terça-feira, 29 de outubro de 2013

Ana

Santa Ana
Ao Cair da Tarde nos pés da Capela de Santa Ana

Finda o dia aos pés do Morro de Santa Ana (ou Santana).
Aquela luz, altiva e forte, que nascera contemplando o vale,
Agora desce lenta e calma, para descansar em definitivo atrás do oiteiro de Ornelas.

Protegidos no interior do vale,
Toda uma nação também se prepara para o repouso diário.
A noite pode ser fria, mas o vento não nos alcança,
Graças ao poder incomensurável da tua proteção, ó imenso parceiro !!
Já nos denominaram de “Campos de dentro de Viamão”,
Cultura endógena facultada claramente a quem nos protege e estimula, Morro de Santa Ana.

Em nome de uma tal de “Cultura Material”, te escavam, te corrompem, te dilaceram buscando acesso ao teu passado nos sítios arqueológicos que guardas como prova da tua história e magnitude.
Para preservar a tua integridade, a tua forma e tua face nada mais racional do que “escavar” apenas os teus sítios mnemônicos, presentes no imaginário dos teus filhos que guardam com carinho tuas lembranças.

Em nome de uma tal “Dinâmica Urbana”, te alteram, te danificam, te ferem, quase te exterminam. É a luta pela vida, pela permanência da existência das vidas humanas que só existem no interior desta capela graças a tua magnifica existência.
Contudo, a tua sabedoria e bondade é maior do que a atrocidade e a brutalidade humana que te aflige, pois permanece altivo e forte fornecendo o pão que alimenta o teu povo, a lenha que aquece nas noites frias de inverno e os sonhos que alimenta as almas daqueles que por opção ou necessidade vivem nas tuas encostas.


Ao Cair da Tarde nos pés da Capela de Santa Ana

A tua história de vida é secular nesta retomada diária de nascimento e ocaso do amigo sol. A minha é reduzida a algumas décadas em que acompanho atento o momento em que guardas o sol a tuas costas.
E só para lembrar, tudo começou com um desbravador, homem leal, forte e aguerrido, oriundo da Ilha de Madeira, Portugal, chamado Jeronimo de Ornelas Menezes e Vasconcelos. Depois veio o Inácio de Francisco que comprou a estancia de Jeronimo. Logo após vieram os religiosos Padres José Gomes de Farias e Manoel Garcia de Mascaranhas. O capitão Pedro Lopes Soares viria a sucedê-los e tantos outros que hoje seria impossível enumerá-los.
Na contingência desta linhagem, tão altiva e magnânima quanto a tua própria existência, eu me apresento como herdeiro desta tradição, como soldado de defesa da tua imagem, da tua história e da tua própria permanência entre nós.
A defesa da tua integridade física, histórica e cultural é uma obrigação tácita para as gerações que nos sucederão neste universo protegido, hoje conhecido pela denominação também religiosa de uma outra santa, a Santa Isabel (da Hungria). As dificuldades do teu povo que escolheu a Santa Isabel como sua padroeira por se tratar da santa protetora dos pobres, doentes e necessitados amplia o contraste com a abundância e a riqueza das tuas potencialidades naturais.


Ao Cair da Tarde nos pés da Capela de Santa Ana

Guapira opposita (Vulgo maria-mole), mata-olho, araçá do mato, capororoca, tanheiro, cafeeiro-do-mato, Moritzia ciliata, Schlechtendalia luzulaefolia, ...
Estas são algumas das espécies vegetais que abrigas.
Ponto culminante desta região, do alto dos teus 311 metros é possível avistar quase tudo ao teu redor. Contudo, a essência do teu cume não está na tua forma, mas na tua rica história.

Já te ameaçaram muito, das tuas entranhas extraíram madeira, pedras, água.
Talvez este tenha sido o preço que tevês que pagar para abrigar e fomentar a população que hoje vive no teu vale.
Apesar das inúmeras cicatrizes que te deixaram, a tua natureza respondeu mais alto, renovando o teu potencial hídrico, vegetal e paisagístico.
Além desta ameaça física, direta e explicita, acredito que a maior ameaça que sofres é outra. Mais contumaz pela sua própria especificidade, silenciosa, sorrateira e paulatina, a maior ameaça que sofres talvez seja o esquecimento da tua história
O desconhecimento da tua magnitude e
O desprezo pela tua importância natural, histórica e cultural.
Neste sentido, a nação que tanto protegeste e que proteges tem uma imensa dívida.
O povo do Vale de Santa Ana (ou da Santa Isabel) te deve este reconhecimento.

Resgatando a minha parcela nesta dívida, te dedico estas palavras, como quem escreve uma carta para um pai que de não muito distante protege os seus filhos, mesmo que estes, por vezes, não o perceba. 

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