ETNOGRAFIA DE RUA
Eu sou co-inventor da denominação "Etnografia de Rua", conforme trabalhada atualmente pelo BIEV/IFCH/UFRGS.
Segue abaixo duas descrições deste contexto de trabalho. Há mais peças acadêmicas comprobatórias desta afirmativa que publicarei na sequencia.
O primeiro extrato é de minha autoria e o segundo de uma colega, a época também bolsista do projeto de Pesquisa BIEV / NUPECS / NAVISUAL / PPGAS / IFCH / FRGS.
Grato pela visita.
Volte Sempre.
SAÍDA A
CAMPO - 14 / 11 / 97 (10 H 06 Min)
Inicio a minha observação
a partir do momento que me aproximo do Largo Glênio Peres e arredores do
Mercado Público de Porto Alegre. Ao passar pelo largo, observo muitas pessoas
que circulam pelo local com toda a “pressa” originária de um grande centro
urbano. Apesar da “pressa” (ou aparente falta de tempo), algumas pessoas param
e ficam observando os “artistas” que atuam naquele local. Destacaria o
tradicional vendedor de remédios naturais que com recursos diversos (aparelho
de som, animais exóticos como cobras, apelo teatral e dramático) tenta vender
os seus produtos no Largo e nas praças da cidade, sendo assim já bastante
conhecido da população; e um músico que tocava violino, utilizando alguns
recursos sonoros como caixas de som e amplificadores de som, chamando bastante
a atenção das pessoas que por ali passavam. Pude observar o Mercado Público
que, totalmente restaurado, estava enfeitado com painéis e desenhos alusivos a
Primeira Bienal do Mercosul, evento cultural que tem mobilizado muitas pessoas
na capital. Vencido o Largo, nos aproximamos da Prefeitura Municipal de Porto
Alegre, passo a me encomodar um pouco com o grande fluxo de pessoas e procuro
então me afastar das ruas mais centrais, andando em direção a Avenida Mauá,
onde se encontra o Caís do Porto, ponto que escolhemos para iniciar a nossa
etnografia de rua. A tentativa de evitar o grande fluxo de pessoas,
afastando-me das ruas centrais, e caminhando pela Av. Mauá não foi muito
promissora, pois também ali o tráfego estava complicado, principalmente em
função de alguns caminhões que descarregavam cargas nas proximidades do Prédio
dos Correios e Telégrafos prejudicando assim o transito de pedestres naquele
local. Passo a mapear os principais vizinhos do Caís do Porto, dentre eles os
Correios e Telégrafos, Secretaria da Fazenda, Delegacia Regional do Trabalho,
terminais de Ônibus coletivos urbanos de Porto Alegre e grande Porto Alegre
(Viamão) e o Instituto Santa Marta (SUS).
A travessia da Av. Mauá
(em direção ao Cais do Porto) é, sem nenhuma dúvida, “uma manobra bastante
arriscada”. Neste local o transito de veículos é muito grande e a velocidade
média dos automóveis, caminhões e coletivos também é alta em função da avenida ser
extensa (uma grande reta), larga (com 3
faixas de rolagem) e não existir nenhum dispositivo inibidor da velocidade (com
exceção do semáforo). Existe uma faixa de segurança e uma semáforo quase em
frente a entrada principal do Caís do Porto, o que, teoricamente, facilitaria a
travessia dos pedestres, no entanto nem sempre é bem assim. Os motoristas
costumam aproveitar ao máximo o tempo destinado para a sua travessia,
transitando no momento em que o sinal fica no amarelo e até nos primeiros
instantes em que o sinal aponta a cor vermelha, ou seja, propõe a sua parada e
permite a passagem para o pedestre.
Portanto, o fato de o sinal estar apontando a travessia para o pedestre
(vermelho para os motoristas) não representa uma situação de travessia segura
para este. Uma outra situação que representa bastante risco para o transeunte
que decide atravessar a Avenida é aquela em que o sinal muda quando o pedestre
encontra-se no meio ou quase no final da travessia da Avenida. Neste caso, a
pessoa precisa correr ou pular a fim de que não sege apanhada por um veículo,
pois observei que os motoristas decidem aproveitar ao máximo todos os segundos
destinados a sua travessia, não abrindo mão assim dos primeiros instantes da
exposição do sinal verde, mesmo que o pedestre ainda se encontre no meio da sua
travessia. Em resumo, atravessar uma avenida no centro da cidade não é uma
tarefa muito fácil e nem muito tranqüila, pois exige do pedestre bastante
atenção e perspicácia para perceber o momento exato que a travessia pode ser
realizada sem nenhum risco para a sua segurança pessoal. Esta situação pode ser
bem mais problemática para os idosos, crianças, gestantes e deficientes físicos
por razoes óbvias.
Vencida a travessia da
Avenida Mauá, entro no portão principal do Caís do Porto. Entrando, a minha
esquerda encontro o posto da guarda portuária, onde um cidadão faz a segurança
no local. Decidi solicitar informações sobre como deveria proceder para
realizar a visitação naquele local. Fui informado que deveria me dirigir ao prédio
da administração do Porto, onde deveria solicitar uma autorização (por escrito)
para realizar a visita. Assim procedi, subindo ao quarto andar do prédio
apontado pelo guarda, onde em contanto com a funcionária Dulce consegui a
permissão, após ter me identificado e externado o objetivo da minha visita
naquele local. De posse da autorização me dirigi ao portão de acesso do Caís,
apresentei a autorização para um outro guarda que a reteu, permitindo a minha
entrada e informando que eu poderia visitar todo o Caís em sua parte em que
estava a minha direita, e a parte que ficava a minha esquerda não poderia ser
acessada por ser “área operacional”, palavras dos funcionários para referir a
parte onde existe intensa atividade de carregadores, guindastes, carga e descarga
de containers, etc.
Neste momento, já na
beira do Rio, acontece o meu primeiro
contato com algo que me acompanharia, ou até me indicaria uma determinada
trajetória nesta visita ao Cais do Porto do Rio Guaíba, os trilhos utilizados
para a locomoção de algumas máquinas
e/ou guindastes que não saberia precisar em detalhes neste momento. Observo que
estes trilhos estão sendo usados pelos guindastes que estão a minha esquerda
(lado Operacional). Na minha direita os trilhos continuam existindo, mas parecem
não estar sendo usados para o deslocamento dos guindastes observados a minha
esquerda , fato que me leva a supor uma provável restruturação físico-espacial
deste local, pois a existência dos trilhos no meu lado direito supõe a
existência destes mesmos guindastes operando em um outro momento anterior a
este.
A minha direita, tenho o
Barco Cisne Branco ancorado com alguns homens no seu interior, parece que
trabalham e organizam algumas coisas no barco. Observando o barco estão um
grupo de alunos de uma escola que realizam uma visita ao Caís. Fotografam e são
fotografados, conversam com os seus professores sobre o barco, sobre o rio, ...
parecem estar gostando bastante do passeio, pois aparentam muita satisfação,
descontração e interesse por tudo o que vêem ao seu redor. De fato, penso que
nem poderia ser diferente, entre outros motivos, por estarmos vivendo um dia
muito ensolarado, com temperaturas altas, céu claro e uma brisa gostosa a
sombra.
O Barco Cisne Branco traz
um sistema do som que ligado, espalha pelo ambiente músicas veiculadas por uma
rádio local da cidade de Porto Alegre. Esta sonoridade traz, segundo o meu
entendimento, consigo uma sensação de descontração para as pessoas que visitam
o local.
Olhando para o interior
do rio, vejo a primeira embarcação que circula pelo local, ela traz uma carga
de areia e se desloca lentamente pelas águas calmas do Rio Guaiba. Na mesma
direção podemos observar o topo de prédio que se encontra na Ilha do Presídio,
ponto próximo ao Cais.
Ainda a minha esquerda,
após passar pelo barco Cisne Branco, encontro trabalhadores que descarregam
determinada carga de uma carreta estacionada neste local.
Vou caminhando a fim de
explorar a região que me foi permitida o acesso, ou seja, lado direito de quem
entra no portão principal do Caís do Porto. Após passar pelo primeiro armazém
B1 (no seu interior estão grande rolos de papel, e pequenos pacotes também de
papel), onde trabalhadores trabalhavam na descarga de determinado produto, me
encontro nos fundos do prédio da administração onde a bem pouco tempo estava
solicitando a autorização para realizar esta visitação. Após este prédio, passo
por um outro armazém B2 fechado e sem nenhuma movimentação de pessoas.
Estacionado neste local
duas grandes carretas com cargas que parecem ser grandes transformadores de
energia elétrica. Os caminhões que puxam a carreta são caminhões do tipo “fora
de estrada”, realmente muito grandes e
contam com sinalizações especiais que chamam a atenção para o seu excesso de
largura e comprimento (diante das dimensões normais utilizadas pelos veículos
tradicionais). Ao me aproximar de uma das carretas, vejo que a altura das rodas chegam próximo ao meu ombro. Como
tenho 1,76 m de altura, a altura das rodas chegam a, aproximadamente, 1,40 m,
são, portanto bastante expressivas.
Após as carretas, vejo
mais três supostos transformadores colocados em linha, os quais suponho estarem
esperando para serem carregados. Faixas estão colocadas nestes transformadores
estampando o nome da empresa de destino (ou de origem), COENSA.
Olhando a minha esquerda,
avisto a Ponto do Rio Guaíba (em direção a cidade de Guaíba) e algumas ilhas do
mesmo rio. Na minha frente mais um prédio, onde leio Fundação Nacional de Saúde
(Vigilância Sanitária), local onde funciona algum setor deste órgão.
Logo a minha direita
existe um portão que encontra-se aberto
e dá acesso ao Caís do Porto. Ao contrário do portão principal, neste não
existem guardas nem outro tipo de segurança que dificultem o acesso. Passo pelo
portão e começo a percorrer a rua que é paralela ao rio, no interior do muro da
Mauá, ou seja, entre o muro e o rio.
Percorrendo esta rua
chego ao primeiro (de uma série) ancoradouro na seqüência de quem vem do portão
principal do Caís do Porto em direção a cidade de Canoas. O primeiro é um
ancoradouro onde encontramos apenas alguns barcos de pequeno porte. Neste local
existe uma placa onde leio: “Grêmio Náutico União, Estação Fluvial Nilton
Silveira Neto, Embarque, Sede Ilha do Pavão”. Nas proximidades do prédio do
Palácio do Comércio, me deparo (...)
**********
Passos para a realização de uma
etnografia de rua
A etnografia da Rua da Praia objetiva um maior conhecimento
deste lugar com o intuito de realizar um ensaio fotográfico de cunho
antropológico sobre o aspecto visual do seu espaço. Para que essa tarefa venha
se realizando, foram construídas algumas formas de abordagem do espaço físico
da Rua da Praia. Ou seja, maneiras de tornar mais produtiva a observação de
espaços tão dinâmicos como este que está sendo analisado.
1
- Fragmento e Totalidade
Quando
se tem por objetivo etnografar um espaço
determinado, que neste caso constitui-se em uma rua, é importante atentar para
o fato de que este espaço não é apenas uma fração isolada de um território
maior – o bairro ou a cidade – mas faz parte deste. Na etnografia de rua,
conhecer e contextualizar as extremidades
desta, bem como daquelas que cruzam-na, pode vir a auxiliar na descrição
das situações de campo que podem ocorrer.
A
etnografia de uma rua não precisa abrangê-la, em um primeiro momento, em sua
totalidade. Mas necessário que se tenha o conhecimento geral desta rua para que
haja maior facilidade na delimitação de seus fragmentos. Ou seja, quadra(s) de uma rua podem aglomerar
características específicas que as diferenciem de outras quadras, em função das
formas de uso deste espaço, bem como de suas alterações.
No caso
da Rua da Praia, por exemplo, a etnografia foi iniciada na extremidade que a
liga à Av. Independência e seguiu-se, até o presente momento, pelas três
quadras seguintes. O entroncamento onde localiza-se esta extremidade da
Rua da Praia é fundamental para a
compreensão de alguns fatores: em primeiro lugar, é aí que está a ligação do Centro da cidade com vários outros bairros,
sendo que e é uma característica da Subida da Rua da Praia, por exemplo, que
uma série de taxis-lotações tomam conta do tráfego da rua em direção àqueles.
Em
segundo lugar, o conjunto da Rua da Praia, Av. Independência e Santa Casa de
Misericórdia conformam um espaço historicamente significativo para os trajetos
dos habitantes da cidade de Porto Alegre e que pode permitir análises
comparativas com a atualidade que é vivida dentro do espaço.
É
importante ressaltar que a opção por concentrar a observação especificamente em
três quadras da Rua da Praia deu-se somente durante o trabalho de campo, pois
estas quadras possuem algumas peculiaridades que permitem considerá-las como um
bloco específico – embora em nenhum momento isolado – dentro da própria rua.
2 - Observação do
espaço físico e sua relação com as formas de sociabilidade
Os tipos de aproveitamento de um espaço
por seus usuários são conseqüências das formas como este espaço apresenta-se.
Na etnografia urbana, as relações entre os espaços físicos e os indivíduos que
os aproveitam merecem ser observadas na tentativa de buscar informações acerca
das sociabilidades que aí se desenvolvem.
Assim, a
primeira das peculiaridades que delimitou o campo de observação na Rua da Praia
foi o fato de que estas quadras não foram recobertas com o Calçadão da Rua da
Praia. Um fator estético que pode influenciar na utilização do espaço, bem como
nas formas de sociabilidade que aí se desenvolvem: enquanto a primeira quadra
conta com o fluxo de veículos (que só ocorrerá novamente na Rua Caldas Júnior),
as duas outras ainda guardam o antigo calçamento da Rua da Praia. Pode-se
observar que na primeira quadra, provavelmente em função do trânsito, são menos
freqüentes os encontros de grupos de conversa, o quê já ocorre em número mais
expressivo nas quadras seguintes: foram observados alguns grupos de homens de
meia-idade conversando em outros pontos das três quadras etnografadas.
Ainda
com relação a observação de um espaço físico, é pertinente colocar que a
chegada em campo para a realização da etnografia da Rua da Praia
caracterizou-se, em um primeiro momento, pela confusão sentida pelo pesquisador
frente ao objeto de pesquisa. A dificuldade em perceber a rua, em pensar o quê
etnografar e, principalmente, em visualizar o que de fato existe naquele espaço
constitui-se no primeiro problema. A
estética de um prédio, por exemplo, não pode ser vista somente pelo seu estilo
arquitetônico, mas deve ser considerada por tudo aquilo que a caracteriza: fios
elétricos ao redor, cartazes colados nas paredes, rachaduras, vidros. Estes
pequenos aspectos podem nos revelar com maior precisão a situação atual do
espaço como um todo.
3. Trajetos e cruzamentos
Metodologicamente, a rua foi observada
sob duas perspectivas: os trajetos e os cruzamentos, sendo que as primeiras
visitas à Rua da Praia tiveram por objetivo caminhar circularmente pelo espaço
de cada quadra. Assim, para a observação dos trajetos costuma-se andar por um
lado da rua observando o lado oposto, mapeando no primeiro momento os prédios –
estilos, ornamentos - e quais são as atividades principais que se desenvolvem no espaço: no caso da Rua
da Praia, o objetivo principal era saber quantos e quais eram os prédios
antigos e qual o comércio que estava se desenvolvendo em um espaço de cunho
comercial tão tradicional, como o caso da Rua da Praia em Porto Alegre.
3.1
- A construção do mapa mental do pesquisador
Alguns instrumentos foram tomados como
recursos para ordenar a “confusão visual” que havia na observação Rua da Praia. O reconhecimento de cada prédio
e/ou estabelecimento comercial foi sistematizado com o auxílio de desenhos, onde procurou-se
explicitar, além destes aspectos, outros tais como as portas de entradas dos
prédios (há grandes prédios comerciais com intenso fluxo de pessoas que entram
e saem a todo o momento), ou as placas publicitárias. O recurso do desenho foi
importante, sobretudo em um primeiro momento, para impulsionar a atividade
etnográfica tornando o espaço observado mais claro e compreensível. O desenho é
um instrumento que auxilia o pesquisador a ler
o espaço, um recurso que pode proporcionar uma aproximação mais rápida entre o
pesquisador e o objeto.
No caso da etnografia de
um espaço conhecido anteriormente pelo pesquisador, pode-se dizer que é
importante que ele esteja atento para os fatos sobre os quais já tem conhecimento,
com o intuito de aproveitar estes dados e confrontá-los com a situação atual,
em função das muitas alterações que podem ocorrer no espaço. Na Rua da Praia a
simples alteração dos pontos comerciais tem reformulado o próprio uso deste
espaço, a freqüência e as expectativas de seus usuários.
3.2 - Pontos-de-vista: a mudança necessária do olhar do
pesquisador
Após o mapeamento dos trajetos de três
quadras da Rua da Praia, iniciaram-se as visitas aos cruzamentos. O primeiro
cruzamento – Rua dos Andradas com Rua Dr. Flores – mostrou-se muito mais rico
em acontecimentos em relação aos trajetos e a sua observação necessita de muito
mais tempo para completar-se.
Aqui,
foi sentida uma grande necessidade de alteração de ponto-de-vista do espaço.
Permanecer algum tempo em cada esquina do cruzamento, obervando ao redor
enriquece a qualidade de dados coletados e permite ao pesquisador que se situe
no espaço onde está inserido, atentado para cada pequeno detalhe ou
acontecimento. Desta forma, olhar repetidas vezes os cartazes colados no Rua da
Praia – shows, passeatas, oferta de professor particular – desperta interesse
para outros espaços da cidades onde esta prática não é permitida e sinaliza
outros tipos de comparações.
Com
relação à mudança de ponto-de-vista na etnografia de um espaço, durante a
análise dos trajetos procurou-se subir
nos prédios para realizá-la. A entrada nestes locais pode fornecer dados
relativos sobre as funções que um espaço desempenha e quais são os seus
freqüentadores.
No caso
da Rua da Praia, a análise dos cruzamentos revelou grandes diferenças entre
esses e os trajetos. De certa forma, pode-se dizer que a observação das pessoas
e dos acontecimentos iniciou realmente quando começaram as análises dos
cruzamentos: pessoas que chegam juntas ao lugar, conversam um pouco e se
despedem. Outras que se encontram ocasionalmente e conversam, ou os grupos que
têm neste espaço o seu local de encontro, bem como as ruas que cortam a Rua da
Praia foram percebidos apenas durante a etnografia dos cruzamentos.
O segundo cruzamento observado na Rua da Praia – Rua dos
Andradas esq. Com Rua Vigário José Inácio - foi, com certeza, o ponto mais
produtivo para esta etnografia. Neste momento puderam ser observadas com mais
precisão as relações entre aqueles que desempenham os chamados trabalhos
informais: os camelôs. Vendedores de frutas, aos lado de vendedores de roupas
ou objetos vindos do Paraguai, junto aos divulgadores de serviços (corte de
cabelo, comércio de ouro, fotografias para documentos) e vendedores de jogos de
loteria estão trabalhando no mesmo espaço daqueles que estão no interior das
lojas. Assim, as relações entre aqueles que usufruem de um determinado espaço
podem estar mais visíveis nos cruzamentos.
4.
- A prática da fotografia na etnografia de rua
Sobre o uso da câmera fotográfica na
etnografia de rua, pode considerar que há uma maior qualidade do trabalho
quando o pesquisador a introduz após uma primeira observação. Esta primeira
observação permite que alguns dados possam ser selecionados em função de sua
maior carga significativa. Além disso, em espaços como a Rua da Praia que por
vezes revelam-se adversos para a execução da prática fotográfica, as primeiras
visitas podem facilitar ao pesquisador essa seleção de elementos
significativos. Entretanto, a disponibilidade constante da câmera fotográfica
torna mais provável a captação de circunstâncias singulares que podem ocorrer.
Na etnografia urbana a fotografia é um suporte que permite
ao pesquisador, além de registrar as práticas que os indivíduos exercem em um
determinado espaço, pinçar elementos estéticos que ressaltem características da
própria ambiência que é vivida por estes indivíduos. Na etnografia da Rua da
Praia foi utilizado ainda o recurso do gravador para a captação dos sons deste
espaço.
4.1 - O ato fotográfico: implicações na
relação entre pesquisador e os indivíduos
que
habitam o espaço etnografado
A utilização de câmeras de vídeo ou
fotográficas durante a etnografia urbana certamente produz circunstâncias
peculiares junto aos usuários de um espaço; recursos que, em suma, podem os
atrai-los ou afastá-los. Essas circunstâncias devem ser avaliadas pelo
pesquisador, pois podem trazer dados importantes para a pesquisa.
No caso da etnografia da Rua da Praia há casos de pessoas,
como por exemplo um trabalhador informal que divulga cortes de cabelo e venda
de ouro, que interessado sobre o porquê
das fotografias estabeleceu um diálogo, fornecendo outras informações
sobre as questões de segurança em partes diferentes do Centro da cidade, bem
como sobre o trabalho informal de divulgação que executa, disponibilizando-se
sem constragimentos a ser fotografado enquanto distribuía seus panfletos.
Em contrapartida, o ato de registrar a partir da fotografia
ou do vídeo pode ser um incômodo em outras circunstâncias: pessoas que se
afastam ao perceberem a câmera ou mesmo a restrição taxativa com relação ao uso
desta. Um exemplo claro ocorreu quando, durante a etnografia da terceira quadra
da Rua da Praia fotografando alguns aspectos, um funcionário de uma das lojas
ao redor veio em minha direção alegando que eu deveria parar de fotografar a
loja em que trabalha (que não estava sequer sendo focalizada), pois a marca da
empresa só deveria aparecer mediante alguma autorização da mesma.
Em outra circunstância ainda, um vendedor ambulante tentou
saber porquê eu estava fotografando a rua e, depois de algum tempo de conversa
tendo eu explicado qual era meu objetivo, ele revelou que o maior problema dos
vendedores ambulantes da Rua da Praia se refere aos fiscais da Prefeitura. A
apreensão deste vendedor, talvez como de outros, era a de que eu estivesse
trabalhando para a Prefeitura. Assim, os instrumentos de registro servem, de
certa forma, como uma porta de entrada no universo em que se está interessado.
No entanto, o quê é central neste aspecto é o fato de que o
pesquisador está utilizando instrumentos de registro em espaços públicos e que
as reações dos indivíduos a isso se darão em menor ou maior grau. cabe ao
pesquisador se valer dos vínculos que estas experiências podem lhe trazer.
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