TRABALHO
MONOGRÁICO APRESENTADO NA
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS
CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ANTROPOLOGIA SOCIAL
Disciplina: Teorias da Cultura
DENOMINADO
- As Festas
Populares Religiosas de
Santa Isabel e
de Nossa Senhora da
Imaculada Conceição: uma
análise comparativa entre
os dois maiores
festejos católicos da
Cidade de Viamão
-
Autor:
Jaques Jacomini
INDICE
Introdução ..............................................................................................
03
1. Os traços identitários formadores das santidades em
debate
1.1 Santa Isabel .................................................................................
05
1.2 Nossa Senhora da Imaculada
Conceição...................................... 07
2. Os festejos populares religiosos pesquisados
3. Dados históricos sobre as comunidades estudadas ............................
13
4. Análise comparativa entre as duas festas populares
religiosas pesquisadas 16
Conclusão ..............................................................................................
19
Bibliografia ............................................................................................
21
Anexos ...................................................................................................
23
INTRODUÇÃO
A presente
monografia representa o esforço de concluir os trabalhos realizados na cadeira
Teorias da Cultura, ministrada pelo Professor Ruben Oliven, do Programa de
Pós-Graduação em
Antropologia Social / Instituto de Filosofia e Ciências
Humanas / Universidade Federal do Rio Grande do Sul, através da análise de um
tema específico no âmbito do conhecimento das teorias da cultura.
As festas
populares de cunho religioso estão presentes em quase todo o território
nacional. Cada localidade ou cidade possui traços característicos e uma
dinâmica bastante peculiar, segundo a tipologia de significação e de
simbolização que os agentes religiosos e comunitários imprimem nos seus
eventos. Diante deste contexto mais geral, selecionamos duas festas religiosas
que acontecem no município de Viamão para fazer uma análise comparativa entre
as suas principais características. No contexto mais teórico, nos embasamos no
pressuposto de que “nenhum objeto, nenhuma coisa é ou tem movimento na sociedade
humana, exceto pela significação que os homens lhe atribuem” (SAHLINS, 1979).
Portanto, tentaremos perceber, com base na pesquisa realizada, os aspectos
concernentes a carga de simbolização e de construção social dos significados
que envolvem, delimitam ou delineiam estas duas festas populares.
A cidade de
Viamão é uma das maiores, em termos de população (220.000 habitantes) e
extensão territorial (1.487 Km2), da região metropolitana de Porto Alegre (Ver
anexo 1). Neste município existe uma divisão distrital que aponta para a
formação de dois grandes centros urbanos: região central, sede administrativa e
política do município, e região da Grande Santa Isabel, centro comercial ligado
mais diretamente a Porto Alegre. Percebendo que existe duas festas religiosas
populares ligadas a cada um destes dois pólos físico-geográficos, proponho
realizar uma análise etnográfica e historiográfica de alguns aspectos sociais
ligados a religiosidade destas duas localidades, através dos eventos anuais
mais significativos para estas comunidades: a festa de suas padroeiras.
A região da grande Santa Isabel tem a sua
devoção pela santa que a denomina, Santa
Isabel (Ver anexo 2) e a região central de Viamão tem a sua devoção voltada
para Nossa Senhora da Imaculada
Conceição (Ver anexo 3). Orientado por uma perspectiva relacional e dialética,
iniciarei o trabalho com a descrição das principais características e
especificidades das santas e das festas em debate, investigando os principais aspectos das festividades
realizadas em torno da adoração de ambas as santas. Em um segundo momento,
trabalho com alguns dados históricos que colaboram no entendimento da atual
dinâmica social observada nas comunidades observadas. Na parte final do
trabalho, me proponho a realizar uma análise comparativa entre as duas festas,
resgatando e apontando as suas principais semelhanças e diferenças,
relacionando-as com a dinâmica social e história destas duas localidades. Nos
anexos apresento iconografias referentes as construções textuais deste trabalho
que enriquecem e reapresentam alguns dados já expostos no corpo da monografia.
Quanto a
metodologia empregada, é importante destacar que abordo o meu objeto de estudo
através do método etnográfico, (pesquisa qualitativa), incorporando as
técnicas de observação direta e participante, complementadas com a realização
de entrevistas e com a produção de imagens fotográficas e iconográficas. Destaco que entendo a
observação participante como uma importante técnica de pesquisa, pois trata-se
de “um processo pelo qual mantém-se a presença do observador numa situação
social com a finalidade de realizar uma investigação científica. O Observador
está em relação face-a-face com os observados e, ao participar da vida deles no
seu cenário natural, colhe dados. Assim, o observador é parte do contexto sob
observação, ao mesmo tempo modificando e sendo modificado por este contexto.”[1]
1. OS TRAÇOS IDENTITÁRIOS
FORMADORES DAS SANTIDADES
EM DEBATE
1.1 SANTA ISABEL
“Ó
Deus,
destes
para nós o exemplo de vida de Santa Isabel
que
reconheceu e venerou Cristo nos pobres e doentes.
Daí
a todos nós, por sua inercessão,
Seguir
o exemplo de vida, no serviço aos pobres e aflitos,
Amando-os
como Cristo os amou.
Amém.
Ave
Maria ...
Santa
Isabel, rogai por nós !”
Oração
à Santa Isabel
Delinear os
traços formadores e fundadores das santidades em debate, foi um anseio deste
pesquisador na construção do presente trabalho, diante da carga simbólica e
imaginativa que estão empregnados. Atividade que não foi muito fácil devido as
fontes disponíveis para pesquisa. Lançamos mão de alguns panfletos, livros e
outros impressos cedidos pelas paróquias e colhemos relatos dos padres que são
responsáveis pelas igrejas pesquisadas, a fim de ter algumas informações
básicas sobre as santas Isabel e Imaculada Conceição.
Segundo as
informações colhidas nas entrevistas com o Padre Carlos e Padre Leoclides,
párocos da Igreja Matriz de Santa Isabel, esta santa nasceu na Hungria em 1207,
ainda muito jovem casou-se com o Duque Luís IV, tornando-se rainha da Hungria.
Isabel era de caráter vibrante e muito dedicada à oração, possuindo grande amor
para com os pobres e doentes e trabalhava contra toda injustiça feita ao seu
povo. O seu marido a apoiava neste intuito de auxiliar os mais necessitados,
porém com a morte de seu marido em uma batalha campal, ela foi obrigada, pela
sogra e cunhadas, a deixar a corte, com vinte anos e mãe de três filhos. A sua
expulsão aconteceu justamente pela sua opção de auxiliar e apoiar com afinco e
retidão os mais pobres e necessitados, contrariando assim a sua orientação
social de nobre que a cobrava um outro tipo de postura diante dos pobres. Desde
então, abandonou a sua condição social anterior e passou a dedicar-se
exclusivamente aos pobres. Ingressou na Ordem Terceira Franciscana,
dedicando-se com afinco no auxílio a pessoas doentes. O desfecho desta história
acontece com a sua morte que aconteceu em 17 de novembro de 1231, quando
possuía apenas 24 anos e encontrava-se em uma situação de extrema pobreza e
sofrendo de uma doença não nominada, mas mencionada como irreversível para os
níveis tecnológicos da medicina praticada na época.
Como podemos
perceber pelos relatos dos religiosos entrevistados, é muito presente no seu
imaginário a opção da santa pelos pobres e doentes, o sofrimento que passou na
defesa destes, a sua expulsão do castelo em que morava devido a esta opção,
após a morte do seu marido, fatos que delineiam a conduta moral e social da
Santa Isabel.
A opção pelos pobres e pela justiça social
colhida da história de Isabel orienta toda a filosofia de trabalho e
organização da paróquia da Santa Isabel até hoje. Os religiosos declaram que,
na oportunidade da fundação da paróquia, a comunidade que procurava uma santa
para ser a sua padroeira fez a sua opção pela Santa Isabel justamente pelo fato
de que estas características da sua trajetória de vida eram significativas para
esta comunidade formada por pessoas muito humildes, pobres e sofredoras devido
a uma série de carências econômicas e sociais. Perguntados sobre os detalhes
desta escolha, os religiosos comentam que a opção pode ter sido realmente
definida muito mais por influência da vivência dos párocos da época que eram
europeus e traziam na bagagem um pouco da história da Isabel da Hungria do que
pela ansiedade popular de possuir uma padroeira com quem se identificassem, uma
vez que os primeiros moradores da região não tinham contato com este tipo de
informação.
Na sua imagem
esculpida em gesso presente na Igreja Matriz da Santa Isabel merece destaque
alguns ornamentos, cores e formas. As cores predominantes na sua vestimenta são
o vermelho, o azul e o verde e o dourado da sua coroa. Em uma mão ela carrega
um cesto com rosas e na outra, uma espécie de bastão. Segundo o Padre Carlos,
em determinada situação, Santa Isabel, ainda rainha da Hungria, havia pegado um
cesto de pães para distribuir entre os pobres em uma atitude que contrariava a
sua família devido a situação social que ocupava. Ao distribuir os pães, as
suas cunhadas e sua sogra surprenderam-na, tentando impedila de tal ato. Isabel,
tentando simular a sua investida, evitando assim o conflito com sua família
haveria realizado o seu primeiro milagre, através da transformação dos pães em
rosas.
1.2 NOSSA SENHORA DA
IMACULADA CONCEIÇÃO[2]
“Se
o Brasil nasceu à sombra da Cruz, organizou-se, cresceu, prosperou amparado
sempre pela mãe santíssima, venerada ternamente e invocada sob numerosos
títulos, cada qual mais belo e expressivo ... Entre os títulos marianos
prevalece o da Imaculada, que exorna, com muitos secundários, mais de 350 dos
templos principais. E era natural. Desde os primórdios floresceu em Terras de
Santa Cruz a devoção à Imaculada Conceição de Maria, implantada pelos
descobridores.”
Papa
Pio XII numa alocução de 1954
A tradição que
envolve a cultuação à Imaculada Conceição de Maria Santíssima está intimamente
relacionada a cultura portuguesa e aos colonizadores portugueses que aportaram
no Brasil na época do descobrimento. Em 1646 o Rei D. João IV consagrou
Portugal e todos os seus domínios (inclusive o Brasil) a Nossa Senhora da
Conceição. Alguns teólogos afirmam que o culto à Imaculada Conceição faz parte
das mais antigas e veneráveis tradições brasileiras e que desde o seu
nascimento, o Brasil vive sob o manto e o patrocínio de Maria Imaculada.
Nos primeiros
séculos da história da igreja, o privilégio da Imaculada Conceição era
tranqüilamente e sem contestações professado de modo implícito, no paralelo,
com muita freqüência estabelecido pelos padres da igreja, entre Eva e Maria.
Assim como a
antiga Eva saíra pura e imaculada das mãos divinas, assim também a nova Eva,
Maria, deveria ter saído das mãos do criador, pura e imaculada. Isto é tanto
mais razoável quanto a primeira Eva haveria de legar a morte a toda a sua
descendência, enquanto a Segunda Eva daria a todos os seus filhos o oposto, ou
seja, a vida. Seria contraditório que tivesse incorrido na culpa de Eva
precisamente aquela que foi ordenada por Deus para a reparação de tal culpa.
Também era
freqüente, nos padres da igreja, tanto do Oriente quanto do Ocidente, a
proclamação da absoluta pureza e santidade de Nossa Senhora e nessa proclamação
estava, sem dúvida, implícita a verdade da Imaculada Conceição, pois a mancha
do pecado original não poderia compaginar-se com tão ilibada pureza e tão
exímia santidade.
Nossa Senhora da
Conceição é conhecida também como Patrona do Exército Brasileiro. A “Canção do
Soldado”, hino do exército, era um antigo cântico em louvor da Imaculada.
Segundo narração do General Dionísio Cerqueira, em suas memória sobre a Guerra
do Paraguai, que na véspera da Batalha de Tuiuti (23 de maio de 1866) “ao toque
de recolher, às oito da noite, todos os corpos formaram. Depois da chamada, os
sargentos puxaram as companhias para a frente da bandeira e rezou-se o terço.
Alguns praças, os melhores cantores, entoaram em voz vibrante, sonora e cheia
de sentimento, a velha canção do soldado brasileiro: Ó Virgem da Conceição,
Maria Imaculada, vós sois a advogada dos pecadores, e a todos encheis de graça
com a vossa feliz grandeza. Vós sois dos céus, princesa, e do Espírito
Santo, Esposa. Maria mãe de graça, mãe
de misericórdia, livrai-nos do inimigo e protegei-nos à hora da morte, Amém.”[3] Durante a Guerra do
Paraguai, todas as noites o exército brasileiro se perfilava e, em conjunto,
rezava o terço, sendo acompanhado pelas bandas de música.
Nossa Senhora da
Conceição é também padroeira do Seminário Maior de Viamão e nomina a sua
instituição de ensino: Faculdade de Filosofia Nossa Senhora da Imaculada
Conceição (FAFIMC). Esta é a única instituição de ensino superior do município,
situa-se na margem da RS-040 (parada 48) e traz na parte superior do prédio uma
grande imagem da santa na cor branca, juntamente a um grande relógio. Durante a
noite, para quem transita pela RS, a imagem da santa é bastante visível e chama
bastante a atenção das pessoas que por ali passam devido a sua beleza,
imponência e a um bom sistema de iluminação que facilita a visualização mesmo a
quilômetros de distância da imagem.
Na sua imagem
esculpida presente na Igreja Matriz de Viamão
merece destaque alguns ornamentos, cores e formas. As cores predominantes na
sua vestimenta são o vermelho, o azul e
o dourado da sua coroa. Tem as mãos postas e está coberta por um vasto manto
bastante colorido.
2. OS FESTEJOS POPULARES RELIGIOSOS
PESQUISADOS
As principais
atividades da festa da padroeira da Santa Isabel são realizadas na semana que circunda a data da morte da
Santa, 17 de novembro, porém os festejos mais gerais acontecem durante todo o
mês de novembro. Isto acontece em função de que os festejos são divididos em
duas programações, uma programação chamada de “Social” e outra denominada de
“Religiosa”. O centro dos eventos é a própria paróquia e a organização fica a
cargo de uma comissão de organização chamada de “festeiros” composta por 30
pessoas na oportunidade em que acompanhamos. Nos meses que antecedem o evento,
os festeiros fazem diversas reuniões na igreja antecipando todos os
procedimentos necessários para a realização da festa da padroeira. Estas
reuniões e a organização como um todo são realizadas em parceria com as
Comunidades Eclesiais de Base (CEBES) e as capelas localizadas nas vilas próximas ao núcleo
central da Vila Santa Isabel ligadas à igreja matriz.
A programação
religiosa tem por objetivo reunir os devotos da santa mais ligados as
atividades regulares da paróquia em torno das missas especiais, grupos de
orações, procissões, entre outras celebrações religiosas. Na oportunidade em
que acompanhamos as atividades da festa, observamos que esta programação
religiosa iniciou no dia quinze de novembro com uma missa onde estiveram
presentes todas as comunidades religiosas ligadas à Igreja Matriz de Santa
Isabel e o tema era em “Louvor e Partilha das Santas Missões”. O encerramento
das atividades do programa religioso aconteceu no dia vinte e um de novembro,
denominado como o “Domingo da Padroeira”, com missa temática, “Sede Santos como
vosso Pai é Santo”, procissão e uma missa solene após a procissão com o tema “A
Exemplo de Santa Isabel caminhamos à Santidade”. Talvez um dos momentos mais
esperados desta programação tenha sido a procissão luminosa que aconteceu no
dia dezenove de novembro com saída da Igreja Matriz em direção à Comunidade
Scalabrini, uma das dez comunidades religiosas ligadas à matriz que localiza-se
na Vila Luciana, proximidades da Vila Santa Isabel. Nesta oportunidade a fé e a
adoração da santa sai do universo paroquiano e ganha a publicidade popular
pelas principais ruas da vila, com uma grande adesão dos moradores que não
estão ligados diretamente a igreja, fiéis e seguidores mais freqüentes.
A programação
social tem por objetivo reunir a comunidade de um modo geral, tentando
propiciar a possibilidade de participação daqueles agentes sociais que não
estão ligados mais diretamente as atividades de cunho estritamente religioso.
É a oportunidade para que as
personalidades públicas como o prefeito da cidade e demais autoridades
públicas, empresários, etc. participem dos festejos populares religiosos
emprestando o seu prestígio social para o evento e, ao mesmo tempo,
aproveitando um espaço público de grande adesão da comunidade local para
divulgar as suas idéias, externar as suas posições através de um pronunciamento
oficial ou mesmo atuando nos bastidores da festa. Na oportunidade em que
acompanhamos as atividades da festa, observamos que esta programação social
iniciou no dia seis de novembro com um jantar dançante com música ao vivo, onde
foi servido churrasco, galeto, feijão mexido, abóbora caramelada e buffet de
saladas, além de outros pratos quentes. O encerramento das atividades do
programa social aconteceu no dia vinte e oito de novembro, com a realização de
um chá de confraternização onde foi realizado um concurso de escolha da Rainha
Infantil da Festa.
Um dos momentos
mais esperados desta programação para uma grande parte de comunidade carente da
região talvez seja o “Almoço da
Solidariedade”. No dia quatorze de novembro aconteceu um almoço especial
oferecido para pessoas pobres e carentes da comunidade da Santa Isabel. Esta é
uma atividade impregnada de significado religioso defendida pelos padres e
responsáveis pela paróquia que afirmam: sendo a Santa Isabel protetora e
zeladora dos pobres e doentes, este momento dos festejos é voltado
especialmente para aquelas pessoas que não possuem recursos para participar dos
outros momentos da festa onde são cobrados ingressos, convites, etc. Para ter
acesso a este almoço, as pessoas interessadas procuram com antecedência a
secretaria da igreja, declarando a sua situação de carência, para serem
cadastradas, recebendo uma ficha que deve ser apresentada no dia do almoço.
Paralelo ao “Almoço da Solidariedade”, acontece o “Almoço Festivo da Padroeira”
no “Domingo da Padroeira”, domingo mais próximo no calendário ao dia da santa,
17 de novembro. Este é o ponto alto da programação social e aconteceu no dia
vinte e um de novembro na oportunidade em que acompanhávamos as festividades do
ano de 1999. O cardápio básico é composto por galeto e buffet de saladas e
pratos quentes. Além do almoço festivo, oportunidade em que o salão paroquial
ficou inteiramente tomado pela comunidade com a presença de, aproximadamente,
500 pessoas, nesta mesma oportunidade aconteceram brincadeiras do tipo
“Pescaria”, realização de rifas promocionais e sorteio de brindes. No almoço
estiveram presentes autoridades do município como o prefeito municipal,
vereadores e empresários. Após ao almoço aconteceu uma “domingueira”, baile ao
estilo gaúcho com presença de músicos tradicionalistas que animaram a festa até
o início da noite de Domingo.
“...
havia um povo que, no final do ano, lá pelo mês de dezembro, reunia-se para
louvar e agradecer o amor de Deus pai manifestado em Nossa Senhora , que em sua Imaculada Conceição
trouxe salvação ao mundo. Juntos eles revezavam, refletiam e celebravam ! Com
alegria e fé, foram passando essa tradição adiante ...
Agora
no ano de 1999, você e sua família estão convidados para participar da novena e
da festa de Nossa Senhora da Conceição. Será um momento de encontros,
reencontros e, sobretudo, de muita fé. Venha ! Sua presença é muito importante
para continuarmos esta história ! ”
Texto divulgado no panfleto chamando a
comunidade para a festa da Nossa Senhora da Imaculada Conceição
As principais
atividades da festa da padroeira de Viamão são realizadas no mês de dezembro. Os festejos possuem uma
programação geral com atividades religiosas e sociais. O centro dos eventos é a
própria paróquia e a organização fica a cargo de uma comissão de organização
chamada de “festeiros” composta por 27 pessoas na oportunidade em que
acompanhamos. Nos meses que antecedem o evento, os festeiros fazem diversas
reuniões na igreja antecipando todos os procedimentos necessários para a
realização da festa da padroeira. Estas reuniões e a organização como um todo
são realizadas em parceria com as capelas localizadas nas vilas próximas ao
núcleo central da igreja matriz de
Viamão.
A programação
observada iniciou no dia 29 de novembro e se estendeu até o dia 8 de dezembro.
No período de 29 de novembro a 07 de dezembro foi realizada uma Novena em
louvor à Nossa Senhora da Conceição. Cada dia da novena foi dedicado a um tema
específico do tipo: “Maria, Mãe fiel e corajosa”, “Maria Mãe dos caminhantes”,
“Maria, rainha das famílias”, ... O tema central da festa do ano de 1999 foi:
“Com Maria rumo ao Novo Milênio”. Entre os dias 1º e 3 de dezembro aconteceram apresentações artístico-culturais na frente
da igreja, atividade que envolveu um grande número de viamonenses,
especialmente no dia 03 de dezembro, oportunidade na qual a Orquestra Sinfônica
de Porto Alegre (OSPA) se apresentou pela primeira vez na cidade de Viamão.
Para a realização desta atividade houve uma espécie de parceria entre a
paróquia e a Prefeitura Municipal de Viamão, através da Secretaria Municipal de
Cultura. No dia 5 de dezembro ocorreu o almoço festivo à Nossa Senhora da
Conceição no salão paroquial da matriz, reunindo cerca de 300 pessoas. Entre
elas, estiveram presentes representantes dos poderes público executivo e
legislativos, entre outras autoridades. O prefeito municipal, o presidente da
Câmara de Vereadores e demais integrantes dos poderes executivo e legislativo
prestigiaram o evento. O cardápio principal do almoço era composto de churrasco
e buffet de saladas. Um comunicador, através de um sistema de som com
alto-falantes distribuídos no entorno da igreja, fazia o trabalho de emissão de
recados e animador da festa. Após ao
almoço foi realizada uma missa e uma procissão. No encerramento das
festividades, dia 8 de dezembro, houve novamente um almoço comemorativo, uma
missa e uma procissão luminosa pelo centro da cidade de Viamão.
A programação
pesquisada e observada que tem por objetivo reunir a comunidade de um modo
geral, tentando trazer um bom número de viamonenses a participar das
festividades da padroeira merece um destaque. Pelo fato de que as grandes vilas
populares de Viamão e, portanto, a maior densidade da massa populacional
encontram-se nas margens da RS 040, especialmente no trecho entre as paradas 32
e 42, a
adesão destes viamonenses nas festividades da padroeira realizada no centro da
cidade não acontece de uma forma expressiva. Agrega-se a estes aspectos
geográficos e populacionais uma “Cultura” de deslocamento do tipo pendular
desta população citada em direção ao centro de Porto Alegre e não ao centro de
Viamão.
Segundo relatos
dos religiosos entrevistados, a Festa do Divino Espírito Santo que acontece
anualmente no centro de Viamão talvez tenha uma expressão e uma adesão popular
maior que as festividades realizadas em torno da padroeira da cidade. Esta
festa possui características semelhantes a festa da padroeira, especialmente
devido a sua origem cultural de cunho luso-brasileira.
3. ALGUNS DADOS HISTÓRICOS
SOBRE AS COMUNIDADES
EM DEBATE
Nesta parte do
trabalho, trazemos alguns dados históricos que remontam ao início do povoamento
das comunidades que estamos investigando. Cabe destacar as diferenças entre os
períodos histórico de fundação da Paróquia do Centro de Viamão em contraste com
o período histórico que define a fundação da Paróquia da Santa Isabel.
Segundo alguns historiadores como Clóvis
Silveira de Oliveira, o surgimento da “Freguesia de Viamão” está ligada às
viagens que João de Magalhães faz por volta de 1714 por orientação do então
Governador do Rio de Janeiro D. Francisco de Távora que pretendia “fazer
vistorias nos lados do sul”[4]. O povoamento do extremo sul do Brasil
acontece, segundo o historiador Walter Spalding, com a chegada de Dona Ana da
Guerra, irmã do Capitão-mor Francisco de Brito Peixoto, fundador de Laguna e um
dos grandes tropeiros da época, mais seu genro, João de Magalhães, que
estabeleceram-se nos “Campos de Viamão” [5].
Ali, em terras de Dona Ana, foi erguida uma capelinha em louvor de Nossa
Senhora da Conceição e Santana e, ao seu redor, logo se formaria uma pequena
localidade que ficou conhecida por Lombas de Santana[6]. Neste momento se materializa, através
da capela, o primeiro ato efetivo de adoração à Nossa Senhora da Imaculada
Conceição.
Em meados de 1740, fato semelhante provocaria o
surgimento de um outro povoado. Francisco Carvalho da Cunha doaria uma légua de
terra para a construção de uma outra capela, a de Nossa Senhora da Conceição do
Viamão, que logo se transformaria em uma igreja. Esta segunda capela chegou a
categoria de igreja e permanece no local onde ainda hoje encontramos a Igreja
Matriz de Viamão. Em volta desta igreja
fundou-se um grande povoado, povoado de
Viamão, que já em 1747 era elevado à categoria de freguesia.
Já relacionando
a ocupação do centro de Viamão com a sua periferia, é interessante destacar um
outro dado que remonta à dinâmica social e espacial desta época e que sugere um
tipo de interpretação que aqui empenhamos. Na sua relação com o mundo exterior,
o povoado de Viamão estava distante do mar (cerca de 120 Km ) e sem possibilidade
de erguer qualquer tipo de porto na sua costa,
só possuía comunicação com o restante do Brasil por terra. Porém, em
determinado momento, descobriram, a mais ou menos 60 Km de distância da sede do
povoado, uma grande lagoa denominada de “Guaybe” pelos indígenas. Este fato
levou os habitantes de Viamão a criarem um porto naquele local, o Porto de
Viamão. Este mesmo porto passaria a ser denominado Porto do D’Ornelas ou Porto
do Dorneles, quando da radicação de Jerônimo de Ornelas (mais seus agregados e
parentes) naquele mesmo local e de Porto do Dionísio, quando utilizado como
escoadouro da estância de Dionísio Rodrigues Mendes (Fundador da Capela de
Nossa Senhora de Belém, hoje Belém Velho). A chegada dos casais açorianos, em
1752, marca o início da colonização do
então Porto de Viamão (nome dado a um ancoradouro nos fundos da Sesmaria de
Jerônimo de Ornellas, onde está agora a Praça da Alfândega). Instalados em
casas de palha no local onde encontramos hoje a atual Praça da Alfândega, os
casais vindos das Ilhas dos Açores inauguravam o que viria a ser “um arraial
bastante fértil”. [7]
A primeira
ocupação do trecho inicial no eixo “Porto de Viamão” – “Freguesia de Viamão”
(Rio Guaiba até a atual divisa dos Municípios de Viamão e Porto Alegre)
acontece no momento em
que Jerônimo de Ornelas se estabelece no Porto de Viamão e
escolhe o Morro Santana para construir a sede da sua sesmaria (Segundo Oliveira
nas imediações da atual Escola de Agronomia da UFRGS). Nas medidas atuais, essa
sesmaria teria uma área de aproximadamente 14.000 hectares ,
abrangendo assim a atual área da Santa Isabel [8].
Contudo, uma ocupação mais efetiva observada na área da Santa Isabel remonta
aos anos 50 e 60 do século XIX foi uma
das primeiras a sofrer a ocupação urbana característica da segunda metade deste
século no município. Segundo a nossa pesquisa, percebemos que até ao final da
década de 40, toda esta área, situada a Leste do Morro Santana, num extenso
vale, era rural, compreendida por várias chácaras e tambos de leite. O primeiro
loteamento a surgir foi denominado “Lomba do Sabão”, inscrito no Cartório de Registro de Imóveis do Município
em 07 de janeiro de 1944. A
ocupação efetiva dos altos da atual Avenida Liberdade (Via do Trabalhador), no
entanto, só ocorreu a partir de 1953, com o loteamento “Nossa Senhora
Medianeira” .
O referido
loteamento surgiu no lugar onde se situava a chácara do agrimensor Francisco Hormes, que adquiriu a propriedade
de Breno Alves (morador de Porto Alegre). Hormes veio de Taquara e como devoto
de Nossa Sra. Medianeira, ao fazer o loteamento, reservou um pedaço de área
verde para a construção de um santuário, a primeira capelinha católica da região,
localizada na rua Dr. Nilo. Desta forma, inicia-se a ocupação urbana do
território, surgindo também os equipamentos de infra-estrutura. Ao lado da área
reservada à Capela foi instalado uma bomba d’água com poço artesiano para o
abastecimento, identificada pela população como “Bica”, cujo vertedouro ainda
existe bem como a referida bomba d’água. Com o passar dos anos, o local foi
abandonado e ocupado por moradias irregulares. Somente na década de 80 é que
membros da comunidade católica reiniciaram o processo de utilização da Capela,
que já foi ocupada por uma escola que incendiou e mais tarde foi instalado no
local um posto policial. Atualmente a área é utilizada por um Clube de Mães.
A Igreja da
Santa Isabel[9]
teve sua primeira sede onde hoje localiza-se a Escola Estadual Walt Disney e o
centro Espirita Caminho da Luz, confluência das ruas Medianeira e Lisboa (Ver
mapa anexo). Sobre as razões que ocasionaram a mudança do local da igreja,
existem duas afirmativas recorrentes nas falas dos nossos informantes. A
primeira indica que os padres perceberam que havia um maior fluxo de pessoas
nas imediações da atual Avenida Liberdade,
resolvendo, portanto transferi-la para onde ela está atualmente. A
Segunda depõe sobre uma calamidade
acontecida em torno de um grande vendaval que destruiu a igreja localizada na
confluência das Ruas Lisboa e Medianeira e esta seria uma das razões do
deslocamento do centro religioso para um outro local, em função de existir uma
avaliação que a atual localização não era mais viável para o centro religioso.
Existe um questionamento popular sobre a posse do primeiro sino da Igreja da
Santa Isabel que, após ao vendaval, haveria sido transportado, juntamente com o
resto dos materiais de construção da igreja para a comunidade Santo Agostinho
na Vila Augusta. O sino que era da Santa Isabel, ainda está, segundo depoimento
de moradores entrevistados, na igreja da Vila Augusta.
4. ANÁLISE
COMPARATIVA ENTRE AS
FESTAS POPULARES RELIGIOSAS
PESQUISADAS
A comparação
analítica que realizamos entre a festa da padroeira de Viamão com a festa da
padroeira da Santa Isabel nos permite
traçar alguns eixos distintivos entre estes dois eventos populares viamonenses.
A festa da
padroeira de Viamão, Nossa Senhora da Imaculada Conceição, possui um caráter
mais oficial a nível da municipalidade local, quando comparada a festa da
padroeira da Santa Isabel, uma vez que trata-se da festa da padroeira ca Cidade
de Viamão, independente da maior ou menor adesão de seus munícipes. Esta
oficialidade é observada claramente, por exemplo, diante da parceria entre a
paróquia da matriz de Viamão e o poder público municipal que entra como
patrocinador direto e co-organizador dos eventos festeiros da matriz como
ocorreu em 1999, onde houve todo um engajamento da prefeitura, através da sua
Secretaria Municipal de Cultura, no sentido de viabilizar as apresentações
artísticos-musicais durante os festejos, especialmente a apresentação da
Orquestra Sinfônica de Porto Alegre. Neste sentido, a festa de Santa Isabel tem
um caráter mais comunitário e popular e menos oficial, no que concerne na sua
relação com a administração pública local. Os agentes sociais que atuam na sua
organização são mais informais, oriundos das camadas mais populares das
redondezas da paróquia, emprestam uma originalidade de festa popular de cunho
religioso típico de cidades mais interioranas. Ao passo que a festa da
Imaculada conceição não contando com uma adesão popular das mesmas proporções
da Santa Isabel, possui um caráter mais formal e institucional, pois conta com
o apoio profissional de técnicos da administração pública local que colabora na
sua organização. Portanto, temos a festa da Imaculada Conceição com uma adesão
popular muito menor do que a festa da Santa Isabel. Segundo a nossa perspectiva
de análise social e diante da realidade observada em campo, isto acontece
devido ao contexto social em que encontram-se estas duas paróquias. A paróquia
de Santa Isabel encontra-se em meio a cerca de 15 vilas populares onde a população conta com uma renda média que não
ultrapassa dois salários mínimos, nível de escolaridade que circunda as
iniciais séries do 1º grau, enfim trata-se de uma comunidade carente
em todos os sentidos. A paróquia da Matriz de Viamão encontra-se em uma área
nobre da cidade, um dos centros históricos de maior expressão da região
metropolitana, com uma população de alto poder aquisitivo, atendida na maior
parte de suas necessidades de estrutura físico-social como saneamento, rede de
água e eletricidade, sistema bancário e de serviços públicos, etc.
Analisando o
material de divulgação das festa religiosas em debate (Ver anexo 6), observamos
alguns detalhes que devem ser aqui lembrados. O material de divulgação da festa
da padroeira de Santa Isabel é bem mais simples, não contendo lista de
empresários colaboradores, se comparado ao material de divulgação da festa da
Imaculada Conceição que traz uma lista extensa de apoios de empresários locais.
Esta observação reforça a tese anteriormente exposta, no que diz respeito ao
nível de popularidade dos dois eventos. O material da Santa Isabel representa
ter um custo financeiro menor do que o produzido pela matriz de Viamão que
possui um colorido mais rico e expressivo do que o anterior. Neste materiais é
interessante destacar também que no chamamento da festa de Nossa Senhora da
Imaculada Conceição a imagem central é a do templo religioso e não a da santa.
Isto não acontece no material de chamamento para a festa de Santa Isabel que
traz uma imagem com baixa qualidade gráfica de um busto da santa e não a do seu
templo. A constatação direta para esta opção se dá pelo fato de que o templo da
Conceição é um prédio histórico construído no século passado, tombado pelo
Instituto do Patrimônio Histórico Nacional, sendo por isso muito procurado e contemplado
por pessoas que diariamente o visitam com objetivo de simples contemplação ou
mesmo para fins de pesquisa e análise científica.
Para concluir
esta comparação analítica, não poderíamos de dar destaque para as origens
culturais e étnicas fundadoras das duas igrejas que tem reflexo direto nas
festividades por elas organizadas. Fica bem claro para nós a origem
luso-brasileira na fundação da Igreja da Nossa Senhora da Imaculada Conceição,
ligada aos traços dos primeiro colonizadores que aqui chegaram nos séculos
passados. Já em 1549, quando D. João III, Rei de Portugal, determinou enviar ao
Brasil o Governador-Geral Tomé de Sousa, e com este vieram o Padre Manuel da
Nóbrega e os primeiros jesuítas, temos a nominação desta santa em um dos três
navios de Tomé de Souza: o Salvador, Nossa Senhora da Ajuda e Nossa Senhora da
Conceição. Foram essas as invocações das três primeiras igrejas edificadas na
cidade do Salvador, onde Tomé de Souza fixou a sede do seu governo: São
Salvador (que deu nome à capital); Nossa Senhora da Ajuda e Nossa Senhora da
Conceição da Praia que ficava então nos arredores e hoje fica dentro da cidade.
No caso das origens fundadoras da Igreja de Santa Isabel, percebemos que a
influência que incide sobre a sua fundação remete para um outro período
histórico bem mais recente, décadas de 40 e 50 do século XIX e que a
descendência cultural e étnica também possuem uma outra matriz. Foram
imigrantes europeus[10] oriundos da Itália,
Alemanha e Suécia os primeiros fomentadores do projeto de se ter a comunidade
religiosa reunida em torno de um templo católico. Diante da necessidade de se
eleger a padroeira da localidade, sederam a alternativa trazida pelo pároco da
época que era de origem sueca e propôs que se elegesse a Santa Isabel da Hungria[11], em função das suas
características populares e assistenciais. Estes imigrantes viviam em uma
realidade social bastante difícil, diante da necessidade de fundar de fato toda
uma estrutura e um aparato de cidade que não possuíam, frente a uma série de carências
econômicas optaram pela sugestão do pároco Guilherme Span, primeiro padre desta
paróquia.
CONCLUSÃO
Os sistemas
simbólicos (alimentares, de vestuário, publicitários, religiosos, etc.) possuem
processos dinâmicos de significação que lhe atribuem sentido, segundo o
contexto social e cultural[12] em que estão inseridos.
Esta é um eixo conclusivo deste trabalho que realizamos, segundo a orientação
das teorias da cultura. Ou seja, as festas populares religiosas pesquisadas estão
inseridas em um sistema simbólico de cunho religioso com processos próprios de
significação construídos conforme o contexto social em que estão inseridas. A
exemplo do que nos ensina Sahlins existe uma razão cultural em nossos hábitos
alimentares, de vestimenta e de cunho religioso que define a nossa relação com
os elementos inseridos dentro destes sistemas de significado. Alexandre Bergamo
destaca um pressuposto muito próximo
deste que citei de Sahlins quando afirma: “O Sentido da moda está em que a
roupa significa algo, e esse significado, além de diferir em função do grupo
pesquisado e de sua posição no interior da estrutura social, imprime e
direciona diferentes condutas para esses diversos grupos sociais.” (BERGAMO,
1998)
Ao propor o
relacionamento duas festas populares
religiosas das padroeiras de Santa Isabel e de Viamão, não havíamos travado
contato com o trabalho de Geertz – Os Usos da diversidade – mas até parece que
já havíamos, pois na afirmativa “Imaginar diferenças continua sendo uma ciência
da qual todos nós temos necessidade” (GEERTZ, 1999) está contida toda a nossa
intenção e a nossa necessidade de refletir sobre as prováveis diferenças entre
os dois contextos sociais aqui expostos. Para além das criações grotescas e
desconexas com as realidades sociais devidas, esta necessidade de que fala
Geertz está intimamente ligada a um pressuposto bachalardiano. Esta percepção
do poder da imaginação é um tema essencialmente bachelardiano e, segundo o meu
ponto de vista, deve ser assim encarado. Bachelard vai propor a fenomenologia
da imaginação, conjugada com uma fenomenologia da imagem poética, destacando “a
imagem vem antes do pensamento” (No sentido de uma arqueologia das imagens).
Tomando a casa como exemplo, Bachelard mostra como a imaginação é capaz de
sobrepujar as percepções do real: “Ao seu valor de proteção, que pode ser
positivo, ligam-se também valores imaginados, e que logo se tornam dominantes.”
(Bachelard, 1988)
A nossa hipótese
inicial de trabalho, no que concerne as diferenças sociais entre as duas
comunidades estudadas, se confirmam no encerramento desta monografia. Através
da análise dos festejos populares em destaque, percebemos que as diferenças na
ocupação do território, bem como a distinta formação étnica e social das áreas avaliadas
se refletem hoje na organização das comunidades religiosas e nas dinâmicas
populares e sociais de um modo geral presentes nestas localidades. Percebemos,
portanto que “o significado é socialmente construído” (GEERTZ, 1999), segundo a realidade e o contexto social em que estão
inseridos. Os esquemas de significação social referentes a Santa Isabel diferem
dos esquemas de significação social do restante de Viamão devido aos diferentes
contextos histórico-sociais que estas comunidades se fundaram e se construíram.
Os dados históricos e etnográficos demonstraram que a “diferença imaginada” por
este pesquisador, segundo os resultados deste trabalho, foi verificada nos
dados colhidos em campo.
Para finalizar esta conclusão, gostaria de destacar a importância
que a antropologia tem neste trabalho de relação com as diferenças sociais,
diante da sua proposta de sempre relativizar os nossos pré-conceitos no
processo de construção e de investigação dos nossos objetos de estudo. Dentro
da área antropológica, a etnografia merece ser lembrada, a exemplo do que
Geertz avalia sobre os usos da etnografia: “Ela é a grande inimiga do
etnocentrismo, do confinamento de pessoas em planetas culturais onde as únicas
idéias que precisam invocar são ‘aquelas em torno daqui’, não porque assuma que
as pessoas são todas iguais, mas porque sabe quanto elas não o são e como são
incapazes, ainda assim, de se desconsiderarem mutuamente. Mesmo que um dia
tenha sido possível e mesmo que hoje provoque saudades, a soberania do familiar
empobrece a todos; (...) A Etnografia, ou uma delas em todo caso, é sem dúvida
fornecer, como fazem a história e as artes, narrativas e cenários para
refocalizar a nossa atenção.” (GEERTZ, 1999)
BIBLIOGRAFIA
1. BACHELARD,
Gaston. A Poética do Espaço. São
Paulo: Martins Fontes, 1993.
2. BERGAMO,
Alexandre. “O Campo da Moda”.
Revista de Antropologia, vol. 41, No. 2, 1998.
3. COELHO,
Marcos de Amorim. Geografia do Brasil.
São Paulo: Ed. Moderna, 1990.
4. GANDIM,
Jairo. História da Paróquia da Santa
Isabel. Mimeo. Viamão: 29 de abril de 1997.
5. GEERTZ,
Clifford. A Interpretação das Culturas.
Rio de Janeiro: Zahar Ed. , 1978.
6. ---------------------.
“Os Usos da Diversidade”. Porto Alegre: Ed. Da UFRGS. Horizontes Antropológicos, No. 10, 1999, p. 13-34
7. MACEDO,
Francisco Riopardense de. Porto Alegre:
origem e crescimento. Porto Alegre: Ed. Sulina, 1968.
8. OLIVEN,
Ruben George. “Nação e Tradição na Virada do Milênio.” In. A Parte e o Todo: a diversidade cultural no Brasil-Nação. Porto
Alegre, Vozes, 1992, p.13
9. ORTIZ,
Renato. “Modernidade-Mundo e identidades.” In: Um Outro Território. Ensaios sobre a Mundialização. São Paulo. Olho
D’Água, s/d. p. 67-89
10.
-------------------. “Uma Cultura
Internacional-Popular”. In. Um Outro
Território. Ensaios sobre a mundialização. São Paulo: Olho d’água, s/d, p.
67-89.
11.
SAHLINS,
Marshall. “La
Pensée Bourgeoise.” In. Cultura e Razão Prática. Rio de
Janeiro: Zahar, 1979.
12.
SANTOS, Armando Alexandre dos. O Brasil sob o manto da Imaculada. São
Paulo: Ed. Artpress, 1996.
13.
VELHO, Gilberto. O Desafio da Cidade. Novas Perspectivas da Antropologia Brasileira.
Rio de Janeiro: Ed. Campus, 1980.
ANEXOS
As imagens que compõe os anexos estão disponíveis no
Site
http://www.panoramio.com/user/5198529
http://www.panoramio.com/user/5198529
[2] “Virgem
bendita, que pela vossa Conceição anunciaste o próximo despontar do Divino Sol,
sêde, nós vos rogamos, a luz do nosso espírito, alegria do nosso coração, a
nossa defesa nos perigos, sustento nas tentações, auxílio naquelas virtudes que
vos tornaram tão admirável aqui na terra e tão gloriosa no céu.” Oração à Imaculada Conceição
[3]
Reminiscências da Campanha do Paraguai, Editora da Biblioteca do Exército, Rio
de Janeiro, 1980, p.155.
[4] Grifo do
historiador citado.
[5] Campos
de Viamão: nome genérico utilizado na época para referir toda a área que
conhecemos hoje no entorno da Cidade de Viamão (Palmares do Sul, Águas Claras,
Tavares, Itapuã e alguns municípios da Grande Porto Alegre como Alvorada,
Gravatai, Cachoeirinha, ...)
[6]
Onde atualmente se encontra o Distrito de Águas Claras / Município de Viamão.
[7]
Expressão usada na primeira referencia registrada em documento sobre a povoação
que se formava no então Porto de Viamão, a qual se desenvolvia rapidamente para
os padrões da época.
[8]
Investigações arqueológicas do Museu Joaquim José Felizardo em parceria com o
Núcleo de História da UFRGS, apontam para a confirmação desta hipótese.
[9]
Oficialmente a primeira missa da paróquia foi rezada no dia 3 de abril de 1960
às 10 horas pelo padre Guilherme Sponn da Congregação dos Oblatos de São
Francisco de Sales.
[10] Marcos
de Amorim Coelho em Geografia do Brasil demonstra graficamente que a imigração
para o Brasil foi bastante expressiva entre os anos de 50 a 55.
[11] Segundo
relatos dos padres existe mais de uma Santa Isabel na Igreja Católica, portanto
eles reafirmam Santa Isabel da Hungria.
[12]
Trabalhamos com o conceito de cultura conforme ORTIZ em Um Outro Território.
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