UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
INSTITUTO
DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS
CURSO
DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ANTROPOLOGIA SOCIAL
Disciplina:
Teorias da Cultura
Professor:
Ruben Oliven
Semestre 99/1
- Notas
de Aula - 9o.
Encontro: Culturas Globais
Aluno:
Jacques Jacomini
- Notas
de Aula - 9o.
Encontro: Culturas Globais
A discussão sobre a existência de culturas globais, a
extensão do processo de globalização cultural, bem como a dinâmica das fronteiras
culturais são temas bastante atuais e estão sendo discutidos por vários
pensadores contemporâneos. A temática da “produção cultural” e da “formação de
juízos estéticos” no contexto da pós-modernidade, por exemplo, são algumas das
preocupações dentro deste contexto aqui citado.
Para colaborar com esta reflexão, gostaria de citar Benjamin
que nos ensina: “Em princípio, uma obra de arte sempre foi reprodutível, mas a
reprodução mecânica 'representa uma coisa nova'”. Os avanços nas tecnologias da reprodução
eletrônica e da capacidade de armazenar imagens acentuaram consideravelmente a
circulação de informações, ou seja o nível tecnológico atual permitiu uma
aceleração extremamente grande da reprodução, armazenamento, recuperação e
emissão de obras de arte, de textos, documentos, imagens enfim de tudo o que é
produzido nos meios ópticos e eletrônicos. No entanto, isso é suficiente para
afirmar que existe uma cultura global ou globalizada, circulando virtualmente
sem respeito a qualquer tipo de fronteira ?
Segundo a leitura dos textos propostos, é possível perceber
que existem diversas respostas para esta indagação. Tentando seguir uma das
trajetórias possíveis, poderíamos afirmar que para alguns autores o que de fato
está em jogo é uma análise da produção cultural e da formação de juízos
estéticos mediante um sistema organizado de produção e de consumo mediado por
divisões do trabalho, exercícios promocionais e arranjos de marketing
sofisticados.
Harvey, por exemplo, propõe a análise de “duas questões importantes
que se destacam pela sua relevância direta para a compreensão da condição da
pós-modernidade como um todo.”
Para desenvolver a primeira questão, o autor chama Benjamim
para o debate, fala de “capital simbólico”, esclarecendo: “Em primeiro lugar as
relações de classe vigentes nesse sistema de produção e de consumo são de um tipo peculiar. Sobressai aqui antes o puro poder do dinheiro
como meio de domínio do que o controle direto dos meios de produção e do
trabalho assalariado no sentido clássico.
Um efeito colateral tem sido reavivar o interesse teórico pela natureza
do poder do dinheiro (em oposição ao de classe) e pelas assimetrias passíveis
de daí advirem (cf. o extraordinário tratado de Símmel sobre The philosophy of money).” (Pag. 312)
Para exemplificar, as estrelas da mídia, por exemplo, podem
receber altos salários, mas ser espantosamente exploradas pelos seus agentes,
gravadoras, magnatas da mídia etc. Tal
sistema de relações monetárias assimétricas vincula-se à necessidade de
mobilizar a criatividade cultural e a inventividade estética não somente na
produção de um artefato cultural, mas também em sua promoção, embalagem e
transformação em algum tipo de espetáculo de sucesso. Mas o poder monetário assimétrico não promove
necessariamente a consciência de classe.
Para desenvolver a segunda questão, Harvey renova o debate
com Benjamim, afirmando: “Em segundo
lugar, o desenvolvimento de uma produção e de um markenting culturais numa
escala global também foi um agente
primordial de compressão do
tempo-espaço, em parte porque projetou um musée
imaginaire, um clube de jazz ou uma sala de concerto na sala de estar de
todos, mas também por várias outras razões que Benjamin considerou:
“As nossas tavernas e as nossas ruas metropolitanas,
os nossos escritórios e salas mobiliadas, as nossas estações ferroviárias e as
nossas fábricas pareciam ter nos aprisionado irremediavelmente. Surgiu então o filme e explodiu esse
mundo-prisão com a dinamite de um milésimo de segundo, de modo que agora, em
meio às suas ruínas e detritos espalhados, seguimos calma e
audaciosamente. Com o close-up, o espaço
se expande; com a câmara lenta, o movimento é estendido... Evidentemente,
abre-se para a câmera uma natureza distinta da que se abre para o olho nu - no
mínimo porque um espaço inconscientemente penetrado é substituído por um espaço
conscientemente explorado (Benjamin, 1969, 236)” . (pag. 313)
Para
retomar a questão da “compressão do espaço-tempo”, citada acima e as suas
várias respostas ou possibilidades, gostaria de remeter o debate novamente para
Harvey que trabalha com 4 possibilidades:
A primeira linha de defesa é a fuga para um tipo de silencio
exaurido, blasé ou encoraçado e inclinar-se diante do sentido avassalador
de quão vasto, intratável e fora do controle individual ou mesmo coletivo tudo
é. A informação excessiva, afirma-se, é uma das melhores induções ao
esquecimento. (...)
Dentro deste campo de análise, o autor aborda a questão do
“desconstrucionismo”, afirmando que o
desconstrucionismo terminou, apesar das melhores intenções dos seus praticantes
mais radicais, por reduzir o conhecimento e o significado a um monte
desordenado de significantes . Assim fazendo, produziu uma condição de niilismo
que preparou o terreno para o ressurgimento de uma política carismática e de
proposições ainda mais simplistas do que as que tinham sido desconstruídas.
A segunda eqüivale a
uma negação voluntariosa da complexidade do mundo, e a uma inclinação a
representar essa complexidade em termos de proposições retóricas com alto grau
de simplificação. São abundantes os
slogans, da direita até a esquerda do espectro político, sendo apresentadas
imagens sem profundidade para captar sentidos complexos. Supõe-se que as viagens, mesmo imaginárias e
vicárias, ampliam a mente, mas, com a mesma freqüência, elas terminam por
confirmar preconceitos.
A terceira resposta tem sido encontrar um nicho intermediário
para a vida intelectual e política que recusa a grande narrativa, mas nem por
isso deixa de cultivar a possibilidade de uma ação limitada. Trata-se do ângulo progressista do
pos-modernismo, que acentua a comunidade e a localidade, as resistências locais
e regionais, os movimentos sociais, o respeito pela alteridade etc. Trata-se de
uma tentativa de extrair ao menos um mundo apreensível da infinidade de mundos
possíveis que nos são mostrados
diariamente na tela da televisão.
A
quarta resposta tem sido tentar montar no tigre da compressão do tempo-espaço
mediante a construção de uma linguagem e de imagens capazes de espelhá-la e,
quem sabe, dominá-la. Eu ponho os
escritos frenéticos de Baudrillard e Vírilio nessa categoria, porque eles parecem
diabolicamente inclinados a fundir-se
com a compressão do tempo-espaço e a reproduzi-la em sua própria retórica extravagante. Já vimos esse tipo de resposta
antes, mais especificamente nas extraordinárias evocações feitas por Níetzsche
em A Vontade de Poder.
Nenhum comentário:
Postar um comentário