Prezados Amigos
Segue a cópia de um trabalho importante para este que vos tecla. Foi a minha primeira monografia apresentada na UFRGS. Cursava a cadeira de antropologia 1, ministrada pela professora Cornelia. Labutava no IDBM. Portanto, foi inevitável trabalhar com instituições totais. Segue abaixo o texto digitalizado, a partir do original. Há muitos erros, pois não fiz a correção após a digitalização. Fica como uma espécie de "registro histórico".
Valeu.
Um abraço.
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÈNCIAS HUMANAS
CURSO DE CIÉNCIAS SOCIAIS
DISCIPLINA: ANTROPOLOGIA I HUM 402
1992/ 2o. SEMESTRE
PROFESSORA
CORNÉLIA ECKERT
PESQUISA DE CAMPO
Projpto
PESQUISANDO UMA INSTITUIÇI;0 TOTAL
Nome: JAQUES XAVIER JACOMINI
Matr.: 1409/92-7
Porto Alegre,
dezembro de 1992.
SUMARIO
INTRODUÇÃO
3
J. O.Instituto Dom Bosco
1.1
Localização O..*.................................................... 6
1.2
Aspectos Externos da Instituiç@o......................... 7
1.3
Entrando no Instituto.................................... o 7
1.4
"Estratificação" Social dentro do.................. I.D.B.M 9
1.5
Relaç'3es Intergrupos............................................. 11
CONCLUSÃO................................................................... 21
METDDOLCGIA........................................ *.*..#...... 28
REFERÈ@JCIAS SIBLIOGRAFICAS....................... 29
OBRAS CONSULTADAS.................... *.#9............. #.#.* 31
3
INTRODUÇÃO
L'-ste trabalho
tem por objetivo analisar os a,,,pectos sociais o estruturais de uma
instituiç@o total. Abord I arei o' ti Po
de relacion3m.,nto humano, entro inbernos o equipe dirigen como também entro os
internos com os Próprios internos, que é travado dentro desta instituição. Inicia dando uma visão global das
características gerais da instituição como a sua loca lizaç@o, aspectos
físicos externos e int-rnos da casa estudada.
A-.sequir, no
pnnto ESTRATIFICAÇÃO social dentro do I. D.B.M., lanço idéias gerais que
explicam como os internos são divididos e agrupados dentro da inrtituiç@o. Caractprizo o tipo de patologia, ou o grau de
deficiência que s@o utilizados pa rã nortear a divisão dos deficientes
em determinados grupos.Es tes esclarecimentos são importantes na medida que
direcllna'),m p.2 rã a filosofia de trabalho que 6 adotada por uma instituição
totalizante, neste caso# estilo mnnicomial.
Após a estas considerações, no ponto Relaç@es Intergrupos, esclareço de
que forma os internos se relacionam entre si, convivendo no todo da
instituição. Ou se a, esclareço qu e
apesar da divisão em grupos existente na casa, existe relações de interação
social que são vivenciadas pela
totalidade da mas sã de internados, pois eles vivem em constante
contato. Para is to, utilizei o
relato de um dia dentro da instituição, ou seja,
tudo o que acontece rotineiramente na casa,
desde as 7 horas
da manhã de um dia X até as 7 horas da manhã dó dia seguin-
te. Obviamente, a cada dia foram observados
fatos novos na pés
quisap mas a proposta é dar uma dimensão ao
mesmo tempo do que
acontece durante os vários
períodos do dia na instituição, como também daqueles acontecimentos que
pareceram ser mais típicos e por isso est@o relacionados com o dia-a-dia
ínstitucional.
4
Neste ponto
surgem também alguns aspectos da relací onaínento entro os profissionais da
casa, que prefiro classifi car de equipe dirigente, com os internados. Algumas palavras e expressões de uso corrente
na instituiç2ío e usadas nosta,re laç2lo equipe dirigente internados são
salientadas, poisla meu ver, elas apontam para os prin c lpio@ totalitários
excludentes e doscríminatórios adotados pelo sistema institucional.E, via de
regra, me parece que e!-,tes-, 11 principias 11 surgem sem pre, quando
estamos analisando qualquer tipo de instituição total (quartéis, conventos,
presídios, manic'o'mios,.campos de prisioneiros de guerra, abadias, mosteiros,
etc..).Surgem com a concentimento e o respaldo de uma sociedade, por vezes, omis
sã e dpscomprometida com o problema e surgem também com a rés palda legal
dos org@os Estatais que preferem simular um aparente controle da situaç@o. Entretanto, estão ambosp Estado e sociedade,
contrariando vários dispositivos legais como , os existentes em nossa
Constituiç@o Federal que preve no seu capítulo I, dos Direi-tos e Deveres
Individuais L- Coletivos o se guinte.- 11 ART.52 - todos s@o iguais
p,?rante a lei, sem distin ção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito
à vida, à lib-@rdadp,, à igualdade, à segurança e à proptiedade,,*@ "#
Esta pesquisa foi realizada no Instituto DOM BOSCO
F,IASCULINO, uma das instituições da
Fundação do Bem Estar do
Menor (FEDEM).
Esta casa abriga crianças, adolescentes e adu.l tos portadores de
deficiências mentais e em alguns casos portadores de deficiências múltiplas
(cegos, surdos, mudos, para--' líticos,*..).
Cabe salientar
que, quando mencionei " adultos 11 po de parecer algo equivocado,
uma vez que pelo o que se sabe, a nível de opini@o pública, a FEREM atende
crianras e adolecoscentes até 16 anos (no caso de infratores esta faixa etá ria
é estendida até os 21 anos). Entretanto,
este problema de poss uir uma clientela adulta, fugindo das especificidades da
fundação é apenas uma das contradições desta instituição publica. Existe um grande ponto de interrogação na
cabeça dos
atuais
administradores em rulação a este problema.
A realidade é que mais de SO,@J da população de internados, em um
universo de aproximadamente 105 pessoas, desta instituição completaram ou estão
completando uma idade supgrior aos 21 anos (a pessoa mais idosa está com 45
anos de idade). Entretanto estas soas
foram abandonadas em mp'dia, a mais de 159 ou até, de 20 anos na instituiç@o,
perdendo assim todo e qualquer vinculo com suas famílias. Por incapacidade administrativa, marasmo
burocrático ou mesmo falta de outros abrigos públicos estas pés soas
continuam internadas na FEBEM.
Já mais a nível de conclusão, levanto algumas
propostas alternativas pêra o tratamento da deficiente mental.Pois, através da
pesquisa, percebi que existe um entendimento, entro a maioria das pessoas
ligadas aos setores de saáde mental, que o atual sistema de atendimento e
tratamento através da insti~ tuição total, n@o tem sido positivo para os
pacientes. Muito pelo contrário, o
quadro da deficiente regride na medida que aumenta o período de internação nos
manicômios. Estas propostas alternativas
são guiadas a nível nacional por um projeto de lei, proposto pelo Deputado
Federal PAULO DELGADO do Partido dos Trabalhadores de filmas Gerais e a nível
estadual por um projeto de leip já
aprovado no legisla-tivo gaúctio, proposta pé lo Deputado Estadual
MARCOS ROLIM também do Partido dos Traba lhadores que prevê a extinção
progressiva dos hospitais psiquiátricos e sua substituição por outros recursos
assistênciais a regulamenta a internação psiquiátrica compulsória.
6
1. O INSTITUTO DUM
BOSCO
1.1 LOCALIZAÇÃO
O Instituto
Dom Bosco Masculino está localizado na parada 36 da faixa (RS 040) que leva à
Viamão, já dentro dos limites da município de Viam,@o.
Quanto a
sua localizaç@o geográfica é importante sã líentar um aspecto'que parece
sqr estratégico Através dos con tatos e conversas informais que travei
com alguns fu ncionários, fiquei sabendo que existe uma espécie de estigma,
entre os funcionários, em relação ao f;-ito de trabalhar no I.D.B.PI.
(Instituto Dom Bosco C-Iasculino). É con@onso do corpo funcional que trabalhar
no referido instituto representa, para o funcionário da FEBEPI, uma espécie de
* castigo. Um dos fatores deste castigo
refere~se a distância em que se encontra o instituto em relação a cidade de
Porta Alegre e a própria sede administrativa da FEBEM. Portantot para
trabalhar nesta casa, a maio ria dos funcionários precisam utilizar
quatro Ônibus na viagem de ida e volta entra a sua cara e o seu local de
trabalho. Este deslocamento é muito
penoso pelo fato de que Viam@o é uma das cidades dormitório da grande Porto
Alegre, por isso os ôni bus trafegam sempre lotados. O tempo de duraç@-io da viagem da centro de
Porta Alegre até o I*D*B#M@ é quase uma hora.
Existe ainda outro aspecto cornplic,-idor que 'é o fato de,, que a
maioria dos funcionários sendo plantonistas em finais de semana precisam
utilizar o transporte coletivo nos sábados e domin gos e nes tos dias é
muito diflcel de tomar os ônibus,
pois os horários s2ío muito intercalados.
*Quando estávamos em uma assembléia de categoria
profissional, na ocasião de uma greve na FEBEM, uma funcionária, após fazer
algumas considerações criticando a atual administração da Fundação, recebeu um
bilhete anônimo que pelo fato de ter passado de mão em mão ficou desconhecido o
seu emitente que dizia o se
guinte: 11 se não te cuidar, vai parar no Dom
Dosco 11.
7
1.2 ASPECTOS EXTERNOS DA INSTITUIÇNO
O
instituto Dom Bosco faz parte do complexo de Viamão, onde também se encontra o Instituto f)om Dosco Feminino o
Instituto Paulo C@onego de Nadal, o Instituto Ana Jobim e o Ins tituto
Feminino.
Circundando
esta área existe muito verde, o Parque Municipal Sant'Hilaire faz divisa com as
torras da FE[3EM.
Na frente
da instituição existe um grande campo de futebol, cortado pela estradinha que é
uma espécie de atalho e da ;--icesso ao Instituto r)om Bosco I-Iasculino.
Acima da
campo, ficam algumas arvores próximo a ela bancos de pedrag um jardim pouco
cuidado e ao lado uma Igreja toda cercada por telas a arames.
Na entrada do instituto, existe um,grande saguão em
forma de uma circunferência rodeado por bancos de concreto, @n de os meninas
costumam sentar para olhar a movimentação das pessoas ou então, quando é
permitido, nos sábados e domingos, mais frequentemente, namorar com as *I
gurias do feminino
J.3 ENTRANDO NO INSTITUTO
Após este saguão, atravessamos uma porta grande, che
ga-se ent@o a uma porta menor a esquerda com uma
plaqueta, onde se lê: 11 DOM BCSCO 11.
Logo ao entrar por esta porta seguindo por um corredor extenso temos a
direita respectivamente,uma sala de atividades educativas/pedag6gicas, um
almoxarifado, o banheiro dos funcionários, uma porta que dá acesso ao Pátio li
vre interno da casa, o dormitório da grupo lMA, o refei't6ric)/ sala de
estar dos monitores e finalmente um grande sal2ío em de satívidade (ocioso).
*Na história desta institulçãoy a alguns anos atrás,
os defíci entes de ambos os sexos viviam no mesmo espaço físico, divididos
apenas em dormitórios diferentes, isto ocasionou uma interaçao muito constante
eritre meninos o meninas que desenvolveram então relaç@os de afetividado. Mais recentemente houve o dêsniembramento,
dos meninos para ocupar o lado esquerdo do prodio e as meninas ficaram com o
lado direito. Contudo, ficou entre eles
esta relaç2ío de afetividade por isso a maio i
Se seguirmos pelo lado esquerdo do mesmo corredor, encontramos a
secretaria/administraç2ío, a sala da direção e assistentes dire-tivos, após a
sala do *chefe de equipe, a enfermaria, o dormitório do grupo lMB e no final um
grande salão que serve de dormitório para a grupo 2M. No final deste corredor existe uma escada de
ferro que já perdeu sua pintura, desgastada
pelo tempo, ela dá acesso ao andar superior - do prédio. No andar superior temos o dormitório dos
grupos **6M, 3MA, 3MB, 4M o SM, além de um salão para atividades esportivas,
uma sala ocupada atualmente pela estagiária do técnico
em educaç@o, uma sala da terapeuta
ocupacional, outra sala
ociosa, um banheiro com vários chuveiros e
outro banheiro que
possuí uma grande pia com aproximadamente 10
torneiras e 10
vasos sanitários este ultimo banheiro está
interditado para
reformas a mais de 2 meses.
*Chefe de Equipe - É a
nomenclatura destinada a um monitor que é 11 escolhido "@ pela direção da
casa para chefiar a equipe de monitares que neste caso s@o 4
profissionais. Ele faz uma espé cie
de intermediaçllo entra a equipe de monítores com a direção da casa.
**Quanto a esta composição
de grupos e a diferenciação que existe entre eles voltarei a mencionar,
explicando detidamente como estão dispostos na instituição, no item l 4 11
Estratifica ção 11 social dentro do IDBM.
9
1.4 A ESTRATIFICAUNO SOCIAL DERJTRO DO IDBM
Como já citei,a
população média desta instituição és ta em torno de 105 internos, este
núm@ro varia em função das baixas representadas pelas fugas, pelas lnternaç3es
hospitalares e pelas raras visitas externas e em função do acréscimo de
internos representada por constantes novas internaçbes.
Para que esta
massa humana sobreviva, foi adotado um sistema de divisão por grupos espalhados
em varias salas da ca sã.
Os internos
estão divididos atualmente em B grupos que segundo alguns critérios são
reestruturados e reorganizados
constantemente. e @; \'
Os grupos lMA e lMB possuem basicamente as mesmas ca
racterísticas e são formados por 28 crianças que possuem as me nores idades
cronológicas da casap contudo a idade r-,iental, se gundo avaliações de
técnicos da casavaria de B a 10 meses a um ano e meio de idade. Estas crianças apresentam uma deficiên cia
mental profunda, quase todos possuem características autis tas e são totalmente
dependentes em todas as suas necessidades básicas, ou seja, alimentação
higiene, saúde,,etc ...
O grupo 2M é composto por 15 internos. Eles são i na sua maioria@)moços e adultos
com deficiência mental grave, com características)quanto ao aspecto
educativo,)semitreináveis e treináveis.
Alguns também são bastante dependentes nas suas ne cessidades
básicas. A idade mental neste grupo está
um pouco acima da idade mental dos internos dos grupos lM, contudo ela n2ío
passa de dois anos aproximadamente.
I Os grupos 3MA e 3MB apresentam características
semelhantes quanto a idade mental_,mas diferem no aspecto da dependência. Os 11 internos do grupo 3MA são bem menos
dependem tes, composto por crianças e adolescentes com deficiência men tal
moderada, e são treináveis. No 3MB,
composto por 10 cria n ças e adolescentes, eles são mais dependentes e
apresentam de' ficiências físicas leves, sendo também treináveis.
O grupo 4M é o mais problemático da casa. É um grupo
mental
ti elo ia da deficiência
de entendimento
dos funcionários que o internolqua ' n ' do n2lo se enquadra em outros grupos,
por possuir muitos problemas ele é destinado ao grupo 4n Genericamente falandog
dá para classificar como um grupo formado por adultos treináveis, com deficiência
mental de grave a moderada. Este grupo é
composto
por 12 internos.
O grupo SM também à composto por um número de 12
internos adultos que apresentam características treináveis, possuem
alguma independência para tarefas como as ligadas a higie ne pessoal,
alimentação, conservação de objetos,etc ...
No grupo 6M existem 20 internos. Este grupo é composto,pelo que chamam na
instituição)de *llguris bom". O
grupo é formado por adultos, facilmente treináveis, com uma considerável
independência para executar as atividades que se realizam na ca se.
Desde o cuidado com a propria higiene, como também as ativi dades de limpeza e
conservação das dependências do prédio, do s 'tios, etc ... Alguns destes
internos possuam auto '
pa
rlzaçao para
realizarem passeios nos finais de semanal desacompanhados dos mlo
nitores, a parques pjblicos, praças, etc.,,
*Este termo denomina aqueles internos que apresentam as melhores
condíç3es físicas a psíquicas para a realização de atividades e tarefas somo de
limpeza e conservação do prédío@ ou mesmo de eu
'lio nos grupos ditos "os mais
prejudicados''. Estes intç-rnos) xl
quando da falta de monitoresjorientam e organizam os
grupos, dos internos que são mais dependentes para realizar as suas necess.i
dades básicas.
1.5 RELAÇDES INTERGRUPOS
Apesar de existir esta divis7So dos internos por grupos, na maioria da
tempo, dentro da instituição, eles interagem, ao mesmo tempo, com todos os
grupos, pois o horário de permanência exclusiva no dormitório respectivo do seu
grupo se restringe aos horários da noite para dormir e durante o dia,nos
chamados "*horários de descanso 11.
Avaliando este aspecto achei interessante relatar um pouco do quotidiano
dos internos, para dar uma idéia de como eles se relacionam entre si. Para tanto achei conveniente come çar
descrevendo a vida institucional desde as primeiras horas da manhã, passando
pelo decorrer do dia até a noite e o dia se, guinte.
As 7 horas da manhã acontece a 11 passagem de plan t@o "I, isto
'é,, neste horário a equipe de i-nonitores da noite é substituída pela equipe
de monitares da manhã. Os monitoreseeas
sum9m" os seus respectivos grupos. Ao chegar no dormitório de' seu grupo )
o monitor faz uma espécie de inspeção.'
Cabe ao monitor verificar as condições tanto das instalações do prédio, @o
biliarlos, condiç3es de limpeza e higiene das dependências do dormitório, como
também das condições de sajde,.higiene, compor tamento, etc ... do interno. e o
monitor receber o plantão com um interno, por exempla@ apresentando
escoreaç3es, hematomas,
@etc.. e não constatar isto@ posteriormente ele
virá a ser co.
'.@Ç'brado a saber da situação que envolveu
estes ferimentos com
um determinado interno e pode ser
responsabilizado por tal fa-
to.
*Horários de Descanso
internos permanecem nos dormitórios# deitados em sua
camas,nao especificamente dormindo. Este
horário é adotado após as refei ç@es.
chamado assim os períodos em que,os
12
Para que
se possa acompanhar o desenrolar das ativida dos desenvolvidas pelo grupo,
existe o registro de ocorrências que é feito em um livro específico. Nele constam todas as varia çbes de
comportamento, as atividades durante o período, a dose medicamentosa que os
internos estão submetidos, recados de moni tor para monitor, quando
estes não conseguem manter contatos di reto com os colegas, entre outros
dados.
ao exemplos de registro de
ocorr@encias:
Ç 2 @,-@s-corrência da Noite:
11/10/92
Monitor - Aureci
NO de internos: 19+ Flávio
em fuga
Recebi o serviço em
condiç3es, com os internos na ca
sa, exceto João Luis Silva, que retornou por
volta das 21:30 ha
ras e dormiram tranquilos.
Comportamento geral bom, sem
alteração de conduta.
Saúde aparentemente todos
bem.
Auxiliaram
nas tarefas da casa e nos grupos: Alexan dre Machado, Aldoir, Cláudio, Jonas e
Jocel.
Pela
manhã os internos da cozinha foram acordados às
6
horas para a higiene pessoal.
Passo
o plantão com os internos presentes na casa.
Aurecíll.
(Registro
de ocorrência do livro pertencente ao
gru-
po
6m turno da noite)
tzi
I l@ "Ocorr5ncia
da Noite de 18 a 19/06/92
eA @ @ Monitora
- Eva Linda
NO
de menores: 12
Recebi
o plantão c/ menores no dormitório.
Julio
Casar muita agitado, perturbando os demais,
comendo reboco e saindo da dormitório.
Necessito
de um menor para auxíliar-me ou que pe-
lo
menos possa ficar na porta quando tenho que ausentar-me do
dormitório,
pois se fecho a porta os menores jogam tudo o que
podem
pela janela, se deixo a porta aberta, alguns menores saem.
Não
há roupas, não há lençois, nem toalhas, está
se
tornando quase impossível trabalhar nessas condições.
Menores dormiram bem.
13
Daniel
está com o rosto machucado de tanto se autoagredir; deveria sgr encaminhado a
algum especialista.
Passa o plantão c! menores no dormitório.
Linda.
- N,--no foi dado banho, pois não há roupas,
Linda'#.
(Registro
de ocorrência do livro pertencente ao g@u po
Quanto
aos registros em livros de ocorrência é importante salientar, também, que eles
funcionam como um meio de controlar a vida do interno. Diariamente os monitores ré gistram
aspectos relacionados ao comportamento do interno em livro: Quer dizer, se for
registrado por exemplo, que o interno está muito agitado, ou muito "
atuante 11 ele, no momen to em que o setor mc')dico tiver conhecimento do
registro sofrerá uma mudança na sua medicação.
Neste caso, rec.-3berá uma dose maior de tranquilizantes para que o quadro
de comporta monto se reverta.
Este
controle também pode, funcionar, por exemplo, no sentido de averiguar a conduta
do interno dentro da ínstituição, em um período de alguns dias ou semanas a fim
de se avaliar se o referido interno é merecedor ou não de alguma vantagem em
relação dos outros. Esta vantagem pode
ser ré presentada por uma vaga no pr6ximo passeio (não são todos que
participam dos passeios), ou a obtenção de uma roupa nova, ou simplesmente um
número maior de refeiç3es no dia.
Das 7
horas até as B h e 3Omin aproximadamente é a que chamam de horário de
descanso. Os internos devem permane cer
no dormitório na companhia do monitar.
Apartir das B h e 3Dmin é servido a café da manhã, mas antes dista já
começa a se ouvir nos dormitórios algumas reclamaçoes: não esta na hora do café
tio, eu quero toma café, hoje é pão com chimia ou margarina? 11 (Jarmar grupo
4M).
Os grupos são *" deslocados 11 para o
refeítório,al guns em fila outros livremente dependendo da atitude do monitor,
para o café. Os grupos lM geralmente
tomam café no próprio dormitório, em função da dificuldade de locomoção que a
maioria dos internos deste ru
Ao chegar no refeitório todos os internos mantém o
primeiro contato da dia, eles então conversam uns com os ou-
tras e tudo parece uma grande bagunça:
11 trouxe o balão?
em esqueci Batista
exquecheu tia?
14
(Batista interno
do grupo 4M) (Monitora Rita) (Batista interno da grupo 4M)
tio, tio o
Leonardo roubou o meu p@o " (Tadeu in terno da grupo 5M)
- 11 diabo, diabo, diabo 11 (Leonardo interno do grupo
4M)
O café é trazido da cozinha em uma grande panela de
aluminiot cada monitor serve a café, que geralmente é leite com chocolate ou
leite fervido purojem pequenas canecas de plástí co. O pão é distribuído de
forma igual para todos, dois para ca da uml eventualmente um interno
entra em agressão física com outro pela posse de um pão.
Após o café, cada grupo tem um destino que é determi
nado pelas escalas pré-estabelecidas pela casa.
*Deslocados - Este termo que é de uso corrente em meio
aos p@o fissionais da casal principalmente a monitaria, significa lêvar o grupo
de internos, geralmente juntos e em fila, para outras dependências da
instituição. Estes termos lembram a
minha @iexperiencia de vida em um aquartelamento, por sinal@ outro tipo de
instituição total. Estas palavras, como
HORARIO de DESCAN SO, ASSUMIR o grupo, deficientes TREINÃVEIS, não
TREINAVEIS,es tão dentro da lógica institucional explicitando as suas práticas
a utoritárias a descriminatórias. Ou
seja, na instituição,o interno perde totalmente a sua relação com o seu proprio
eu,pois a classe dirigente se apropria de seu poder de decisão e de sua
liberdade para simples atos como o de se locomover- de uma determinada sala ou
dependência da instituição para outra sala ou dependência dentro da própria instituição.
15
Os grupos dos meninos maiores possuem atividades és
pecíficas em rotinas da.casa. Alguns auxiliam na cozinha, ou-
tros na lavanderia, ou em atividades de capina e
limpeza 'das adjacências do prédio. Os
internos ditos 11 treináveis 11 auxiliam também os monitores que ficam
responsáveis pelos grupos dos internos mais dependentes.
Também existeg
pela manhã, as escalas com as estagiárias(os) em educaç@o física, terapoutas
ocupacionais e téc nicas em educação (pedagia especial) que atendem
alguns inter nos previamente avaliados e escolhidos para estas atividades.
Os internos que
não estão em nenhuma destas atívida des ficam então no pátio interno da
instituição.
Em companhia dos
monitores .,eles brincam no pátio,pa rã isso disp3e de algo que um dia já foi
um escorregador e ho je e um amontoado de latas e ferros retorcidos pela
ferrugem, de um balanço susponso por um suporte de forro antigo no qual haviam
mais de três balanças , de alguns canos de concreto,com u:m diâmetro de
aproximadamente l metro e meio cada um, dispos tos sem uma sequência
l6gica. Além desses 11 aparelhos I, tudo
o que para qualquer um transuente seria denominado de lixo,co mo tampinhas de
garrafa, sacos plásticos, vidros, recepientes vazios de ahampoos, detergentes,
pequenos pedaços de madeira, quando encontrados pelos internos no pátio é
motivo de alegria. Eles manuseiam estes
objetos, brincam o se divertem como se fossem brinquedos, argila ou massa de
modelar.
Observei um
interno com uma meia cheia de tampinhas de garrafa, ele as tirava para fora da
meia dizendo:
tia, tia
olha um, dois, treze, quatro olha, olha".
Torna a colocar todas as tampinhas dentro da meia, neste
processa ele passa quase que toda a manhã.
Por volta das 10 horas é distribuído um lanche chamado
pelos meninos também por merenda.
tia não
está na hora da merenda, to com fome (Silvio Amaral, grupo SM)
16
A 11 merenda
" varia, ela pode ser uma banana, o que é mais frequente, ou uma maçã, ou
iinda uma laranja. Nos finais de semana
geralmente a merenda ó sagu, gelatina ou cangica com lei
tep de vez em quando l<isuco com pão.
Depois da 11
merenda 11 entre 10 horas e 30 min e li ho ras e 30 mín a maioria das
ativid,-idcs já se encerraram, começa
então
a preparação para o almoço. Os meninos são reunidos em
seus
grupos para se prepararem para o banho, quando trocam de
roupas@
penteiam os cabelos, ...
Entre
11 horas e 30 min e 12 horas é servido o almo-
ço.
Os internos se reunem novamente no refeitório, agora para
almoçar.
Cada monitor vai
até a cozinha pega uma bandeja (uma tampa de panela de aluminio das grandes)
com o número de pratos exato ao námero de meninos do grupo, distribui os pratos
e fica observando-os almoçar. Na maioria
das vezes surge algum problema durante o almoço, são agress3es entre os
meninos, quando um tenta pegar o prato do outro. Quando o almoço demora a ser ser-
vido, os
interno icam impacientes e
irritados, alguns, depen-
dendo da
demora entram em crise I, se
auto agridem ou sim-
plesmente
desistem de almoçar.
Após ao almoço entre 12 horas e 13 horas é a preparação da passagem de
plantão que agita a casa.
*Entrar em Crise dificil
caracterizar este fato, pois ele abrange muito e é considerado como tal em
várias situações. Por exemplo, pode se
tratar de uma O~ crise convulsiva que a maio ria dos internas sofrem de
vez em quando, pode se tratar de uma
-'fi9x ao acompan
exaltaç hada de agressoes lslcas a
terceiros, ou então com auto-agressão, pode ainda se
tratar de uma tentativa de chamar a atenção para alguma coisa. Muitos internos, quando não recebem a atenção
devida chegam a simular de terminadas crises a fim de receber maior
atenção.
17
Entram então em ação novamente os meninos que possuem
a incumbência de realizar as atividades de limpeza e con
servaç2ío das instalações para que haja a passagem de
plantão sem altL-raç2lo ". /
Quanto a esta atividade um aspecto que cabe salien tar
é - o fato de os internos, eventualmente, não estarem dispostas a reali.znr
tais atividades. Como acontece a qualquer
ser humano, em determinados dias não nos dispomos a realizar certas
atividades. No caso dos internos, quando
isto acontece, o monitor responsável pela realização da determinada atividade
exerce uma espécie de coerç@o sobre o int-rno, fato que se pode constatar
através do seguinte diálogo:
- Monitar.-" Marcio tu precisas passar o pano no
corredor'. 11
- Marcio:l' hoje eu não quero tio
- Monitor 11 o que? n@o quer? tu achas que te
gover-
nas? 11
- [,larcio:l' manda o Alexandre Machado passar
- Monitor:l' não esquece que terá passeio no final de
semana e se tu não limpares o corredor eu te corto do passeio" - Marcio:l'
ta bom tio, mas é só hoje que eu vou límpar, eu faço isto todos os dias'. 11
*Sem Alteraç@o - Termo empregado pelos profissionais da casa,/ em
particular os monitores, para caracterizar um peri r odo dentro da instituição
transcorrido sem maiores problemas e dificuldades, ou sejap quando apenas os
acontecimentos diários são observados.
Neste aspncto acho interessante destacar uma passa-
gem do livro 11 f-iAi,JlCOl'-IIUS, PRISDES E
CUNVERJTOS " de ERVING
GOFFrlAPI que mo tem auxiliado bastante neste
trabalhe, no senti
do de notear vários objetos das pesquisas e
entrevistas que
fiz:
11 Nos hospitais para doentes
mentais, existe a
que é oficialmente conhecido
como 11 terapia in-
dustrial 11 ou 11 laboterapia
11 os pacientes rec L.@
bem tarefas, geralmente
inferiores - por exem-
plo, varrer as folhas, servir a
mesa, trabalhar
ha lavanderia e limpar os
pisos. Embora a natu
reza de tais tarefas decorra
das necessidades
de trabalho do estabelecimento a afirmação apre
sentada ao paciente é que essas
tarefas o aju-
darão a
reaprender a viver em sociedade o que sua voluntariedade e capacidade para
enfrentalãs serão consideradas como prova diagnostica de melhora 11. 157
157 - Seria
errado considerar com excessivo ceticismo essas 11 terapias 11. Alguns trabalhos por exemplo, na lavanderia e
na sapataria - tem seu ritmo próprio o muitas vezes são dirigidos por pessoas
mais ligadas a seu ofício do que ao hospital; por isso, muito frequentemente, o
tem po gasto nestas tarefas é muito mais agradável do que aquele passado
numa enfermaria quieta a escura. Além
disso, a nocl5o de colocar os pacientes em trabalho 11 'útil"' parece uma
possibili
dade tão atraente em nossa
sociedade, que al'-
guns serviços - como consertos de
sapatos e fa-
bricação de colchbes - podem ser
mantidos, pe-
lo manos por algum tempo, sem
prejuizo para a
instituição.
(te a mundo da equipe dirigente 11 pág.B2)
19
As 13 horas acontece, novamente a 11 passagem de plan
tão 119 ou sejag a equipe de monitores da tarde recebem os grupos da equipo
da manhã. Quanto ao recebimento,
acontece o mos mo ritual que descrevi na passagem de serviço do pessoal
da noi te para o pessoal da manhã.
O que difere s5o os horários, Até as 15 horas a
horário de do.,3canso, os internos permanecem em seus dormitórios. As 15 horas é servida o lanche, (merenda) no
mesmo@sis tema do relatado no período da manhã.
Entro 15 horas e 30 min e 17 horas são realizadas as atividades de
limpeza e conservaç@o dos prédio e as educativas, pedagógicas e
recreativas. Estas ultimas em um ritmo
bem mais lento, pois a tarde não exis tem estágíarios na casa. Apartir das 17 horas começa então a
preparação para o jantar. Entre 17 horas
e 30 min e 18 horas ó servida a jantar, com a mesma sistemática do almoço. Após o jan ter são reiniciadas as
atividades para a passagem de plantão que acontece as 19 horas, aqui são repetidas aquelas situaç@es que
mencionei da ocasião da passagem de plant@o do período da manhã, para a tarde.
As 19 horas a equipo de monitores da noite recebem os
seus grupos. Entre 19 horas e 20 horas e
30 min são realizadas atividades livres, a encargo de cada monitor. As 20 horas e 30 min é servido o lanche da noite, p2lo e leite quase que
diariamente. As 21 horas os internos são
reunidos em seus grupos para dormirem seriag na linguagem militar, o toque de
recolher.
A rotina, para o interno, recomeça as 6 horas do dia
seguinte quando novamente são reiniciadas as atividades de pre paração
para a passagem de plantão que acontece as 7 horas da
manhã.
Ainda em relação a este período noturno vivida na
instituição, algumas considerações são importantes e precisam ser feitas.
O número de monitares no período da noite e bem redu
zido em relação as equipes da dia. Os
técnicos e as pessoas da administração que durante o dia circulam na casa#
controlando as atividades durante a noite estão ausentes.
20
Estes fatores
influenciam diretamente para a diferença no ritmo das atividades à noite. No r)eríorio noturno
existe mais liberdade para os iritrrnarlos,
o ç) que é o mais
surpreendente, também para os n@o
internados. A noite são ex
piorados os anseias qt.ie durante o dia s@o
severamente re-
preendidos. A noite a instituição muda de
cara.
O Hospital São Pedra, a
noite, e o lugar
dos menos explicitados, de
fantasmas invadin
do a escuridão, de esquecidos
desejos anun
ciando-se nos sonhos a
delírios. O recalcado
retorna a sua força assusta
No Hospital. S@o Pedra, a noite,
se expressam às claras, os desejos pervertidos. Essa montagem perversa das relaç3es sociais
aparece-,na legitimação da violência institucional para com os funcionários, em
suas pobres e loucas condições de trabalho; dos funcioná rios para com o 11 Guarda
Belo 11 (intorno do hospital); deste para seu companheiro de quar ta
(Por uma sociedade sem manicâmios:um olhar
sobre a São Pedra - texto de CARi-lEM de OLI-
VEIRA - psicóloga mestre em psicologia clí-
nica, especialista em saúde pjblica, direto-
ra de ensino e pesquisa do Hospital São Pe-
dro, Presidente
da Conselho Federal de Psicologia - apresentado na 69 jornada de psico logia,
sociedade de psicologia do Rio Grande do Sul, jynho/90).
Este relato)sobre o hospital São pedro@mostra que o que foi constatado
no IDBPL, quanto as características da vida no período da noite, em uma
instituição total@ manico-
21
CONCLUSAO
Através
da minha pesquisa de campo, avalianrio-a insti tuiç3o que foi o meu abjeta de
traballiojchego a L.,lgumas conclusoes*
A
conclus,-no cr@ntrcil que surge é tr@jduzidn pela idéia de que o atendimento ao
deficiente mental em instituições totais, como os manicômios, ou casas
similares, como a que pés-
quisei, totalmente maléfica para as pessoas que
estão ali in-
A instituiç2ío total não contribui em nada para a me-
lhora do estado de sajdo'dos internados. Muito pelo contrário,
ela prejudica e debilita ainda mais a sanidade mental
das péssoas. Isto graças,a sua
capacidade de se apropriar da vontade de viver dos internas, dns suas
manifestações de vida, daquilo que ele aprendeu fora da instituição. A instituição segrega, ou CC)MO e citado no
livro 11 manicômios prisbes e conventos 'I- C-IDR TIFIC@'- a vida do
internado. Com as suas atividades
excludentes o@ , d@scriminat6rias a instituição reafirma L- reproduz em rq,aior
escala os preconceitos e a marginalização do deficiente mental que s@o
produzidos na sociedade.
dur,-.intk- a minha
pesquisa, relatos de pessoas que, -@ando lembravam do estado de saúde dos
internos ao chegar na instituição em relação ao estado de saúde atual, após vários anos de internação, emocionados diziam: 11
ele era muito melhor quando chegou aqui 11.
Uma funcionária falando a respeito de um interno que
hoje só pronuncia uma única palavra aos gritos',0
diabo, diabo: NN
- 11 Quando c) Leonardo chegou aqui no Dom Bosco ele
falava tudo, gostava muita de cantar. Cantava sam
bas, com ritmo.
Tinha que ver ele cantando
Para
subsidiar minha conclusão cita a seguir posicionamentos de pessoas ligadas ao
setor de sáude mental que seguem esta linha de raciocínio:
11 A alternativa únici de hospital psiquiátrico pa rã
a 11 atcnç@o 11 ao doente.mental já dava mostras de fracasso desde 1925 data
dos rimeiros ré is-
22
A saáde mn-ntil n@o é soriiente o sistema psiquiá
trico, mas nós estamos convencidos de que se n@o houver evaluç3cs no sistema
psiquiátrico, não possível se falar em saúde mental ".
11 Sou um psiquiatra e quero poder continuar a
trabalhar numa profiss@o que n@o esteja destina da a excluir as pessoas a sim a
curá-las 11.
" ús pacientes de serviços psiquiátricos tem o
direito de serem tratados 'num regime de liberdade 11.
(Fr_gnco Rotelli psiquiatra italiano. Um
dos principais teóricos do movimento internacional por uma sociedade sem
manicômios. Este é um fra gmento de sua
palestra no Seminario Internacio-
nal de saúde mental, realizado
em outubro de
1991, na Assembléia Legíslativa
em Porto Ale-
gre).
A rotina irlstitucional é
capaz de bitolar a
tua vontade de humanizar mais o atendimento do
deficiente 11.
11 Com o passar do tempo, as pessoas que -trabalham
neste meio param de questionar os problemas dos te meio e começam a
aceitar as mazelas da instituição como algo normal e aceitável "
( - Paulo Ricardo - Monitor da FEBEMP trabalha no
atendimento ao grupo 6M do I.D.13.M).
Os hospitais
psiquiátricos são verdadeiras c.a sas de destruiÇ2;o da subjetividade
humana;.apon ta as contra'diclnes de uni sistema que tudo apos -tou na
segregação e no estigma, transformando instituições em verdadeiros depósitos de
indivi' duos 11.
(Carmem Oliveira
- psicóloga, mestre em psicolo i 'de p'blicag di-
23
gia cl'nica, especialista em sau retara de Ensino o
Pesquisa do Hospital São Pédro, presidente do Conselho Federal de Psicologia).
São muitos os depoimentos que levam a este entendiíncn
to; o fracasso das instituições manicômiais.
Entretanto, apesar das críticas serem válidas, é preciso que se lance
alternativas para o problema, ou seja, n@o basta constatar a falência da atual
forma de atender o deficiente mental.
Nesse sentido, observei, através da minha pesquisa, que existe uma
espécie de consenso quanto a alternativa que surge frente a este modelo
psiquiátrico decrépito. Ela foi
verbalizada de várias formas e nos mais diversos contextos, expressada por
diverssas tendências ideológicas e políticas.
Apesar disso as propostas alternativas que surgem fazem referência ao
projeto de lei dos Deputados PAU LC DELGADO (do Partido dos
Trabalhadores de t'linas Grrais)e [,]AR CGS RCLIIII (do Partido dos
Trabalhadores do Rio Grande do Sul), que, via de regra, proplbe a extinção
progressiva dos hospitais psiquiátricos e sua substituiç,-no por outros
recursos assistanciais e regulamenta a internação psiquiátrica compulsória.
Esta proposta mesmo nas pessoas mais ligadas ao setor
de saúde mental, causa, de início um determinado ceticismo e
estranhamento. Eu fui apanhado por estes
sentimentos, porém, quando se analisa mais particularmente cada uma das formas
ai ternativas de atendimento e recompondo, principalmente algumas experiências
neste sentida vivenciadas em países como a Inglater@ rã, a França, Itália,
Espanha e Cuba da'para se notar claramente que não está sendo proposto Uma
utopia. Vê-se que existem és tudos
sp'rios e pessoas ídoneas empenhadas na reformulaç@o das
24
O projeto de lei é muito amplo e a proposta e bastan te complexa,
entretanto, tentancia resumi-lo citarei as formas de atendimento alternativo
que constam no bojo do @irojeto de lei: Seriam desenvolvidas formas de
atendimento locais de saú de mental (municipalizaç2lo da atendimento)
que incluem ambula tórios, centros de convivência, leitos em hospital geral, ofi
cinas laborais e de expresso, cooperativas, hospital-dia, pen s@as
protegidas, ...
Um dado numérica que ilustra muito bem o problema da munícipalização que
está sendo proposta para o atendimento do deficiente foi verificado no I.D.B.M.
Em uma populaç2-lo de 94 internos nesta instituição, 49 internos são oriundos
de municí pios do interior da estado e apenas 45 internos s@o de Porto Alegre,
ou seja, mais de SO% da população, devido a uma série de fatores, vem de seus
municípios de origem, na maioria dos casos municípios do interior, buscar
atendimento na capital.
Acontece neste caso algo semelhante a superprocura pelos serviços da
hospital de pronto socorria de Porto Alegre e da Santa Casa de Miseric6rdia de
Porto Alegre. Inúmeras ambulâncias
trazem, diariamente pacientes de cidades do interidr, muitas vezes distantes de
capitalj para serem atendidos em Porto Alegre, em função da falta de recursos
médicos nl-@tas ci dari as.
Surge então está temática da descentralizaç3o do aten dimento ao
portador de deficiências mentais. Esta
descpntraliizaçao aparece em dois ambitos.
O primeiro seria descentralizar a atendimento geograficamente, ou seja,
municipalizando o sistema de saúde e atendendo a deficiente, preferencialmente
na sua cidade de origem, ou seja, não descaracterizá-lo ou dêsmembrá-lo de sua
comunidade, onde ele possui os seus amigos,as suas experiências de vida, enfim
os seus referências Quanto a este aspecto, destaca a entrevista que fiz com um
interno da I.D.B.M., na qual ele me externou as seguintes palavras:
2S
Desde lá de BOM JESUS que o meu pai era beba do,
ele podia ter feito o meu exame ... ; A FEDEM à louca mesmo; Queria trabalha
numa fir
ma,
compra uma horta, pra planta milho e da
pros
porco, lavagem, bota no cochinho do porco,
ele
fica bem gordo, depois mata o porco pra
faze
banha pra cozinha arroz, feij@o; aqui nas
sa FUBEM eu já to enjoado, queria um lugazinho
melho 11.
(TAOEU, idade aproximada 26 anos, interno oriun
do da cidade de Bom Jesus) -
Através destas
palavras, percebe-se a referência que o interno faz a sua cidade de origem, Bom
Jesus, e a alguns as pectos do estilo de vida que tinha no interior,
como cultivar uma tiortap criar animais,*.* Apesar de estar vários anos inter
nado neste instituto, TANEU possui vivo dentro de si a referen cial a sua
comunidade. Certamente se ele estivesse
recebendo tratamento neste local, convivendo com os seus semelhantes pri meiros
as suas perspectivas de avanço de seu quadro clínico se riam mais
favoráveis.
O segundo
aspecto da descentralizaç@o refere-se a descentralizar o atendimento de uma
unidade institucional es-@ tanque. Ou
seja, ao invés de internar compulsoriamente os paci entes em um
manicômio, onde elos permanecem em média de 15 a 20 anos, ou em alguns casos,
até a morte, levaria o paciente a' experimentar outras formas de tratamento
alternativo variando segundo o grau de sua doença. O paciente experimentaria ent@o, por exemplo,
tratamentos em ambulatórios, centros de convivência, leitos em hospital geral e
as demais alternativas citadas anteriormente.
26
Mencionarei, a
seguir, alguns depoimentos que defèn dem uma sociedade sem manicômios, ou seja,
defendem a proposta de extinguir paulatinamente os manicômios
11 A legislação
vigente, datada de 1934, reflete ainda a intolerância e os preconceitos da se
ciodade frente as diferenças.
Propomos altera ç3es na legislação federal e estadual bem como a criação
do código de saúde do município 11.
(das DIRETRIZES
da Proposta Preliminar de Política
de Saúde Mental para a cidade de Porto Ale gre - Versão ABRIL/92 -
Secretaria Municipal da Saúde, Prefeitura Municipal de Porto Alegre,
Administração Popular).
11 Lutamos em
nosso cotidiano institucional e nos espaços
sociais por uma proposta de uma se ciedade sem manicômios e isto
significa a cons trução de um aparato científico, administrativo e
legislativop que atenda a l6gica de inser ção social da doente mental. Lutamos por uma sociedade que possa
confrontar as diferenças, encorajar as singularidades, apostar no desejo, criar
e tolerar incertezas 11.
(fragmenta da
Política de Atenção Integral à saúde mental - PAISMENTAL/SSMA, Hospital
psiqui'átrico São PE3dro/SSMA).
27
A proposta desencadeada é de
desinstitucionali zaç@o: de desconstrução dos aparatos jurídicolegal,
administrativo, científica que legitimam a exclus@o social do doente rnentalp
fundamentados nas noç@es de incapacidade e de periçulosida de, produzindo
existências em sofrimento. E de invenção
de outras instituições que produzam saú de mental, inserção social,
projetos de vida al.i cerçados na singularidade, nas diferenças, em vã
lores éticos-estéticos 11.
(Sand.ra Fagundes -
integrante do movimento da lu ta Antímanicamial no Brasil, assessora de
saúde mental da SMSSS P-A e ex-coordenadora da PAIS mental da SSMA -
RS).
" Não nos seduz
qualquer visão romântica sobre a loucura.
Mas, se toda loucura tem uma RAZAO que a reconhece e protege, então toda
a RAZAO tem sua loucura que lhe provoca e estimula 11.
(fragmento do texto: 11 A NAU
DOS LOUCOS; carta
de um companheiro de viagem 11
do Deputado Esta-
dual Marcos Rolim, autor do
projeto de lei que
prevê a extinção dos
manicômios).
28
METODGLOGIA
Utilizei uma mctodolagia bastante particular neste trabalho. Inicialmente realizei observações periódicas
no inte rior da instituição, fiz algumas entrevistas não diretivas com
alguns profissionais da casa, principalmente monitores e realizei, também
conversas informais com alguns internos que foram de grande valia para algumas
constatações do trabalho.
Lembrando-me da palestra de BERNARDO (que nos relatou suas experiências
em pesquisas de campa) acho importante ressaltar algumas colocações feitas
nesta oportunidade: Disse ele, entre outras brilhantes colocações, que era uma
dica do próprio MALINCWSKI, que para realizar na sua melhor forma uma pesquisa
de campa, deveria se escrever ou ambasar as constataç3es e conclusões, após ter
se afastado do grupo em estudo. Ou sejag
com base no diária de campo, ou utilizando outras anotaç@es como subsídio
deveria se realizar um olhar do 11 fora 11 pa rã 11 dentro 11 daquele
grupo ou universo pesquisado, a fim de se realizar um bom trabalho de campo.
Claro que as palavras usadas não foram especificamen te estes, mas a
questão que gostaria de colocar é a fato de,por mais que eu tenha me esforçado
não conseguir realizar este olhar de 11 fora 11 para 11 dentro I, em seu
sentido pleno. Este fato deve-se a
condição a que estou colocado de funcionária des ta instituição. Oú seja, eu possuo um vínculo empregatício
com este órgão institucional, estou ligado a ele, -tenazmente, segundo regras e
devores administrativos e burocráticos ou ainda, todo este sistema institucional
exerce uma força de coarçao sobre mim, como a todo outra funcionário. Apesar da minha tentativa de relativizar
todos os 11 pré-conceito:Y da instituiç:ão e de tentar relativizar a idéia do
própria sistema institu cíonal como um todo, acho que realizei, por vezes, um
olhar de 11 dentro 11 para 11 dentro 11 da instituição. Trata-se apenas de um esclarecimento que acho
importante de ser colocado uma vez que, notadamento, este trabalho deve estar
longe de alguma cons trução mais científica.
29
REFERÈNCIAS
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do Rosário. do Jornal de Divulgação da Exposíç@o: 11 Re-
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de Minha Passagem pela Terra: Arthur Bispo da Rosário"
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se realizou na Pinacoteca III do MARGS (Museu de Artes
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-,,OLIVEIRA, Carmem. Por uma Sociedade sem
Manicâmios: um olhar sobre o São Pedra da Jornal de Divulgação da Exposição:
11 Re ciistro de Minha Passaclem pela Terra: Arthur Bispo do
Rosário" que se realizou na Pinacoteca III do M.ARGS (Museu de Artes
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ROTELLI, Franco.
Loucos pela Vida. Jornal
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fevereiro de 1992.
30
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A terapia da
liberdade. Política de Atenção Integral
à Saude Mental - PAIS MEIJTAL/SSMA. @iospital Psiquiátrico São Pedro/ SSMA. do
Jornal de divtjlqaç!,So da Ex@osiç@o: 11 Registro de mínha
_passagem pela torra: Arthur Bispo do Ros'rio q@je se rEn lizou na Pinacoteca Ill do MARGS
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Proposta
Preliminar da Políica de Saúde Mental para a Cidade de Porto Alegre. Versão Abril/92 - Secretaria Municipal de
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31
OBRAS CONSULTADAS
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JDNIDRI Senilton Bezerra. Cidadania e Loucura; Políticas de
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Social, Centro Brasileiro para a infãncia e adolescência. Brasília, em 13 de julho de 1990
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