terça-feira, 7 de julho de 2015

Mestre Borel








3.2 Mestre Borel
A lembrança que aqui se faz necessária é a seguinte: já na oportunidade em que fui provocado para compor uma proposta inicial de conclusão da disciplina, fiz grafar em documento enviado a ministrante da disciplina o projeto que propunha realizar análise crítica de obra cinematográfica avaliada sob o plano de trabalho acadêmico desenvolvido na disciplina Afro descendência e Cidadania No Brasil Contemporâneo. Assim procedi, pois acredito que os recursos áudios-visuais são fundamentais no processo de ensino-aprendizagem. Além disso, a minha trajetória de trabalho na área da antropologia visual demonstra previamente que sempre estive mobilizado para realizar estudos antropológicos que dialoguem diretamente com os recursos oferecidos pela arte fotográfica e cinematográfica.
Neste sentido, a época da citada provocação acadêmica, citei duas alternativas. Em primeiro lugar, avaliar criticamente a obra denominada: The Great Debaters que tem como título no Brasil: O Grande Desafio. Em segundo lugar realizar análise crítica de vídeo etnográfico avaliado sob o plano de trabalho acadêmico desenvolvido na disciplina Afro descendência e Cidadania No Brasil Contemporâneo. A fim de tentar viabilizar a segunda alternativa, estive pessoalmente na sede do Banco de Imagens e Efeitos Visuais da Cidade de Porto Alegre (BIEV), para solicitar uma cópia da obra denominada: Mestre Borel – A Ancestralidade Negra em Porto Alegre. Uma vez que não considerava adequado trabalhar a partir da versão publicada na rede mundial de computadores. Fui muito bem recebido e até convidado para permanecer naquele local onde ocorria uma aula da disciplina de Antropologia Visual e da Imagem (PPGAS/IFCH). Agradeci e explanei as minhas metas dentro da demanda que me colocava naquele ambiente acadêmico: Relacionar o conteúdo da obra (Vídeo Etnográfico) com as temáticas trabalhadas em sala de aula durante o semestre (leituras dos textos e discussões e debates realizados sobre as atividades da disciplina da disciplina Afro-descendencia e Cidadania no Brasil Contemporâneo). Destaquei ainda que o objetivo era construir um texto do tipo ensaio acadêmico no fechamento da avaliação da obra cinematográfica, com vistas à futura disponibilização do mesmo  na rede mundial de computadores para todos os interessados.
O fato é que até o presente momento não tive acesso a uma versão original do documentário Mestre Borel: a ancestralidade negra em Porto Alegre. Mas, mesmo assim, decidi trabalhar com a biografia de Walter Calixto Ferreira, o Mestre Borel. A decisão ocorre, pois as adversidades encontradas para realizar este trabalho monográfico são comuns a todo não branco. Ou seja, a elite branca não costuma privilegiar as demandas dos afro-descendentes. Como já conheço bem todo este contexto decidi seguir na luta.
A peça videográfica supra citada coloca Walter Calixto no centro de uma cena biográfica, falando sobre suas memórias e experiências em Porto Alegre e ao redor do Brasil, ligadas a um itinerário negro nas cidades. Mestre Borel, apresenta os seus saberes e seus fazeres. Declara-se detentor de traços da cultura de matriz africana e narra sobre os seus conhecimentos religiosos, históricos, mitológicos e artísticos.
A fonte de todo este trabalho está nas tradições africanas, relacionada ao convívio com seus antepassados. Mestre Borel: a ancestralidade negra em Porto Alegre é um documentário que deveria ser agregado ao plano de estudo desta disciplina, pois se trata de referencia impar no estudo da negritude observada na capital dos gaúchos. Além disso, por estarem os seus idealizadores (pesquisadores do BIEV) tão próximos a nós, certamente o depoimento destes também poderia ser um momento de troca muito interessante.
O destaque que eu gostaria de colocar é o seguinte: a obra possui dois grandes eixos relacionados entre si (a urbanidade e a religiosidade portoalegrense). Assistindo o vídeo, mesmo por um público leigo, a proposta de Mestre Borel fica muito clara, pois ele apresenta de forma didática as reflexões sobre a grandeza da religião dos orixás, sobre a espiritualidade afro-brasileira e também sobre o resgate da memória dos bairros periféricos da cidade de Porto Alegre (locais de presença intensa de afro-descendentes).
A obra integral tem duração de aproximadamente 55 minutos. Contou com financiamento da Prefeitura de Porto Alegre, através da Secretaria Municipal da Cultura (Edital do FUMPROARTE). Além do Banco de Imagens e Efeitos Visuais da Cidade de porto Alegre (BIEV) contou com o apoio do Núcleo de Culturas Contemporâneas (NUPECS) e do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social (/PPGAS). Estiveram ainda presentes na mobilização em torno da obra a Comunidade Terreira Ile Axé Iyemonja Omi Olodo, o Memorial do Rio Grande do Sul e diversos colaboradores e gestores do Mercado Público de Porto Alegre. O Roteiro e a pesquisa que fundamenta etnograficamente o documentário ficou a cargo da antropóloga Dra. Ana Luiza Carvalho da Rocha.
A pesquisa que realizei em veículos de mídia impressa e informatiza afirmam que Walter Calixto Ferreira, também conhecido como Mestre Borel, foi um dos mais principais representantes das religiões afro-brasileiras e da cultura negra no Rio Grande do Sul, além de carnavalesco, escritor e pesquisador. Mestre Borel era considerado o mais antigo alabê (tamboreiro de candomblé ou batuque) e também um dos principais responsáveis pela preservação da cultura e da história dos povos africanos em Porto Alegre.
Considero que o resgate realizado pela equipe de pesquisadores do Banco de Imagens e efeitos visuais de Porto Alegre (BIEV), através do documentário: “Mestre Borel: a Ancestralidade Negra em Porto Alegre” é a obra prima deste importante grupo de intelectuais acadêmicos. E, sem sombra de dúvida, a antropóloga Dr. Ana Luiza Carvalho da Rocha que pesquisa a história e a cultura de Porto Alegre a mais de três décadas, é a principal figura este grupo. Não é um simples resgate da africanidade local, pois coloca o negro no centro do debate acadêmico e avalia com muita propriedade as mudanças ocorridas durante o processo de urbanização da capital dos gaúchos. A pesquisadora citada propõe:
”Investigar a dinâmica das interações e representações sociais na e da cidade sob a perspectiva de suas formas de vida social visando um repertório mais amplo das formas de sociabilidade no meio urbano do Brasil e suas variações culturais. Aprofundar uma reflexão conjunta acerca das memórias coletivas e ações culturais no âmbito patrimonial da cidade de Porto Alegre em sua interface com experiência de vida de seus grupos urbanos face às crises, os conflitos e as tensões do mundo contemporâneo, assunto que vem preocupando pesquisadores e profissionais da área da cultura.Reunir práticas museólogicas e narrativas etnográficas no estudo do mundo urbano contemporâneo como fonte de pesquisa para estudo do lugar das experiências humanas, das práticas sociais e das diferenças na cidade como tema de ações culturais no âmbito da memória e do patrimônio etnológico da sociedade contemporânea. Investigar a memória da quotidianeidade da cidade de Porto Alegre com a pesquisa no tratamento documental, colocando como ponto convergente de ambos os projetos a  criação de um Museu virtual  como espaço de problemas para o entendimento do mundo urbano contemporâneo”. (Rocha, 1999)
A história de Mestre recuperada através do documentário etnográfico Mestre Borel - A ancestralidade negra em Porto Alegre foi abordada em publicação que fiz no blog A Cidade de Santa Isabel. Destaquei o trabalho de Ana Luiza Carvalho da Rocha informando que o mesmo narra as memórias de um dos mais reconhecidos tamboreiros da religião de matriz africana em Porto Alegre. Um dos grandes méritos da produção videográfica foi o seu caráter interdisciplinar, pois a equipe de produção do documentário contou com pesquisadores que atuam no projeto Habitantes do Arroio Dilúvio, com o filho e herdeiro do trabalho de Borel, fato que gerou uma troca produtiva de relatos e imagens. E por falar em Arroio Dilúvio é importante destacar que a narrativa de Borel dá uma nova roupagem para as imagens dos territórios do Areal da Baronesa, da Ilhota e da antiga Rua Cabo Rocha, revelando a relação íntima do antigo curso do Arroio Dilúvio com a memória negra na cidade.



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