UNIVERSIDADE
FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
INSTITUTO
DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS
CURSO
DE CIÊNCIAS SOCIAIS
Disciplina:
SOCIOLOGIA DA SAÚDE
Professora:
MARIA ASSUNTA CAPILONGO
TRABALHO: CENAS
DA SAÚDE EM
PORTO ALEGRE
- ENSAIO FOTOGRÁFICO
NO INSTITUTO PSIQUIÁTRICO
FORENSE MAURÍCIO CARDOSO
-
Aluno:
JAQUES XAVIER JACOMINI
Matrícula:
1409/92.7
SUMÁRIO
1.
INTRODUÇÃO
............................................................................................................03
Apresentação
do Ensaio Fotográfico
Fotografia 01
.............................................................................................................05
FOTOGRAFIA 02
.............................................................................................................06
FOTOGRAFIA 03
.............................................................................................................07
FOTOGRAFIA 04
.............................................................................................................08
FOTOGRAFIA 05
.............................................................................................................09
FOTOGRAFIA 06
.............................................................................................................10
FOTOGRAFIA 07
.............................................................................................................11
FOTOGRAFIA 08
.............................................................................................................12
FOTOGRAFIA 09
.............................................................................................................13
FOTOGRAFIA 10
.............................................................................................................14
FOTOGRAFIA 11
.............................................................................................................15
FOTOGRAFIA 12
.............................................................................................................16
FOTOGRAFIA 13
.............................................................................................................17
2. INSTITUTO PSIQUIÁTRICO
FORENSE DR. MAURÍCIO CARDOSO
2.1 BREVE HISTÓRICO DA
INSTITUIÇÃO .............................................................18
2.2 ASPECTOS GERAIS DA
INSTITUIÇÃO .....................................................19
2.3 ASPECTOS GERAIS DA “TRIAGEM”
.................................................22
3. ANÁLISE TEÓRICO-CIENTÍFICA
DO ENSAIO FOTOGRÁFICO .............................25
BIBLIOGRAFIA
...............................................................................................................32
INTRODUÇÃO
Este trabalho, - " Cenas da Saúde em Porto
Alegre" - é um ensaio fotográfico realizado no Instituto Psiquiátrico
Forense Dr. Maurício Cardoso. Além do
levantamento fotográfico, apresentamos a análise teórica das cenas colhidas
nesta instituição. Para isso
utilizaremos, basicamente os textos dos autores estudados durante o semestre na
cadeira de Teoria e pesquisa Sociológica em Saúde, em especial Michel Foucault
- "Vigiar e punir- ‘História da Violência nas Prisões".
No ponto um - Apresentação do Ensaio Fotográfico
- expomos as fotos, propriamente ditas, acompanhadas das respectivas legendas,
em uma seqüência lógica estrutural que norteiam este trabalho. Esclarecemos, desde já, que escolhemos apenas
uma parte desta instituição para realizar as fotos, uma vez que foi na
"Triagem" que encontramos, após a duas visitas a esta instituição, os
aspectos mais significativos para as análises as quais nos propusemos a
realizar. "Triagem" é o nome
dado a uma das alas do Instituto Psiquiátrico Forense Dr. Maurício Cardoso,
diferenciada das demais alas, em função de ser completamente fechada, ou seja,
os "Pacientes" lá internados não podem sair para o pátio para tomar
sol ou para outras atividades como os pacientes das outras alas fazem.
No ponto dois realizamos algumas considerações
sobre o Instituto escolhido para o nosso trabalho. Em um primeiro momento, fazemos um breve
histórico desta instituição, para localizar a sua existência dentro do contexto
do atendimento a pacientes psiquiátricos no Estado do Rio Grande do Sul. A seguir levantamos alguns aspectos gerais da
instituição e, após alguns aspectos gerais da unidade que elegemos para
realizar o ensaio fotográfico'- "Triagem". Procedemos assim para localizar melhor o
nosso leitor dentro de alguns aspectos e especificidade desta instituição que
são importantes para o entendimento do nosso trabalho.
No ponto três nos ocupamos da análise
teórico-científica das cenas levantadas nesta instituição, através do ensaio
fotográfico. Utilizaremos, neste caso,
basicamente dois autores Roberto Machado e Michel Foucault e a partir das obras:
"Vigiar e Punir" e "Danação da Norma" tentaremos sinalizar
para o entendimento daqueles aspectos que percebemos como os mais
significativos para esta análise.
Consideramos que a riqueza de elementos e
materiais recolhidos nesta instituição, durante as visitas e os contatos com os
pacientes e funcionários, permitiriam um trabalho científico muito mais apurado
e elaborado do que este que pôr ora apresentamos. No entanto, ficaremos mais restritos a
proposta do Ensaio Fotográfico, acompanhado de sua respectiva análise
científica, pois é este o nosso objetivo neste momento.
APRESENTAÇÃO DO
ENSAIO FOTOGRÁFICO
FOTO 01
Portão Principal de acesso ao Instituto
Psiquiátrico Forense Maurício Cardoso
Voltado para a Avenida Bento Gonçalves - Bairro
Partenon, Porto Alegre.
FOTO 02
Parte da Fachada frontal da "Triagem"
com
Porta principal de acesso ao centro.
FOTO 03
Portão
de acesso aos "isolamentos" da "Triagem"
Ao
lado esquerdo e direito deste, portões secundários de acesso aos
"isolamentos".
Ao
fundo, "Posto de Observação" dos funcionários, com 2 funcionários
presentes.
FOTO 04
Ângulo de visão do funcionário que se
encontra no "Posto de Observação",
quando este olha em direção ao portão principal
de entrada e saída da "Triagem".
FOTO 05
Ângulo de visão do funcionário que se encontra no
"Posto de Observação",
quando olha para o seu lado direito.
Em cima de sua mesa de trabalho, alguns objetos
utilizados pêlos funcionários.
Em segundo plano, um funcionário passa pelo
corredor.
Ao fundo da foto, visão dos "Isolados".
FOTO O6
Ângulo de visão do funcionário que se encontra no
"Posto de Observação",
quando olha para o seu lado esquerdo.
Em cima de
sua mesa de trabalho, alguns objetos utilizados pelos funcionários.
Ao fundo, visão lateral dos "Isolados".
FOTO 07
Aspectos do corredor que dá acesso aos
"Isolamentos" (lado direito, visto do "Posto
de Observação" dos funcionários).
Chuveiros, torneiras e controladores de descarga
das latrinas estão colocados do lado
de fora dos "Isolamentos".
Ao fundo, alguns colchões e colchonetes
utilizados pelos pacientes.
FOTO 08
Em detalhe, porta do "Isolado", visto
na foto anterior ao lado direito do corredor.
FOTO 09
Camas de ferro, utilizadas para as
"Contenções Mecânicas" dos pacientes.
Corredor lateral que dá acesso aos
"Isolamentos" (lado esquerdo, visto do "Posto de
Observação dos funcionários).
FOTO 10
Porta de acesso à um "Isolamento", com
paciente ocupando o seu interior.
FOTO 11
O paciente, preso no isolamento, olha para fora
de sua cela.
(Angulo de visão do paciente no interior de seu
isolamento, quando olha para fora)
FOTO 12
Interior de um "Isolamento", com sua
porta principal.
FOTO 13
O mesmo "Isolado" da foto anterior, com
outro ângulo de visão.
(aspectos internos)
2. INSTITUTO
PSIQUIÁTRICO FORENSE DR. Maurício CARDOSO
2.1 BREVE
HISTÓRlCO DA INSTITUIÇÃO
No início deste século,, os doentes mentais que
cometiam crimes eram presos na Casa de Correção. Somente em 15 de agosto de 1924, o Decreto
No. 3.356, assinado pôr Borges de Medeiros, regulou a assistência aos alienados
no Estado, alterando essa situação. O
artigo I'. desse Decreto define que "a assistência a alienados será
ministrada no Manicômio Judiciário, a instituir-se; no Hospício São Pedro; em
estabelecimentos particulares, sob a fiscalização do Estado.
A vinculação administrativa de tais órgãos eram
com a Secretaria dos Negócios do Interior e Exterior e sua inspeção ficava a
cargo do diretor do Manicômio Judiciário e de delegados especiais.
O Manicômio Judiciário deveria funcionar nas
dependências do Hospício São Pedro, em pavilhão separado, enquanto não fosse
construído um prédio próprio para sua instalação. Tal estabelecimento era destinado à internação
de condenados ou acusados que apresentassem sintomas de loucura e que
necessitassem de observação ou tratamento; a delinqüentes isentos de
responsabilidade pôr serem portadores de doença mental e a outros quando fosse
necessária a observação continuada para posteriores decisões judiciais.
O mesmo Decreto de No. 6880, de 7 de dezembro de
1937, que organiza a Polícia de carreira no Estado, definiu que o manicômio
Judiciário passaria I subordinação do Gabinete Médico Legal da Polícia
Civil. Em 1938, a casa passou a
chamar-se Manicômio Judiciário Dr. Maurício Cardoso e, posteriormente,
Instituto Psiquiátrico Forense Dr. Maurício Cardoso.
2.2 ASPECTOS
GERAIS DA INSTITUIÇÃO.
O Instituto Psiquiátrico Forense Dr. Maurício
Cardoso está localizado na Avenida Bento Gonçalves, 2850, Bairro Partenon. São circunvizinhos da instituição, a Igreja
São Jorge e o Hospital Psiquiátrico São Pedro.
Em visitas ao instituto, observamos algumas
características muito peculiares a esta instituição. Passaremos a descrever algumas destas
características, a fim de colaborar para o entendimento do nosso trabalho.
No que concerne aos aspectos administrativos,
esta é uma Instituição Pública Estadual, vinculada a Secretaria de Segurança
Pública do Estado do Rio Grande do Sul.
O instituto é dirigido pôr uma equipe de profissionais técnicos que são
orientados pelos Diretores Administrativo, Diretor Técnico e Diretor de
Assuntos Gerais.
No setor de arquivo, obtivemos a informação que
esta instituição conta com, aproximadamente, quinhentos pacientes. Para cada paciente existe três tipos de
documentos básicos: Uma papeleta clínica, outra papeleta administrativa e o
prontuário penal. Os dois primeiros,
papeleta clínica e administrativa são de uso interno, ficam portanto restritos
a esta instituição, visando o acompanhamento do paciente. Já o prontuário penal é o principal documento
do paciente, pôr isso acompanhado nas suas possíveis mudanças e remoções para
outras instituições. Neste mesmo setor,
quanto a sua funcionalidade, caberia destacar que a documentação ainda não foi
informatizada, causando um grande acúmulo de prontuários e papéis em geral e
que falta funcionários para organizar estes documentos. A mais recente aquisição deste setor foi uma
máquina copiadora Xerox que encontra-se ociosa, pois não existe um funcionário
preparado para operá-la. A falta de
funcionário não é privilégio deste setor, na maioria dos setores foi constatada
a carência de recursos humanos.
Ao circularmos pela instituição, um fato marcou
bastante a nossa visita: a dificuldade inicial de reconhecermos, dentro do
grupo de pessoas que encontramos, os pacientes em meio aos funcionários e vice
versa. Neste sentido, caberia até
relatar um fato ocorrido durante a visita que ilustra esta constatação:
"Ao chegarmos ao Pavilhão G, Ala fechada
masculina, deparamo-nos com uma pequena biblioteca. Uma sala de, aproximadamente I,5 m pôr 2,0 m,
onde se encontrava um cidadão sentado a uma mesa, controlando a retirada dos
livros. Ele, com uma garrafa térmica em
cima de uma mesa e uma cuia de chimarrão na mão, lia, tranqüilamente um
livro. Vestido com roupa simples, porém
limpa e bem conservada, calcando sapatos também limpos. Coloquei-me a indagá-lo sobre a quantidade de
livros solicitados diariamente pelos pacientes e a assiduidade dos mesmos à
biblioteca. O cidadão respondeu-me que a
procura pelos livros era muito baixa, quase nula e portanto não sabia precisar
a quantidade de solicitações feitas pelos pacientes diariamente. Agradeci a sua atenção e passei a visitar
outras dependências do mesmo pavilhão.
Ao sair, fui informado que aquele cidadão que cuidava dos livros era um
paciente e não um funcionário, como eu tinha imaginado inicialmente."
Esta situação ilustra muito bem este aspecto que
nos chamou a atenção, alguns funcionários foram confundidos com os pacientes,
enquanto que confundimos alguns pacientes com funcionários.
Outro aspecto muito interessante é que, ao
entrarmos na instituição, percebemos que alguns pacientes permanecem
tranqüilamente pelo pátio interno da instituição, exclusivamente do sexo
masculino. As pacientes raramente são
vistas no pátio, ficam na unidade E que é uma das unidades totalmente fechadas.
Quanto a disposição e organização dos diversos
prédios e pavilhões dentro do espaço físico do Instituto, caberia destacar que
temos uma seqüência de nove prédios, dispostos paralelamente aos prédios que
compõe a frente da instituição. A
exceção de um, a unidade E que é fechada e abriga cerca de 53 mulheres,,
situado lateralmente aos demais, no fundo do pátio do instituto.
Assim temos, na parte da frente do pátio (visão
de quem entra no instituto) três prédios.
No prédio central funciona a administração e os setores de organização e
planejamento do trabalho na instituição.
No lado direito, temos o Pavilhão D, onde se encontra pacientes que
possuem a permissão de sair para o pátio e demais dependências do instituto,
portanto uma unidade aberta. No lado
esquerdo, temos o prédio que abriga os pavilhões F e G, onde encontramos
pacientes que não podem sair para outras dependências, ou seja, uma unidade
fechada. Logo atrás do bloco
administrativo temos um prédio onde funcionam a farmácia e o setor de serviço
social, além de outras salas ociosas.
Entrando um pouco mais, deparamo-nos com dois outros prédios colocados
lado a lado. No prédio da direita estão
o refeitório e uma cozinha dos funcionários, no lado esquerdo, temos uma
unidade chamada de "Triagem": Local pôr onde passam os pacientes, ao
chegarem no hospital, antes de serem conduzidos a uma unidade em
definitivo. Observamos que este local é
utilizado também para o controle maior de alguns pacientes que estão mais
agitados ou nervosos,, dado a sua complexidade estrutural e o seu aparelhamento
interno de disciplinamento. Entrando um
pouco mais, encontramos um grande prédio, o mais antigo desta instituição, onde
funciona a unidade A . Esta unidade é classificada também como aberta e o
número de pacientes é bastante reduzido, em função de que nela estão sendo
realizadas algumas obras de recuperação do prédio. Ao fundo da unidade A, temos dois outros
prédios dispostos lado a lado. No prédio
mais a direita, encontramos a Unidade B,
também uma unidade aberta com poucos pacientes e com características bem
peculiares a este tipo de instituição; iluminação insuficiente, mal cheiro,
saias pouco cuidadas, ... No prédio mais a esquerda, encontramos a Unidade C,
também uma unidade aberta, porém com um número maior de pacientes. Ao entrarmos neste prédio, a nossa
acompanhante (guia) diz: "Agora vocês vão ver o que é realmente o I P
F." Nesta unidade observamos vários pacientes deitados em suas camas, em
péssimas condições de higiene e conservação.
Prostrados, debilitados, apresentando uma situação de plena morbidez, em
função da falta de cuidados a que estão submetidos. No interior deste prédio, após passarmos
pêlos dormitórios, chegamos a um refeitório onde se concentravam inúmeros
pacientes, alguns sentados outros deitados, porém todos na mesma situação de
abandono que os pacientes dos dormitórios se encontravam. Vários senhores idosos, sem nenhuma atividade
ou ocupação se encontravam ali.
2.3
ASPECTOS GERAIS DA "TRIAGEM"
Como já colocamos, sucintamente, Triagem é uma
unidade desta instituição que possui algumas características especiais. Pôr este lugar passam todos os pacientes que
chegam até ao instituto, antes de serem colocados em definitivo em uma unidade
em especifico. Este local também é usado
para receber os pacientes que, pôr ventura, apresentem alguma atitude de
agitação ou agressividade, durante a sua permanência na instituição. Isto ocorre porque neste prédio encontra-se
as condições físicas, arquitetônicas e de vigilância mais adequadas para este
tipo de necessidade institucional, reenquadrar o paciente nas
"normas" preestabelecidas pela '.'equipe dirigente" [1] e nos "regimes de
verdade" [2]
aceitos e difundidos no âmbito da instituição.
Nas visitas que realizamos ao instituto, foi
nesta unidade que encontramos os elementos necessários para realizar as
análises que o nosso raciocínio científico sugeria. Norteados com a ênfase analítica no
"Panóptico de Bentham" [3], percorremos os corredores
desta unidade e passamos a salientar aqueles aspectos que nos parecem ser os
mais significativos.
Em determinada oportunidade, chegando na porta de
acesso a esta unidade, mesmo acompanhados de uma funcionária da própria
instituição, fomos interpelados sobre a aquisição da permissão de entrada neste
setor. Só conseguimos entrar, após a
afirmação da funcionária que nos acompanhava de que tínhamos a autorização do
diretor geral daquela instituição para realizar o nosso trabalho
acadêmico. Este fato aponta para o grau
de controle interno que rege este tipo de instituição, ou seja, até mesmo um
funcionário não possui a condição de estar em outros setores que não o seu
próprio setor de trabalho.
Ao entrarmos na unidade, encontramos um paciente
deitado em uma cama de ferro que estava colocada no corredor. Este paciente tinha as suas mãos e pés
amarrados a esta cama, através de algumas ataduras do tipo das usadas nas
contenções de membros inferiores e superiores pelos médicos
traumatologistas. A este procedimento é
dado o nome de "contenção mecânica", ou seja o paciente está
“contido”, imobilizado totalmente. O
paciente, que encontramos nesta situação, gritava, pedindo ajuda, solicitando
que fosse solto e que recebesse algum tipo de atenção dos funcionários, estes,
no entanto, o ignoravam completamente
Logo que entramos, o nosso fotógrafo de câmara em
punho, um funcionário que nos recebia disse que não poderíamos fotografar o
paciente “contido”, em hipótese nenhuma.
Tratou logo de tentar explicar aquela situação do paciente em sua
"contenção": - ele (o paciente) chegou aqui bêbado, por isso
precisamos "contê-lo"; eu já disse para ele, quando ele conseguir
fazer um quatro [4]
nós o soltaremos !!" (Risadas) Esta
explicação foi dada em tom de deboche e ironia, pela parte do funcionário,
demonstrando total descaso pelo paciente.
O nosso fotógrafo comentou: “-
como é que ele vai conseguir fazer um ‘quatro’
com os pés e mãos amarrados.”
No que concerte aos aspectos físicos e
arquitetônicos desta unidade, caberia destacar, entre outras coisas a forma
como esta organizado este espaço. Os
funcionários, incubidos da vigilância dos pacientes, permanecem em uma pequena
salinha, cercada de grades e envidraçada que encontra-se no centro da
unidade. Esta posição permite aos
funcionários uma ampla visão de todo o espaço físico existente, concentrando
sua atenção especialmente para as portas dos isolamentos que estão colocados em
dois corredores,, um a sua direita e o outro a sua esquerda. É algo parecido
com uma "guarita de guarda", um pouco sofisticada e bastante
protegida de qualquer elemento estranho que possa tentar penetrá-la de fora
para dentro, disposta em um ângulo de 180 graus, fato que permite ao seus
ocupantes "vigiar" os pacientes sem serem vigiados pelos mesmos ( o
ângulo de visão do paciente do seu isolamento não permite ver os funcionários
no interior de seu posto de trabalho, os vidros do "Posto de observação
são do tipo fumê). Estas afirmações
podem ser acompanhadas pela exposição fotográfica que faz parte deste trabalho.
Outro aspecto importante, neste contexto da
organização dos espaços, que também podem ser observados através das fotos, é o
que aponta para a posição dos pontos de água, chuveiros e controladores das
descargas das latrinas utilizadas pelos pacientes. Estes dispositivos estão localizados no lado
de fora dos isolamentos, ou seja, os pacientes não tem controle destes
mecanismos de higiene e manutenção corpóreo-fisica. Para utilizá-los, necessitam da permissão ou
consentimento dos funcionários que estão acompanhando-os. Esta situação aponta também para alguns
aspectos importantes no entendimento do funcionamento destas instituições. O paciente tem a sua vida totalmente
administrada, controlada e vigiada, durante as vinte e quatro horas do dia, não
possuindo o controle nem sequer das atividades mais básicas e corriqueiras,
como as de limpeza e higiene do próprio corpo.
Neste ponto do trabalho, me resumirei a apenas
descrever alguns aspectos observados na instituição, fotografados e levantados
para o trabalho. A sua análise e relação
com as teorias estudadas serão desenvolvidas mais adiante.
3.
ANÁLISE TEÓRICO-CIENTÍFICA DO ENSAIO
FOTOGRÁFICO
"Aparece, através das disciplinas, o poder da
Norma. Nova lei da sociedade
moderna? Digamos antes que desde o
século XVIII ele veio unir-se a outros poderes obrigando-os a novas
delimitações; O da Lei, o da Palavra e do Texto, o da Tradição.
O Normal se estabelece como principio de coerção no ensino,
com a instauração de uma educação estandardizada e a criação das escolas
normais; estabelece-se no esforço para organizar um corpo médico e um quadro
hospitalar da nação ca pazes de fazer funcionar normas gerais de saúde (... )
Compreende-se que o poder da norma funcione facilmente dentro de um sistema de
igualdade formal, pois dentro de uma homogeneidade que é a regra, ele introduz
como um imperativo útil e resultado de uma medida, toda a gradação das
diferenças individuais. (FOUCAULT, Michel.
Vigiar e Punir. p. 164)
Iluminados pelas construções teóricas de Foucault
e de Roberto Machado, passamos agora a realizar um análise daqueles aspectos
institucionais, observados em campo, captados pela lente do nosso fotógrafo,
que mais colaboraram para o entendimento dos princípios gerais da
"normalização" e da "medicalização", com os quais trabalhamos
durante o semestre.
Esta passagem do Foucault, supratranscrita, do
capitulo 11 - Os Recursos Para o Bom Adestramento, do livro "Vigiar e
Punir", orientará, juntamente com a obra "Danação da Norma" do
Roberto Machado, a nossa tentativa de analisar os aspectos institucionais
observados em campo. Entre vários outros
autores que poderiam colaborar neste sentido, elegemos estes pôr considerá-los
como os principais pensadores, dos quais tivemos contato, que estão
debruçando-se sobre o tema da "normalização" das sociedades e das
instituições sociais.
Na primeira e na segunda foto, observamos
aspectos muito gerais da fachada do Instituo e da unidade que pesquisamos. Elas são mais ilustrativas do que analíticas
e, portanto, não carecem de maiores debates.
Na terceira fotografia, começamos a encontrar os aspectos que mais nos interessam nesta
análise institucional. A partir dela,
guiados pelos pressupostos do "Panóptico de Bentharn", partimos para
a compreensão da organização físico-espacial desta unidade em especial, a
"Triagem". Porém, antes de
entrarmos na análise do Panóptico, cabe destacar as idéias que são o eixo
principal da obra de Foucault e que são frisadas pelo autor, desde o início do
livro "Vigiar e Punir", obra obrigatória para todo o cientista
interessado no estudo deste tipo de instituição.
"Dentre tantas modificações, atenho-me a uma: o
desaparecimento dos suplícios. Hoje
existe a tendência a desconsiderá-lo (... ) o júri adotado quase em toda a
parte, a definição do caráter essencialmente corretivo da pena, e essa
tendência que se vem acentuando sempre mais desde o século XIX a modular os
castigos segundo os indivíduos culpados? (... ) No entanto, um fato é certo: em
algumas dezenas de anos, desapareceu o corpo suplicado, esquartejado, amputado,
marcado simbolicamente no rosto ou no ombro,,
exposto vivo ou morto, dado como
espetáculo. Desapareceu o corpo como
alvo principal da repressão penal." ( Foucault, Vigiar e Punir, p. 14 )
Constatamos estas afirmações de Foucault em nossa
ida a campo. Encontramos, logo na
entrada da instituição, pacientes "Livremente" passeando pelo pátio
interno, alguns sentados nos banco do jardim, outros deitados em um aparente
clima de "normalidade". Porém,
para os leitores mais atentos, não é difícil constatar as 4 G anormalidades"
da instituição que estão ai mascaradas.
Tranqüilidade, talvez o termo mais correto seja apatia, não é sinônimo
de saúde. Nestes pacientes, no intimo
dos seus organismos age, entre outras forcas, um poderoso recurso médico:
"A contenção química", fato que foi constatado em visita ao setor de
medicamentos da instituição. Ficamos
impressionados com a quantidade de medicamentos que são administrados para os
pacientes diariamente, fiquei mais admirado ainda pelo poder de contenção que
estes medicamentos representam. Estamos
sugerindo a relação com a idéia de Foucault dos "corpos dóceis" que
podemos observar neste caso, conectando com este entendimento da mudança
ocorrida nos métodos de tratamento dos "desviantes". Ou seja, não encontramos mutilados,
esquartejados ou marcados simbolicamente no rosto ou no ombro, encontramos
pacientes inteiros e perfeitos, do ponto de vista f’ísico, porém pacientes com "corpos
dóceis", esquadrinhados e aplainados pelo poder das "normas"
institucionais.
Voltando a foto três e ao panóptico, ressaltamos
que, nesta instituição não encontramos a exposição dos princípios
arquitetônicos de Bentham exatamente como estão colocados na sua proposta
original, inspirada no Jardim Zoológico de Versalhes a época de Luís XIV:
"Na periferia uma construção em anel; no centro, uma
torre; esta é vazada de largas janelas que se abrem sobre a fase interna do
anel; a construção periférica é dividida em celas, cada uma atravessando toda a
espessura da construção; elas tem duas janelas , uma para o interior,
correspondendo as janelas da torre; outra, que dá para o exterior, permite que
a luz atravesse a cela de lado a lado (... )."
( FOUCAULT, Michel.
Vigiar e Punir. p. 177)
Contudo, encontramos, claramente os princípios
teóricos básicos de Bentham: "ver tudo, saber tudo, cuidar de tudo."
Recordando Roberto Machado, destacaria a passagem que diz: "Disposição
arquitetônica que tem como objetivo responder a um problema político" [5]. Destaco, também as
palavras do próprio Bentham, ao defender os princípio do seu panóptico: "
Com o Panóptico não se trata mais simplesmente de excluir um grupo de pessoas
da sociedade, enclausurando-o em um espaço de desordem, de confusão, de
banimento. Ele é um operador, um instrumento
político, que dá ao poder maiores capacidades de se exercer aumentando a sua
forca através da constituição de um espaço planificado, ordenado, dividido, bem
distribuído. (...) não é somente um modelo de prisão perfeita, mas um principio
um esquema, uma forma ideal de um
mecanismo de poder; uma figura da tecnologia política que é polivalente em
suas aplicações: pode se adaptar a todos os estabelecimentos em que se trata de
organizar a inspeção e a economia."
As fotos de número 4, 5 e 6 compõe uma seqüência
de ângulos da visão que os funcionários possuem, a partir do seu "posto de
observação", do espaço físico da unidade como um todo. Basicamente, estamos tentando mostrar que
esta ângulo de visão dos funcionários é muito privilegiado, se for comparado,
pôr exemplo com o ângulo de visão que o paciente tem, quando olha para fora do
seu isolamento, fato que pode ser acompanhado na foto de número 13. Este "privilegiamento" não é
casual,, como podemos acompanhar pela descrição dos princípios do panóptico de
Bentham, ele existe em função de uma necessidade política da própria
instituição, segundo os princípios filosóficos que a regem.
Podemos constatar, então que, nesta instituição,
verificamos, através da organização dos espaços físicos da mesma, ser verdade
uma das idéias principais que regem o funcionamento do panóptico de Bentham: o
paciente (ou preso) possui a sensação de estar sendo vigiado nas 24 horas do
dia, mesmo que não esteja sob o olhar disciplinador do funcionário, em função
da organização dos espaços e das artimanhas da arquitetura elaborada para os
objetivos políticos da instituição.
"Daí o efeito mais importante do Panóptico: induzir no
detento [6]
um estado consciente e permanente de visibilidade que assegura o funcionamento
automático do poder. Fazer com que a
vigilância seja permanente em seus efeitos, mesmo se é descontinua em sua ação;
que a perfeição do poder tenda a tomar inútil a atualidade do seu exercício;
que esse aparelho arquitetural seja uma máquina de criar e sustentar uma
relação de poder independente daquele que o exerce; enfim, que os detentos se
encontrem presos numa situação de poder de que eles mesmos são os
portadores. Para isso, é ao mesmo tempo
excessivo e muito pouco que o prisioneiro seja observado sem cessar pôr um
vigia: muito pouco, pois o essencial é que ele se saiba vigiado; excessivo,
porque ele não tem necessidade de sê-lo efetivamente." (FOUCAULT,
Michel. Vigiar e Punir. p. 177-8)
Na foto de número 7, visão de alguns aspectos de
um dos corredores que dá acesso aos isolamentos, gostaria de destacar a
disposição dos recursos dos equipamentos de limpeza e higiene pessoal e a sua
localização. Ou seja, os chuveiros,
torneiras e acionadores da descarga das latrinas usadas pelos pacientes
encontram-se do lado de fora do isolamento, portanto o paciente não tem acesso
direto a estes tipos de recursos.
Considerando que destes recursos dependem a manutenção mínima de
conservação da própria vida do paciente, nos seus aspectos do atendimento das
suas necessidades vitais e fisiológicas, consideramos ser este um dos aspectos
mais significativos observados nesta unidade, no que diz respeito ao
monitoramento completo, pôr parte dos funcionários, da vida do paciente.
Me parece que, esta organização arquitetônica
destes recursos de higiene pessoal recorda o que já foi aqui colocado, quando
remontamos os aspectos da mudança que houve no tratamento dos desviantes, a
partir de meados do século XIX. Ou seja,
"a marca de ferro" foi abolida, no tratamento dos desviantes, e entra
em cena o poder da "Norma" médica para este mesmo tratamento. Foucault diz: "Não tocar mais no corpo,
ou o mínimo possível, e para atingir nele algo que não é o corpo
propriamente", destacando a mudança que houve nas estratégias de poder
utilizadas para punir as pessoas.
"Segundo essa penalidade, o corpo é colocado num
sistema de coação e de privação, de obrigações e de interdições. O castigo passou de uma arte das sensações
insuportáveis a uma economia dos direitos suspensos. Se a justiça ainda tiver que manipular e
tocar o corpo dos justiçáveis, tal se fará à distancia, propriamente, segundo
regras rígidas e visando a um objetivo bem mais - elevado -. (... )"
(FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir. p.
16)
A foto de número 8 destaca uma porta de um
isolamento. Destacamo-la para ilustrar
as informações que estamos trabalhando.
Observa-se que ela é de madeira, porém emoldurada pôr ferro e aço,
portanto muito resistente. Vê-se, também
a única "janela" de acesso para o exterior do isolamento existente,
um pequeno quadrado protegido pôr barras de ferro que limita totalmente a visão
do paciente para o seu exterior.
A foto de número 9 destaca uma cama de ferro que
não é utilizada pelos pacientes simplesmente para repousarem ou dormirem. Trata-se de uma cama, do tipo cama de
hospital, utilizada basicamente para realizar a "Contenção Mecânica"
dos pacientes que ficam mais agitados ou impacientes.
No capitulo II - Os Recursos Para o Bom
Adestramento -, subitem "A Sanção Normalizadora" da obra Vigiar e
Punir de Foucault, encontramos algumas idéias que, segundo o nosso juízo, colaboram para o entendimento
destas ,,maquinarias" de disciplinamento, como a cama encontrada na
unidade da instituição que estamos analisando:
"Na essência de todos os sistemas disciplinares,
funciona um pequeno mecanismo penal. É beneficiado pôr uma espécie de
privilégio de justiça, com suas leis próprias, seus delitos especificados, suas
formas particulares de sanção, suas instancias de julgamento. As disciplinas estabelecem um - infra-penalidade
- ; quadriculam um espaço deixado vazio pelas leis; qualificam e reprimem um
conjunto de comportamentos que escapava aos grandes sistemas de castigo pôr sua
relativa indiferença." ( FOUCAULT, Michel.
Vigiar e Punir. p. 159)
Sobre esta foto ainda, gostaria de lembrar a
situação que já foi citada no anteriormente neste trabalho, no ponto - Aspectos
Gerais da Triagem, que destaca este procedimento da "contenção
mecânica". Como já citamos esta
situação, não voltaremos a ela neste momento, porém cabe ratificá-la, pois
colabora para o entendimento desta propostas disciplinares observadas na
instituição em destaque.
Na foto de número 10 temos a porta de um
isolamento, visto do lado de fora, com um paciente no seu interior. Temos a inscrição: "Isolado"
registrada na porta, fato que faz supor a necessidade da instituição de
identificar claramente os pacientes e sua situação de estarem sofrendo a
"sanção normalizadora".
Nas fotos de número 11 e 12 temos alguns aspectos
e características do interior de um isolamento.
São dois ângulos diferentes que sinalizam para uma impressão única: as
péssimas condições de habitabilidade a que estão sujeitos os pacientes desta
instituição. Caberia destacar que este
isolamento não esta na unidade que escolhemos para estudar, a triagem. Destaco este fato, pois nos isolamentos da
triagem não existe banheiro a disposição do paciente isolado, como já destaquei
anteriormente, nem ao menos uma cama come esta que vimos nestas fotos. Este isolamento fotografado pertence à
unidade G e foi fotografado para dar uma idéia do interior de um isolamento,
uma vez que na "triagem" não conseguimos realizar a mesma foto.
A foto de número 13 propõe que tenhamos a noção
do ângulo de visão que o paciente tem do interior do seu isolamento, quando
olha para o exterior do mesmo, através da sua porta de saída. Esta foto, na verdade, colabora mais para a
análise que fizemos no início do trabalho, com base na seqüência de fotos 4, 5 e 6. Situação que enfocamos as
diferenças dos ângulos de visão que os funcionários tem do todo da instituição,
se comparados com este mesmo ângulo de visão a partir da posição do paciente
dentro do espaço físico que lhe é colocado.
BIBLIOGRAFIA
1.
FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir: nascimento da prisão;
tradução de Lígia M. Pondé Vassalo. Petrópolis,
Vozes, 1987. 280 p.
2.
LEWGOY, Alzira Maria Baptista. Marginalidade e Controle Social. Porto Alegre: Secretaria da Justiça, Escola
do Serviço Penitenciário do Rio Grande do Sul,
1991.
3.
MACHADO, Roberto. Danação da Norma: Medicina Social e
Constituição da Psiquiatria no Brasil.
Rio de Janeiro: Edições Graal, 1978.
[1] Conceito conforme GOFFMAN, Erving. Manicômios, Prisões e Conventos. São Paulo, Ed. Perspectiva, 1974.
[2]
Conceito conforme FOUCAULT, Michel (I 980, p. 13 I)
[3] FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir. História da Violência nas Prisões. Petrópolis: Ed. Vozes, 1996.
[4]
Fazer um quatro" - expressão usada para descrever o teste que as pessoas
realizam para demonstra o seu equilíbrio.
Com apenas um pé apoiado no solo, flexiona a perna oposta, aproximando o
pé do joelho.
[5] MACHADO, Roberto. Danação da Norma. p. 322-24.
[6] Detento - sobre os conceitos
detento/paciente, preso/paciente, caberia destacar que na instituição estudada
usa-se a nomenclatura paciente para classificar os apenados e não preso ou
detento. Pôr isso vale como sinônimo,
quando mencionamos presos/detentos na relação com os pressupostos teóricos dos
autores que estamos trabalhando
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