ele não está descansando, por um instante, das lides cotidianas, não está se entregando fugitivamente às delícias do sonho: ele está se ocupando consciente e atentamente do próprio passado, da substância mesma da sua vida.” (BOSI, 1994)
Contudo, apesar de reconhecer a amplitude do pensamento de Halbwachs e a sua importância para os estudos de memória, acredito que, a fim de vencer as superfícies e penetrar na essência deste conhecimento transmitido pelos informantes é necessário lançar mão do aparato teórico bachelardiano. Portanto, relembramos que para ter a impressão de que duramos, precisamos substituir nossas recordações, num meio de esperança ou de inquietação, numa ondulação dialética. Não há recordação sem esse tremor do tempo, sem esse frêmito afetivo. Mesmo nesse espaço que acreditamos pleno, a evocação, a confidência, a narrativa ocupam o vazio dos tempos inativos; sem cessar, quando recordamos, estamos misturando, ao tempo que serviu e ofereceu, o tempo inútil e ineficaz.  Reviver o tempo desaparecido é apreender a inquietude de nossa morte. Consciência de fragmentos de morte e de nada no decorrer de nossa vida. Não se pode mais atribuir continuidade ao tempo ao pressentir tão vivamente os desfalecimentos do ser.
Bachelard tem uma frase em “A Dialética da Duração” que trago para o encerramento deste bloco, pois ela fala mais do qualquer outra frase que eu pudesse aqui construir:
“A Vida, em seus sucessos, é feita com tempos bem ordenados; é feita, verticalmente, de instantes superpostos ricamente orquestrados; liga-se a si mesma, horizontalmente, pela justa cadência dos instantes sucessivos unificados numa função.” (BACHELARD, 1950)
 







                                                                                                   [18]













CONCLUSÃO

Este estudo antropológico está ainda em andamento, pois, como foi colocado no início deste, hoje na condição de mestrando do PPGAS / IFCH / UFRGS, venho trabalhando constantemente neste pesquisa. Portanto, as conclusões que aqui apresento não são  finais e acabadas. O que aqui apresento são, na verdade, alguns pontos conclusivos que já foi possível acessar até a atual fase desta investigação científica.
A singularidade deste espaço urbano estudado: o Cais do Porto da Cidade de Porto Alegre, está presente no imaginário dos portalegrenses, de um modo geral, e, de uma forma muito especial, no imaginário dos trabalhadores do Porto (em atividade e inativos). Como pode-se constatar através das lembranças articulados pelos informantes que entrevistei, o porto possui toda uma dinâmica interna própria, uma cultura particular, uma economia e uma sociabilidade muito específica, muito sua, portanto, particular e singular. A duração do tempo portuário e a organização do seu espaço talvez sejam as duas maiores evidências desta singularidade.
Experimentei por diversas vezes uma determinada experiência de “Choque”[19] entre a velocidade e a temporalidade sentida na área intraportuária em relação ao que sentia no momento seguinte a saida do porto[20]. O contraste, por exemplo, entre a corrida intensa e desmedida da urbanidade do centro de Porto Alegre (automóveis, pessoas, etc.), especialmente da Avenida Mauá e adjacências em relação a tranqüilidade, ao ritmo pausado e regrado que se tem  dentro do porto é muito grande, gritante e, até suponho que para muitos, agressivo.
A beira do rio observa-se o deslocamento das embarcações que lentamente desenham formas geométricas na água, dando a impressão de que a sua velocidade médio-ideal é bastante antagônica daquela que a nossa cultura urbana solicita e imprime. Parece que as estas pessoas não “perdem” ou “ganham” tempo, elas “apenas” vivem o seu ritmo que não é o nosso ritmo médio-ideal urbano. Em terra, na área portuária acontece algo análogo, pois o deslocamento tanto de pedestres como de veículos não está organizado essencialmente sob a norma das regras de trânsito, não é vigiado pelos controladores eletrônicos de velocidade (caetanos e pardais), nem é balizado por sistemas físicos de contenção do tipo sonorizadores, quebra-molas, etc.
Todos estes fatores reforçam a nossa tese da singularidade deste espaço urbano, refúgio para “dementes”, como foi relatado por um entrevistado, local de refúgio e abrigo não só para embarcações, mas também para seres humanos que não encontrando outro local para o seu repouso ou para viverem os seus devaneios, se dirigem para o cais do porto.
 As  diversas informações colhidas juntos aos meios de comunicação de massa da cidade (Rádio, televisão e Jornal) também caminham neste sentido. É grande o número de comerciais de TV, por exemplo, que utilizam o porto para produzirem as suas imagens publicitárias. Os armazéns, guindastes, muros “contracenam” com modelos, atores e atrizes famosos nacional e internacionalmente, destacando e reforçando as características deste espaço urbano que representou e continua a representar uma referência muito forte para a cultura e para a história da cidade de Porto Alegre. É também grande o número de vezes que entrevistas publicadas nos jornais tematizam sobre o porto. Por vezes é um novo projeto de lei que propõe recuperar aquele espaço, ou uma viagem do secretário dos transportes que vai até Brasília para solicitar mais verbas para as atividades portuárias, enfim o Cais do Porto de Porto Alegre aparece muito na mídia nos mais diversos formatos, pelas mais diversas razões e com um variado tipo de finalidades.
A par da mídia, acredito que os  entrevistados são portadores (guardiões) de uma definição de tempo construído segundo as suas lembranças articuladas num cotidiano vivido de trabalho com o porto. Portanto, este espaço urbano é singular e os portadores da sua memória também o são, pois  com “o esforço de rememoração criam  tempos e espaços específicos que grudam os sujeitos que lembram a tempos e espaços singulares”. (ECKERT, 1997) Deste modo, surgem maioria das construções mnemônicas que remetem as fortes sensações e relações de pertencimento dos trabalhadores e ex-trabalhadores com o cais do porto de Porto Alegre.
A referência a continuidade e a descontinuidade do tempo e dos espaços surge como um ponto chave para a nossa investigação (especialmente para aqueles depoimentos que citamos e que forma trabalhados no salão de iniciação científica). Encontramos em Bachelard e na sua dialética da duração algumas respostas interessantes. Segundo a sua proposta de empenharmos o que denominou de “ritmoanálise”, percebemos que o que vivemos são estruturas espaço-temporais, ou seja, o eterno drama da reatualização do passado no presente[21]. Neste sentido a antropóloga Cornelia Eckert  propõe: “sugiro uma etnografia da lembrança da duração e não uma etnografia da lembrança do passado” (ECKERT, 1997)
A conclusão de que existe  uma “alma portuária” presente neste espaço e neste tempo é uma das conclusões, dentre as demais, que mais nos perplexifica. Encontramos Arquitetos, urbanistas, sociólogos e antropólogos falando desta “alma”[22] nas referências que fazem sobre diversas cidades, praças e outros espaços e lugares urbanos. A “alma” (ou as almas) do Cais do Porto podem ser sentidas especialmente nas zonas mortas, lugares onde não há mais vida, conforme referências dos entrevistados.   
No que tange ao processo de revitalização dos “velhos” portos, parece que esta é uma prática que acontece no mundo inteiro, segundo o que investigamos. Há, entre urbanistas, arquitetos e demais profissionais desta área uma espécie de necessidade em executar urgentemente uma inscrição do novo sobre o velho, através das intervenções urbanísticas e arquitetônicas. Esta é uma tendência mundial, global. Portanto, aponta-se para o fato de que o reordenamento e as remodelações propostos para o Cais do Porto da Cidade de  Porto Alegre são produtos de um processo de mudanças históricas, econômicas e sociais que extrapolam as fronteiras citadinas locais, estando inseridas no corpo de uma cosmovisão globalizada e globalizante (complexa e moderna) que vem determinando a organização e reorganização dos grandes espaços urbanos contemporâneos .      











BIBLIOGRAFIA

1.    AGUIAR, Douglas Vieira de. O Porto e a Cidade. In Wrana Panizi e João Rovatti / Estudos Urbanos: Porto Alegre e Seu Planejamento. Porto Alegre: Ed. UFRGS / Prefeitura Municipal de POA, 1993.

2.    BACHELARD, Gaston. A Dialética da Duração. São Paulo: Ed. Ática, 1988.

3.    ----------------- ,-------- . A Poética do Espaço. São Paulo: Martins Fontes, 1993.

4.    BOSI, Ecléa. Memória e Sociedade – Lembranças de Velhos. São Paulo : Ed. Queiroz e EDUSP, 1987.

5.    CASTELLO, Lineu. As áreas portuárias e as cidades contemporâneas. Porto Alegre: UFRGS, Faculdade de Arquitetura. Anotações para a palestra no Painel Porto Alegre e o Muro, organizado pela prefeitura Municipal de POA, Departamento de Esgotos Pluviais, na Usina do Gasômetro. Porto Alegre, julho de 1993.

6.    COSTA, Elmar Bones da. História Ilustrada de Porto Alegre. Porto Alegre : Ed. Já Editores, 1997.

7.    ECKERT, Cornelia. Antropologia do Cotidiano e Estudo das Sociabilidades a Partir das Feições do Medo e das Crises na Vida Metropolitana. Porto Alegre: UFRGS. Projeto de Pesquisa, 1997.

8.    --------- ,------------. Memória e Identidade: Estudo Etnográfico dos Ritmos Temporais e da Duração Social de uma Comunidade de Trabalho no Sul da França. Porto Alegre: UFRGS. Artigo, 1997.

9.    FUNDAÇÃO DE ECONÔMIA E ESTATÍSTICA DO ESTADO DO RS (FEE). Anuários Estatísticos do Rio Grande do Sul.

10.FRANCO, Álvaro. Porto Alegre – Biografia de Uma Cidade. Porto Alegre: Ed. Tipografia do Centro S. A . (final do século / inicio deste)

11.FRANCO, Sérgio da Costa. Guia Histórico de Porto Alegre. Porto Alegre: Ed. da Universidade / PMPA, 1988.

12.________ , ___________ . Porto Alegre e Seu Comércio. Porto Alegre: Ed. Associação Comercial de Porto Alegre, 1983.

13.GEERTZ, Clifford. A Interpretação das Culturas. Rio de Janeiro: Ed. Zahar, 1978.

14.GOITIA, Fernando Chueca. Breve História do Urbanismo. Madrid: Ed. Aliança Editorial, 1970.

15.JACOMINI, Jaques. Um Olhar Etnográfico Sobre O cais do Porto da Cidade de Porto Alegre: aspectos da historiografia, da dinâmica social e da espacialidade do Porto de ontem, de hoje e de amanhã, articulados com os aspectos da historiografia, da dinâmica social e da espacialidade de uma cidade que tem porto até no nome. Artigo

16.NORBERG-SCHULZ, Christian. Nuevos Caminhos De La Arquitectura - Existencia, Espacio y Arquitectura. Barcelona: Ed. Blume, 1975.

17.ROCHA, Gilmar. Cidade à Deriva. Belo Horizonte: Ed. PUC Minas, 1997.

18.SPALDING, Walter. Pequena História de Porto Alegre. Porto Alegre: Ed. Sulina, 1967.

19.VIRILIO, Paul. O Espaço Crítico. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1993.

20.ZALUAR, Alba. Desvendando Máscaras Sociais. São Paulo: Ed. Livraria Francisco Alves S . A .

21.ZIMMERMANN, Sérgio Luis Duarte. Porto dos Casais. Exposição sobre o Projeto do Arquiteto ALBERTO ADOMILLI




[1] Projeto coordenado pelas Professoras Dras. Cornelia Eckert e Ana Luiza Carvalho da Rocha / Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social (PPGAS) / Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) / Universidade Federal do Rio Grande DO Sul (UFRGS)
[2] Lévi-Strauss, Aula Inaugural  citado por ZALUAR, 1955 em Desvendando Máscaras Sociais.
[3] Esta monografia representa, além de uma atividade regular de encerramento das atividades proposta pela Disciplina “Individualismo, Sociabilidade e Memória”,  um esforço de trabalhar com um recorte de uma pesquisa maior que culminará com a realização da minha dissertação de mestrado.
[4] Segundo denominação geográfica, o Rio Guaiba é lago, pois une dois grandes volumes de águas navegáveis, o Rio Jacuí e a Lagoa dos Patos. O Jacuí desce em turbulência de sua nascente localizada no Planalto, cerca de 400 metros acima do nível do mar. Ao atingir a Depressão Central, a 100 metros de altitude, suas águas correm para o leste e vão diminuindo a velocidade, de acordo com o suave declive da planície. No trajeto final, próximo a Porto Alegre, o Jacuí recebe as águas do Taquari, do Caí, do Sinos e do Gravatai, formando um delta, uma enorme bacia de decantação onde se acumula a terra arrancada das encostas do Planalto. Essas águas calmas e barrentas são despejadas no Guaíba, apenas cinco metros acima do nível do mar. O Guaiba desemboca na Lagoa dos Patos que lança suas águas no Oceano Atlântico, 250 Km ao sul.
[5] Cubeiros - indivíduos que carregavam e limpavam os “Cubos”, recipientes onde eram armazenados os excrementos das residências mais abastadas. Uma vez cheios, eram levados até as margens do rio pelos escravos (e depois pelos funcionários da prefeitura que assumiram este serviço) e ali descarregados e lavados para voltarem a ser utilizados nas residências.
[6] Um relatório da época dizia: “É preciso melhorar o porto tanto do ponto de vista econômico como estético e sobretudo higiênico.”
[7] O princípio de “isolar espacial e temporalmente implica reunir ordenadamente”, difundido pelo movimento que se conhece como “medicalização (ou normalização / higienização) das cidades” observados no Brasil durante a segunda metade do século passado é abordado de uma forma bastante interessante por Roberto Machado Et All  em “Danação da Norma : Medicina Social e Constituição da Psiquiatria no Brasil”.
[8] Schulz chama a nossa atenção para o fato de que foi HEIDEGGER o primeiro pensador a trabalhar com a noção de que “a existência é espacial.” Portanto, Merleau-Ponty, Bachelard e Bollnow devem muito a Heidegger.
[9] Neste sentido, ver “O Cone da Memória” In. BOSI, Ecléa Memória e Sociedade - lembranças de velhos 4 ed., pg. 46-8
[10] idem
[11] BOSI, Ecléa Memória e Sociedade - lembranças de velhos 4 ed., pg. 46-8

[12] BACHELARD, Gaston A dialética da duração  Ática, 2ª ed., São Paulo, 1994, 135p.
[13] Bachelard afirma que “a nossa primeira tarefa é a postulação metafísica da existência de lacunas na duração, isto é uma tarefa do estudo, e opõe-se a concepção contínua de Bergson. Assim, a continuidade psíquica não é um dado, mas uma obra.”
[14] INSPIRADO Em “La rythmanalise” de LÚCIO PINHEIRO DOS SANTOS (Professor de Filosofia da Universidade do Porto / Brasil) , publicação da Sociedade de Filosofia e Psicologia do Rio de Janeiro, 1931), comenta: “Há lugar em psicologia para uma ritmanálise, assim como se faz psicanálise.” A idéia é de regulação dos tempos psíquicos a partir de uma desorganização direcionada a quebrar as falsas permanências e durações mal feitas. Ou como disse o Próprio Bachelard :“É preciso curar a alma que sofre por meio de uma vida ritmica, por um pensamento rítmico, por uma atenção e um repouso rítmicos. É antes de tudo desembaraçar a alma das falsas permanências, das durações mal feitas, desorganizando-a temporalmente.”

[15] M. Halbwachs, Les cadres sociaux de la mémoire. In.  Bosi
[16] Momento em que apresentei esta mesma pesquisa, em um estágio de investigação anterior a este, no X Salão de Iniciação Científica, realizado em 1998 na UFRGS.
[17] Além desta lembranças dicotômicas vida e morte, os entrevistados trouxeram outros elementos muito interessantes sobre o Cais do Porto de Porto Alegre na sua convivência com os espaços urbanos que o circundavam. Ouvimos vários relatos que falam da existência de uma forte relação entre o Mercado Público de Porto Alegre (Antigo Mercado das Frutas) e o Porto de Porto Alegre, dada a sua proximidade físico-geográfica e a sua afinidade comercial e social. Vários permissionários do Mercado Público são de origem portuguesa, estes relatam com emoção a sua chegada na cidade, em um primeiro contato bastante intimo e sentimental com o Cais do Porto:
“ O primeiro passo que eu dei ali, o primeiro degrau que eu pisei em Porto Alegre foi no Cais do Porto, aqui atrás do Mercado, e dali era só atravessar o Mercado Livre, que era o Mercado das Frutas, e a Júlio de Castilhos e eu estava dentro de casa já. Então aquilo ficou. Agora, tu chega ali tá um baita de um muro. E auto prá la, auto prá ca. Tu fica louco. Isso fica dentro da gente”. (S. A.)
Esta relação do Mercado Público com o Cais do Porto é alterada com a construção do Muro da Avenida Mauá, como podemos perceber nos relatos seguintes:
“Aqui tinha bastante movimento, mas não tinha esse paredão ai.  A gente saia livre. Só saia ali, tinha lugar prá sair. Não e como esse paredão, tem tudo trancado. Só pode entrar por lá ou por aqui ”. (C. B.)
“O muro trouxe realmente um certo prejuízo para a cidade, pois antes você chegava ao cais por vários lugares. Hoje, não. Você chega ao cais por zonas, mas o muro não tem nada a ver com esta visão romântica, porque nem sequer o por do sol e mais bonito naquela direção.” (A. L. E)


[18] Imagem genérica que criei para ajudar a pensar a proposta de Bachelard dos ritmos, ondulações e instantes.
[19] Conforme concepção trabalhada por Simmel e Benjamim, ao trabalharem sobre as formas de sensibilidade e socialização do homem moderno na metrópelo.
[20] Nos primeiros relatos de campo eu já destacava estes aspectos da dinâmica deste local: “A travessia da Av. Mauá (em direção ao Cais do Porto) é, sem nenhuma dúvida, “uma manobra bastante arriscada”. Neste local o transito de veículos é muito grande e a velocidade média dos automóveis, caminhões e coletivos também é alta em função da avenida ser extensa (uma grande reta),  larga (com 3 faixas de rolagem) e não existir nenhum dispositivo inibidor da velocidade (com exceção do semáforo). Existe uma faixa de segurança e uma semáforo quase em frente a entrada principal do Caís do Porto, o que, teoricamente, facilitaria a travessia dos pedestres, no entanto nem sempre é bem assim. Os motoristas costumam aproveitar ao máximo o tempo destinado para a sua travessia, transitando no momento em que o sinal fica no amarelo e até nos primeiros instantes em que o sinal aponta a cor vermelha, ou seja, propõe a sua parada e permite a passagem para o pedestre
[21] Bachelard afirma: Nesse teatro do passado que é a memória, o cenário mantém os personagens em seu papel dominante,”
[22] Segundo SPENGLER “o que distingue a cidade de uma aldeia (ou vila) não é a sua extensão, não é o seu tamanho, se não a presença de uma alma citadina (...) O Verdadeiro milagre é quando nasce a alma de uma cidade. Subitamente sobre a espiritualidade geral da cultura, destaca-se a alma da cidade como uma alma coletiva de uma nova espécie, cujos últimos fundamentos permanecem para os outros em eterno mistério. E uma vez desperta, se forma um corpo visível. A coleção de casas da aldeias (ou vila), cada uma das quais com sua própria história, se converte em um único conjunto. E este conjunto vive, respira, cresce, adquire um rosto familiar e uma forma e uma história internas. A partir deste momento, apesar das casas em separado, do tempo, da catedral e do palácio (do governo), constitui a imagem urbana em sua unidade o objeto de um idioma de formas e de uma história específica que acompanha em seu curso todo o ciclo vital de uma cultura ”







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A  CONDIÇÃO  PÓS-MODERNA









UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS
CURSO DE CIÊNCIAS SOCIAIS
Disciplina: Sociologia Contemporânea II
Semestre: 1997/II
Professor: Luciano Fedozzi












-    A  CONDIÇÃO  PÓS-MODERNA : UMA PESQUISA SOBRE AS ORIGENS DA MUDANÇA CULTURAL   -   DAVID  HARVEY    -













Aluno: JAQUES XAVIER JACOMINI
Matrícula: 1409/92.7






HARVEY, David. A Condição Pós-Moderna - uma pesquisa sobre as origens da mudança cultural. São Paulo: Ed. Loyola, 1993.


PANORAMA GERAL DO LIVRO


A obra de Harvey que nos ocupamos neste momento é, sobre o meu ponto de vista, um trabalho instigante e muito interessante sobre uma das temáticas mais discutidas e analisadas nas ciências sociais contemporâneas, a pós-modernidade. O livro, no seu todo, traz um texto rico de conceituações, discussões e pressupostos colocados dentro deste campo de debate, modernidade X pós-modernidade. Além do texto, propriamente dito, encontramos ainda nesta obra uma série de recursos iconográficos, (gravuras, fotos, imagens de algumas obras de arte, ...), de tabelas, esquemas e de gráficos ilustrativos que tornam o seu conteúdo ainda mais interessante e esclarecedor. Portanto, em resumo, trata-se de uma publicação da mais alta relevância para todos os intelectuais e pesquisadores interessados em empenhar este debate, moderno X pós-moderno, tão presente e tão necessário no meio acadêmico e científico.
O livro está dividido em 4 partes, mais uma introdução que o autor chama de “a tese”, um prefácio e a parte dos agradecimentos. Para este fichamento, nos determos somente sobre a parte 4a. - A Condição Pós-Moderna - pois seguimos a orientação do professor da cadeira neste sentido.
Um aspecto que chama a atenção do leitor no livro, no que concerne a sua estrutura, é a forma pontual como aborda os temas que propõe discutir. Nesta parte 4, por exemplo, temos 9 pontos (ou tópicos) que abordam diversas questões que estão colocadas no seio da discussão moderno X pós-moderno, desenvolvidos de uma forma pontual, sintética e divididos entre si dentro do corpo geral do livro.





19

A Pós-Modernidade como condição histórica


Este ponto do texto vai discutir  “As práticas estéticas e culturais têm particular suscetibilidade à experiência cambiante do espaço e do tempo exatamente por envolverem a construção de representações e artefatos espaciais a partir do fluxo da experiência humana.  Elas sempre servem de intermediário entre o Ser e o Vir-a-Ser”. (pag. 293)
Surge, dentro desta perspectiva de uma abordagem espacial e temporal, a abordagem da estética como um elemento constituinte da pós-modernidade. Neste sentido, o autor afirma:  “É possível escrever a geografia histórica da experiência do espaço e do tempo na vida social, assim como compreender as transformações por que ambos têm passado, tendo por referência condições sociais e materiais. (...)   Aí, as dimensões do espaço e do tempo têm sido sujeitas à persistente pressão da circulação e da acumulação do capital, culminando (em especial durante as crises periódicas de superacumulação que passaram a surgir a partir da metade do século passado) em surtos desconcertantes e destruidores de compressão do tempo-espaço.
As respostas estéticas a condições de compressão do tempo-espaço são importantes, e assim têm sido desde que a separação, ocorrida no século XVIII, entre conhecimento científico e julgamento moral criou para elas um papel distintivo. 










20

Economia com espelhos


Para empenhar uma discussão sobre o que chama de “o triunfo da estética sobre a ética” e sobre “a construção de imagem na política”, Harvey toma uma situação social-econômica e política  no contexto histórico recente dos E. U. A . .
“Economia vodu” e “Economia de espelhos” são metáforas que o autor utiliza para realizar uma crítica sobre as situações sócio - econômicas que envolvem a eleição de Ronald Reagan, “um ex-ator de cinema”, e a política desencadeada por esta eleição que Harvey denomina de “política mediatizada moldada apenas por imagens.” (pag. 295)
O autor coloca algumas conseqüências econômicas e sociais sobre esta situação política que destaca no cenário dos E. U. A .:
“Uma maré montante de desigualdade social engolfou os Estados Unidos nos anos Reagan, alcançando em 1986 o ponto mais alto do período de pós-guerra; na época os 5 % mais pobres da população, que tinham melhorado gradualmente sua parcela da renda nacional para uma proporção de quase 7% no início dos anos 70, viram-se com somente 4,6%.  Entre 1979 e 1986, o número de famílias pobres com filhos aumentou 35 % e, em algumas grandes áreas metropolitanas, como Nova Iorque, Chicago, Baltimore e Nova Orleans, mais da metade das crianças vivia em famílias com renda abaixo da linha de pobreza. (...)
Um aumento do número de pessoas sem moradia marcou um estado geral de deslocamento social caracterizado por confrontos. Os doentes mentais foram devolvidos aos cuidados. de suas  comunidades, (...)” (pag. 296)
Harvey continua discutindo este panorama socio-econômico norte-americano, salientado as suas mazelas e introduzindo as idéias do que denomina de uma “economia de cassino”, e de uma nova cultura yuppie, com seus atavios de pequena nobreza , estreita atenção ao capital simbólico, à moda e ao design e de qualidade de vida urbana”. (pag. 300)
Para clarear mais ainda as suas posições, o autor traz gráficos que remontam alguns aspectos econômicos que está discutindo, bem como relatos de pessoas que tiveram suas vidas permeadas por estas mazelas sociais que coloca como fruto de uma ordem política e social implantada pelo governo norte-americano da época:

“Tenho 37 anos.  Pareço ter 52.  Algumas pessoas dizem que a vida nas ruas é livre e fácil... Ela não é livre nem fácil.  Não se recebe dinheiro nenhum.  O pagamento é a sua saúde e a sua estabilidade mental.”

“O nome do meu país é apatia.  Minha terra está coberta de vergonha.  O meu olhar vê as hordas sem teto passando pela chama túrgida do serviço de bem-estar social.  Ele procura quartos e calor, alguns cabides em lugar protegido, uma gaveta; um lugar quente para tomar sopa - para isso serve a liberdade.”

Este ponto é finalizado com o autor falando de  “um mundo abarrotado de ilusão, de fantasia e de fingimento”.


















21

O Pós-Modernismo como o espelho dos espelhos


Este ponto do texto é bastante breve e inicia com a afirmação do autor de que  “Uma das condições principais da pós-modernidade é o fato de ninguém poder ou dever discutí-la como condição histórico-geográfica.” Isto é dito para introduzir uma discussão dicotômica posterior onde entra no debate a economia e a cultura.
O autor vai afirmar que “o pós-modernismo surgiu em meio a este clima de economia vodu, de construção e exibição de imagens políticas e de uma nova formação de classe social” (pag. 301), mapeando o que considera como os primórdios do pós-modernismo. Considera ainda o fenômeno já citado anteriormente: “ (...) a passagem da ética para a estética como sistema de valores dominante”.


















22

Modernismo fordista versus pós-modemismo flexível, ou a
interpretação de tendências opostas no capitalismo como um todo.


Este ponto é marcado por uma tabela (pag. 304) onde o autor coloca aspectos característicos de dois momentos históricos distintos, “o modernismo fordista” e o pós-modernismo flexível”. Chama a atenção para o fato de que realizou esta tarefa utilizando uma técnica muito em voga na pós-modernidade, “a colagem.” Trata-se de uma análise comparativa realizada com base em pressupostos trabalhados por outros autores.
Referindo a tabela, Harvey afirma que  “Ela ajuda a explicar como O Capital de Marx é tão rico em percepções daquilo que constitui o foco do pensamento atual. Ela também auxilia a compreensão das razoes por que as forças culturais que atuavam, por exemplo, na Viena fin-de-siècle constituíram uma mistura tão complexa que é quase impossível dizer onde começa ou termina o impulso modernista.  Com a sua ajuda, podemos dissolver as categorias do modernismo e do pós-modernismo num complexo de oposições que exprime as contradições culturais do capitalismo.” (Pag. 305)
 Para maiores detalhes, vide-tabela.










 



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A  lógica transformativa e especulativa do capital.


Com a afirmação de que “O capital é um processo, e não uma coisa”, o autor inicia mais este tópico do texto, com o objetivo de empenhar uma discussão sobre cultura e capital (ou capitalismo).
Após algumas explicitações sobre o capitalismo, o autor afirma: “Costuma-se considerar a vida cultural um plano  exterior a esta lógica capital. (...)  Considero este argumento errôneo em dois sentidos (...).” (pag. 307)
Em resposta a esta discussão, destacaria o trecho em ele afirma: “Precisamente porque o capitalismo é excursionista e imperialista, a vida cultural , num número cada vez maior de  áreas, vai ficando ao alcance do nexo do dinheiro e da lógica de circulação do capital.”
(pag. 308)
Harvey chama Bourdieu para este debate, dizendo: “É esse o ponto em que podemos voltar a invocar a tese de Bourdieu (...) segundo a qual cada um de nós possui poderes de improvisaçao regulada, moldada pela experiência, que nos permite ter 'uma capacidade interminável de engendrar produtos - pensamentos, percepções, expressões, ações - cujos limites são fixados pelas condições historicamente situadas' de sua   produção; (...) E, sugere Bourdieu, por meio de mecanismos desse tipo que toda ordem estabelecida tende  a produzir ‘a naturalização de sua própria arbitrariedade’, expressa no 'sentido de limites' e no ‘sentido de realidade, que formam por sua vez, a base de uma 'adesão inerradicável à ordem estabelecida' (...)” (pag. 308)







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A obra de arte na era da reprodução eletrônica e dos bancos de imagens.


A temática da “produção cultural” e da “formação de juízos estéticos” no contexto da pós-modernidade é o eixo central de análise deste ponto do texto.
Para iniciar a discussão, Harvey cita Benjamin lembrando : “Em princípio, uma obra de arte sempre foi reprodutível”, mas lembra que “a reprodução mecânica 'representa uma coisa nova'”. Neste sentido, o autor coloca que “os avanços nas tecnologias da reprodução eletrônica e da capacidade de armazenar imagens acentuaram consideravelmente as previsões de Benjamim” (pag. 311), ou seja o nível tecnológico atual permitiu uma aceleração extremamente grande da reprodução, armazenamento, recuperação e emissão de obras de arte, de textos, documentos, imagens enfim de tudo o que é produzido nos meios ópticos e eletrônicos.
O trecho a seguir explana o cerne da questão discutida neste tópico do texto: “O que de fato está em jogo aqui, contudo, é uma análise da produção cultural e da formação de juízos estéticos mediante um sistema organizado de produção e de consumo mediado por divisões do trabalho, exercícios promocionais e arranjos de marketing sofisticados.  E, em nossos dias, o sistema inteiro é dominado pela circulação do capital (com freqüência multinacional).” (pag. 311)
Dentro de todo este debate proposto até aqui, Harvey propõe a análise de “duas questões importantes que se destacam pela sua relevância direta para a compreensão da condição da pós-modernidade como um todo.”
Para desenvolver a primeira questão, o autor chama Benjamim novamente para o debate, fala de “capital simbólico”, esclarecendo: “Em primeiro lugar as relações de classe vigentes nesse sistema de produção e de consumo são  de um tipo peculiar.  Sobressai aqui antes o puro poder do dinheiro como meio de domínio do que o controle direto dos meios de produção e do trabalho assalariado no sentido clássico.  Um efeito colateral tem sido reavivar o interesse teórico pela natureza do poder do dinheiro (em oposição ao de classe) e pelas assimetrias passíveis de daí advirem (cf. o extraordinário tratado de Símmel sobre The philosophy of money).” (Pag. 312)
Para exemplificar, cita o caso das “Estrelas da Mídia”:  “As estrelas da mídia, por exemplo, podem receber altos salários, mas ser espantosamente exploradas pelos seus agentes, gravadoras, magnatas da mídia etc.  Tal sistema de relações monetárias assimétricas vincula-se à necessidade de mobilizar a criatividade cultural e a inventividade estética não somente na produção de um artefato cultural, mas também em sua promoção, embalagem e transformação em algum tipo de espetáculo de sucesso.  Mas o poder monetário assimétrico não promove necessariamente a consciência de classe.  Ele leva a exigências de liberdade individual e de livre iniciativa. (...)” (pag. 312)
Para desenvolver a segunda questão, o autor renova o debate com Benjamim, afirmando:  “Em segundo lugar, o desenvolvimento de uma produção e de um markenting culturais numa escala  global também foi um agente primordial de compressão do tempo-espaço, em parte porque projetou um musée imaginaire, um clube de jazz ou uma sala de concerto na sala de estar de todos, mas também por várias outras razões que Benjamin considerou:

“As nossas tavernas e as nossas ruas metropolitanas, os nossos escritórios e salas mobiliadas, as nossas estações ferroviárias e as nossas fábricas pareciam ter nos aprisionado irremediavelmente.  Surgiu então o filme e explodiu esse mundo-prisão com a dinamite de um milésimo de segundo, de modo que agora, em meio às suas ruínas e detritos espalhados, seguimos calma e audaciosamente.  Com o close-up, o espaço se expande; com a câmara lenta, o movimento é estendido... Evidentemente, abre-se para a câmera uma natureza distinta da que se abre para o olho nu - no mínimo porque um espaço inconscientemente penetrado é substituído por um espaço conscientemente explorado (Benjamin, 1969, 236)” .  (pag. 313)





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Respostas à compressão do tempo-espaço


Neste tópico a discussão central é a “compressão do espaço-tempo” e as suas várias respostas. O autor vai trabalhar com 4 linhas:
“ A primeira  linha de defesa é a fuga para um tipo de silencio exaurido, blasé ou encoraçado  e inclinar-se diante do sentido avassalador de quão vasto, intratável e fora do controle individual ou mesmo coletivo tudo é. A informação excessiva, afirma-se, é uma das melhores induções ao esquecimento. (...)
Dentro deste campo de análise, o autor aborda a questão do “desconstrucionismo”, afirmando que  o desconstrucionismo terminou, apesar das melhores intenções dos seus praticantes mais radicais, por reduzir o conhecimento e o significado a um monte desordenado de significantes . Assim fazendo, produziu uma condição de niilismo que preparou o terreno para o ressurgimento de uma política carismática e de proposições ainda mais simplistas do que as que tinham sido desconstruídas.” (pag. 315)
“A segunda   eqüivale a uma negação voluntariosa da complexidade do mundo, e a uma inclinação a representar essa complexidade em termos de proposições retóricas com alto grau de simplificação.  São abundantes os slogans, da direita até a esquerda do espectro político, sendo apresentadas imagens sem profundidade para captar sentidos complexos.  Supõe-se que as viagens, mesmo imaginárias e vicárias, ampliam a mente, mas, com a mesma freqüência, elas terminam por confirmar preconceitos.” (pag. 315)
“A terceira resposta tem sido encontrar um nicho intermediário para a vida intelectual e política que recusa a grande narrativa, mas nem por isso deixa de cultivar a possibilidade de uma ação limitada.  Trata-se do ângulo progressista do pos-modernismo, que acentua a comunidade e a localidade, as resistências locais e regionais, os movimentos sociais, o respeito pela alteridade etc. Trata-se de uma tentativa de extrair ao menos um mundo apreensível da infinidade de mundos possíveis que nos são  mostrados diariamente na tela da televisão. (...)”
“A quarta resposta tem sido tentar montar no tigre da compressão do tempo-espaço mediante a construção de uma linguagem e de imagens capazes de espelhá-la e, quem sabe, dominá-la.  Eu ponho os escritos frenéticos de Baudrillard e Vírilio nessa  categoria, porque eles parecem diabolicamente  inclinados a fundir-se com a
compressão do tempo-espaço e a reproduzi-la em sua  própria retórica  extravagante. Já vimos esse tipo de resposta antes, mais especificamente nas extraordinárias evocações feitas por Níetzsche em A Vontade de Poder. (...)



























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A crise do materialismo histórico


Retomando um pouco a discussão  anterior, neste tópico o autor a firma que “o estranho é quão radicais algumas dessas respostas deram a impressão de ser e quão difícil foi para a esquerda, em  oposição à direita, lidar com elas.”
 A partir de então, ele passa a analisar as percepções existentes na “direita tradicionalista” e na “nova esquerda”:
“Da perspectiva da direita tradicionalista, os excessos dos anos 60 e a violência de 1968 pareciam subversivos ao extremo.  Talvez por isso a descrição de Daniel Bell em The cultural contradictions of capitalism, embora partindo inteiramente de um ponto de vista direitista que visava à restauração do respeito pela autoridade, tenha sido mais precisa que muitas tentativas esquerdistas de perceber o que estava acontecendo.  Outros autores, como Toffler e até McLuhan. viram a significação da compressão do tempo-espaço e das confusões por ela geradas de modo que a esquerda não podia ver, justamente por estar tão profundamente envolvida em criar a confusão. (...)”
“A nova esquerda preocupava-se com uma luta para libertar-se das algemas duais   da política da velha esquerda, particularmente em sua representação por partidos comunistas tradicionais e pelo marxismo 'ortodoxo', e dos poderes repressivos do capital corporativo e das instituições burocratizadas (o Estado, as universidades, os sindicatos etc.). Ela via a si mesma, desde o começo, como uma força cultural e político-econômica, tendo ajudado a produzir a virada para a estética que o pós-modernismo representava. (...)” (pag. 319)
Neste mesmo sentido, o autor coloca que “a nova esquerda tendia a abandonar a sua fé tanto no proletariado como instrumento de mudança progressista como no materialismo histórico enquanto modo de análise.  André Gorz deu adeus à classe operária e Aronowitz anunciou a crise do materialismo histórico. Assim, a nova esquerda perdeu sua capacidade de ter uma perspectiva crítica sobre si mesma e sobre  os processos sociais de transformação que estiveram na base da emergência de modos pós-modernos de pensamento.
Na continuação, o autor segue na sua crítica aos autores citados e as suas propostas desconstrutivistas do materialismo histórico, dizendo:
“Insistindo que eram a cultura e a política que importavam, e que não era razoável nem adequado invocar a determinação econômica mesmo em última instância (para não falar de invocar teorias da circulação e da acumulação do capital ou de relações de classe necessárias na produção), ela foi incapaz de conter  sua própria queda em posições ideológicas que  eram fracas no confronto com a força recém-encontrada dos neo-conservadores, e que a forçavam a competir no mesmo terreno da produção de imagens, da estética e do poder ideológico quando os meios de comunicação estavam nas mãos dos seus oponentes.” (pag. 320)






















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Rachaduras nos espelhos, fusões nas extremidades


Este tópico inicia com uma pequena provocação analítica, com a frase “Sentimos que o pós-modernismo acabou”, que vai reintroduzir a discussão do “desconstrutivismo” no cenário da pós-modernidade. A partir de então, o autor retoma uma perspectiva analítica que já havia traçado sobre situações conjunturais econômicas e sociais da sociedade norte-americana, a fim de introduzir um debate sobre o que P. Lévy (1996)[1] chamaria de virtualização das sociedades contemporâneas, ou seja “a influencia do capital fictício” e as operações econômicas realizadas via on-line, através das redes informatizadas que atuam no hiperespaço (eu prefiro cyberespaço). Destacaria alguns trechos:
“ Fortunas feitas da noite para o dia pelos jovens, agressivos e implacáveis operadores no, hipe     respaço das operações financeiras instantâneas se perderam com muito maior, velocidade do que foram adquiridas. A economia da cidade de Nova Iorque e de outros      importantes centros financeiros foi ameaçada pela rápida queda do volume negociado.  Mas o resto do mundo permaneceu estranhamente imóvel.  'Mundos diferentes', foi a manchete do Wall Street Journal, ao comparar a visão 'misteriosamente distante' de Main Street, EUA, com a de Wall Street.
Sobre esta questão dos “mundos diferentes”, lembro um pouco a atual crise das bolças que se observou a nível mundial como um contraponto interessante com esta situação levantada por Harvey, feita com base em aspectos econômicos e sociais do final da década de 80. Não proporia um debate, neste momento, mas fica a dúvida se hoje ainda poderíamos considerar a situação mundial, com base no caso das crises nas bolsas observadas em praticamente todo o globo, como “mundos diferentes”, sugerida pelo autor em questão.
“A influencia do capital fictício é ainda mais hegemônica; ele cria seu próprio mundo fantástico de riqueza e ativos nominais enormes. (...)”

O autor recoloca a metáfora das “rachaduras” para referir crises vivenciadas tanto no plano econômico, como do plano intelectual, onde vai falar de “rachaduras num edifício intelectual”.
Retomando a afirmativa do próprio título deste tópico (ou capítulo), - Rachaduras nos espelhos, fusões nas extremidades - , Harvey vai dizer que : “As rachaduras nos espelhos podem não ser muito grandes e as fusões nas extremidades podem não ser muito marcantes, mas o fato de todas elas existirem sugere que a condição da pós-modernidade passa por uma súbita evolução, talvez alcançando um ponto de autodissolução em alguma coisa diferente. Mas o quê ?” (Pag. 325)
Seguindo nesta perspectiva, o autor coloca a sua posição pessoal sobre o questionamento supra mencionado, afirmando que “não é possível dar resposta fazendo abstração das forcas político-econômicas que ora transformam o mundo do trabalho, das finanças, (...)”.  A partir de então vai tecendo algumas análises a nível mundial das tendências que considera como verdadeiras para os próximos anos, no campo social, político e econômico. Chama novamente W. Wenders para o debate, definindo-o como neo-romântico (fato que discordo, pois considero que o cineasta em questão se aproxima mais de uma “neo-arqueologia”, ou mesmo de uma antropologia pós-moderna do que de um “neo-romantismo” [2]) e reafirma sua tendência marcadamente marxista, fato que perpassa todo o texto, defendendo os pressupostos que encerram esta obra, dentro da idéia “de que nem tudo está perdido” (ou alguma coisa assim):
“Além disso, há uma renovação do materialismo histórico e do projeto do Iluminismo. Por meio do primeiro, podemos começar a compreender a pós-modernidade como condição histórico-geográfica. Com essa base crítica, torna-se possível lançar um contra-ataque da narrativa contra a imagem, da ética contra a estética (...). Uma renovação do materialismo histórico-geográfico pode na verdade promover a adesão a uma nova versão do Projeto do Iluminismo. (...)” (pag. 325)
A frase derradeira: “Há alguns que desejam que retomemos ao classicismo e outros que buscam que trilhemos o caminho dos modernos.  Do ponto de vista destes últimos, toda época tem julgada a realização da 'plenitude do seu tempo, não pelo ser, mas pelo vir-a-ser'. Minha concordância não poderia ser maior.” (pag. 326)







[1] Afirmação feita com base na leitura de LÉVY, Pierre. O Que é o Virtual. São Paulo: Ed. 34, 1996.
[2] Afirmação feita com base na leitura  WENDERS, Wim. A Paisagem Urbana (La Verité des Images). Paris, Lárche, 1992. In. Revista do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.





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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS
CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ANTROPOLOGIA SOCIAL
Disciplina: INDIVIDUALISMO, SOCIABILIDADE E MEMÓRIA
Professora: CORNELIA ECKERT

Semestre 99/1













EXERCÍCIO  DE  AVALIAÇÃO  1
SALEM, Tânia. "A "despossessäo subjetiva": dos paradoxos do individualismo. In: Revista Brasileira Ciências Sociais n° 18, ano 7, fev. 1992.



















Aluno: JAQUES XAVIER JACOMINI



Introdução


A proposta de Tânia Salem no artigo A “Despossessão Subjetiva”: dos paradoxos, do individualismo é bastante interessante e adequada para realizarmos uma espécie de fechamento das discussões que realizamos até agora na disciplina “Individualismo, Sociabilidade e Memória”. Assim entendemos esta atividade de avaliação e assim nos empenhamos na feitura deste pequeno ensaio.
Para a construção deste ensaio, seguimos a seguinte orientação estrutural: Em um primeiro momento – Despossessão Subjetiva ? – trazemos questões mais gerais tomadas do artigo de Salem, como os seus objetivos e princípios norteadores, inspirações e influências teóricas. Neste ponto destacamos ainda a divisão dos blocos (ou momentos) que compõe o trabalho da autora.
Em um segundo momento - Retomando autores e suas concepções – tentamos trazer para este ensaio  considerações sobre alguns dos autores trabalhados por Salem. Dentre eles, elegemos Simmel para uma retomada mais pausada. Sobre este último, realizamos inicialmente um apanhado mais geral sobre a sua teoria e, posteriormente, uma explanação mais específica sobre as suas concepções de indivíduo.  














1. Despossessão Subjetiva ?

Como a própria autora coloca, o objetivo deste trabalho é “repensar o modo como cientistas sociais vêm tematizando a categoria moderna de Pessoa, consubstanciada na noção de indivíduo e, em especial, na de indivíduo psicológico”. Este esforço analítico de Tânia Salem tem nome: “A Despossessão subjetiva”. A premissa básica é a de que há uma instância no interior do próprio sujeito que o constrange às expensas de sua vontade e consciência.
A abordagem desenvolvida pela autora visa “depreender descontinuidades significativas na representação do sujeito psicológico, relativamente à de seu predecessor – o indivíduo jurídico”. Salem destaca ainda que o indivíduo psicológico só adquire sentido e inteligibilidade em um universo individualista.
O Artigo, desenvolvido em dois blocos (além da apresentação): “Do ‘Individualismo possessivo’ ao sujeito psicológico: inflexões e descontinuidades” e “Das articulações entre a ‘despossessão subjetiva’ e a configuração individualista”, chama para o debate diversos pensadores que trabalhamos em sala de aula dentre os quais Dumont e Simmel  aparecem em relevo. Dentre aqueles que não abordamos e que a autora utiliza na sua análise, destacaria a presença de Foucault que “ainda que não se referindo explicitamente à destituição do sujeito sobre si mesmo, a tangência, e a elucida parcialmente, ao invocar as conseqüências derivadas do fato de saber / poder formarem a partir do século XIX um todo indissociável.”
Ao citar Gauchet & Swain – A História da individualização é, de outro lado e necessariamente, a história de uma despossessão ou de uma destituição subjetiva – fica claro para nós a fonte (ou uma das fontes) de inspiração que Salem toma para articular a construção deste texto, bem como o porque de defini-lo “A Despossessão Subjetiva”.

 

 




 

 Retomando Autores e suas Concepções


Salem destaca que os primórdios da investigação sobre este tema estão calcados na obra de Mauss, porém é Dumont que “é o autor contemporâneo que mais extensa e sistematicamente se empenhou na relativização e na crítica contumaz da moderna categoria de indivíduo”.
Tendo como tese central a oposição entre individualismo e holismo, a contribuição de Dumont, segundo a autora, revelou-se insuficiente para a apreensão da categoria moderna de indivíduo. Diante desta situação, a recorrência as teses de Simmel, Lasch, Sennett, Ariès, Foucault, entre outros é a alternativa capaz de “suprir o ‘elo falante’ relativamente ao eixo analítico dumontiano.” Diante dos pensadores “alternativos” que colaboram para a “despossessão subjetiva”, destacados por Tânia Salem, elegemos Simmel para realizarmos um aprofundamento maior sobre as suas concepções.
Para Simmel, a sociedade existe onde vários indivíduos entram em interação. Esta ação reciproca se produz sempre por determinados instintos ou para determinados fins. Instintos eróticos, religiosos ou simplesmente sociais, fins de defesa ou ataque, de jogo ou ganho, de ajuda ou instrução,  estes e infinitos outros fazem com que o homem se encontre num estado de convivência com outros homens, com ações a favor deles, em conjunto com eles, contra eles, em correlação de circunstâncias com eles. Essas interações significam que os indivíduos, nos quais se encontram aqueles instintos e fins, fora por eles levados a unir-se, convertendo-se numa unidade, numa "sociedade". Pois unidade em sentido empírico nada mais é do que interação de elementos. O mundo não poderia ser chamado de uno, se cada parte não influísse de algum modo sobre as demais, ou se em algum ponto se interrompesse a reciprocidade das influências.
A unidade ou sociaçäo pode ter diversos graus, segundo a espécie e a intimidade que tenha a interação - desde a união efêmera para dar um passeio até a família - desde as relações por prazo indeterminado até a pertinência a um mesmo Estado - desde a convivência fugitiva num hotel até a união estreita de uma corporação medieval. Simmel designa como conteúdo ou matéria da sociaçäo tudo quanto exista nos indivíduos (portadores concretos e imediatos de toda a realidade histórica) - como instinto, interesse, fim, inclinação, estado ou movimento psíquico -, tudo enfim capaz de originar ação sobre outros ou a recepção de suas influências.
Dito de outra forma, podemos considerar conteúdos (materiais) versus formas de vida social onde:
1°) uma delas é que em qualquer sociedade humana pode-se fazer uma distinção entre seu conteúdo e sua forma.
2°) é que a própria sociedade em geral se refere à interação entre indivíduos. Essa interação sempre surge com base em certos impulsos ou em função de certos propósitos. Os instintos eróticos, os interesses objetivos, os impulsos religiosos e propósitos de defesa ou ataque, de ganho ou jogo, de auxilio ou instrução, e incontáveis outros, fazem com que o homem viva com outros homens, aja por eles, com eles, contra eles, organizando desse modo, reciprocamente, as suas condições - em resumo, para influenciar os outros e para ser influenciado por eles.  A importância dessas interações esta no fato de obrigar os indivíduos, que possuem aqueles instintos, interesses, etc.; a formarem uma unidade - precisamente, uma "sociedade".
A sociaçäo só começa a existir quando a coexistência isolada dos indivíduos adota formas determinadas de cooperação e de colaboração, que caem sob o conceito geral da interação. A sociaçäo é, assim, a forma realizada de diversas maneiras, na qual os indivíduos constituem uma unidade dentro da qual se realizam seus interesses. E é na base desses interesses - tangíveis ou ideais, momentâneos ou duradouros, conscientes ou inconscientes, impulsionados casualmente ou induzidos teleologicamente - que os indivíduos constituem tais unidades.
Em qualquer fenômeno social dado, conteúdo e forma sociais constituem uma realidade unitária. Uma forma social desligada de todo conteúdo não pode ter existência, do mesmo modo que a forma espacial não pode existir sem uma matéria da qual seja forma. Tais são justamente os elementos, inseparáveis na realidade, de cada ser e acontecer sociais: um interesse, um fim, um motivo e uma forma ou maneira de interação entre os indivíduos, pelo qual ou em cuja figura aquele conteúdo alcança realidade social. Portanto, temos nem só objetividade, nem só subjetividade. Somente quando a vida desses conteúdos adquire a forma da influência reciproca, só quando se produz a ação de uns sobre os outros - imediatamente ou por intermédio de um terceiro - é que a nova coexistência social, ou também a sucessão no tempo, dos homens, se converte numa sociedade.
Para clarear um pouco mais a tese  geral de Simmel, destacamos a seguinte citação:
“Por sociedade não entendo apenas o conjunto complexo dos indivíduos e dos grupos unidos numa mesma comunidade política. Vejo uma sociedade em toda parte onde os homens se encontram em reciprocidade de ação e constituem uma unidade permanente ou passageira.  Logo, em cada uma dessas uniões produz-se um fenômeno que caracteriza, da mesma forma, a vida individual; a cada instante, forças perturbadoras, externas ou não, opõem-se ao agrupamento, e este, se for deixado a agir por sua própria conta, não tardarão elas a dissolvê-lo, isto é, a transferir seus elementos para agrupamentos estranhos. ... Nessa circunstância, temos a sociedade como uma unidade sui generis, distinta de seus elementos individuais”.
No que tange a questão específica da concepção de indivíduo em Simmel, podemos afirmar que “indivíduo em Simmel afirma-se como um ser proprietário de si, tanto perante a sociedade quanto de um ponto de vista subjetivo”.
O indivíduo psicológico em Simmel fala de um sujeito fundado em uma autonomia subjetiva radical capaz de erigir em torno de si um abrigo intimo que o protege dos "outros".
Sobre a concepção de  indivíduo moderno, temos Simmel em uma posição diferenciada de Dumont e Pacpherson, pois estes apresentaram uma preocupação sobre o plano formal ou externo do indivíduo (indivíduo jurídico), enquanto que Simmel debruçou-se de forma explícita sobre o domínio mais propriamente interno do indivíduo (indivíduo psicológico).






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As Regras do Método Sociológico




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NUPECs


NÚCLEO  DE  PESQUISAS  SOBRE  CULTURAS  CONTEMPORÂNEAS
PROGRAMA  DE  PÓS-GRADUAÇÃO  EM  ANTROPOLOGIA  SOCIAL
INSTITUTO  DE  FILOSOFIA  E  CIÊNCIAS  HUMANAS
UNIVERSIDADE  FEDERAL  DO  RIO  GRANDE  DO  SUL







RELATO  DE  EXPERIÊNCIAS





Organizado  por  JAQUES    JACOMINI
                  Perquisador – B.   CNPq
Orientadoras: Prof. (as) : Dra. ANA LUIZA C. DA ROCHA
                                            Dra. CORNELIA ECKERT
NUPECs / IFCH / UFRGS
Av. Bento Gonçalves, 9 500
Cep.: 91 509-900 - Porto Alegre - RS
Tel.: 316 66 47
Porto Alegre, Setembro  / 1998.





 

 

SUMÁRIO







Introdução .................................................................................................................................. 04


1.      Banco de Dados Etnográficos .............................................................................................. 06

2.      Banco de Imagens e de Efeitos Visuais da Cidade de Porto Alegre .................................... 14

3.      Digitalização de Imagens ..................................................................................................... 24

4.      Digitalização de Textos Com Imagens ................................................................................ 28

5.      Glosário ................................................................................................................................ 35



Bibliografia ................................................................................................................................ 38





























INTRODUÇÃO

A construção (ou estruturação) de Bancos de Dados (e de Imagens) Relacionais Informatizados, ao contrário do acesso a estes mesmos bancos, é uma atividade que exige algumas pré-noções e um conhecimento técnico / prático muito específicos e especializados. A presença, o acompanhamento e a orientação de profissionais das áreas da informática, biblioteconomia e arquivística são essenciais para que se realize um trabalho de qualidade. De qualquer maneira, acreditamos que não existem “fórmulas mágicas”, manuais perfeitos ou roteiros irretocáveis para o trabalho de estruturação de Bancos de Dados Relacionais Informatizados. Existem uma série de possibilidades dispostas em inúmeros softwares, técnicas e procedimentos de documentação e arquivística. Provavelmente seja esta a razão das maiores dificuldades nesta área: a infinidade de possibilidades.
Os manuais “oficiais”, da Microsoft C. por exemplo, nem sempre ajudam a esclarecer as nossas dúvidas e dificuldades na Construção de Bancos de Dados e de Imagens, pois são, na maioria, muito técnicos e trazem exemplos muito genéricos e / ou de cunho comercial / empresarial. Poderíamos destacar os maiores problemas deste tipo de Material da seguinte forma:
I – São muitos extensos, de difícil manuseio. Sobram informações em alguns aspectos e áreas, no entanto faltam informações em outros aspectos e áreas;
II – As denominações, nomenclaturas e argumentações deixam a desejar, na maioria das vezes;
III – Ficam engessados ao nível das informações “oficiais” (ou oficialescas). Não trazem exemplos e propostas de estruturações para as áreas científicas e acadêmicas, priorizando as áreas comerciais e empresariais.
Neste trabalho, uma reapresentação da apostila “Trabalhando Com Banco de Imagens e Banco de Dados”, propomos apresentar as nossas experiências de trabalho na Construção do Banco de Dados Etnográficos do Núcleo de Pesquisas Sobre Culturas Contemporâneas e Banco de Imagens e Efeitos Visuais da Cidade de Porto Alegre. Uma versão ampliada (com vários anexos: tabelas, gráficos, etc.) desta informações aqui apresentadas podem ser observadas no relatório parcial das atividades do Pesquisador (I. C. / CNPq) - Jaques Jacomini.
Temos o objetivo de  colaborar com a discussão que permeia os desafios pertinentes ao trabalho com grandes quantidades de dados (documentos escritos, imagéticos e sonoros) reunidos e sistematizados em Bancos Relacionais.  Desde já gostaríamos de afirmar uma pequena filosofia que nos norteia nestes trabalhos: “Vários Caminhos Podem Levar a um Mesmo Lugar.” Da mesma forma, gostaríamos, desde já, destacar cinco procedimentos básicos no trabalho da documentação informatizada:
1-      Determinar a finalidade do Banco de Dados a ser criado;
2-      Determinar a estrutura necessária, ou seja, as tabelas, consultas, relatórios, etc. Segundo o guia do desenvolvedor do software Visual Fox Pro, cada assunto deverá ser disposto em uma tabela do Banco de Dados;
3-      Determinar os Campos necessários: Cada categoria de informações em uma tabela é chamada de campo e é exibida como uma coluna (da tabela).
4-      Determinar os Relacionamentos de Tabelas: Observar cada tabela e decidir quanto ao modo em que os dados de uma tabela estão relacionados com os dados de outras.
5-      Refinar (Redefinir, Reelaborar, Reestruturar, Refazer): Analisar a estrutura inicial quanto a possíveis erros. Um caminho é criar as tabelas, adicionando alguns registros de dados experimentais. Após, verifique se consegue obter os resultados que você deseja e faça os ajustes necessários.

















1. BANCO  DE  DADOS  ETNOGRÁFICOS  

O trabalho com Banco de Dados é uma das principais atividades do pesquisador contemporâneo envolto nas necessidades de investigação colocadas pela dinâmica das chamadas  “sociedades da informação”. A quantidade de informação que circula e é difundida nos meios acadêmicos, e na sociedade de um modo geral,  é cada vez maior e é processada de uma forma também cada vez mais rápida, diante da disponibilidade de novas tecnologias informáticas que dão o ritmo e a velocidade destas atividades. Portanto, a realização de qualquer tipo de pesquisa científica moderna exige a organização de um Banco de Dados que proporcione agilidade e confiabilidade na organização, indexação e recuperação desta massa de dados que cresce e se complexifica diariamente no mundo todo.
Inseridos neste contexto, acima colocado, a equipe de trabalho do Projeto Integrado  “Estudo Antropológico de Itinerários Urbanos, Memória Coletiva e Formas de Sociabilidade no Meio Urbano Contemporâneo” encontrou a necessidade de se  empenhar em uma grande empreitada : A construção de um Banco de Dados que viesse a suprir as necessidades e exigências de pesquisa e da investigação científica proposta  por este  projeto.   
Realizamos um grande esforço, a fim de que, uma vez coletado, todo o material de pesquisa estivesse reunido e organizado de uma forma que possibilitasse a sua recuperação ágil, rápida e simplificada. Para que alcançássemos este objetivo, foi necessário uma pesquisa prévia sobre os métodos e processos biblioteconômicos e arquivísticos, pois não contamos com um profissional desta área na nossa equipe de trabalho. Além da pesquisa (No Item 'Pesquisas Bibliográficas' destaco pormenores desta pesquisa dos processos biblioteconômicos e arquivísticos), buscamos orientações com bibliotecários da própria universidade que, gentilmente, nos auxiliaram para a tomada de algumas decisões e procedimentos mais elaborados. Neste sentido, precisamos agradecer a equipe de bibliotecários, funcionários e bolsistas da Biblioteca Setorial de Ciências Sociais e Humanidades (BSCSH) e do Centro de Documentação Social (CDS) / Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) / Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) que sob a coordenação da Bibliotecária Maria Lizete Gomes Mendes prestaram uma inestimável colaboração a este bolsista e a este projeto de pesquisa .
A construção do Banco de Dados é uma atividade que exige um trabalho  diário e permanente de alimentação, recuperação e de reestruturação, portanto esta é uma atividade que ainda não está concluída. A dinâmica do trabalho de alimentação, recuperação e de reestruturação é dada segundo três fatores em especial:
 I - as exigências (necessidades) científicas dos pesquisadores que se alteram durante o transcorrer da pesquisa, diante do desenvolvimento e evolução desta;
II - as decisões  tomadas pela equipe de trabalho do Banco de Dados, que ganha em experiência e prática operacional, na medida em que as compilações, armazenamentos e recuperações (de dados etnográficos e dados imagéticos) avançam, passando assim a repensar a organização das estruturas anteriores deste Banco;
III - e, finalmente, pelas exigências (necessidades) emergentes de trabalho, diante dos novos tipos de documentos (gráficos, imagéticos, iconográficos, ...) que passam a fazer parte do acervo deste Banco de Dados.

1.1 PRINCIPAIS PROCEDIMENTOS E TÉCNICAS ADOTADOS NO TRABALHO DO BANCO DE DADOS ETNOGRÁFICOS  

Passaremos a relatar um pouco da evolução e da sistematização dos procedimentos e principais atividades de trabalho que marcaram este primeiro período no que se refere à construção do Banco de Dados, a fim de que possamos demonstrar a nossa preocupação com o aperfeiçoamento deste trabalho.
Iniciamos o trabalho propriamente dito com a organização do material que fora coletado e acumulado pelas Pesquisadoras Dr.as. Cornelia Eckert e Ana Luiza C. Da Rocha desde o ano de 1989. Os materiais que compunham este acervo, eram, na sua maioria, recortes de jornais e revistas (nacionais e estrangeiras), livros, periódicos e textos avulsos (cópias xerox).
 A primeira forma de armazenar este material foi através de uma ordenação temática, utilizando palavras chaves que foram surgindo no universo desta pesquisa e auxiliaram neste ordenamento inicial. Esta primeira organização foi marcada pelo início de uma discussão teórica e metodológica sobre qual o método de organização e classificação  seria o mais adequado para as necessidades do nosso Banco de Dados. Este arranjo inicial representava apenas uma pequena quantidade de documentos, portanto não exigia uma complexificação do método de organização e arquivamento maior do que a adotada naquela ocasião, porém a discussão e o debate já se fazia necessário em função da perspectiva de um crescimento rápido deste material, fato que viria a se observar logo em seguida.  
As discussões e as pesquisas sobre os métodos de arquivamento e acervamento de documentos foram avançando, paulatinamente, e fez-se necessário, então, um reordenamento da organização inicial da nossa base de dados que, até então, contava com um arranjo documental segundo um ordenamento temático. Com as discussões e pesquisas que nos levaram a este reordenamento,  passamos a ter uma maior clareza sobre os procedimentos que devíamos adotar para uma melhor operacionalidade do Banco de Dados e, passamos a optar, então por dois caminhos:
I - utilizar um SISTEMA DE ARQUIVAMENTO INDIRETO, ou seja, com a criação de um índice, a recuperação das informações acontecia em um primeiro momento neste índice que remeteria ao local exato (pasta) onde se encontra a informação que se tenta recuperar;  
II - Adotar um MÉTODO DE ARQUIVAMENTO, segundo uma orientação específica do método ALFABÉTICO / NOMINAL onde destacaríamos sempre a fonte Documental.

Estes dois caminhos nos levaram a traçar uma “árvore” de organização para os nossos documentos (ou arranjo documental)  que,  colocada de uma forma muito simplificada, era a seguinte :

 

                    JORNAIS  -  ZERO HORA
                            “            -   FOLHA DE SÃO PAULO
                            “            -   CORREIO DO POVO
                            “            -    DIÁRIO DO SUL
                            “            -   (...)


                     REVISTAS  -  O GLOBO
                     (devemos considerar neste item como revistas, somente as revistas                                                                                                                         
                      que   representar uma “coleção”.)


                       PERIÓDICOS  -  ANAIS
                                 “              -  REVISTA
                                 “              -  BOLETIM


 

                                          TEXTOS XEROX



Neste período, iniciei uma série de orientações semanais com a Bibliotecária Chefe da Biblioteca Setorial de Ciências Sociais e Humanidades (BSCSH) / Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) / Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Maria Lizete Gomes Mendes,  com vistas a uma capacitação e uma qualificação em atividades de documentação e arquivamento .
A quantidade de informações do Banco de Dados foi crescendo gradativamente, na medida em que as pesquisas e a investigação científica do Projeto Integrado “Estudo Antropológico de Itinerários Urbanos, Memória Coletiva e Formas de Sociabilidade no Meio Urbano Contemporâneo” avançaram. A demanda de organização, arquivamento e catalogação da crescente quantidade de informações colocava para a equipe de pesquisadores uma nova tarefa: a rearticulação da atual base da dados, diante da sua  complexificação e remensuração. 
São estes os fatores que levaram a equipe de trabalho do projeto de pesquisa a tomarem duas decisões, no período compreendido entre os meses de julho e dezembro de 1997 :
I - Criar um processo de informatização da base de dados, através do sistema de pastas e sub-pastas, utilizando o software "Explorer" (Windows 95);
II - Estudar, pesquisar e explorar a implantação de um software específico para o trabalho com Bancos de Dados Relacionais.
Mediante a uma divisão de tarefas, fiquei responsável pela execução dos dois procedimentos acima descritos. Para o primeiro procedimento, contei com o auxílio e colaboração da colega Luciane Moreau Coccaro, também pesquisadora de iniciação científica do projeto de pesquisa ao qual estou vinculado.
Através de pesquisas sobre documentação e arquivamento, tive a oportunidade de conhecer uma obra de Don M. AVEDON, intitulada "Discos Ópticos e Imagens Eletrônicas - Conceitos e Tecnologia"[1] a qual preconizava a adoção do sistema de Pastas e Sub-Pastas na organização de documentos e imagens eletrônicas. Este fato me deixou mais confiante e disposto a implementar uma proposta de trabalho a qual, intuitivamente, já percebia como viável e adequada. Este embasamento teórico veio reafirmar um entendimento prévio de que o sistema operacional da Microsoft - Windows 95 - apresenta recursos simples e adequados para as necessidades de organização e armazenamento de pequenas quantidades de dados e / ou informações.
Criamos, então um sistema de organização informatizada do nosso Banco de Dados que reproduzia a lógica de pastas do arquivo físico que tínhamos organizado até aquele momento. As grandes vantagens eram: acesso rápido e confiável, criação e exclusão de pastas com simples teclar de botões (ou teclas) e um sistema de recuperação de informações, também muito simples, rápido e confiável, feito através da função "Localizar" do Windows Explorer.
 Este sistema de organização é bastante confiável e prático, porém limitado, especialmente no que se refere aos procedimentos de conexão entre indexadores, relacionamento entre registros e possibilidades de criação de formulários, relatórios e pesquisas relacionadas a mais de um banco de dados. Diante desta problemática, surgiu a necessidade de buscarmos informações sobre os softwares que trabalham especificamente com Banco de Dados Relacionais. Após a uns sessenta dias de investigação sobre este assunto, observamos que o software Access (Microsoft Corporation) poderia ser uma alternativa interessante diante das nossas necessidades de trabalho em gerenciamento de dados.
Comecei, então uma pesquisa sobre o software Microsoft Access (detalhes sobre estas pesquisas, realizada em diferentes suportes de informação, podem ser acompanhadas nos itens: Pesquisas Bibliográficas, Audição e Visualização de Fitas VHS e Pesquisas On-Line)  que é um sistema de gerenciamento de banco de dados relacional (SGBDR). Através das pesquisas teóricas [2] e algumas experiências práticas  pude realizar uma iniciação no trabalho com Bancos de Dados Relacionais. Porém, neste período (Julho / Dezembro / 1997) não foi possível avançar mais neste sentido, diante de limitações técnicas e de tempo disponível para esta atividade.
Ainda neste período de atividades, realizei o  Curso de Capacitação em Atividades de Documentação: arquivamento, organização, catalogação e indexação dentro de um projeto de construção de Banco de Dados e de Imagens, desenvolvido na Biblioteca Setorial de Ciências Sociais e Humanidades (BSCSH) / Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) / Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). 
A aquisição de um Micro Computador – Processador Pentium, 166 Mhz, 32 MB de memória Ram, HD de 2 GB - (realizada no período anterior a este), destinado exclusivamente para o trabalho do Projeto Individual A: “Antropologia do Cotidiano e Estudo das Sociabilidades a Partir das Feições dos Medos e das Crises na Vida Metropolitana.” (Professora Executora: Dra. Cornelia Eckert) e do Projeto Integrado “Estudo Antropológico de Itinerários Urbanos, Memória Coletiva e Formas de Sociabilidade no Meio Urbano Contemporâneo”, trouxe uma importante qualificação  no  trabalho de organização, classificação e indexação de dados.
A configuração detalhada desta máquina é a seguinte:

CPU TYPE: Pentium-s
CPU CLOCK: 166 MHz
Base Memory 640 K
Extended Memory 31 744 K
Cache Memory 512 K
Diskette Drive A: 1,44  3,5 in
Diskette Drive B: None
Pri Master Disk: LBA, Mode 4,2160 MB
Pri Slave Disk: CDRom, mode 4
Sec. Master Disk: none
Sec. Slave Disk: none
Display Type: EGA/VGA
Serial Port(s): 3F8 2F8
Parallet Port(s): 378
Bank0 EDO DRAM: No
Bank1 EDO DRAM: No
L2 Cache Type: Pipelined Burst

No período  Janeiro / Junho / 1998 ,  a instalação do pacote Office 97 (Grupo de Programas da Microsoft de última geração disponíveis no Brasil) propiciou uma  qualificação ainda maior das técnicas e dos procedimentos de organização, classificação e indexação de dados, especialmente por podermos contar, a partir de agora, com o software Access instalado em nosso computador (Versão Office 97).
Estas pré-condições técnico-informáticas conjugadas a uma intensa discussão da equipe de pesquisadores, a fim de definir as palavras-chaves e as categorias que passarão a ser usadas no Banco de Dados e no Banco de Imagens, nos possibilitaram a iniciar um novo rearranjo da atual base de dados.
Mediante toda a qualificação realizada nos períodos anteriores (cursos, orientações, pesquisas, ...), no que concerne as atividades de Documentação - arquivamento, organização, catalogação e indexação – desenvolvi, com o auxílio da colega Luciane Moreau Coccaro, orientação técnica da bibliotecária Maria Lizete Gomes Mendes e da Professora Dra. Cornelia Eckert, uma nova base de dados para o Banco de Dados Projeto Integrado “Estudo Antropológico de Itinerários Urbanos, Memória Coletiva e Formas de Sociabilidade no Meio Urbano Contemporâneo”. Dentro do ambiente Windows, utilizando o Microsoft Access, temos agora a possibilidade de trabalhar com um sistema de gerenciamento relacional de Banco de Dados (SGBDR), contando com inúmeras possibilidades de armazenamento, relacionamento, recuperação, inserção (importação e exportação), impressão e apresentação de dados e informações. Dentre elas, destacaria:
·         Organização de dados de acordo com uma categoria pré-estabelecida;
·         Armazenamento de informações referentes a diferentes bases de dados e de diferentes suportes (gráficos, iconográficos, ...);
·         Definição de inúmeras formas de relacionamento entre as diversas tabelas que compõe o Banco de Dados;
·         Definição de várias formas de recuperação da informação;
·         Definição de várias formas controle, restrição e segurança (chaveamento) da base de dados;
·         Importação e exportação de dados de outros programas e aplicativos que são processados no sistema operacional Microsoft Windows 95. É possível, por exemplo, relacionar dados com Microsoft Word 7.0 ou 97 (Processador de Texto), com dados do Excel 7.0 ou 97 (Planilha Eletrônica), com dados do Visual Fox Pro (Banco de Dados), entre outros;
·         É possível realizar várias formas de apresentação e impressão dos registros do Banco de Dados em qualquer um dos softwares citados no item anterior, criando relatórios temáticos, formulários de apresentação de dados específicos a alguns campos do Banco de Dados ou apresentações de dados acompanhadas de iconografias ou imagens relacionadas a estes.
 A elaboração da estrutura da nova base de dados foi uma atividade bastante laboriosa, pois demandou uma avaliação técnica muito precisa e criteriosa que só foi possível através da intervenção de toda uma equipe de trabalho. Atualmente esta nova base de dados está pronta, porém o processo de alimentação (translado dos registros da base anterior para a atual, mais a inserção dos novos registros de dados) desta base está em uma fase bastante inicial, pois requer um longo trabalho de digitação, definição de categorias e de redefinição de  palavras-chaves (em alguns casos). Como já citamos, contamos agora com uma infinidade de possibilidade de inserção, organização e apresentação  de dados, portanto é difícil demonstrar todas estas possibilidades graficamente como fizemos nos casos dos arranjos documentais anteriores a este (Anexos Anteriores). A visualização perfeita de todas estas possibilidades só seria possível através do conhecimento prévio do software que utilizamos. 
















2. BANCO  DE  IMAGENS   E  DE  EFEITOS  VISUAIS  DA  CIDADE  DE  PORTO  ALEGRE [3]

A construção do   “Banco  de  Imagens  da Cidade de  Porto Alegre”, vinculado ao Projeto Individual A: “Antropologia do Cotidiano e Estudo das Sociabilidades a Partir das Feições dos Medos e das Crises na Vida Metropolitana.” (Professora Executora: Dra. Cornelia Eckert), Projeto Individual B:  “Coleções Etnográficas, Itinerários Urbanos e Patrimônio Etnológico: A Criação de um Museu Virtual” (Professora Executora: Dra. Ana Luiza C. da Rocha) e Projeto Integrado “Estudo Antropológico de Itinerários Urbanos, Memória Coletiva e Formas de Sociabilidade no Meio Urbano Contemporâneo”,   remonta a uma proposta  de estruturação de documentação  e de inventário dos  dados de pesquisa etnográficos e imagéticos e é entendido dentro do seguinte contexto:  
“A Complexidade da memória, para além da lógica obsessiva do esquecimento, adquire nesta pesquisa, um sentido novo : a formação de um Banco de Imagens da Cidade que permita ao usuário formas mais integrativas, criativas e interativas de documentação e recuperação do acervo documental da cidade de Porto Alegre, possibilitando-lhe novas possibilidades de interpretação dos tempos e espaços sociais.” [4]
Propõe-se na fase de divulgação dos dados, ordenados e analisados,  construir um Banco de Imagens Interativo, encerrando assim as formas tradicionais de interação, acumulação e recuperação do suporte informacional. Trata-se de conceber o patrimônio de registros históricos a partir das transformações urbanas aqui instrumentalizadas pela digitalização de fotos, filmes, gravuras e demais iconografias que retratam as transformações na cidade de Porto Alegre, inaugurando uma nova forma de interação, acumulação e recuperação deste patrimônio.
Referindo de outra forma, poderíamos afirmar que:
 “longe de se adotar formas estáticas de apropriação e produção de conhecimentos, no âmbito da preservação patrimonial, e a partir da ordenação criteriosa do conjunto documental da cidade de Porto Alegre, este projeto (...) preocupa-se, fundamentalmente, com formas interativas de participação e acesso do usuário de um museu com as estruturas identitárias dos habitantes das grandes metrópoles tendo como ‘fio condutor’ o inventário deste arranjo documental.” [5]
Vivemos a “civilização da imagem”[6], com os seus recursos multimídias, suas redes de informação e comunicações informatizadas, seus processos (e procedimentos) “cognitivos digitais”, etc. É dentro deste contexto que precisamos abordar a proposta da implementação de um Banco de Imagens da Cidade onde vivemos. Assim, as tarefas de construção do arranjo documental e arquivístico que desenvolvo, permite “abordar o patrimônio etnológico acumulado que representa a cidade a partir de jogos de memória de seus habitantes, integrando os recursos interativos de novas tecnologias as formas clássicas de tratamento documentais de valor histórico, significa para este projeto um desafio.” [7]
Dentre os objetivos, destacaria dois:
·         “Realizar o estudo dos itinerários urbanos e formas de vida social na cidade como forma de recuperação e resgate de informações do patrimônio etnológico da cidade de Porto Alegre, tendo como objeto de investigação formas interativas de registro, de documentação, de apropriação e produção de seus documentais, em seus suportes diversos;” [8]
·         “Criar, com base nos jogos da memória da quotidianidade de seus habitantes, um Banco de Imagens da cidade de Porto Alegre que testemunhe a cadeia dos ritmos, dos gestos, dos movimentos e das intenções de seus habitantes que investe no resgate da herança patrimonial de Porto Alegre, e de suas produções culturais coletivas.” [9]

Quanto a  operacionalização desta pesquisa, estão sendo inventariadas coleções videográficas[10] e fotográficas da cidade de Porto Alegre, implementando  o tratamento técnico de tais coleções reencenadas no Banco de Imagens da Cidade. Este tratamento técnico é dado com a utilização de recursos de informática no processo de seleção, catalogação, indexação, e recuperação dos documentos, bem como no tratamento,  digitalização e  edição das imagens (fotos, vídeos, iconografias, gravuras, etc.)
A Construção de um Banco de Imagens exigiu um empenho e um trabalho análogo ao que foi relatado para a Construção do Banco de Dados, especialmente porque estes dois bancos estão interrelacionados, no que concerne a sua proposta, organização e estruturação.
O elemento diferenciador do Banco de Imagens, se relacionado com o Banco de Dados Etnográfico,  é dado pela própria integração dos projetos de pesquisa aqui empenhados, ou seja, a sua construção é dada pela inserção do Projeto que visa a Construção de um Banco de Imagens Digitalizadas e Interativas da Cidade de Porto Alegre, coordenado pela Professora Dra. Ana Luiza Carvalho da Rocha.
 O objetivo de construir um Banco de Imagens Digitais da Cidade de Porto Alegre foi  obstruído neste primeiro ano do projeto diante da inexistência de equipamentos informáticos necessários a sua execução. Diante de tal carência técnica, nos dedicamos por trabalhar na Construção de um Banco de Imagens da Cidade de Porto Alegre de suporte físico (fotos, imagens VHS, desenhos, gravuras e iconografias em geral), pensado, organizado e estruturado mediante uma lógica teórico-técnica que possibilite a sua digitalização imediata, mediante a aquisição do equipamento informático necessário ao processo. Diante disto, foi necessário todo um empenho e um trabalho voltado para os procedimentos de organização, catalogação e indexação dos documentos que integram o Banco de Imagens de suporte físico, semelhantes aos empenhados no Banco de Dados Etnográficos, exigindo assim muita pesquisa e orientação junto a materiais escritos e técnicas da biblioteconômia e da arquivística, também alcançados com o auxílio de bibliotecários da Biblioteca Setorial de Ciências Sociais e Humanidades  (BSCSH) / Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) / Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) [11].
Mesmo não sendo possível realizarmos a implantação integral do Banco de Imagens Digitalizadas e Interativas neste primeiro ano do projeto, devido as limitações técnico-informáticas, nos dedicamos a várias atividades preparatórias para este procedimento que será realizado posteriormente. Dentre elas, destacaríamos a realização de cursos na área de digitalização de imagens e de extensa pesquisa bibliográfica sobre as principais temáticas que estão colocadas para o trabalho com imagens digitais a nível nacional e internacional, além de experiências e testes  realizados em equipamentos  disponibilizados pelo Centro de Documentação Social (CDS) / Biblioteca Setorial de Ciências Sociais e Humanidade (BSCSH) / Instituto de Filosofia e Ciências Humanas  (IFCH) / Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). O estudo e a pesquisa nesta área são imprescindíveis ao trabalho de construção do Banco de Imagens Digitalizadas e Interativas da Cidade de Porto Alegre, uma vez que esta tecnologia é muito recente no Brasil e pelo fato também de ser uma tecnologia em constante evolução e reformulação técnicas.
Passaremos a relatar as principais atividades desenvolvidas nesta primeira etapa (Biênio 97 / 98) do processo de construção do “Banco de Imagens Digitais e Interativas da Cidade de Porto Alegre”, segundo a uma divisão cronológica (Divisão por Períodos).






2.1 PRINCIPAIS PROCEDIMENTOS E TÉCNICAS ADOTADOS NO TRABALHO DO BANCO   DE  IMAGENS  E  EFEITOS  VISUAIS  DA  CIDADE  DE  PORTO  ALEGRE.

Pretendemos aqui relatar um pouco da evolução e da sistematização dos procedimentos e principais atividades de trabalho que marcaram este primeiro período de investigação científica,  no que se refere à construção do Banco de Imagens e Efeitos Visuais da Cidade de Porto Alegre.
Iniciamos o trabalho propriamente dito com a organização do material que fora coletado e acumulado pela Pesquisadora Dra. Ana Luiza C. Da Rocha. Os materiais que compunham este acervo, eram, na sua maioria, recortes de jornais e revistas (nacionais e estrangeiras), livros, e textos avulsos (cópias xerox).
 A primeira forma de armazenar este material foi através de uma ordenação temática, utilizando palavras chaves que foram surgindo no universo desta pesquisa e auxiliaram neste ordenamento inicial. Realizamos uma ordenação cronológica para alguns tipos específicos de material como a Coleção de Revistas do Globo, por exemplo. Esta primeira organização foi marcada pelo início de uma discussão teórica e metodológica sobre qual o método de organização e classificação  seria o mais adequado para as necessidades do  Banco de Imagens.
Neste período, iniciei uma série de reuniões e orientações semanais com a Antropóloga, Pesquisadora e autora Projeto Individual B: “Coleções Etnográficas, Itinerários Urbanos e Patrimônio Etnológico: A Criação de um Museu Virtual”, Dra. Ana Luiza Carvalho da Rocha / Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social (PPGAS) / Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) / Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), com a Socióloga e Pesquisadora Sônia Picinini / Museu Universitário / Pró-Reitoria de Extensão (PROREXT) / Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), com a Bibliotecária Maria Lizete Gomes Mendes / Biblioteca Setorial de Ciências Sociais e Humanidade (BSCSH) / Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) / Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), visando uma capacitação pessoal e uma qualificação profissional em atividades de ordenação, organização e arquivamento de coleções fotográficas e iconográficas.
Além destas reuniões e orientações semanais, realizei outras que não obedeceram rigorosamente uma periodicidade semanal, porém também contribuíram para as atividades de pesquisa e de investigação científica deste projeto. Dentre elas, destacaria as orientações com a Pesquisadora e Professora Dra. Marília Levacov / Centro de Informações em Ciência e Tecnologia (CIC&T)/ Instituto Latino-Americano de Estudos Avançados (ILEA) / Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e a troca de informações com a bibliotecária Nádia Vanti /  Centro de Informações em Ciência e Tecnologia (CIC&T) / Instituto Latino-Americano de Estudos Avançados (ILEA) / Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) .
O diálogo e a troca de informações com o Museu Universitário, através da pesquisadora Sônia Picinini e com o Centro de Informações em Ciência e Tecnologia , através da Professora Dra. Marília Levacov foi uma atividade que, iniciada neste período, se estendeu durante todo o transcurso das nossas investigações científicas.
A aproximação com o Museu Universitário aconteceu em função de que nele existe uma coleção de Imagens da Cidade de Porto Alegre (Fotografias, iconografias, gravuras, ...) em fase de reorganização e reestruturação, com vistas a sua inserção na Rede Mundial de Computadores (Internet), através de sua Home Page. Já a aproximação  com o Centro de Informações em Ciência e Tecnologia (CIC&T) aconteceu em função de que nele encontramos pesquisadores trabalhando com projetos de pesquisas no campo de Banco de Imagens, disponibilizados via rede de computadores (Acesso on-line), sob a coordenação da Professora Dra. Marília Levacov, especialista nesta área de conhecimento.
As orientações e troca de informação com as pesquisadoras e profissionais supra citadas colaboraram sobremaneira para o nosso trabalho em três campos de conhecimento distintos, porém complementares:
A – Atividades de organização, arquivamento e indexação de coleções fotográficas e iconográficas;
B – Procedimentos de digitalização de imagens fotográficas e iconográficas;
C – Atividades de armazenamento, indexação, recuperação e edição de imagens fotográficas e iconográficas digitalizadas (mapa de bits).

Em um segundo período de trabalho, demos continuidade as reuniões e orientações iniciadas no período anterior (março a junho de 1997). A continuidade desta atividades, as quais já citamos, trouxeram importantes avanços e aprimoramentos para as nossas atividades de pesquisa e de investigação científica. Porém o fato que marcou este período de pesquisa foi a realização do Curso de Digitalização de Imagens e as posteriores Oficinas Experimentais realizadas com base nos conhecimentos adquiridos no curso.
Por estarmos trabalhando em um projeto que visa a construção de um Banco de Imagens Digitalizadas e Interativas da Cidade de Porto Alegre, o Curso de Digitalização, bem como as Oficinas Experimentais  realizadas posteriormente, foram muito importantes nesta fase da investigação científica. Aliadas às pesquisas teóricas realizadas, estas intervenções prático-experimentais nos permitiram começar a trabalhar com imagens digitais que, uma vez reunidas, organizadas e indexadas, levariam a formação de um Banco de Imagens.  Dada a relevância destas atividades  para este projeto de pesquisa, passaremos a relatar estas atividades com um pouco mais de minúcia:
Em termos teóricos, o Curso de Digitalização nos permitiu acessar o seguinte conceitual técnico:


§  Conceito de Digitalização;
§  Sistemas de Processamentos de Imagens;
§  Entrada de Dados;
§  Dispositivos para digitalização : Scanners; Câmeras digitais, ...;
§  Tipos de arquivos;
§  Resolução Gráfica;
§  Limiar;
§  Processamento : Edição, Indexação,  OCR (Reconhecimento Óptico de Caracteres);
§  Conversão de arquivos raster para vector;
§  Armazenamento;
§  Mídias;
§  Disco Rígido;
§  Sistema RAID;
§  Discos Ópticos;
§  Jukeboxes;
§  Torres de CD;
§  Optando pela mídia mais adequada;
§  Transmissão;
§  Saída : Monitores, Impressoras, ...;
§  Integração com outras tecnologias;
§  Aspectos Legais.

Em termos práticos, o Curso de Digitalização nos permitiu experimentar (de forma rápida) as seguintes atividades:

·         Trabalhar com Sistemas de Processamentos de Imagens
·         Executar a Entrada de Dados
·         Trabalhar com o principal Dispositivos para digitalização : Scanners.
·         Articulando Diferentes Tipos de arquivos
·         Definindo a Resolução Gráfica
·         Atividades de Processamento de Imagens : Edição, Indexação,  OCR (Reconhecimento Óptico de Caracteres).
·         Armazenando Dados e Imagens
·         Indexando Dados e Imagens em uma pequena base de dados
·         Articulando Mídias opcionais
·         Armazenando no Disco Rígido
·         Armazenando em Discos Ópticos
·         Transmissão de Dados
·         Trabalhando com os Periféricos de Saída : Monitores, Impressoras, ...

Após a realização do Curso de Digitalização, realizamos algumas Oficinas de Digitalização e Tratamento de Imagens e de Textos  no Centro de Documentação Social (CDS) / Biblioteca Setorial de Ciências Sociais e Humanidades (BSCSH) / Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) / Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), a fim de experimentarmos e operacionalizarmos os procedimentos apreendidos. O equipamento usado nesta oportunidade possuía a seguinte configuração:

CPU TYPE: Pentium-s
CPU CLOCK: 100 MHz
Base Memory 640 K
Extended Memory 15 360 K
Cache Memory 256 K
Diskette Drive A: 1,44  3,5 in
Diskette Drive B: None
Pri Master Disk: LBA, Mode 0,1286 MB
Pri Slave Disk: none
Sec. Master Disk: none
Sec. Slave Disk: none
Display Type: EGA/VGA
Serial Port(s): 3F8 2F8
Parallet Port(s): 378
Bank0 EDO DRAM: No
Bank1 EDO DRAM: No
L2 Cache Type: Async
Scanner Hewlett Packard (HP)
Model: HP ScanJet 3P
Versão para Microsoft Windows
Softwares (do Scan):
HP Picture Place
HP Picture Scan
HP Picture Place Editor
HP Copier
OCR (Optical Character Recognition) [12]
Impressora (Matricial) EPSON LQ – 1070 +
Res. : 360 X 360


Dentre as atividades realizadas, destacaria as seguintes:
*  Leitura e análise dos manuais (instalação, operação, digitalização, tratamento e edição de textos e imagens) do Scanner HP ScanJet 3p;
*   Leitura e análise dos manuais (instalação, operação, tratamento e edição de imagens) do Software Corel Draw 5.0;
*       Leitura e análise dos manuais (instalação, operação) do Software Access 2.0;
*       Procedimentos de Digitalização de textos;
*       Procedimentos de Digitalização de imagens;
*       Procedimentos de Digitalização de textos com imagens (e vice versa);
*       Realização de testes sobre definição de imagens (Dpi’s);
*      Realização de testes sobre extensões de arquivos de imagens;
*      Realização de testes sobre extensões de arquivos de textos;


DIGITALIZAÇÃO  DE  TEXTOS

A digitalização de textos foi um dos procedimentos desenvolvidos exaustivamente nas oficinas que realizamos. Inicialmente, pode parecer que esta é uma técnica, relativamente, simples, porém, na medida em que passamos a entrar nos detalhes e especificidades do programa de reconhecimento óptico de caracteres / textos (OCR), Word Scan, percebemos que não era bem assim.
Em primeiro lugar, deve-se ter um conhecimento mínimo de todas as possibilidades que o software de reconhecimento de textos  (que se está usando) nos oferece em termos de: definição de imagens (geralmente vai de 75 Dpi’s [13] até 600 Dpi’s para leitura óptica e de 100 Dpi’s até 2400 Dpi’s interpoladas); extensões de arquivos (TIF, TIFcomp, PCX, JPG, ...), área de abrangência para a leitura do documento originas (Geralmente até o tamanho A4) e intercambialidade com os softwares de processamento de textos (Word 6.0, Word 7.0, Word 97, Word Pad, ...). O desconhecimento de qualquer uma destas características e a consequentemente inadequação na sua configuração pode levar à experiências desastrosa ou mesmo à impossibilidade de se realizar a digitalização perfeita e adequada de um texto. Algumas destas configurações são sugeridas pelas máquinas e programas informáticos, ou seja, pode ser feita automaticamente pelo computador / scanner. Neste caso, porém, existe uma grande probabilidade de as sugestões (automaticalidade) serem inadequadas para determinados casos específicos. Por exemplo, os programas e as máquinas são configuradas para trabalharem sobre situações padronizadas (as mais utilizadas pelos seus usuários). No caso da digitalização de textos, se supõe que o original (texto) tem uma qualidade gráfica perfeita, o papel onde foi impresso este texto possui bem definido as cores branco (papel) e preto (letras e números), o tamanho do papel é padrão A4, com espaços interlineares duplos, afastamento da margem direita de 2 Cm, afastamento da margem esquerda de 3 Cm, entradas de parágrafo de 2Cm, possua o texto disposto em uma única coluna, etc. Porem, se estamos trabalhando em condições adversas a qualquer uma destas condições “Padrão” (digitalizando um texto de uma página de jornal, por exemplo, ou um texto impresso em máquina matricial de baixo padrão gráfico, etc.) e aceitarmos as sugestões do computador / scanner / software / os resultados, certamente, serão desastrosos.
Em segundo lugar, deve-se partir para uma preparação e uma avaliação do texto original a ser escaneado. A preparação consiste basicamente em:
·         Extrair do texto clipes e grampos metálicos, encadernações e capas (removíveis), quando houverem;
·         Apagar anotações, sublinhados, rascunhos e qualquer outro tipo de elemento gráfico (manuscrito e impresso) que esteja sobre (ou junto) o (ao) texto a ser digitalizado. Qualquer elemento gráfico (letra, número ou mesmo um ponto) presente na área a ser escaneada pode confundir a leitura óptica, mudar o conteúdo e o sentido de palavras, expressões e / ou frases ou ainda atrasar o procedimento de reconhecimento óptico de caracteres (OCR), tornando-o lento, imperfeito e insatisfatório [14] ;
Em terceiro lugar, deve-se realizar a digitalização de uma página do texto como teste, onde tentamos configurar, o mais adequadamente possível, o  tamanho da área digitalizada, a definição de imagem (Dpi's), a extensão de arquivo, etc. Se o resultado foi positivo, passamos a proceder a digitalização de todo o texto. O teste é importante, pois não há como pré-definir todos estes itens de configuração, uma vez que cada texto apresenta uma característica muito própria de qualidade gráfica (intensidade, cor e qualidade de tinta utilizada; desenho, definição e tipo de fontes / letras / caracteres; tamanho de espaços utilizados e não utilizados no papel, podendo ser tamanho A4, tamanho ofício, etc. uma coluna duas colunas, uma coluna com inserção de gravuras, etc.)..
Segundo algumas experiencias, concluimos que o melhor resultado foi alcançado com uma definição gráfica de 200 Dpi’s, mas mesmo assim ainda necessitando de algumas edições. As informações que estão no cabeçário ou no rodapé da página são trazidos, automaticamente, para dentro do texto, bem como o número de páginas, por exemplo. Neste caso há a necessidade de se comparar o texto original com o texto digitalizado, a fim de restaurar estas confusões. De qualquer forma, a digitalização de textos é uma opção muito interessante para as novas necessidades de trabalho (envolto na tecnologia informática) onde é imprescindível diminuir o constante fluxo e a quantidade interminável de papéis impressos. Entretanto, esta já é uma outra discussão que, apesar de termos  tido a oportunidade de abordá-la [15], inseridos no  trabalho com Banco de Dados e Banco de Imagens, não a empenharemos neste momento por não ser este o nosso objetivo.


DIGITALIZAÇÃO  DE  IMAGENS

A exemplo do que fizemos com os textos, durante as oficinas de digitalização, escaneamos várias imagens, dentro do mesmo objetivo aqui já mencionado.
Para esta atividade,  duas características do equipamento em que trabalhávamos nos impedia de realizar tarefas mais elaboradas. A primeira característica referia-se a impossibilidade de scanearmos e processarmos imagens coloridas, uma vez que o Scanner HP ScanJet 3p  só permite trabalhar com imagens em preto e branco (com vários tons de cinza). A Segunda característica era a baixa definição gráfica em que este hardware estava trabalhando, apenas 75 Dpi’s. Esta era uma limitação colocada pelo próprio Scanner HP ScanJet 3p que definia, automaticamente, a quantidade de pontos por polegada (ou Dpi’s) no processo de digitalização, mediante ao tipo e configuração da impressora (periférico de saída de dados) conectada a ele. Como, neste caso, a impressora conectada ao scanner era uma Epson Matricial (Modelo LQ – 1070+), o scanner definia sempre um máximo de 75 Dpi’s como resolução gráfica padrão [16]. Mesmo assim, foi possível estrearmos no campo das imagens digitais, mapas de bits (bmp), processamento e edição de imagens, armazenamento e recuperação desta imagens, etc.
Como não podíamos criar muitas situações de testes e experimentações sobre as definições gráficas de nossas imagens (estavam chaveadas em 75 Dpi’s), nem tampouco sobre as cores das imagens (O Scanner HP ScanJet 3p só trabalha com tons de cinza / preto e branco), centramos nossos esforços em cima das extensões de arquivo (tipos de arquivo) mais usadas / adequadas e menos usadas / adequadas para cada tipo  específico de situação de digitalização de imagens.
Antes, porém, de realizar os procedimentos de scaneamento das imagens, precisamos efetuar os passos de preparação deste material (imagem fotográfica, iconográfica, etc.) que são muito semelhantes aqueles procedimentos já aqui mencionados no tocante a preparação para a digitalização dos materiais gráficos (textos, livros, apostilas, etc.). Ou seja, extrair grampos, clipes e outros objetos assemelhados, pré-avaliar a qualidade gráfica das imagens (intensidade de cores e / ou tinta, existência ou não de fungos, mofos, dobraduras, rasuras, etc.) , dividindo-as em lotes segundo estas características.
 Por exemplo, em se tratando de fotos antigas, podemos criar lotes de fotos segundo as suas características de conservação e apresentação. Teríamos, então um lote de fotos em bom estado de conservação, lotes de fotos com estado de conservação razoável e lotes de fotos em mau estado de conservação. Em se tratando de fotos recentes e em bom estado, porém de vários tamanhos e formatos, criaríamos lotes de fotos tipo paisagem (Horizontal) tamanho 10 X 15 Cm, lotes de fotos tipo paisagem (horizontal) tamanho 20 X 30 Cm, ... ou lotes de fotos tipo retrato (Vertical) tamanho 10 X 15 Cm, lotes de fotos tipo retrato (Vertical) tamanho 20 X 30 Cm, e assim por diante. Este trabalho de pré-organização do material a ser digitalizado (segundo o nosso exemplo, fotos), dividindo-o em lotes,  permite uma maior agilidade e velocidade no procedimento de digitalização. Isto acontece porque, uma vez configurado o scanner, em termos do tamanho da área a ser digitalizada, de definição gráfica (Dpi’s), de extensão de arquivos de imagens, etc. mediante a apresentação de uma foto, não é necessário reconfigurar a máquina para as fotos posteriores, visto que pertencem a um mesmo lote de fotos, ou seja, possuem as mesmas características.
Voltando `a questão dos diversos tipos de arquivos de imagens, destacamos a tabela que segue:

FORMATOS  DE  ARQUIVOS  GRÁFICOS  MAIS  USADOS

Extensão
Tipo de Arquivo
Comentário
TIF
Tag Image File Format
Mais utilizado para figuras
TIFComp
Tag Image Format Compactado
Extensão ideal para textos
PCX
Zsoft Format
Utilizados pela maioria dos aplicativos
EPS
Encapsulated PostScript
Utilizados pela maioria dos aplicativos
BMP
Bitmap do Windows
Formato padrão do Sistema Operacional Windows.
GIF
Compuserv
Utilizados pela maioria dos aplicativos

Existe uma carência muito grande de bibliografia que aborde especificamente a questão dos formatos dos arquivos gráficos, no trabalho com imagens digitais. Portanto, as experiência realizadas neste sentido, no Centro de Documentação Social (CDS) / Biblioteca Setorial de Ciências Sociais e Humanidades (BSCSH) / Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) / Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), foram muito significativas para a nossa formação técnica nesta área.
Com base nestas experimentações, destacaríamos os seguintes aspectos:
·         Não existem regras fechadas e perfeitas para o trabalho com estes formatos de arquivos. A performance de cada um deles varia muito segundo aos objetivos que se tem (escaneando imagens), ao tipo de equipamento que se dispõe para trabalhar e ao nível de domínio operacional (preparação técnica do operador) que detemos sobre os softwares e hardwares em que estamos trabalhando;
·         Com base no que foi afirmado no item anterior, o melhor caminho para a decisão sobre os formatos de arquivos gráficos (qual escolher) ainda é proceder a uma experimentação, antes de definir o formato a ser utilizado (definitivamente);
·         É necessário atentar bastante para a relação custo / benefício, ao se definir o tipo de arquivo gráfico em que vai se trabalhar. Sabendo-se que as imagens digitalizadas geram  arquivos  gráficos muito grandes [17], o usuário esta diante de duas alternativas:  a) fazer a opção em usar formatos de arquivos que são plenamente satisfatórios no item armazenamento de dados, ou seja, comprimem (ou otimizam) os arquivos. Apesar de saber que corre o risco de perder no item qualidade gráfica da reprodução digital.  b)  fazer a opção em usar formatos de arquivos que são plenamente satisfatórios no item qualidade gráfica, mesmo sabendo que estes formam arquivos de imagem muito extensos.
 Segundo algumas de nossas experiências, destacamos a  tabela e o gráfico abaixo:


FORMATO DO ARQUIVO
TAMANHO DO ARQUIVO
JPG
186  KB
TGA
654  KB
TIF
654  KB
PCX
794  KB
EPS
1352  KB








Através das informações do gráfico e da tabela, observamos que o tamanho dos arquivos oscilaram entre 186 KB e 1.352 KB, segundo o tipo de arquivo gráfico que foi empregado. Considerando uma situação hipotética, onde pretendemos digitalizar cinqüenta imagens iguais a esta, por exemplo, usando o formato TIF, teríamos uma necessidade de armazenamento de 32 700 KB. É justamente neste momento que surgem os problemas de armazenamento, assunto que já abordamos, brevemente, neste relatório.


DIGITALIZAÇÃO  DE  TEXTOS  COM  IMAGENS (e vice versa)

Durante as oficinas de digitalização de imagens, realizadas no Centro de Documentação Social (CDS) / Biblioteca Setorial de Ciências Sociais e Humanidades (BSCSH) / Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) / Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), enfrentamos uma atividade um pouco complexa: digitalizar imagens, contendo textos e digitalizar textos, contendo imagens. É um pouco complexa, pois envolve dois procedimentos distintos em dois momentos técnicos antagônicos (e complementares). Na verdade, já abordamos, em um primeiro momento, as investidas que realizamos na digitalização de textos e, posteriormente, as investidas realizadas na digitalização de imagens. Assim sendo, é necessário apenas lembrarmos destes dois momentos, trazendo-os para um único espaço.
Na digitalização de textos com imagens, quando nos interessa tanto as informação imagéticas como as escritas, precisamos digitalizar o texto, realizando todos aqueles procedimentos que já citamos,  armazenando-o em um arquivo de documento texto (processador de texto, Microsoft Word, por exemplo). Feito isso, passamos a operar com os softwares de digitalização e tratamento de imagens (Microsoft Corel Draw, por exemplo), a fim de transformar a nossa imagem original em um mapa de bits, posteriormente, armazenando-a em um arquivo de formato  gráfico.  Após a este procedimentos, se recorre as ferramentas de recortar  e colar (no programa de edição de imagens) ou as ferramentas de inserir figura (no programa de edição de textos) para se recompor a imagem original que foi digitalizada.
Realizados estes procedimentos, talvez comece a fase do trabalho mais laboriosa: dentro do processador de texto, realizar as formatações e as edições necessárias à manutenção de todas as característica do documento original. Nem sempre conseguimos manter todas as características originais do documento, em função de que as vezes os formatos de documento diferem bastante.
Este tipo de técnica é muito interessante, por exemplo, para as nossas necessidades de reprodução e armazenamento de artigos de jornais e revistas que possuem tanto texto quanto imagens que podem passar a integrar tanto o Banco de Dados Etnográficos e o Banco de Imagens da Cidade Porto Alegre. A fim de demonstrar uma situação deste tipo, anexamos uma reportagem da Revista do Globo denominada “De Que é Que Você Tem Medo ?” [18]  onde temos uma reportagem que passou a integrar o Banco de Dados Etnográficos, por abordar o nosso principal tema de pesquisa (Cultura do Medo), e uma imagem que remonta uma campanha publicitária de época (Veiculada na Cidade de Porto Alegre) que pode integrar (e interessar) o Banco de Imagens da Cidade de Porto Alegre.
Este período de trabalho foi marcado, especialmente, por três fatores:
I - A partir deste período o Banco de Imagens da Cidade de Porto Alegre passou a ter um espaço físico exclusivamente seu, sendo instalado na sala 108 do Instituto Latino Americano de Estudos Avançados / ILEA / Universidade Federal do Rio Grande do Sul / UFRGS [19]
II – Neste período aconteceu a aquisição de equipamentos e programas de informática para ser usado exclusivamente no Banco de Imagens da Cidade de Porto Alegre;
III – A partir da obtenção do hardware e dos softwares, começamos a ensaiar algumas atividades de digitalização, tratamento e processamento de imagens fotográficas, segundo a proposta e as orientações dos  projetos de Pesquisa Projeto Individual A: “Antropologia do Cotidiano e Estudo das Sociabilidades a Partir das Feições dos Medos e das Crises na Vida Metropolitana.” (Professora Executora: Dra. Cornelia Eckert), Projeto Individual B:  “Banco de Imagens da Cidade de Porto Alegre.” (Professora Executora: Dra. Ana Luiza C. da Rocha) e Projeto Integrado “Estudo Antropológico de Itinerários Urbanos, Memória Coletiva e Formas de Sociabilidade no Meio Urbano Contemporâneo”

Sobre o primeiro tópico, caberia destacar que participamos de todo o  processo de instalação do Banco de Imagens da Cidade de Porto Alegre em sua nova sede. Colaborando, desde o início deste semestre, nos contatos e tratativas com os professores Mário Barberena / Diretor Instituto Latino Americano de Estudos Avançados (ILEA) / Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e Marília Levacov / Coordenadora do Centro de Informações em Ciência e Tecnologia (CIC&T) / Instituto Latino Americano de Estudos Avançados (ILEA) / Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) no sentido de auxiliar nos tramites burocráticos e administrativos que envolveram este processo de transição do Banco de Imagens da Cidade de Porto Alegre para a sua nova sede. Uma vez instalados, passamos a operar as técnicas e os procedimentos de digitalização, tratamento, catalogação e indexação de imagens digitalizadas, com base nos conhecimentos acumulados até este período, adquiridos com a realização do Curso de Digitalização de Imagens e com as oficinas de escaneamento de imagens (fotográficas, iconográficas, ...)  aqui já referidas.
Sobre o segundo tópico, caberia destacar que a aquisição do equipamento de informática, bem como dos softwares,  para o Banco de Imagens trouxe a possibilidade de operacionalização  para os procedimentos de documentação e digitalização propostos neste projeto de pesquisa. Entretanto, junto a essa possibilidade de operacionalização surgiram grandes desafios de trabalho, no que concerne ao estudo e ao domínio técnico-científico destas novas mídias e tecnologias, muitas das quais ainda não conhecíamos. Portanto, passamos por um longo período de leitura, análise e interpretação de manuais, textos informativos / explicativos, helps interativos, consultas a outros profissionais, a fim de conseguirmos aproveitar ao máximo os novos equipamentos e os novos programas informáticos em que estávamos trabalhando.
A configuração básica do equipamento é a seguinte:

. PENTIUM II 266 Mhz
CPU clock  266 Mhz, soquete tipo ZIF, com dissipador de calor e microventilador, Cache 512 Kb. gabinete TORRE  c/FONTE 300W, 127/220V-60Hz

. memória RAM 96Mb - 72V (expansível até 384Mb)
Controladora ENHANCED IDE-PCI On Board, 01 interface paralela Padrão CENTRONICS (EPP/ECP), 02 interface serial ASSINCRONAS RS-232C UART 16550

. Teclado ABNT-2

. Placa de Vídeo STEALHT64 3D 3000 4Mb, PCI

. Monitor 17” SVGA Color Dp. 28mm NE, DIGITAL
Resolução 1280x1024mm - Refresh 75Hz

. 02 hard drives 4.3Gb SCSI, 7.200 Rpms

. Controladora ADAPTEC 3940 Fast Wide SCSI-3/PCI

. CD-ROM SCSI 16x (PHILIPS)

. Placa de som SOUND BLASTER AWE 32 (CREATIVE LABS)
c/ 2 caixas acústicas 60W e Microfone

. gravador de CD-ROM interno PHILIPS
(gravação 2x e Leitura 6x)

. drive  3,5”, 1.44Mb

. Impressora EPSON STYLUS 800
Resolução 1440x720 PPP, Interface Paralela Bidirecional, Serial RS 422 (MAC)
Slot para Interface B, Buffer 32Kb, Linguagem ESC/P2 e IBM X24e, Adobe PostScript2

. Placa fax-modem US ROBOTICS 33600 BPS

. mouse LOGITECH First Plus SERIAL 3 BOTÕES com mouse pad

. SCANNER de mesa Policromático HP Scanjet 4C 600x2400 DPI, Interface SCSI

. 02 estabilizadores

. 1 Nobreak 2,5 KWA

Os programas adquiridos são os que seguem:

. Adobe Photoshop 4.0 WIN 95

. Corel Draw 7.0 WIN 95

. MS-Visual FoxPro 5.0 WIN 95

. Director Suite 6.0 Studio WIN

Sobre o terceiro tópico caberia ressaltar que realizamos as seguintes atividades:

*  Leitura e análise dos manuais (instalação, operação, digitalização, tratamento e edição de textos e imagens) do Scanner HP DeskScan II;
*  Leitura e análise dos manuais (instalação, operação, tratamento e edição de imagens) dos Softwares adquiridos para o Banco de Imagens, em especial o Microsoft Visual Fox Pro 5.0
*      Leitura e análise dos manuais (instalação, operação) do Software Access 97;
*      Procedimentos de Digitalização de textos;
*      Procedimentos de Digitalização de imagens;
*      Procedimentos de Digitalização de textos com imagens (e vice versa);
*      Realização de testes sobre definição de imagens (Dpi’s);
*      Realização de testes sobre extensões de arquivos de imagens;
*      Realização de testes sobre extensões de arquivos de textos;
*     Procedimentos de Digitalização de textos seguida  de indexação;
*      Procedimentos de Digitalização de imagens seguida de indexação;

Para não ser repetitivo, não voltarei a abordar (qualitativamente)  todas as questões técnicas que envolveram todos estes procedimentos, uma vez que elas se assemelham muito ao que já foi aqui abordado anteriormente. As técnicas, no geral, são muito semelhantes, aquelas que realizamos nas oficinas de digitalização de textos e de imagens no Centro de Documentação Social (CDS) / Biblioteca Setorial de Ciências Sociais e Humanidades (BSCSH) / Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) / Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), no que concerne a operacionalidade das mesmas. As diferenças mais significativas são referentes ao aprimoramento técnico que, neste momento, foram enormemente ampliadas. Em especial, no que se refere à potência de processamento (Trabalhava-mos em um Processador Pentium 100 MHZ e agora trabalhamos em um Processador Pentium II 266 MHz.) e a qualidade dá máquina de digitalização, scanner, ( Trabalhava-mos em um Scanner muito simples, HP ScanJet 3p, e agora trabalhamos em um equipamento mais sofisticado, Scanner HP DeskScan II.)
Quanto as atividades, propriamente ditas, precisamos relatar que realizamos a digitalização e o processamento ( armazenamento em uma pequena base de dados experimental) das imagens das seguintes obras:

·         PESAVENTO, Sandra. O Espetáculo da Rua. Porto Alegre: Ed. Da Universidade / UFRGS; Prefeitura Municipal de Porto Alegre / PMPA, 1992. (Um total de 64 fotografias em diferentes formatos)
·         OLIVEIRA, Clóvis Silveira de. Porto Alegre: a cidade e sua formação. Porto Alegre: Ed. Gráfica Metrópole S. A . , 1993. (Um total de 106 fotografias em vários formatos)
·         COSTA, Alfredo R. da Costa. O Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Ed. Da Livraria do Globo, 1922. (Um total de 1.136 fotografias de diferentes formatos)
 Para podermos dimensionar algumas características destas atividades, destacamos a tabela que segue:


TABULAÇÃO  DE  DADOS  DAS  EXPERIÊNCIAS  PRÁTICAS  EM  DIGITALIZAÇÃO  DE  IMAGENS

Tamanho da Foto /
Definição
Color / PB
Procedimento
Realizado
Tempo Médio de
Duração do Proced.
Espaço Necessário
Para Armazenamento

10 X 15 /  150 Dpi’s

Color
Digitalização +
Armazenamento

1 min. 20 Seg.

114 KB

10 X 15 /  300 Dpi’s

Color
Digitalização +
Armazenamento

2 min. 20 Seg.

326 KB

10 X 15 /  600 Dpi’s

Color
Digitalização +
Armazenamento

6 min.  00 Seg.

1.064 KB

10 X 15 /  1200 Dpi’s

Color
Digitalização +
Armazenamento

15 min. 30 Seg.

3.356 KB






Fonte: Atividades de Digitalização de Imagens realizadas no Banco de Imagens da Cidade de Porto Alegre.

Com base nas informações contidas na tabela, fruto das experiências realizadas, o trabalho de digitalização das imagens destas três obras, referidas acima, envolveu uma necessidade de armazenamento de, aproximadamente, 425.756 KB, para um total de, aproximadamente, 220 horas / processamento.
Segundo um reordenamento da equipe de trabalho do Projeto Individual A: “Antropologia do Cotidiano e Estudo das Sociabilidades a Partir das Feições dos Medos e das Crises na Vida Metropolitana.” (Professora Executora: Dra. Cornelia Eckert), do Projeto Individual B:  “Banco de Imagens da Cidade de Porto Alegre.” (Professora Executora: Dra. Ana Luiza C. da Rocha) e do Projeto Integrado “Estudo Antropológico de Itinerários Urbanos, Memória Coletiva e Formas de Sociabilidade no Meio Urbano Contemporâneo”, a partir do mês de maio do ano corrente, passei a não atuar (Diretamente) mais nas atividades de pesquisa do Projeto Individual B, Banco de Imagens da Cidade de Porto Alegre. A partir de então, permaneci atuando exclusivamente no Projeto Individual A: “Antropologia do Cotidiano e Estudo das Sociabilidades a Partir das Feições dos Medos e das Crises na Vida Metropolitana.” (Professora Executora: Dra. Cornelia Eckert) e Projeto Integrado “Estudo Antropológico de Itinerários Urbanos, Memória Coletiva e Formas de Sociabilidade no Meio Urbano Contemporâneo”.




GLOSÁRIO


Arquivamento -

Arquivamento é a guarda e a conservação metodizada de livros e documentos que relatam e comprovam atos e fatos de uma administração.

Índice -

O índice de um sistema de classificação é uma listagem, em ordem alfabética, dos termos, acompanhados dos símbolos que os representam. São considerados índices: Catálogos; Bibliografias; Índices de livros e artigos de periódicos.

Documentação -

Documentação é “uma técnica de nossos dias. Sua aparição é tão recente que o próprio nome é discutido, já que nem todos o aceitam”. [20]
A palavra começou a ser empregada desde quando o Instituto Internacional de Bibliografia a propôs em lugar de “bibliografia”,  devido ao aparecimento de documentos que não são livros : fotocopiados, microfilmados, microfichados, xerocados, compilados por computador, registrados e arquivados por meios mecânicos, elétricos e eletrônicos de seleção, reprodução e transmissão.
Hoje, após tantos congressos internacionais e devida à necessidade de se organizar e transmitir a imensa quantidade de informações em todos os setores da atividade humana, já é tranquila a função da documentação. Há inclusive centros de documentaçào que não são bibliotecas.
Os centros de documentação prestam relevantes serviços `qa ciência, especialmente ao trabalhador intelectual, de maneira mais completa do que as bibliotecas, mesmo as modernizadas com os sistemas decimais de catalogação. Os centros de documentação espalhados pelo mundo se relacionam entre si e se filiam às sociedades internacionais dedicadas aos assuntos bibliográficos. Por isso, todo o trabalhador intelectual pode recorrer a eles ou às referidas sociedades, quando necessitar de um documento.

Classificar -

Classificar um acervo é dividi-lo em grupos ou classes segundo diferenças ou semelhanças.
Um sistema de classificação, portanto, consiste num conjunto de classes dispostas em ordem sistemática.
O termo “categorias” é empregado para as classes mais gerais dos fenômenos.

Catalogação -

Catalogação é o processo de identificação e referenciação, mediante descrição de documentos considerados como entidades físicas.


Indexação -

A inclusão do registro do documento no índice toma o nome de indexação e abrange tarefas como:
- Identificação do documento
- Determinação do assunto de que trata
- Seleção dos descritores

Pode ser feita
Pôr Palavras - utilizando a linguagem natural dos mesmos
Pôr Conceitos - pressupões a análise do conteúdo temático dos documentos e emprega uma linguagem artificial. Pode ser pré - coordenada ou pós -coordenada.

Revocação -

A habilidade de RECUPERAÇÃO de documentos relevantes de um acervo é chamada de “Capacidade de Revocação”.
A Precisão do sistema é determinada pela relação documentos relevantes / total de documentos recuperados.
As bibliotecas não especializadas costumam indexar somente pêlos assuntos gerais (sumarização).
As bibliotecas especializadas adotam uma indexação exaustiva.

Descritor -

O termo selecionado para representar, sem ambigüidade, o conteúdo temático de um documento é chamado de descritor.
Podem indicar conceitos ou entidades individuais (nomes próprios ou identificadores) e aparecem, na maioria das vezes, como substantivos, de preferencia no masculino, devendo-se evitar as formas verbais.
Os descritores são reunidos em vocabulário controlado, que, no caso de obedecer a uma estrutura semântica, toma o nome de “Thesaurus”.


     Para  Determinar  o  Descritor  (assunto)  Deve-se:

1. Analisar o documento para identificar as idéias nele contidas e o objetivo do autor ao escrevê-lo;
2. Precisar os conceitos que melhor representem o tema, os objetivos e as idéias do documento;
3. Selecionar os conceitos mais adequados à recuperação;
4. Considerar os fenômenos mencionados no documento;
5. Considerar os processos utilizados;
6. Considerar as propriedades inerentes aos objetos;
7. Considerar as operações efetuadas;
8. Considerar o equipamento empregado;

Ordem de Citação -

Na construção de descritores a seqüência em que são enumerados os vários conceitos presentes nos assuntos é denominada “ordem de citação.”
A sua importância deriva do fato de que as características mencionadas em primeiro lugar serão mais facilmente recuperadas no acervo.

Identificação -

Recomenda-se, sempre que possível, que as fotos (e outros tipos de documentos) sejam identificadas pelo autor. Quando essa identificação não possa ser feita, como no caso de fotos antigas, o catalogador providenciará pesquisa em fontes de referencia.

Título -

O Catalogador transcreverá o título como aparece na fonte principal de informação. Caso o material não possua título, deverá ser providenciado um, breve e descritivo.
Uma obra entra pelo título quando o autor é desconhecido ou não pode ser determinado e não emana de uma entidade coletiva.

Elementos de entrada -

 Os nomes de ruas, avenidas e logradouros públicos também poderão entrar diretamente, seguidos de termo identificador.
Ex.: Atlantida ( Avenida )


Registro  (ou  Registo) -


1. Ato ou efeito de registrar
2. Livro especial onde se registram ocorrências públicas ou particulares
3. Indicação em gráfico, escala, ... pôr aparelho apropriado, da marcha de certas máquinas, da graduação  de instrumentos de precisão, etc.
4. Relógio
5. Chave de torneira, ou outro aparelho que regula a passagem dum fluido
6. Caução postal que se obtém pagando taxa extra sobre o perco do porte
7. Certidão de nascimento.

Registrar -


1. Escrever ou lançar em livro especial
2. Consignar pôr escrito
3. Fazer o registro de ...
4. Marcar por meio de registro ou registradora.

Arranjar -

1. Arrumar
2. Avir-se

Arranjo -

1. Ato ou efeito de arranjar
2. Administração e / ou arrumação doméstica


PARA  REGISTRAR  OS  DOCUMENTOS  NOS  BANCOS  DE  DADOS:

1. Estabelecer um protocolo de chegada do material;
2. Usar numeração seqüencial, tanto para as fotos, como para os negativos, no caso de fotos, contatos e seus respectivos negativos formarem um conjunto;
3. Usar carimbo no verso da foto como elemento identificador da instituição e do número seqüencial do documento. No caso de grande quantidade de fotos, preceder a numeração com a indicação do ano. O carimbo, o menor possível, deve ser colocado a um canto da fotografia, devido ao efeito de polimerização da tinta sobre o papel. Deve-se usar tinta a mais clara possível;
4. As fotos sem negativo e os negativos sem fotos não precisam, necessariamente, ser numerados.


PARA  ARRANJAR  OS  DOCUMENTOS  NOS  BANCOS  DE  DADOS

1. Não usar clips nas fotos ou negativos, sobretudo metálicos;
2. Evitar escrever no verso das fotos usando caneta esferográfica. Não escrever nunca sobre a imagem fotográfica;
3. Não grampear as fotos;
4. Não usar fita adesiva sobre as fotos.
Sobre estas dicas de arranjo das fotos, mais detalhes podem ser encontrados no “Manual de Normas Mínimas - normas mínimas recomendadas para registro e arranjo.” ( segue a referencia completa deste na nossa bibliografia).













BIBLIOGRAFIA


- Catálogo do banco de imagens do museu universitário / UFRGS.

- Controle vocabular  -  CPDOC

-Organização de arquivos. Material do curso de especialização da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo.

- VIRUEZ, Guilma Vidal. Tratamento técnico bibliográfico, catalogação, classificação e indexação de fotos.

- OLIVEIRA, Gleidhe de o e. Técnicas de arquivo.

- OLIVEIRA, Elizabeth de Mello Leitão Baptista de. Normas Mínimas recomendadas para registro e arranjo.

- DERISE, Ana. Normas Mínimas recomendadas para catalogação e classificação.

- ROCHA, Ana Luiza Carvalho da. Oralidade, escrita e redes digitais: modos e meios de pensamento em antropologia.

- SALOMON. Délcio Vieira. Como Fazer Uma Monografia. São Paulo : Martins Fontes, 1994

- ECO, Umberto.                 Como Fazer Uma Tese. Sãp Paulo : Ed. Perspectiva, 1988.

- MILLS, C. Wright. A Imaginação Sociológica. Rio de Janeiro : Zahar, 1980.


- CENTRO Nacional de Desenvolvimento do Gerenciamento da Informação (CENADEM). Anais do Latin American Document Imaging Conference & Show -  INFOIMAGEM 94.
- CENTRO Nacional de Desenvolvimento do Gerenciamento da Informação (CENADEM). Anais do Latin American Document Imaging Conference & Show -  INFOIMAGEM 95.
- CENTRO Nacional de Desenvolvimento do Gerenciamento da Informação (CENADEM). Anais do Latin American Document Imaging Conference & Show -  INFOIMAGEM 96.
- CENTRO Nacional de Desenvolvimento do Gerenciamento da Informação (CENADEM). Anais do Latin American Document Imaging Conference & Show -  INFOIMAGEM 97.
- WINSTON,  P. H. Inteligência Artificial
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- ANCONETANI, Patrizia. et all. Arqueologia ; Passeos Virtuales Por Las Civilizaciones Dasaparecidas. España: Ed. Toledo, 1996.









[1] AVEDON, Don M. Discos Ópticos e Imagens Eletrônicas - Conceitos e Tecnologia. São Paulo: Ed. Centro Nacional de Desenvolvimento da Informação (CENADEM), 1991.
[2] Colaboraram para esta pesquisa:
·         A Socióloga Sônia Picinini / Museu Universitário / Pró-Reitoria de Extensão / Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) que havendo realizado o curso sobre Access no Centro de Processamento de Dados (CPD) / Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e que possuindo uma larga experiência com trabalho em Banco de Dados do Museu Universitário, prestou-me prestimosa assessoria neste campo de informação.
·         A Biblioteca da Escola Técnica da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) por ter  cedido, através de empréstimo, as vídeo-aulas (Fitas VHS) sobre o Microsoft Access.
·         A Biblioteca do Instituto de Informática da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) por ter   cedido, através de empréstimo, os manuais do Microsoft Access.
·         Ao Centro de Processamento de Dados (CPD) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) por ter  me cedido a apostila do curso sobre Microsoft Access. 
[3] Atividade de Pesquisa realizada no âmbito do Projeto Individual B:  “Coleções Etnográficas, Itinerários Urbanos e Patrimônio Etnológico: A Criação de um Museu Virtual” (Professora Executora: Dra. Ana Luiza C. da Rocha)
[4] ROCHA, Ana Luiza C. da. (1997, p. 10)
[5] Idem.
[6] Vivemos a “Civilização da Imagem” : Esta é uma afirmativa que, certamente, levaria à varias discussões bastante complexas sobre a sua própria validade. Através da inserção nos projetos e investigações científicas aqui mencionados, podemos acessar alguns aspectos destas discussões que estão sendo ampliados e revistos, na medida em que os nossos estudos avançam. Só para citar alguns títulos (de obras científicas) em que encontramos esta discussão, destacaria os seguintes:

Þ               WOLK, Sue. Panorama Mundial do Processamento Eletrônico de Imagens de Documentos - O Presente e o Futuro. In. INFOIMAGEM - 94 (Latin American Document Imaging Conference & Show), 1994, São Paulo. Anais. S. P. ,1994. p. 01-13
Þ               CATTELAN, Paulo. Curso de Introdução à Digitalização de Documentos. Mimiog. Apostila. Porto Alegre, 1997
Þ               LÉVY, Pierre. As Tecnologias da Inteligência: O Futuro do Pensamento na Era da Informática. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1996.
Þ               -------, ------. O Que é Virtual ?  São Paulo: Ed. 34, 1996.
Þ               LOUREIROS, Marcos Dantas. Terá Marx Algo a Dizer Sobre a Informatização da Sociedade ?  In. XXIV Congresso Nacional de Informática, 1991, São Paulo. Anais. S. P. SUCESU, 1991. p. 03-11.
[7] Ibidem
[8] Ibidem
[9] Ibidem.

[10] O trabalho com imagens videográficas (Sistema VHS) compartilhadas / articuladas / processadas com os recursos informáticos envolve uma tecnologia ainda um pouco recente e restrita  no Brasil. Porém, com a constante disseminação de informações, através de revistas técnicas e, especialmente, através de alguma home pages (voltadas para estas novas mídias) na Internet, que abordam o tema e o crescente declínio dos preços dos Hardwares e Softwares, esta linguagem de informação passa a ser um pouco mais conhecida entre os brasileiros. Veja, por exemplo, o artigo denominado “Mande o Vídeo Para o HD – Como instalar no PC uma placa para capturar imagens de um aparelho de vídeo para o disco rígido” da sessão “Soluções – Faça Você Mesmo” da Revista InfoExame de Maio de 1998, Número 146, páginas 132-134. Esta matéria mostra como, (com apenas uma placa para captura de vídeo, um micro Pentium / multimídia / Windows 95 / 32 MB de RAM, uma fonte de vídeo / filmadora ou videocassete / alguns cabos de conexão e uma chave de fenda) articular duas mídias, até bem pouco tempo, inintercambiáveis. 
[11] Autores “tradicionais” como Umberto Eco (Como se Faz uma Tese); Délcio Viera Salomon (Como Fazer Uma Monografia);  C. Wright Mills ( A Imaginação Sociológica); Pedro Augusto Furasté (Normas Técnicas Para o Trabalho Científico), entre outros, foram de fundamental importância para as nossas pesquisas e orientações realizadas. Entretanto, as publicações “mais alternativas”, como as do Centro Nacional de Desenvolvimento do Gerenciamento da Informação (CENADEM), trouxeram um embasamento teórico e técnico muito importantes para as nossas investigações. Destacaria, dentre estas obras, os Anais do INFOIMAGEM (Latin American Document Imaging Conference & Show) anos 94, 95 e 96; Artigos de Linda Kempster (Armazenamento de Massa: Dados e Imagens - O Presente e o Futuro das Mídias Removíveis); Obras de Don M. Avedon (Discos Ópticos e Imagens Eletrônicas - Conceitos e Tecnologia), entre outros.
[12] É importante destacar a configuração do equipamento utilizado, a fim de que possamos dimensionar o nível técnicológico em que estávamos trabalhando naquele momento.  A configuração permite, também  demonstrarmos  os níveis de duração de tempo e dificuldades encontradas para estas atividades diante das limitações tecnológicas que estavam colocadas naquela oportunidade.
[13] Dpi’s: Dots per inch ou pontos por polegada. Uma imagem com definição de 300 Dpi’s, por exemplo, é formada por 900 pontos / por polegada.
[14] Nenhum software de reconhecimento de óptico caracteres possui a capacidade técnico-informática de reconhecer 100 %  dos caracteres varridos eletronicamente pelo scanner. A potência deste reconhecimento oscila entre 70 %  e 97 %, dependendo da qualidade e potência do software, qualidade do texto original e capacidade técnica de operação da máquina (computador / scanner) e dos programas (OCR, Processadores de Texto, ...) informáticos.
[15] Veja, por exemplo, o artigo de OLIVEIRA, Leonardo e BERALDO, Mariléa de Castro - Impacto da Informática na Organização de Arquivos Técnicos  - Anais do Latin American Document Imaging Conference & Show (INFOIMAGEM) 1995. Realizado em São Paulo. Promovido pelo Centro Nacional de Desenvolvimento do Gerenciamento da Informação (CENADEM). Página 396. E o artigo de ALTAM, Fábio – Work o quê ? – O Workflow é o inimigo número 1 da papelada. Pelo menos em tese. E é também a mania do momento – Publicado na Revista InfoExame, Ano 13, Número 146, Maio de 1998. Páginas 106-107.   
[16] Isto acontece com vários outros hardwares e softwares (chaveamento de algumas funções, através de linguagens de programação de computadores), pois os programadores entendem que se o usuário possui, por exemplo, uma impressora de baixa definição gráfica (menos de 300 Dpi’s) não é coerente permitir que este usuário digitaliza uma imagem com 600 Dpi’s. Entendo que falta um pouco de criatividade e imaginação  à estes programadores, pois não é nem um pouco difícil de se supor que, mesmo tendo uma impressora de baixa definição, o usuário poderia digitalizar uma imagem no seu equipamento  (doméstico) e após buscar a impressão em uma outra impressora de maior definição gráfica (uma Laser Jet, por exemplo).
[17] Uma fotografia colorida (Tamanho 10 X 15) digitalizada com 1200 Dpi’s no formato JPG vai gerar um arquivo de 3.356 KB. Se esta mesma foto for digitalizada em formato TIF gerará um arquivo, no mínimo, três vezes maior. Neste momento começam os problemas de armazenamento, uma vez que os “famosos disketes”, mídia de armazenamento removível ainda mais usada no Brasil,  possuem uma capacidade de armazenamento de apenas 1.44 MB (ou  1.444 KB). Para as novas necessidades de armazenamento o Zip Drive é uma solução interessante. Com R$ 390,00 pode-se adquirir o último modelo deste tipo de mídia removível, Zip Plus, que trabalha com discos com capacidade de armazenamento de 100 MB. Para este debate, o livro de Linda Kempster – Armazenamento de Massa: Dados e Imagens, o Presente e o Futuro das Mídias Removíveis – traz uma importante contribuição. 
[18] Revista do Globo de Número 506. De 15 de abril de 1950. Páginas 10, 70 e 71.
[19] Até então, estava sediado provisoriamente junto ao Laboratório de Antropologia Social (sala 209, Prédio D2, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas  IFCH)
[20] LA VEGA, Lasso de. Manual de Documentácion. In. SALOMON, Délcio Vieira. Como Fazer Uma Monografia.




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TRABALHO  MONOGRÁICO  APRESENTADO  NA

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS
CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ANTROPOLOGIA SOCIAL
Disciplina: Teorias da Cultura









DENOMINADO


-   As Festas  Populares  Religiosas  de  Santa  Isabel  e  de  Nossa Senhora  da  Imaculada  Conceição: uma análise  comparativa  entre  os  dois  maiores  festejos  católicos  da  Cidade  de  Viamão  -   














Autor: Jaques  Jacomini





INDICE




Introdução .............................................................................................. 03


1. Os traços identitários formadores das santidades em debate
1.1 Santa Isabel ................................................................................. 05
1.2 Nossa Senhora da Imaculada Conceição...................................... 07

2. Os festejos populares religiosos pesquisados
      2.1 A Festa de Santa Isabel ............................................................. 09
      2.2 A Festa de Nossa Senhora da Imaculada Conceição ................. 11

3. Dados históricos sobre as comunidades estudadas ............................ 13

4. Análise comparativa entre as duas festas populares religiosas pesquisadas 16


Conclusão .............................................................................................. 19

Bibliografia ............................................................................................ 21

Anexos ................................................................................................... 23





INTRODUÇÃO

A presente monografia representa o esforço de concluir os trabalhos realizados na cadeira Teorias da Cultura, ministrada pelo Professor Ruben Oliven, do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social / Instituto de Filosofia e Ciências Humanas / Universidade Federal do Rio Grande do Sul, através da análise de um tema específico no âmbito do conhecimento das teorias da cultura.
As festas populares de cunho religioso estão presentes em quase todo o território nacional. Cada localidade ou cidade possui traços característicos e uma dinâmica bastante peculiar, segundo a tipologia de significação e de simbolização que os agentes religiosos e comunitários imprimem nos seus eventos. Diante deste contexto mais geral, selecionamos duas festas religiosas que acontecem no município de Viamão para fazer uma análise comparativa entre as suas principais características. No contexto mais teórico, nos embasamos no pressuposto de que “nenhum objeto, nenhuma coisa é ou tem movimento na sociedade humana, exceto pela significação que os homens lhe atribuem” (SAHLINS, 1979). Portanto, tentaremos perceber, com base na pesquisa realizada, os aspectos concernentes a carga de simbolização e de construção social dos significados que envolvem, delimitam ou delineiam estas duas festas populares.
A cidade de Viamão é uma das maiores, em termos de população (220.000 habitantes) e extensão territorial (1.487 Km2), da região metropolitana de Porto Alegre (Ver anexo 1). Neste município existe uma divisão distrital que aponta para a formação de dois grandes centros urbanos: região central, sede administrativa e política do município, e região da Grande Santa Isabel, centro comercial ligado mais diretamente a Porto Alegre. Percebendo que existe duas festas religiosas populares ligadas a cada um destes dois pólos físico-geográficos, proponho realizar uma análise etnográfica e historiográfica de alguns aspectos sociais ligados a religiosidade destas duas localidades, através dos eventos anuais mais significativos para estas comunidades: a festa de suas padroeiras.
 A região da grande Santa Isabel tem a sua devoção pela santa que a denomina,  Santa Isabel (Ver anexo 2) e a região central de Viamão tem a sua devoção voltada para Nossa Senhora da  Imaculada Conceição (Ver anexo 3). Orientado por uma perspectiva relacional e dialética, iniciarei o trabalho com a descrição das principais características e especificidades das santas e das festas em debate, investigando  os principais aspectos das festividades realizadas em torno da adoração de ambas as santas. Em um segundo momento, trabalho com alguns dados históricos que colaboram no entendimento da atual dinâmica social observada nas comunidades observadas. Na parte final do trabalho, me proponho a realizar uma análise comparativa entre as duas festas, resgatando e apontando as suas principais semelhanças e diferenças, relacionando-as com a dinâmica social e história destas duas localidades. Nos anexos apresento iconografias referentes as construções textuais deste trabalho que enriquecem e reapresentam alguns dados já expostos no corpo da monografia.
Quanto a metodologia empregada, é importante destacar que abordo o meu objeto de estudo através  do método etnográfico,  (pesquisa qualitativa), incorporando as técnicas de observação direta e participante, complementadas com a realização de entrevistas e com a produção de imagens fotográficas e  iconográficas. Destaco que entendo a observação participante como uma importante técnica de pesquisa, pois trata-se de “um processo pelo qual mantém-se a presença do observador numa situação social com a finalidade de realizar uma investigação científica. O Observador está em relação face-a-face com os observados e, ao participar da vida deles no seu cenário natural, colhe dados. Assim, o observador é parte do contexto sob observação, ao mesmo tempo modificando e sendo modificado por este contexto.”[1]













1. OS  TRAÇOS  IDENTITÁRIOS  FORMADORES  DAS  SANTIDADES  EM  DEBATE

1.1 SANTA  ISABEL

“Ó Deus,
destes para nós o exemplo de vida de Santa Isabel
que reconheceu e venerou Cristo nos pobres e doentes.
Daí a todos nós, por sua inercessão,
Seguir o exemplo de vida, no serviço aos pobres e aflitos,
Amando-os como Cristo os amou.
Amém.
Ave Maria ...
Santa Isabel, rogai por nós !”

Oração à Santa Isabel

Delinear os traços formadores e fundadores das santidades em debate, foi um anseio deste pesquisador na construção do presente trabalho, diante da carga simbólica e imaginativa que estão empregnados. Atividade que não foi muito fácil devido as fontes disponíveis para pesquisa. Lançamos mão de alguns panfletos, livros e outros impressos cedidos pelas paróquias e colhemos relatos dos padres que são responsáveis pelas igrejas pesquisadas, a fim de ter algumas informações básicas sobre as santas Isabel e Imaculada Conceição.
Segundo as informações colhidas nas entrevistas com o Padre Carlos e Padre Leoclides, párocos da Igreja Matriz de Santa Isabel, esta santa nasceu na Hungria em 1207, ainda muito jovem casou-se com o Duque Luís IV, tornando-se rainha da Hungria. Isabel era de caráter vibrante e muito dedicada à oração, possuindo grande amor para com os pobres e doentes e trabalhava contra toda injustiça feita ao seu povo. O seu marido a apoiava neste intuito de auxiliar os mais necessitados, porém com a morte de seu marido em uma batalha campal, ela foi obrigada, pela sogra e cunhadas, a deixar a corte, com vinte anos e mãe de três filhos. A sua expulsão aconteceu justamente pela sua opção de auxiliar e apoiar com afinco e retidão os mais pobres e necessitados, contrariando assim a sua orientação social de nobre que a cobrava um outro tipo de postura diante dos pobres. Desde então, abandonou a sua condição social anterior e passou a dedicar-se exclusivamente aos pobres. Ingressou na Ordem Terceira Franciscana, dedicando-se com afinco no auxílio a pessoas doentes. O desfecho desta história acontece com a sua morte que aconteceu em 17 de novembro de 1231, quando possuía apenas 24 anos e encontrava-se em uma situação de extrema pobreza e sofrendo de uma doença não nominada, mas mencionada como irreversível para os níveis tecnológicos da medicina praticada na época.
Como podemos perceber pelos relatos dos religiosos entrevistados, é muito presente no seu imaginário a opção da santa pelos pobres e doentes, o sofrimento que passou na defesa destes, a sua expulsão do castelo em que morava devido a esta opção, após a morte do seu marido, fatos que delineiam a conduta moral e social da Santa Isabel.
 A opção pelos pobres e pela justiça social colhida da história de Isabel orienta toda a filosofia de trabalho e organização da paróquia da Santa Isabel até hoje. Os religiosos declaram que, na oportunidade da fundação da paróquia, a comunidade que procurava uma santa para ser a sua padroeira fez a sua opção pela Santa Isabel justamente pelo fato de que estas características da sua trajetória de vida eram significativas para esta comunidade formada por pessoas muito humildes, pobres e sofredoras devido a uma série de carências econômicas e sociais. Perguntados sobre os detalhes desta escolha, os religiosos comentam que a opção pode ter sido realmente definida muito mais por influência da vivência dos párocos da época que eram europeus e traziam na bagagem um pouco da história da Isabel da Hungria do que pela ansiedade popular de possuir uma padroeira com quem se identificassem, uma vez que os primeiros moradores da região não tinham contato com este tipo de informação.   
Na sua imagem esculpida em gesso presente na Igreja Matriz da Santa Isabel merece destaque alguns ornamentos, cores e formas. As cores predominantes na sua vestimenta são o vermelho, o azul e o verde e o dourado da sua coroa. Em uma mão ela carrega um cesto com rosas e na outra, uma espécie de bastão. Segundo o Padre Carlos, em determinada situação, Santa Isabel, ainda rainha da Hungria, havia pegado um cesto de pães para distribuir entre os pobres em uma atitude que contrariava a sua família devido a situação social que ocupava. Ao distribuir os pães, as suas cunhadas e sua sogra surprenderam-na, tentando impedila de tal ato. Isabel, tentando simular a sua investida, evitando assim o conflito com sua família haveria realizado o seu primeiro milagre, através da transformação dos pães em rosas.





1.2 NOSSA  SENHORA  DA  IMACULADA  CONCEIÇÃO[2]

“Se o Brasil nasceu à sombra da Cruz, organizou-se, cresceu, prosperou amparado sempre pela mãe santíssima, venerada ternamente e invocada sob numerosos títulos, cada qual mais belo e expressivo ... Entre os títulos marianos prevalece o da Imaculada, que exorna, com muitos secundários, mais de 350 dos templos principais. E era natural. Desde os primórdios floresceu em Terras de Santa Cruz a devoção à Imaculada Conceição de Maria, implantada pelos descobridores.”

Papa Pio XII numa alocução de 1954

A tradição que envolve a cultuação à Imaculada Conceição de Maria Santíssima está intimamente relacionada a cultura portuguesa e aos colonizadores portugueses que aportaram no Brasil na época do descobrimento. Em 1646 o Rei D. João IV consagrou Portugal e todos os seus domínios (inclusive o Brasil) a Nossa Senhora da Conceição. Alguns teólogos afirmam que o culto à Imaculada Conceição faz parte das mais antigas e veneráveis tradições brasileiras e que desde o seu nascimento, o Brasil vive sob o manto e o patrocínio de Maria Imaculada.
Nos primeiros séculos da história da igreja, o privilégio da Imaculada Conceição era tranqüilamente e sem contestações professado de modo implícito, no paralelo, com muita freqüência estabelecido pelos padres da igreja, entre Eva e Maria.
Assim como a antiga Eva saíra pura e imaculada das mãos divinas, assim também a nova Eva, Maria, deveria ter saído das mãos do criador, pura e imaculada. Isto é tanto mais razoável quanto a primeira Eva haveria de legar a morte a toda a sua descendência, enquanto a Segunda Eva daria a todos os seus filhos o oposto, ou seja, a vida. Seria contraditório que tivesse incorrido na culpa de Eva precisamente aquela que foi ordenada por Deus para a reparação de tal culpa.
Também era freqüente, nos padres da igreja, tanto do Oriente quanto do Ocidente, a proclamação da absoluta pureza e santidade de Nossa Senhora e nessa proclamação estava, sem dúvida, implícita a verdade da Imaculada Conceição, pois a mancha do pecado original não poderia compaginar-se com tão ilibada pureza e tão exímia santidade.   
Nossa Senhora da Conceição é conhecida também como Patrona do Exército Brasileiro. A “Canção do Soldado”, hino do exército, era um antigo cântico em louvor da Imaculada. Segundo narração do General Dionísio Cerqueira, em suas memória sobre a Guerra do Paraguai, que na véspera da Batalha de Tuiuti (23 de maio de 1866) “ao toque de recolher, às oito da noite, todos os corpos formaram. Depois da chamada, os sargentos puxaram as companhias para a frente da bandeira e rezou-se o terço. Alguns praças, os melhores cantores, entoaram em voz vibrante, sonora e cheia de sentimento, a velha canção do soldado brasileiro: Ó Virgem da Conceição, Maria Imaculada, vós sois a advogada dos pecadores, e a todos encheis de graça com a vossa feliz grandeza. Vós sois dos céus, princesa, e do Espírito Santo,  Esposa. Maria mãe de graça, mãe de misericórdia, livrai-nos do inimigo e protegei-nos à hora da morte, Amém.”[3] Durante a Guerra do Paraguai, todas as noites o exército brasileiro se perfilava e, em conjunto, rezava o terço, sendo acompanhado pelas bandas de música.
Nossa Senhora da Conceição é também padroeira do Seminário Maior de Viamão e nomina a sua instituição de ensino: Faculdade de Filosofia Nossa Senhora da Imaculada Conceição (FAFIMC). Esta é a única instituição de ensino superior do município, situa-se na margem da RS-040 (parada 48) e traz na parte superior do prédio uma grande imagem da santa na cor branca, juntamente a um grande relógio. Durante a noite, para quem transita pela RS, a imagem da santa é bastante visível e chama bastante a atenção das pessoas que por ali passam devido a sua beleza, imponência e a um bom sistema de iluminação que facilita a visualização mesmo a quilômetros de distância da imagem. 
Na sua imagem esculpida  presente na Igreja Matriz de Viamão merece destaque alguns ornamentos, cores e formas. As cores predominantes na sua vestimenta são o vermelho, o azul  e o dourado da sua coroa. Tem as mãos postas e está coberta por um vasto manto bastante colorido.







2. OS  FESTEJOS  POPULARES  RELIGIOSOS  PESQUISADOS

2.1 A  FESTA  DE  SANTA  ISABEL

As principais atividades da festa da padroeira da Santa Isabel são realizadas  na semana que circunda a data da morte da Santa, 17 de novembro, porém os festejos mais gerais acontecem durante todo o mês de novembro. Isto acontece em função de que os festejos são divididos em duas programações, uma programação chamada de “Social” e outra denominada de “Religiosa”. O centro dos eventos é a própria paróquia e a organização fica a cargo de uma comissão de organização chamada de “festeiros” composta por 30 pessoas na oportunidade em que acompanhamos. Nos meses que antecedem o evento, os festeiros fazem diversas reuniões na igreja antecipando todos os procedimentos necessários para a realização da festa da padroeira. Estas reuniões e a organização como um todo são realizadas em parceria com as Comunidades Eclesiais de Base (CEBES) e as capelas  localizadas nas vilas próximas ao núcleo central da Vila Santa Isabel ligadas à igreja matriz.
A programação religiosa tem por objetivo reunir os devotos da santa mais ligados as atividades regulares da paróquia em torno das missas especiais, grupos de orações, procissões, entre outras celebrações religiosas. Na oportunidade em que acompanhamos as atividades da festa, observamos que esta programação religiosa iniciou no dia quinze de novembro com uma missa onde estiveram presentes todas as comunidades religiosas ligadas à Igreja Matriz de Santa Isabel e o tema era em “Louvor e Partilha das Santas Missões”. O encerramento das atividades do programa religioso aconteceu no dia vinte e um de novembro, denominado como o “Domingo da Padroeira”, com missa temática, “Sede Santos como vosso Pai é Santo”, procissão e uma missa solene após a procissão com o tema “A Exemplo de Santa Isabel caminhamos à Santidade”. Talvez um dos momentos mais esperados desta programação tenha sido a procissão luminosa que aconteceu no dia dezenove de novembro com saída da Igreja Matriz em direção à Comunidade Scalabrini, uma das dez comunidades religiosas ligadas à matriz que localiza-se na Vila Luciana, proximidades da Vila Santa Isabel. Nesta oportunidade a fé e a adoração da santa sai do universo paroquiano e ganha a publicidade popular pelas principais ruas da vila, com uma grande adesão dos moradores que não estão ligados diretamente a igreja, fiéis e seguidores mais freqüentes. 
A programação social tem por objetivo reunir a comunidade de um modo geral, tentando propiciar a possibilidade de participação daqueles agentes sociais que não estão ligados mais diretamente as atividades de cunho estritamente religioso. É  a oportunidade para que as personalidades públicas como o prefeito da cidade e demais autoridades públicas, empresários, etc. participem dos festejos populares religiosos emprestando o seu prestígio social para o evento e, ao mesmo tempo, aproveitando um espaço público de grande adesão da comunidade local para divulgar as suas idéias, externar as suas posições através de um pronunciamento oficial ou mesmo atuando nos bastidores da festa. Na oportunidade em que acompanhamos as atividades da festa, observamos que esta programação social iniciou no dia seis de novembro com um jantar dançante com música ao vivo, onde foi servido churrasco, galeto, feijão mexido, abóbora caramelada e buffet de saladas, além de outros pratos quentes. O encerramento das atividades do programa social aconteceu no dia vinte e oito de novembro, com a realização de um chá de confraternização onde foi realizado um concurso de escolha da Rainha Infantil da Festa.
Um dos momentos mais esperados desta programação para uma grande parte de comunidade carente da região talvez seja  o “Almoço da Solidariedade”. No dia quatorze de novembro aconteceu um almoço especial oferecido para pessoas pobres e carentes da comunidade da Santa Isabel. Esta é uma atividade impregnada de significado religioso defendida pelos padres e responsáveis pela paróquia que afirmam: sendo a Santa Isabel protetora e zeladora dos pobres e doentes, este momento dos festejos é voltado especialmente para aquelas pessoas que não possuem recursos para participar dos outros momentos da festa onde são cobrados ingressos, convites, etc. Para ter acesso a este almoço, as pessoas interessadas procuram com antecedência a secretaria da igreja, declarando a sua situação de carência, para serem cadastradas, recebendo uma ficha que deve ser apresentada no dia do almoço. Paralelo ao “Almoço da Solidariedade”, acontece o “Almoço Festivo da Padroeira” no “Domingo da Padroeira”, domingo mais próximo no calendário ao dia da santa, 17 de novembro. Este é o ponto alto da programação social e aconteceu no dia vinte e um de novembro na oportunidade em que acompanhávamos as festividades do ano de 1999. O cardápio básico é composto por galeto e buffet de saladas e pratos quentes. Além do almoço festivo, oportunidade em que o salão paroquial ficou inteiramente tomado pela comunidade com a presença de, aproximadamente, 500 pessoas, nesta mesma oportunidade aconteceram brincadeiras do tipo “Pescaria”, realização de rifas promocionais e sorteio de brindes. No almoço estiveram presentes autoridades do município como o prefeito municipal, vereadores e empresários. Após ao almoço aconteceu uma “domingueira”, baile ao estilo gaúcho com presença de músicos tradicionalistas que animaram a festa até o início da noite de Domingo.


2.2 A  FESTA  DE  NOSSA  SENHORA  DA  IMACULADA  CONCEIÇÃO

“... havia um povo que, no final do ano, lá pelo mês de dezembro, reunia-se para louvar e agradecer o amor de Deus pai manifestado em Nossa Senhora, que em sua Imaculada Conceição trouxe salvação ao mundo. Juntos eles revezavam, refletiam e celebravam ! Com alegria e fé, foram passando essa tradição adiante ...
Agora no ano de 1999, você e sua família estão convidados para participar da novena e da festa de Nossa Senhora da Conceição. Será um momento de encontros, reencontros e, sobretudo, de muita fé. Venha ! Sua presença é muito importante para continuarmos esta história ! ”

 Texto divulgado no panfleto chamando a comunidade para a festa da Nossa Senhora da Imaculada Conceição


As principais atividades da festa da padroeira de Viamão são realizadas  no mês de dezembro. Os festejos possuem uma programação geral com atividades religiosas e sociais. O centro dos eventos é a própria paróquia e a organização fica a cargo de uma comissão de organização chamada de “festeiros” composta por 27 pessoas na oportunidade em que acompanhamos. Nos meses que antecedem o evento, os festeiros fazem diversas reuniões na igreja antecipando todos os procedimentos necessários para a realização da festa da padroeira. Estas reuniões e a organização como um todo são realizadas em parceria com as capelas localizadas nas vilas próximas ao núcleo central da  igreja matriz de Viamão.
A programação observada iniciou no dia 29 de novembro e se estendeu até o dia 8 de dezembro. No período de 29 de novembro a 07 de dezembro foi realizada uma Novena em louvor à Nossa Senhora da Conceição. Cada dia da novena foi dedicado a um tema específico do tipo: “Maria, Mãe fiel e corajosa”, “Maria Mãe dos caminhantes”, “Maria, rainha das famílias”, ... O tema central da festa do ano de 1999 foi: “Com Maria rumo ao Novo Milênio”. Entre os dias 1º  e 3 de dezembro aconteceram  apresentações artístico-culturais na frente da igreja, atividade que envolveu um grande número de viamonenses, especialmente no dia 03 de dezembro, oportunidade na qual a Orquestra Sinfônica de Porto Alegre (OSPA) se apresentou pela primeira vez na cidade de Viamão. Para a realização desta atividade houve uma espécie de parceria entre a paróquia e a Prefeitura Municipal de Viamão, através da Secretaria Municipal de Cultura. No dia 5 de dezembro ocorreu o almoço festivo à Nossa Senhora da Conceição no salão paroquial da matriz, reunindo cerca de 300 pessoas. Entre elas, estiveram presentes representantes dos poderes público executivo e legislativos, entre outras autoridades. O prefeito municipal, o presidente da Câmara de Vereadores e demais integrantes dos poderes executivo e legislativo prestigiaram o evento. O cardápio principal do almoço era composto de churrasco e buffet de saladas. Um comunicador, através de um sistema de som com alto-falantes distribuídos no entorno da igreja, fazia o trabalho de emissão de recados e animador da festa.  Após ao almoço foi realizada uma missa e uma procissão. No encerramento das festividades, dia 8 de dezembro, houve novamente um almoço comemorativo, uma missa e uma procissão luminosa pelo centro da cidade de Viamão.
A programação pesquisada e observada que tem por objetivo reunir a comunidade de um modo geral, tentando trazer um bom número de viamonenses a participar das festividades da padroeira merece um destaque. Pelo fato de que as grandes vilas populares de Viamão e, portanto, a maior densidade da massa populacional encontram-se nas margens da RS 040, especialmente no trecho entre as paradas 32 e 42, a adesão destes viamonenses nas festividades da padroeira realizada no centro da cidade não acontece de uma forma expressiva. Agrega-se a estes aspectos geográficos e populacionais uma “Cultura” de deslocamento do tipo pendular desta população citada em direção ao centro de Porto Alegre e não ao centro de Viamão.
Segundo relatos dos religiosos entrevistados, a Festa do Divino Espírito Santo que acontece anualmente no centro de Viamão talvez tenha uma expressão e uma adesão popular maior que as festividades realizadas em torno da padroeira da cidade. Esta festa possui características semelhantes a festa da padroeira, especialmente devido a sua origem cultural de cunho luso-brasileira.







3. ALGUNS  DADOS  HISTÓRICOS  SOBRE  AS  COMUNIDADES  EM  DEBATE

Nesta parte do trabalho, trazemos alguns dados históricos que remontam ao início do povoamento das comunidades que estamos investigando. Cabe destacar as diferenças entre os períodos histórico de fundação da Paróquia do Centro de Viamão em contraste com o período histórico que define a fundação da Paróquia da Santa Isabel.
 Segundo alguns historiadores como Clóvis Silveira de Oliveira, o surgimento da “Freguesia de Viamão” está ligada às viagens que João de Magalhães faz por volta de 1714 por orientação do então Governador do Rio de Janeiro D. Francisco de Távora que pretendia “fazer vistorias nos lados do sul”[4].  O povoamento do extremo sul do Brasil acontece, segundo o historiador Walter Spalding, com a chegada de Dona Ana da Guerra, irmã do Capitão-mor Francisco de Brito Peixoto, fundador de Laguna e um dos grandes tropeiros da época, mais seu genro, João de Magalhães, que estabeleceram-se nos “Campos de Viamão” [5]. Ali, em terras de Dona Ana, foi erguida uma capelinha em louvor de Nossa Senhora da Conceição e Santana e, ao seu redor, logo se formaria uma pequena localidade que ficou conhecida por Lombas de Santana[6]. Neste momento se materializa, através da capela, o primeiro ato efetivo de adoração à Nossa Senhora da Imaculada Conceição.
Em meados  de 1740, fato semelhante provocaria o surgimento de um outro povoado. Francisco Carvalho da Cunha doaria uma légua de terra para a construção de uma outra capela, a de Nossa Senhora da Conceição do Viamão, que logo se transformaria em uma igreja. Esta segunda capela chegou a categoria de igreja e permanece no local onde ainda hoje encontramos a Igreja Matriz de Viamão.  Em volta desta igreja fundou-se um grande  povoado, povoado de Viamão, que já em 1747 era elevado à categoria de freguesia.
Já relacionando a ocupação do centro de Viamão com a sua periferia, é interessante destacar um outro dado que remonta à dinâmica social e espacial desta época e que sugere um tipo de interpretação que aqui empenhamos. Na sua relação com o mundo exterior, o povoado de Viamão estava distante do mar (cerca de 120 Km) e sem possibilidade de erguer qualquer tipo de porto na sua costa,  só possuía comunicação com o restante do Brasil por terra. Porém, em determinado momento, descobriram, a mais ou menos 60 Km de distância da sede do povoado, uma grande lagoa denominada de “Guaybe” pelos indígenas. Este fato levou os habitantes de Viamão a criarem um porto naquele local, o Porto de Viamão. Este mesmo porto passaria a ser denominado Porto do D’Ornelas ou Porto do Dorneles, quando da radicação de Jerônimo de Ornelas (mais seus agregados e parentes) naquele mesmo local e de Porto do Dionísio, quando utilizado como escoadouro da estância de Dionísio Rodrigues Mendes (Fundador da Capela de Nossa Senhora de Belém, hoje Belém Velho). A chegada dos casais açorianos, em 1752, marca o início da   colonização do então Porto de Viamão (nome dado a um ancoradouro nos fundos da Sesmaria de Jerônimo de Ornellas, onde está agora a Praça da Alfândega). Instalados em casas de palha no local onde encontramos hoje a atual Praça da Alfândega, os casais vindos das Ilhas dos Açores inauguravam o que viria a ser “um arraial bastante fértil”. [7]
A primeira ocupação do trecho inicial no eixo “Porto de Viamão” – “Freguesia de Viamão” (Rio Guaiba até a atual divisa dos Municípios de Viamão e Porto Alegre) acontece no momento em que Jerônimo de Ornelas se estabelece no Porto de Viamão e escolhe o Morro Santana para construir a sede da sua sesmaria (Segundo Oliveira nas imediações da atual Escola de Agronomia da UFRGS). Nas medidas atuais, essa sesmaria teria uma área de aproximadamente 14.000 hectares, abrangendo assim a atual área da Santa Isabel [8]. Contudo, uma ocupação mais efetiva observada na área da Santa Isabel remonta aos anos 50 e 60 do século XIX  foi uma das primeiras a sofrer a ocupação urbana característica da segunda metade deste século no município. Segundo a nossa pesquisa, percebemos que até ao final da década de 40, toda esta área, situada a Leste do Morro Santana, num extenso vale, era rural, compreendida por várias chácaras e tambos de leite. O primeiro loteamento a surgir foi denominado “Lomba do Sabão”, inscrito  no Cartório de Registro de Imóveis do Município em 07 de janeiro de 1944. A ocupação efetiva dos altos da atual Avenida Liberdade (Via do Trabalhador), no entanto, só ocorreu a partir de 1953, com o loteamento “Nossa Senhora Medianeira” .
O referido loteamento surgiu no lugar onde se situava a chácara do agrimensor  Francisco Hormes, que adquiriu a propriedade de Breno Alves (morador de Porto Alegre). Hormes veio de Taquara e como devoto de Nossa Sra. Medianeira, ao fazer o loteamento, reservou um pedaço de área verde para a construção de um santuário, a primeira capelinha católica da região, localizada na rua Dr. Nilo. Desta forma, inicia-se a ocupação urbana do território, surgindo também os equipamentos de infra-estrutura. Ao lado da área reservada à Capela foi instalado uma bomba d’água com poço artesiano para o abastecimento, identificada pela população como “Bica”, cujo vertedouro ainda existe bem como a referida bomba d’água. Com o passar dos anos, o local foi abandonado e ocupado por moradias irregulares. Somente na década de 80 é que membros da comunidade católica reiniciaram o processo de utilização da Capela, que já foi ocupada por uma escola que incendiou e mais tarde foi instalado no local um posto policial. Atualmente a área é utilizada por um Clube de Mães.
A Igreja da Santa Isabel[9] teve sua primeira sede onde hoje localiza-se a Escola Estadual Walt Disney e o centro Espirita Caminho da Luz, confluência das ruas Medianeira e Lisboa (Ver mapa anexo). Sobre as razões que ocasionaram a mudança do local da igreja, existem duas afirmativas recorrentes nas falas dos nossos informantes. A primeira indica que os padres perceberam que havia um maior fluxo de pessoas nas imediações da atual Avenida Liberdade,  resolvendo, portanto transferi-la para onde ela está atualmente. A Segunda depõe sobre  uma calamidade acontecida em torno de um grande vendaval que destruiu a igreja localizada na confluência das Ruas Lisboa e Medianeira e esta seria uma das razões do deslocamento do centro religioso para um outro local, em função de existir uma avaliação que a atual localização não era mais viável para o centro religioso. Existe um questionamento popular sobre a posse do primeiro sino da Igreja da Santa Isabel que, após ao vendaval, haveria sido transportado, juntamente com o resto dos materiais de construção da igreja para a comunidade Santo Agostinho na Vila Augusta. O sino que era da Santa Isabel, ainda está, segundo depoimento de moradores entrevistados, na igreja da Vila Augusta.           





4. ANÁLISE  COMPARATIVA  ENTRE  AS  FESTAS  POPULARES  RELIGIOSAS   PESQUISADAS

A comparação analítica que realizamos entre a festa da padroeira de Viamão com a festa da padroeira da Santa Isabel  nos permite traçar alguns eixos distintivos entre estes dois eventos populares viamonenses.
A festa da padroeira de Viamão, Nossa Senhora da Imaculada Conceição, possui um caráter mais oficial a nível da municipalidade local, quando comparada a festa da padroeira da Santa Isabel, uma vez que trata-se da festa da padroeira ca Cidade de Viamão, independente da maior ou menor adesão de seus munícipes. Esta oficialidade é observada claramente, por exemplo, diante da parceria entre a paróquia da matriz de Viamão e o poder público municipal que entra como patrocinador direto e co-organizador dos eventos festeiros da matriz como ocorreu em 1999, onde houve todo um engajamento da prefeitura, através da sua Secretaria Municipal de Cultura, no sentido de viabilizar as apresentações artísticos-musicais durante os festejos, especialmente a apresentação da Orquestra Sinfônica de Porto Alegre. Neste sentido, a festa de Santa Isabel tem um caráter mais comunitário e popular e menos oficial, no que concerne na sua relação com a administração pública local. Os agentes sociais que atuam na sua organização são mais informais, oriundos das camadas mais populares das redondezas da paróquia, emprestam uma originalidade de festa popular de cunho religioso típico de cidades mais interioranas. Ao passo que a festa da Imaculada conceição não contando com uma adesão popular das mesmas proporções da Santa Isabel, possui um caráter mais formal e institucional, pois conta com o apoio profissional de técnicos da administração pública local que colabora na sua organização. Portanto, temos a festa da Imaculada Conceição com uma adesão popular muito menor do que a festa da Santa Isabel. Segundo a nossa perspectiva de análise social e diante da realidade observada em campo, isto acontece devido ao contexto social em que encontram-se estas duas paróquias. A paróquia de Santa Isabel encontra-se em meio a cerca de 15 vilas populares onde a  população conta com uma renda média que não ultrapassa dois salários mínimos, nível de escolaridade que circunda as iniciais séries do 1º grau, enfim trata-se de uma comunidade carente em todos os sentidos. A paróquia da Matriz de Viamão encontra-se em uma área nobre da cidade, um dos centros históricos de maior expressão da região metropolitana, com uma população de alto poder aquisitivo, atendida na maior parte de suas necessidades de estrutura físico-social como saneamento, rede de água e eletricidade, sistema bancário e de serviços públicos, etc.
Analisando o material de divulgação das festa religiosas em debate (Ver anexo 6), observamos alguns detalhes que devem ser aqui lembrados. O material de divulgação da festa da padroeira de Santa Isabel é bem mais simples, não contendo lista de empresários colaboradores, se comparado ao material de divulgação da festa da Imaculada Conceição que traz uma lista extensa de apoios de empresários locais. Esta observação reforça a tese anteriormente exposta, no que diz respeito ao nível de popularidade dos dois eventos. O material da Santa Isabel representa ter um custo financeiro menor do que o produzido pela matriz de Viamão que possui um colorido mais rico e expressivo do que o anterior. Neste materiais é interessante destacar também que no chamamento da festa de Nossa Senhora da Imaculada Conceição a imagem central é a do templo religioso e não a da santa. Isto não acontece no material de chamamento para a festa de Santa Isabel que traz uma imagem com baixa qualidade gráfica de um busto da santa e não a do seu templo. A constatação direta para esta opção se dá pelo fato de que o templo da Conceição é um prédio histórico construído no século passado, tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico Nacional, sendo por isso muito procurado e contemplado por pessoas que diariamente o visitam com objetivo de simples contemplação ou mesmo para fins de pesquisa e análise científica.   
Para concluir esta comparação analítica, não poderíamos de dar destaque para as origens culturais e étnicas fundadoras das duas igrejas que tem reflexo direto nas festividades por elas organizadas. Fica bem claro para nós a origem luso-brasileira na fundação da Igreja da Nossa Senhora da Imaculada Conceição, ligada aos traços dos primeiro colonizadores que aqui chegaram nos séculos passados. Já em 1549, quando D. João III, Rei de Portugal, determinou enviar ao Brasil o Governador-Geral Tomé de Sousa, e com este vieram o Padre Manuel da Nóbrega e os primeiros jesuítas, temos a nominação desta santa em um dos três navios de Tomé de Souza: o Salvador, Nossa Senhora da Ajuda e Nossa Senhora da Conceição. Foram essas as invocações das três primeiras igrejas edificadas na cidade do Salvador, onde Tomé de Souza fixou a sede do seu governo: São Salvador (que deu nome à capital); Nossa Senhora da Ajuda e Nossa Senhora da Conceição da Praia que ficava então nos arredores e hoje fica dentro da cidade. No caso das origens fundadoras da Igreja de Santa Isabel, percebemos que a influência que incide sobre a sua fundação remete para um outro período histórico bem mais recente, décadas de 40 e 50 do século XIX e que a descendência cultural e étnica também possuem uma outra matriz. Foram imigrantes europeus[10] oriundos da Itália, Alemanha e Suécia os primeiros fomentadores do projeto de se ter a comunidade religiosa reunida em torno de um templo católico. Diante da necessidade de se eleger a padroeira da localidade, sederam a alternativa trazida pelo pároco da época que era de origem sueca e propôs que se elegesse a Santa Isabel da Hungria[11], em função das suas características populares e assistenciais. Estes imigrantes viviam em uma realidade social bastante difícil, diante da necessidade de fundar de fato toda uma estrutura e um aparato de cidade que não possuíam, frente a uma série de carências econômicas optaram pela sugestão do pároco Guilherme Span, primeiro padre desta paróquia.
  




















CONCLUSÃO

Os sistemas simbólicos (alimentares, de vestuário, publicitários, religiosos, etc.) possuem processos dinâmicos de significação que lhe atribuem sentido, segundo o contexto social e cultural[12] em que estão inseridos. Esta é um eixo conclusivo deste trabalho que realizamos, segundo a orientação das teorias da cultura. Ou seja, as festas populares religiosas pesquisadas estão inseridas em um sistema simbólico de cunho religioso com processos próprios de significação construídos conforme o contexto social em que estão inseridas. A exemplo do que nos ensina Sahlins existe uma razão cultural em nossos hábitos alimentares, de vestimenta e de cunho religioso que define a nossa relação com os elementos inseridos dentro destes sistemas de significado. Alexandre Bergamo destaca um   pressuposto muito próximo deste que citei de Sahlins quando afirma: “O Sentido da moda está em que a roupa significa algo, e esse significado, além de diferir em função do grupo pesquisado e de sua posição no interior da estrutura social, imprime e direciona diferentes condutas para esses diversos grupos sociais.” (BERGAMO, 1998)
Ao propor o relacionamento  duas festas populares religiosas das padroeiras de Santa Isabel e de Viamão, não havíamos travado contato com o trabalho de Geertz – Os Usos da diversidade – mas até parece que já havíamos, pois na afirmativa “Imaginar diferenças continua sendo uma ciência da qual todos nós temos necessidade” (GEERTZ, 1999) está contida toda a nossa intenção e a nossa necessidade de refletir sobre as prováveis diferenças entre os dois contextos sociais aqui expostos. Para além das criações grotescas e desconexas com as realidades sociais devidas, esta necessidade de que fala Geertz está intimamente ligada a um pressuposto bachalardiano. Esta percepção do poder da imaginação é um tema essencialmente bachelardiano e, segundo o meu ponto de vista, deve ser assim encarado. Bachelard vai propor a fenomenologia da imaginação, conjugada com uma fenomenologia da imagem poética, destacando “a imagem vem antes do pensamento” (No sentido de uma arqueologia das imagens). Tomando a casa como exemplo, Bachelard mostra como a imaginação é capaz de sobrepujar as percepções do real: “Ao seu valor de proteção, que pode ser positivo, ligam-se também valores imaginados, e que logo se tornam dominantes.” (Bachelard, 1988)
A nossa hipótese inicial de trabalho, no que concerne as diferenças sociais entre as duas comunidades estudadas, se confirmam no encerramento desta monografia. Através da análise dos festejos populares em destaque, percebemos que as diferenças na ocupação do território, bem como a distinta formação étnica e social das áreas avaliadas se refletem hoje na organização das comunidades religiosas e nas dinâmicas populares e sociais de um modo geral presentes nestas localidades. Percebemos, portanto que “o significado é socialmente construído”  (GEERTZ, 1999), segundo a  realidade e o contexto social em que estão inseridos. Os esquemas de significação social referentes a Santa Isabel diferem dos esquemas de significação social do restante de Viamão devido aos diferentes contextos histórico-sociais que estas comunidades se fundaram e se construíram. Os dados históricos e etnográficos demonstraram que a “diferença imaginada” por este pesquisador, segundo os resultados deste trabalho, foi verificada nos dados colhidos em campo. Para finalizar esta conclusão, gostaria de destacar a importância que a antropologia tem neste trabalho de relação com as diferenças sociais, diante da sua proposta de sempre relativizar os nossos pré-conceitos no processo de construção e de investigação dos nossos objetos de estudo. Dentro da área antropológica, a etnografia merece ser lembrada, a exemplo do que Geertz avalia sobre os usos da etnografia: “Ela é a grande inimiga do etnocentrismo, do confinamento de pessoas em planetas culturais onde as únicas idéias que precisam invocar são ‘aquelas em torno daqui’, não porque assuma que as pessoas são todas iguais, mas porque sabe quanto elas não o são e como são incapazes, ainda assim, de se desconsiderarem mutuamente. Mesmo que um dia tenha sido possível e mesmo que hoje provoque saudades, a soberania do familiar empobrece a todos; (...) A Etnografia, ou uma delas em todo caso, é sem dúvida fornecer, como fazem a história e as artes, narrativas e cenários para refocalizar a nossa atenção.” (GEERTZ, 1999)









BIBLIOGRAFIA


1.     BACHELARD, Gaston. A Poética do Espaço. São Paulo: Martins Fontes, 1993.

2.     BERGAMO, Alexandre. “O Campo da Moda”. Revista de Antropologia, vol. 41, No. 2, 1998.

3.     COELHO, Marcos de Amorim. Geografia do Brasil. São Paulo: Ed. Moderna, 1990.

4.     GANDIM, Jairo. História da Paróquia da Santa Isabel. Mimeo. Viamão: 29 de abril de 1997.

5.     GEERTZ, Clifford. A Interpretação das Culturas. Rio de Janeiro: Zahar Ed. , 1978.

6.     ---------------------. “Os Usos da Diversidade”. Porto Alegre: Ed. Da UFRGS. Horizontes Antropológicos, No. 10, 1999, p. 13-34

7.     MACEDO, Francisco Riopardense de. Porto Alegre: origem e crescimento. Porto Alegre: Ed. Sulina, 1968.

8.     OLIVEN, Ruben George. “Nação e Tradição na Virada do Milênio.” In. A Parte e o Todo: a diversidade cultural no Brasil-Nação. Porto Alegre, Vozes, 1992, p.13

9.     ORTIZ, Renato. “Modernidade-Mundo e identidades.” In: Um Outro Território. Ensaios sobre a Mundialização. São Paulo. Olho D’Água, s/d. p. 67-89

10.      -------------------. “Uma Cultura Internacional-Popular”. In. Um Outro Território. Ensaios sobre a mundialização. São Paulo: Olho d’água, s/d, p. 67-89.

11.      SAHLINS, Marshall. “La Pensée Bourgeoise.” In. Cultura e Razão Prática. Rio de Janeiro: Zahar, 1979.

12.      SANTOS, Armando Alexandre dos. O Brasil sob o manto da Imaculada. São Paulo: Ed. Artpress, 1996.

13.      VELHO, Gilberto. O Desafio da Cidade. Novas Perspectivas da Antropologia Brasileira. Rio de Janeiro: Ed. Campus, 1980.





































ANEXOS

(As imagens que compõe os anexos estarão disponíveis no Site www.fotolog.terra.com.br/acidadedesantaisabel)






[1] Lévi-Strauss, Aula Inaugural  citado por ZALUAR, 1955 em Desvendando Máscaras Sociais.
[2] “Virgem bendita, que pela vossa Conceição anunciaste o próximo despontar do Divino Sol, sêde, nós vos rogamos, a luz do nosso espírito, alegria do nosso coração, a nossa defesa nos perigos, sustento nas tentações, auxílio naquelas virtudes que vos tornaram tão admirável aqui na terra e tão gloriosa no céu.”  Oração à Imaculada Conceição
[3] Reminiscências da Campanha do Paraguai, Editora da Biblioteca do Exército, Rio de Janeiro, 1980, p.155.
[4] Grifo do historiador citado.
[5] Campos de Viamão: nome genérico utilizado na época para referir toda a área que conhecemos hoje no entorno da Cidade de Viamão (Palmares do Sul, Águas Claras, Tavares, Itapuã e alguns municípios da Grande Porto Alegre como Alvorada, Gravatai, Cachoeirinha, ...)

[6] Onde atualmente se encontra o Distrito de Águas Claras / Município de Viamão.
[7] Expressão usada na primeira referencia registrada em documento sobre a povoação que se formava no então Porto de Viamão, a qual se desenvolvia rapidamente para os padrões da época.
[8] Investigações arqueológicas do Museu Joaquim José Felizardo em parceria com o Núcleo de História da UFRGS, apontam para a confirmação desta hipótese.
[9] Oficialmente a primeira missa da paróquia foi rezada no dia 3 de abril de 1960 às 10 horas pelo padre Guilherme Sponn da Congregação dos Oblatos de São Francisco de Sales.
[10] Marcos de Amorim Coelho em Geografia do Brasil demonstra graficamente que a imigração para o Brasil foi bastante expressiva entre os anos de 50 a 55.
[11] Segundo relatos dos padres existe mais de uma Santa Isabel na Igreja Católica, portanto eles reafirmam Santa Isabel da Hungria.
[12] Trabalhamos com o conceito de cultura conforme ORTIZ em Um Outro Território.







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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS
CURSO DE CIÊNCIAS SOCIAIS
Disciplina: Pesquisa Social  IV - Projeto
Semestre: 1997 / I
Professora : Tânia Steren dos Santos












-    PESQUISANDO  UMA  INSTITUIÇÃO  TOTAL  :  Estudo  de  caso  do  instituto  dom  bosco  masculino   -













Aluno: JAQUES XAVIER JACOMINI
Matrícula: 1409/92.7





SUMÁRIO




1. JUSTIFICATIVA .................................................................................    03


2. PROBLEMA / HIPÓTESE ..................................................................     06


3. DEFINIÇÃO  DE  CONCEITOS  E
    QUADRO  TEÓRICO  DE  REFERÊNCIA .......................................     07


4. OBJETIVOS  DO  PROJETO  ............................................................     19


5. METODOLOGIA ................................................................................     21


6. CRONOGRAMA ................................................................................      23


7. REFERÊNCIAS  BIBLIOGRÁFICAS ...............................................     25


8. BIBLIOGRAFIA  CONSULTADA ....................................................     26 


































1. JUSTIFICATIVA

“ O Tema da loucura encanta quem o toca. Ao abordar a loucura (...) não devemos prescindir dela. Ela não invade apenas os outros como pensou o médico Simão Bacamarte. Ela é em nossas vidas ora um acaso, ora uma necessidade. Tocá-la pode ser irreversível; desconsiderá-la pode ser lamentável. (...)
A loucura é capaz de legislar e consagrar, ainda que temporariamente, um incêndio para a diversão dos monótonos romanos, exauridos já pelo tédio das conquistas (...)
A loucura, pôr outro lado, não é um formidável privilégio de alguns leigos ou doutos. A loucura é um sofrimento psíquico que pode ser minimizado, e o primeiro requisito para  esta   tarefa   talvez    seja    tão     imaterial    quanto    a   própria    enfermidade  :  (...)”  [1]

O tema da normalidade (ou normalização das sociedades no sentido como é trabalhado pôr Roberto Machado [2])  dentro das sociedades contemporâneas tem sido trabalhado pôr vários pensadores e intelectuais de várias épocas e de vários períodos históricos. Desde as considerações de Durkheim sobre o que chamou de “normal e patológico” até, mais recentemente, os estudos de Nietzsche, Freud e Foucault,  acumulam-se várias propostas de se abordar o tema, temos assim a noção da importância deste debate para nós cientistas sociais  e para a organização de nossa sociedade atual.
Dentro deste contexto, tentando delimitar um pouco mais o nosso campo de análise, consideramos os movimentos mundiais em defesa da restruturação e reorganização dos princípios científicos e filosóficos que nortearam, até os nossos dias, o trabalho em saúde mental. Temos noticia de propostas que caminham nesta direção como os processos já implantados de, pôr exemplo, “saúde mental comunitária - experiência dos Estados Unidos da América, a antipsiquiatria - modelo da Inglaterra, a psiquiatria de setor - proposta na França, reformas psiquiátricas - na Itália e na Espanha, e a atenção primária, experiência de Cuba.” [3]  Dentre estas várias experiências, caberia destacar, entretanto aquela que, segundo o meu levantamento, funciona como o sustentáculo das propostas de reformulação deste setor de saúde no Brasil, refiro-me a lei 180 da Itália e a Declaração de Caracas de 1990.
A nível nacional, até como reflexo deste movimento mundial, surgiu no Senado Federal proposta de lei do Deputado Paulo Delgado (PT - MG) e na Assembléia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul projeto de lei do Deputado Estadual Marcos Rolim (PT), ambos sinalizando para a extinção progressiva dos hospitais psiquiátricos e sua substituição pôr outros recursos assistências, para a regulamentação da internação psiquiátrica compulsória, entre outras propostas.
Diante de uma proposta de reformulação das políticas de atendimento em saúde para os deficientes mentais, através do projeto de lei que prevê a extinção progressiva dos hospitais psiquiátricos tradicionais, debruço-me sobre esta análise de caso, caso Instituto Dom Bosco Masculino,  a fim de analisar o novo ( nova proposta prevista no projeto de lei ) a partir de uma experiência  que remonta a forma tradicional (de uso corrente no Brasil) de tratamento aos portadores de necessidades especiais.
Este paralelo comparativo, o novo e o tradicional, faz-se necessário uma vez que a forma atual de atendimento tem apresentado vários problemas e as novas sugestões de trabalho propõe mudanças estruturais significativas o que as coloca no centro de uma discussão muito polêmica.
Poderíamos aqui ainda referir a nossa intenção de, apesar de estarmos trabalhando com um análise de caso - O Caso Instituto Dom Bosco Masculino / IDBM,  trabalhamos com materiais, referencias e considerações de outras instituições estilo manicomial como Instituto Psiquiátrico Forense Dr. Maurício Cardoso, Hospital Psiquiátrico São Pedro e Instituto Nacional do Centro Clínico de Saúde /  Hospital St. Elizabeths (E. U. A ).  Nesta primeira instituição realizamos pesquisa de campo, observação participante e ensaio e uma posterior exposição de fotos, na segunda realizamos pesquisa teórica a partir da  tese de mestrado do historiador Alexandre Schiavon e na terceira, “viajamos” teoricamente para os Estados Unidos da América através da obra--  de Erving Goffman - Manicômios, prisões e conventos.    
Entendemos  que este estudo é de elevada  relevância para o debate da “loucura” e suas formas ou proposta de tratamento nas sociedades contemporâneas. Sociedade esta tomada pêlos ventos da pós-modernidade, altamente individualizada, segmentada; em constante conflito e crises sociais, filosóficas, religiosas, ... que busca entender as fronteiras do normal e do patológico, do racional e do irracional, do possível e do impossível. Mais do que nunca, este debate é atual e necessário uma vez que o homem busca desesperado o fulcro de suas construções e realizações mentais e materiais.
























2. PROBLEMA  /  HIPÓTESE

Segundo orientação de nossa professora destacamos o problema e a hipótese de forma relacionada, uma vez que dada o grau de maturação de nossas idéias, seria um pouco precoce externá-los separadamente e de forma definitiva.
O problema central do nosso projeto de pesquisa é : 
“Qual a dimensão dos fatores negativos e dos fatore positivos dentro do atual modelo de assistência médico / psiquiátrica aos pacientes portadores de deficiências e perturbações mentais atendidos nas redes de hospitais públicos e privados.”
Nos arriscando na tentativa de formular uma hipótese inicial de trabalho para a nossa pesquisa, citamos a seguir uma hipótese que precisa ainda ser lapidada, reelaborada, a partir do aprofundamento de nossos estudos :
“ O atendimento (ou tratamento) ao indivíduo portador de deficiência ou problemas mentais em instituições totais [4] como os manicômios ( ou casas similares ), como o Instituto Dom Bosco, objeto do estudo de caso presente neste projeto, é extremamente maléfico para as pessoas ali internadas [5]. Ou seja, o estado de saúde dos pacientes regride e piora progressivamente na mesma proporção em que aumenta o tempo de permanência (e  / ou  internação)  deste paciente nas instituições totais [6].”








3. DEFINIÇÃO  DE  CONCEITOS  e  QUADRO  TEÓRICO  DE  REFERÊNCIA

“ Penso  que, atualmente, para que os conceitos sociológicos sejam tratados adequadamente, cada um deles deve ser ligado ao aspecto a que melhor se aplica, e seguido a partir daí até onde pareça levar, e obrigado a revelar o resto  de sua ‘família’.  Talvez seja melhor usar diferentes cobertores para abrigar bem as crianças do que utilizar uma cobertura única e esplendida, mas onde todas fiquem tremendo de frio.” [7]

Me proponho a trabalhar a definição dos conceitos e o quadro teórico de referencia de uma forma conjunta, inicialmente,  pôr uma intuição intelectual, e, a posteriori, pôr orientação de Salomon [8] que nos diz: “Na prática, e tecnicamente, o marco teórico de referência reflete :  (...)  o conjunto de conceitos, categorias e construções abstratos que constituem o arcabouço teórico, onde se situam suas preocupações científicas, particularmente os problemas cognitivos que o preocupam .” [9]
Dentro do nosso projeto de pesquisa, já é possível identificar alguns conceitos centrais e também alguns pressupostos teóricos dentre outros vários (conceitos e pressupostos) que poderiam ser aqui referidos.  Dentre eles, destacamos os que seguem:


INSTITUIÇÕES  TOTAIS -

Trabalhamos este conceito como denominado pôr Erving Goffman em Manicômios, prisões e conventos, ou seja, são instituições totais “ locais de residência e trabalho onde um grande número de indivíduos com situação semelhante, separados da sociedade mais ampla pôr considerável período de tempo, levam uma vida fechada e formalmente administrada.” [10]
O autor ainda vai definir o hospital psiquiátrico dentro desta classificação de instituição total, quando diz : “As instituições do tipo de hospitais psiquiátricos são ‘totais’, pois o internado vive todos os aspectos de sua vida no edifício do hospital, em intima companhia com outras pessoas igualmente separadas do mundo mais amplo.” [11]



MORTIFICAÇÃO

Este conceito também é tomado da obra de Goffman ( a mesma que referimos anteriormente) e esta relacionado ao processo de anulação da subjetividade dos indivíduos institucionalizados. O autor analisa a questão a partir de considerações sobre a construção do “eu” individual das pessoas :

“Tal como ocorre com o novato de muitas dessas instituições totais, o novo internado percebe que está despojado de muitas de suas defesas, satisfações e afirmações usuais, e está sujeito a um conjunto relativamente completo de experiências de mortificação : restrição de movimento livre, vida comunitária, autoridade difusa de toda uma escala de pessoas, e assim pôr diante. Aqui começamos a aprender até que ponto é limitada a concepção de si mesma que uma pessoa pode conservar quando o ambiente usual de apoios é subitamente retirado.” [12]






EQUIPE  DIRIGENTE

Tomo esta definição novamente do Goffman que a utiliza para referir a equipe de médicos, enfermeiros e atendentes da instituição, ou seja, os profissionais que dirigem e administram a vida do internado (ou paciente).
Neste trecho do livro referido anteriormente o autor contempla esta definição :
 “ Nas instituições totais, existe uma divisão básica entre um grande grupo controlado, que podemos denominar o grupo dos internados, e uma pequena equipe de supervisão. Geralmente, os internados vivem na instituição e tem contato restrito com o mundo existente fora de suas paredes; a equipe dirigente muitas vezes trabalha num sistema de oito horas pôr dia e está integrada no mundo externo. (...) Os participantes da equipe dirigente tendem a sentir-se superiores e corretos. [13]



SOBRE  O  GOFFMAN

Esta obra  de Goffman é uma das principais fontes teóricas para esta pesquisa pôr várias razoes.
 Em primeiro lugar, a noção de “instituição total” e suas características são essenciais para trabalhar a nossa pesquisa de campo no Instituto Dom Bosco, pois lá encontramos infinitas analogias entre as descrições deste autor em suas pesquisas de campo com a instituição objeto de nosso estudo, em termos de organização de rotinas, aspectos da “equipe dirigente” e “grupo de internados”, organização estrutural, interações sociais na instituição, entre outras que poderiam ser aqui elencadas. Ou seja, o IDBM é uma instituição total estilo manicomial e, portanto, deve ser considerada, analisada e trabalhada como tal. Apesar das analogias citadas, existem aspectos institucionais muito específicos ao IDBM, em função disto, pretendemos, através da pesquisa de campo e pesquisa bibliográfica, delimitar estas semelhanças e as não semelhanças com as instituições trabalhadas pôr Goffman. Em nenhum momento, propomos a formulação de generalizações, pois a entendemos perigosas e totalmente fora da nossa proposta de trabalho que a antropologia orienta.
 Em segundo lugar, apesar de ser este o conceito chave, instituição total, para colocarmos em prática a nossa pesquisa existem outros vários conceitos que são também muito significativos para a análise que propomos neste projeto. As idéias de “mortificação”, “regimes de enfermaria”, “equipe dirigente”, entre outros encaixam perfeitamente com a abordagem de outros autores que trazemos para este debate como Foucault, Roberto Machado e Nietzsche, dentre outros. As considerações sobre a construção e reconstrução das subjetividades ou dos “Eus”[14] dos internados que Goffman traz nesta obra, bem como mais especificamente sobre a construção dos estigmas [15] representaram para nós o primeiro contato com esta bibliografia que se debruça sobre o tema da loucura, dos desvios e desviantes, do normal e do patológico. Em especial, o tema da “mortificação” é central para a análise das nossas hipóteses e dos nossos problemas de pesquisa, ou seja, estudar o tipo de tratamento médico / terapêutico atualmente oferecido aos internos da instituição, com vistas a dar ênfase aos seus aspectos negativos e os escassos  aspectos positivos e relacioná-lo com as novas propostas de atendimento e tratamento. Goffman trabalha muito bem esta questão, a mortificação, onde, sem nenhuma dificuldade, o pesquisador pode entender como acontece este processo de anulação do “Eu” individual dos internos, processo este característico não só aos manicômios como também a outras instituições totais referidas pelo autor. Seria interessante ressaltar que, neste sentido, já possuímos algumas constatações importantes, face a nossa pesquisa de campo realizada no IDBM pôr, aproximadamente, dois anos ( de 1991 a 1993), onde, através de entrevistas e pesquisa participante colhemos vários elementos que nos auxiliam nessa análise. Só para explicitar um pouco mais, revendo a conclusão da monografia “Pesquisando uma Instituição Total”, de minha autoria,  realizada em 1993 na cadeira de Antropologia, sob a supervisão da Professora  DENISE  JARDIM, gostaria de trazer alguns trechos para este projeto, que na verdade é a tentativa de retomar aquela discussão, agora de forma mais elaborada e mais sistemática :

“A Instituição total não contribui para a melhora do estado de saúde dos internados. Muito pelo contrário, ela prejudica e debilita ainda mais a sanidade mental das pessoas. Isso graças à sua capacidade de se apropriar da vontade de viver dos internos, das suas manifestações de vida, daquilo que ele aprendeu fora da instituição.  Pôr que isto acontece ?
Isto acontece porque, a partir do momento da internação (compulsória) [16]  o interno passa a ter a sua vida totalmente administrada, ou seja, com o “rótulo” de  louco e internado em uma “Casa Verde do século XX” [17],  ele perde o controle de tudo o que lhe pertencia antes. Desde os seus pertences pessoais, objetos de estimação (roupas, calcados, ...) e tudo o que funcionava antes como um referencial do seu próprio “Eu”, da sua razão subjetiva, é apropriado pela instituição. A partir de agora ele possuirá monitoramento de terceiros para todas as atividades, desde as mais elementares, como as de higiene do próprio corpo, até as mais elaboradas, como criação artística e / ou intelectual. Tudo acontece agora na sua vida em função de uma coletividade: o banho, as refeições, os escassos momentos de lazer, enfim, tudo deixou de ser particular ou privado para ser coletivo e monitorado (supervisionado).
(...)
A instituição segrega, ou, como é citado pôr Goffman, “Mortifica” a vida do internado. Com as suas atividades excludentes e discriminatórias a instituição reafirma e reproduz, em maior escala, os preconceitos e a marginalização do deficiente mental que são produzidos na sociedade. (...)”[18]

Em terceiro e último lugar, trabalhar com Goffman representa trabalhar com um pensador que, apesar de não ser antropólogo, refere claramente na sua obra aquele objetivo que é, para a antropologia o seu maior desafio e o seu maior objetivo, “relativizar”. Esta proposta do autor esta categoricamente colocada no texto e até me arrisco a afirmar que não poderia ser de outra forma, pois nestes “terrenos pantanosos” [19] das ciências humanas não existe teoria pronta e acabada, pressuposto teórico definitivo ou escola ideal para abordá-la. A relativização é, sem dúvida o caminho mais adequado para trabalharmos com estes temas que nos ocupamos neste momento. Não me alongarei mais sobre os aspectos deste autor e suas obras, uma vez que acabaria, se assim o fizesse, entrando no quadro teórico dos outros autores convidados para esta análise.



NORMALIZAÇÃO  DA  SOCIEDADE

Conceito como trabalhado pôr Roberto Machado, podendo ser também chamado de “medicalização” da sociedade significa o processo de controlar os indivíduos, a partir da intervenção do poder da norma e da intervenção médica. Em determinada passagem do livro de Machado,  assim o refere o autor: 

Os médicos elaboram uma teoria social, definem os requisitos de uma sociedade perfeita, ordenada e democrática e, através de vários instrumentos, propõem e concretizam sua participação na direção da sociedade, trazendo ao governo o apoio da ciência.” [20]

Nesta obra este aspecto da medicalização e normalização é abordado no contexto mais geral da sociedade e também em relação a determinadas instituições, como hospitais, cadeias, quartéis, etc. Em todas elas é interessante ressaltar a abordagem da medicina relacionada ao poder político de organização e ordenação das instituições, a exaltação do poder oriundo do saber médico - único capaz de urbanizar o homem, curar as suas doenças e moléstias do corpo e do espírito, a relação entre medicina e planejamento urbano, dentre outras. Alguns trechos que seguem são esclarecedores neste sentido :

“ A cidade configura-se então como objeto privilegiado ou mesmo exclusivo de intervenção médica pôr reunir em sua desordem as causas da doença da população. (...)
A medicina em tudo intervém, (...) Nada do que é urbano lhe pode ser estranho, sob pena de sua intervenção se tornar precária ou ineficaz. Todos os  componentes urbanos, todos os seus lugares, objetos e elementos devem estar sob controle e sob seu controle. Pretendendo controlar a vida social, estendendo-se pela cidade como um todo com o objetivo de corrigir a desordem que ela acarreta, a intervenção normalizadora da medicina deverá ser tão constante quanto a corrupção do meio ambiente e o perigo que a caracteriza. Somente o olhar conhecedor e autoritário de médico e seus subordinados, percorrendo permanentemente a cidade, poderá detectar os locais de perigo atual ou virtual. (...) ” [21]


PANOPTISMO  ( OU  PANÓPTICO  DE  BENTHAM )

Este é mais do que um conceito, poderíamos dizer que é um princípio relacional, no que tange a organização espacial e arquitetônica das instituições totais. Trabalhado na obra  de Foucault - Vigiar e Punir  - ele compreende um capitulo inteiro do livro, dada a sua relevância para a análise das instituições. Esta intimamente relacionado a idéia de controle e as políticas de contenção nos universos institucionais, ou seja, ver tudo, observar tudo, controlar tudo.
Pensado a partir da organização espacial de um jardim zoológico da idade média, “o panóptico funciona como uma espécie de laboratório de poder.” [22]
Puxarei algumas citações do referido texto que afirmam as minha colocações sobre o panóptico :

“O Panóptico de Bentham é a figura arquitetural (...) na periferia uma construção em anel, no centro uma torre, esta é vazada de largas janelas que se abrem sobre a face interna do anel; a construção periférica é dividida em celas, cada uma atravessando toda a espessura da construção; elas tem duas janelas, uma para o interior, correspondendo as janelas da torre; outra que dá para o exterior, permite que a luz atravesse a cela lado a lado. Basta então colocar um vigia na torre central, e em cada cela trancar um louco, um doente, um condenado, um operário ou um escolar. (...)
(...) o efeito mais importante do panóptico: induzir no detento um estado consciente e permanente de visibilidade que assegura o funcionamento automático do poder. Fazer com que a vigilância  seja permanente em seus efeitos, mesmo se é descontinua em sua ação (...)
Uma espécie de ‘ovo de Colombo’ na ordem política. Ele é capaz com efeito de vir se integrar a uma função qualquer (de educação, de terapêutica, de produção, de castigo, ...); de aumentar essa função, ligando-se intimamente a ela (...) Em suma, faz com que o exercício do poder não se acrescente de fora, como uma limitação rígida  ou como um peso, sobre as funções que investe, mas que esteja nelas presente bastante sutilmente para aumentar-lhes a eficácia aumentando ele mesmo seus próprios pontos de apoio. (...) ” [23]

Com vistas a pensar o IDBM a partir destas noções teóricas do panóptico estudadas pôr Foucault, é uma das nossas metas de trabalho a análise e avaliação dos aspectos físicos e arquitetônicos, bem como da organização e dimensionamento do espaço na instituição a ser estudada. Para isso utilizaremos desenhos, croquis, plantas baixas da instituição onde poderão ser visualizadas estes aspectos físicos / estruturais que são imprescindíveis para esta análise e estudo do panóptico no IDBM [24] .



PODER / DISCIPLINA / VIGILÂNCIA

Estes conceitos são tomados aqui a partir das considerações e como estão sendo trabalhados pôr Foucault em Vigiar e Punir. Abordagens mais detalhadas sobre eles não serão aqui realizadas, em função de questões de ordem prática. Contudo, estes conceitos e suas abordagens são muito importantes para esta pesquisa a qual nos propomos a realizar. Mais do que os conceitos e pressupostos teóricos, este autor, Foucault, de um modo geral, em especial em Vigiar e Punir, a exemplo de como referimos o Roberto Machado, é central para a nossa análise, estudo e debate. Não é necessário empenharmos uma defesa maior de Foucault e de suas teorias, pois pensamos que isto é quase um consenso entre os intelectuais, é necessário apenas posicioná-lo e identificá-lo como o pensador que mais tem nos mobilizado para o debate desta discussão das instituições totais e suas formas de tratamento dos loucos ou desviantes, contemplando o embate das propostas de atendimento tradicionais com as novas propostas sugeridas nos projetos de leis já referidos.



LOUCURA

Este conceito, a exemplo da normalidade / anormalidade,  é muito importante para o nosso trabalho, talvez o mais importante, pois é a partir dele que todos os demais se agregam. Não estaríamos discutindo manicômios se não houvessem loucos, não estaríamos discutindo loucura se ela não estivesse em nossa sociedade, não estaríamos estudando a loucura se não nos preocupássemos com ela, enfim, não sei se a lógica é realmente esta, contudo, loucura é “o nosso alimento intelectual” neste momento.
Basicamente, lançaremos mão dos conceitos de Foucault e também de Nietzsche. Este primeiro autor já foi utilizado para a elaboração da monografia que já referi, quando da discussão da loucura, na qual abordamos este tema ou este conceito. Na obra Vigiar e Punir, Foucault remonta historicamente a trajetória e surgimento da loucura como aparato político de contenção das anormalidade ou desvios. É muito interessante de ver esta avaliação histórica para entendermos o que é loucura hoje, como é, e pôr que  que é, ... Uma vez instrumentalizados desta perspectiva histórica, a nosso ver, a análise da loucura contemporânea fica mais clara, concisa e tranqüila. Entendemos que Foucault contribui decisivamente para este debate, chegando ao ponto de alguns pensadores como Sérgio Adorno classificarem a análise da nossa contemporaneidade divididas em dois momentos : período anterior a Foucault e período pós-Foucault. Não estamos adotando esta proposta de classificação do debate, apenas referimos como algo a se pensar e avaliar.
Não poderíamos deixar, entretanto, fora deste debate, o grande  filósofo e pensador Nietzsche. Sem duvida, foi ele um dos pensadores que mais se aproximou efetivamente deste debate, até ao ponto de, no final de sua dúvida,  ser pego pôr aquilo que considerava não existir (como fato patológico), a loucura. Na verdade, pensamos que acabou pôr ser “engolido” pelo sistema de controle, de normalização, de medicalização quando foi diagnosticado como louco. Mas como classificar como louco alguém que considerava a insistência do fato patológico. Para ele, nem a saúde, nem a doença são entidades; a fisiologia e a patologia são uma única coisa; as oposições entre bem e mal, verdadeiro e falso, doença e saúde são apenas jogos de superfície. Há uma continuidade, diz Nietzsche, entre a doença e a saúde e a diferença entre as duas é apenas de grau, sendo a doença um desvio interior à própria vida; assim não há fato patológico.
Nietzsche vai considerar que a loucura não passa de uma máscara que esconde alguma coisa, esconde um saber fatal e “demasiado certo”. [25]  A técnica utilizada pelas classes sacerdotais, pôr exemplo, para a cura da loucura é a “medicação ascética”,  que consiste em enfraquecer os instintos e expulsar as paixões; com isso, a vontade de potência, a sensualidade e o livre florescimento do eu são considerados “manifestações diabólicas”. Mas para Nietzsche, aniquilar as paixões é uma “triste loucura”, cuja decifração cabe à filosofia, pois é a loucura que torna mais plano o caminho para as idéias novas, rompendo os costumes e as supertições veneradas e constituindo uma verdadeira subversão dos valores.
Para  Nietzsche, os homens do passado estiveram mais próximos da idéia de que onde existe loucura há um grão de gênio e de sabedoria, alguma coisa de divino : “ Pela loucura os maiores feitos foram espalhados pela Grécia.” [26]
Em suma, aos “filósofos além do bem e do mal”, aos emissários dos novos valores e da nova moral não resta outro recurso, diz Nietzsche, a não ser o de proclamar as novas leis e quebrar o jugo da moralidade, sob o travestimento da loucura. É dentro desta perspectiva, portanto, que se deve compreender a presença da loucura na obra de Nietzsche.






































4. OBJETIVOS  DO  PROJETO  DE  PESQUISA

A - OBJETIVOS  GERAIS

Analisar a atual estrutura, organização e metodologia de atendimento médico / hospitalar em uma instituição total para tratamento de portadores de necessidades especiais (deficientes mentais) com base em um estudo de caso (O caso Instituto Dom Bosco Masculino), com vistas a projetar as possibilidades de melhoria e restruturação do atual modelo de atendimento ( problematizando os aspectos que estão inseridos nos projetos de lei que prevêem a “reforma psiquiátrica brasileira”) [27].
Este objetivo ainda não é definitivo, uma vez que estamos buscando o amadurecimento do temas e das possibilidades de implementação desta pesquisa. De qualquer foram, hoje, segundo a nossa leitura, em termos de proposta de trabalho, este é o objetivo que podemos referir como sendo o mais geral.


B -  OBJETIVOS  ESPECÍFICOS

I - Relacionar as novas políticas de atendimento médico / hospitalar (tendo pôr base os projetos de lei e as propostas da reforma psiquiátrica)  com o modelo tradicional de atendimento, ou seja, o atendimento oferecido aos internos do IDBM;
II - Avaliar o tratamento médico - terapêutico que os internos recebem na instituição estudada, relacionando-o com a evolução de seus estados de saúde física e mental (neste sentido, avaliar as evoluções e regressões dos estados de saúde dos internos);
III - Descrever os aspectos institucionais particulares ao IDBM, bem como suas características fundamentais ;
IV - Estudar os aspectos físicos e arquitetônicos, bem como a organização da lógica espacial desta instituição a luz dos autores citados;
V - Estudar as relações sociais internos / pacientes nesta instituição, dentro da lógica de um e do outro grupo e a partir da lógica do pesquisador.





































5. METODOLOGIA

“(...) nossa perspectiva crítica, em matéria de concepção de investigação sociológica, situa-se em reação contra o empiricismo e o positivismo da sociologia convencional sem descartar, no entanto, a exigência antiteoricista de questionar a realidade concreta.” [28]

Estamos considerando aqui a metodologia “como suporte e diretriz da pesquisa.” [29]
O nosso método de pesquisa realizar-se-á através de um estudo de caso, com a adoção de uma ênfase maior em observações participantes.
Apesar de estarmos trabalhando com um tema relacionado a saúde, não propomos empreitar a atividade de “curandeiros sociais” [30], portanto não optamos pôr este método na sua relação com uma tendência empiricista. Porém, concordamos com Thiollent quando refere que  “a crítica do empiricismo não deve fornecer o desvio oposto que podemos chamar de ‘teoricismo” e que consiste em um discurso supergeneralizante.” [31]
Para realizarmos a nossa pesquisa de campo, antevemos alguns problemas no que tange ao acesso com o universo a ser estudado, uma instituição total estilo manicomial. Pôr se tratar de uma instituição deste tipo, ou seja, bastante fechada para a comunidade em que se encontra e, administrativamente, muito “policiada” e controlada, observamos que poderão surgir alguns entraves nos primeiros momentos de inserção dos pesquisadores em campo. De qualquer forma, pretendemos utilizar os recursos que temos, institucionais e informais, para, digamos assim, “quebrar o gelo inicial” e podermos assim trabalhar tranqüilos.
Na tentativa de justificarmos [32] a escolha do nosso método de pesquisa, podemos dizer que elegemos o estudo de caso, com ênfase na observação participante, pôr identificá-lo como um dos métodos mais significativos, usuais e de maior aceitação na nossa área, antropologia. Além disso, a observação participante nos permite realizar um movimento de interação com o nosso objeto de estudo muito mais aprofundado, o que nos permite realizar um dos nossos grandes objetivos em pesquisa, o da “relativização”.
Para a definição da nossa amostra de pesquisa, trabalharemos da seguinte forma: Em uma população de, aproximadamente, 100 internos, escolheremos uma amostra aleatória que seja significativa, de 30 a 40 internos, para realizar nosso estudo. Eventualmente, poderemos extrapolar esta amostra inicial, pesquisando outros indivíduos que considerarmos, no transcorrer da pesquisa, como fundamentais para a realização do nosso trabalho. No que concerne a “equipe dirigente”, esta população será estudada no seu todo, em função de que este é um grupo menor, e também porque estudar este grupo a partir do seu todo é algo muito importante para o tipo de análise científica que propomos.
Para a coleta de dados, pretendemos pesquisar atas, registros, anais, relatórios, prontuários e demais documentos da instituição, a fim de elaborarmos tabelas, gráficos, e / ou relatórios que venham a subsidiar os nossos estudos sobre a instituição eleita para este projeto. Para esta atividade, consideramos como essenciais os recursos de informática que auxiliarão significativamente estas tarefas.
Ainda dentro da coleta de dados, pretendemos trabalhar com metodologias da Antropologia Visual, utilizando fotografias, filmagens em VHS e outros recursos audiovisuais para a apreensão de aspectos que fogem dos recursos tradicionais de pesquisa científica.
Para a análise de dados, utilizaremos tanto a análise estatística, sem seguir “O Ritual Estatístico” [33], quanto a análise qualitativa. Obviamente que privilegiaremos a  análise qualitativa, como análise de textos, de discursos, de conteúdo, etc. pois a consideramos como a mais importante para o tipo de pesquisa que nos empenhamos neste momento.







6. CRONOGRAMA


Para a realização do cronograma, apresentaremos uma “tabela cruzada” [34] onde supomos ter como tempo de duração para a realização de nossa pesquisa o espaço de tempo de um ano. Dentro deste espaço temporal, um ano, subdividimos as fases em meses para a perfeita visualização das atividades e seus respectivos períodos de desenvolvimento.
Em função  da natureza deste projeto, toda esta organização cronologia / atividades é muito embrionária e está, portanto, sujeita a algumas variações e reformulações posteriores que ocorrerão no transcorrer do amadurecimento de nosso trabalho acadêmico.





































































7. REFERÊNCIAS  BIBLIOGRÁFICAS



1 - ASSIS, Machado de. O Alienista. Porto Alegre: WM Jackson inc., 1942.

2 -FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir. História da Violência nas Prisões. Petrópolis: Vozes, 1988.

3 -GOFFMAN, Erving. Manicômios, Prisões e Conventos. São Paulo : Perspectiva, 1974

4 - -------------, -------- .  Estigma - Notas Sobre a Manipulação da Identidade Deteriorada. Rio de Janeiro : Zahar, 1980.

5 - NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. Vida e obra. Coleção Os Pensadores. São Paulo :  Ed. Nova Cultural, 1996.

6 -ROLIM, Marcos. A Nau dos Loucos. Carta de um Companheiro de Viagem. In: Jornal Utopia. São Paulo, Abril/Maio 92.p. 5.   

7 -ROTELLI, Franco. Loucos pelo Vida.

8 - SALOMON, Délcio Vieira. Como Fazer uma Monografia. Elementos de Metodologia de Trabalho Científico. Belo Horizonte Interlivros, 1974.

9 -THIOLLENT, M.  Crítica Metodológica, Investigação Social e Enquete Operária. São Paulo : Polis, 1980.










8. BIBLIOGRAFIA  CONSULTADA



1 - ARENT, Marion. Síntese das Entrevistas com a Monitoria do Instituto Dom Bosco. Relatório. Viamão, maio de 1991.

2 - BRASIL, Luís Antônio de. Cães da Província. Porto Alegre : Mercado Aberto, 1991.

3 - DOTTI, Sotero. Relatório Anual do Instituto Dom Bosco Masculino. Viamão, 10 de janeiro de 1985.

4 - --------, -------- .  Relatório Anual do Instituto Dom Bosco Masculino. Viamão, 23 de janeiro de 1989.

5 - JÚNIOR, Benilton Bezerra. Cidadania  e  Loucura : Políticas de Saúde Mental no Brasil.  Petrópolis : Vozes, 1987.

6 - MORAIS, Frederico. A Recuperação do Universo Segundo Arthur Bispo do Rosário.  In. Jornal de divulgação da exposição : “Registro de minha passagem pela terra : Arthur Bispo do Rosário” . Pinacoteca do MARGS, junho de 1992.

7 - OLIVEIRA, Carmem. Pôr Uma Sociedade sem Manicômios : um Olhar Sobre o São Pedro. In. Jornal da Pinacoteca do MARGS, junho de 1992.

8 - PACHECO, Alexandre. Et alli. Informações Técnicas a Respeito da Realidade Institucional do Instituto Dom Bosco Masculino. Viamão, agosto de 1992.

9 - SILVA, Luciana Kraemer da. Crise põe em Risco Oferta de Trabalho em Viamão. In. Jornal Quarta Feira. Viamão, 10 de janeiro de 1992.

10 - SZASZ, Thomas S.   A  Fabricação da Loucura - Um Estudo Comparativo entre a Inquisição e o Movimento de Saúde Mental. Rio de Janeiro : Zahar, 1978.

11 - TREVISAN, Janine  Bendorovicz.  Um Estudo Sobre Crianças Excepcionais em uma Instituição da FEBEM. Monografia. Fevereiro de 1992.













[1] Discurso do deputado estadual Marcos Rolim na Assembléia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul, pôr ocasião da defesa do projeto de lei que previa a extinção progressiva dos manicômios.
[2] MACHADO, Roberto et alii. Danação da norma : Medicina social e constituição da psiquiatria no Brasil.
[3] OLIVEIRA, Carmem de. Pôr que lutar pôr uma sociedade sem manicômios ?  In. Jorna  A Parte / Publicação do gabinete do Deputado estadual Marcos Rolim  PT / RS.
[4] Instituições Totais - denominação como é trabalhada pôr Erving Goffman em Manicômios, prisões e conventos.
[5] Goffman faz uma referencia clara e completa neste sentido na página 141 do livro já referido, quando menciona: “ (...) temos provas dos efeitos destrutivos do fato de viver num mundo dentro de outro mundo, e em condições que tornam difícil levar a sério qualquer um dos dois.” É importante deixar claro que o autor, quando fala em “um mundo dentro de outro mundo”, ele esta se referindo diretamente às instituições totais do tipo manicomial.
[6] Em monografia realizada anteriormente, todas as análises e estudos, com base em pesquisa de campo de aproximadamente dois anos, levam a aceitação desta hipótese.
[7] GOFFMAN, Erving. Manicômios, prisões e conventos.  São Paulo : Ed. Perspectiva 1974.   p . 12
[8] SALOMON,  Délcio Vieiras. Como fazer uma monografia.
[9] Idem,  p. 156
[10]  Goffman, Erving.  Manicômios, Prisões e Conventos.  p. 11
[11]   idem, p. 171
[12]   ibidem, p. 127
[13] ibidem, p. 18-9
[14] Em Prisões, manicômios e conventos, Goffman coloca claramente que o seu maior objetivo   nesta   obra é    “chegar   a   uma  versão   sociológica   da   estrutura  do ‘Eu’ ” p. 11
[15] GOFFMAN, Erving. Estigma - Notas sobre a manipulação da identidade deteriorada. Rio de Janeiro, 1980.
[16] COMPULSÓRIA não no sentido de que esta internação foi feita com ou sem  o consentimento e aprovação do próprio paciente, porque este, na maioria das vezes é levado pôr um terceiro até a instituição (Goffman analisa esta chegada a instituição) mas sim, no sentido, de que o tempo de permanência do interno no manicômio passa a ser compulsório. A “reabilitação” do paciente fica prejudicada em função da incompetência médica, inoperância jurídica e situação caótica da burocracia interna da casa que não possibilita o reingresso deste indivíduo ao seu grupo social. 
[17] Casa Verde plajeando o Machado de Assis e sua obra.
[18] JACOMINI, Jaques. Pesquisando uma instituição total.
[19]  Expressão de minha autoria para referir os aspectos pouco esclarecedores, principalmente quando não relativizados, que comparecem ao debate da normalidade ou patologia, sanidade e loucura, ...
[20] MACHADO, Roberto. Danação da norma : medicina social e constituição da psiquiatria no Brasil. P. 258
[21] Idem, p. 260-61
[22] FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir : Nascimento da Prisão.  Petrópolis : Ed. Vozes.  p. 180.
[23] Idem, p. 182
[24] Seguem em anexo alguns desenhos que foram realizados neste sentido, pôr ocasião da realização da monografia que referi antes trabalhada com a professora Denise Jardim.
[25] NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm.  Vida e obra. Coleção Os Pensadores. São Paulo : Ed. Nova Cultural, 1996.
[26] idem
[27] Reforma psiquiátrica brasileira : terminologia de minha autoria para referir as propostas que estão no boje dos projetos de lei como a extinção gradual dos manicômios e a implementação de formas de tratamento alternativos, descentralização do atendimento aos pacientes do sistema de saúde mental, etc.
[28] THIOLLENT, Michel  J. M.  Crítica Metodológica, Investigação Social & Enquete Operária. São Paulo : Ed. Polis, 1980.
[29] idem
[30] ibidem, p. 20
[31] Ibidem
[32] SALOMON, Délcio Vieira. Como Fazer Uma Monografia.  São Paulo : Martins Fontes, 1994.  P. 157
[33] Ritual Estatístico como trabalhado pôr MILLS, C. Wright  em A Imaginação Sociológica.
[34] SALOMON, Délcio Vieira. Como Fazer uma Monografia. P. 158-59








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2 comentários:

Jacomini disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Jacomini disse...

Gente
A página está ficando muito pesada, consequentemente tenho dificuldade na edição da mesma. Portanto, preciso estudar uma forma de resolver este problema técnico.
Acompanhe.
Namaste