Amigos e amigas
Vamos entrar no capítulo três da obra.
Como já referi antes, segue o capítulo particionado por questões técnicas (informatizadas).
1.
ARTE e RESISTÊNCIA NA PERIFERIA
“Hei de ver a lua brilhar, iluminar o nosso
pavilhão.
De mãos dadas vamos cantar a nossa canção.
Sou da Vila faz tempo e ninguém vai nos separar”
Ari Rodrigues
A Arte Popular, enquanto expressão civilista
de uma cidadania não branca é um contexto comum entre três grandes nomes desta
cena antropo-poética: Noel Rosa, Mestre Borel e JacquesJa. Diante da opressão
imposta pelas regras da sociedade de consumo e também pelo poder da Norma (Poder
Institucional-legal imposto pelo Estado) o cidadão afro-descendete reage
protestando. E qual é a melhor forma de protesto? A Expressão Artística Não
Convencional (Arte Popular). Sem sombra de dúvida o HIP HOP é o maior exemplo
disto. A Arte de rua (ou cultura popular urbana), através do hip hop é a maior
expressão da negritude urbana no Brasil Contemporâneo. Eu tive a oportunidade
de participar deste movimento, quando da elaboração da “Semana Cultural” em
Viamão. Havia fundado a Associação do Patrimônio Cultural de Viamão (AAPC) que
foi o embrião do Centro de Estudos Sociais e Antropológicos Jerônimo de Ornelas
(CESAJO). O grupo de trabalho de antanho decidiu organizar a primeira mostra de
Hip Hop de Viamão. Com o apoio da produtora “Promo Show”, coordenada pelo
parceiro de evento Carlos Silva, organizamos um grande evento popular em praça
pública que reuniu mais de cinco mil pessoas no centro da Cidade de Viamão. A
partir deste evento, estabelecemos uma série de contatos com grupos de Hip Hop
da região metropolitana de Porto Alegre, especialmente com White Jay5
(Nome Artístico), liderança do movimento oriundo da Cidade de Alvorada. A
partir destas inter-relações fomos convidados para participar do Programa Hip
Hop Sul, transmitido pela Fundação Piratini (TVE/RS). Estivemos nos estúdios de
gravação do programa, interagindo com os artistas envolvidos, com a equipe de
produção do programa, bem como com integrantes das comunidades envolvidas que
acompanhavam os artistas, prestigiando este trabalho.
O relato exposto acima se faz necessário para
demonstrar que esta junção ciência e arte é uma constante na caminhada deste
acadêmico desde os tempos idos. Estou disposto a fazer ciência em um contexto
mais amplo do que o tradicional. Não abro mão de realizar uma construção de
conhecimento relacionada à minha realidade social e étnica. Estou orientado
pelo texto constitucional brasileiro, reconhecendo-o como supremo e orientador
do sistema jurídico nacional. Portanto, busco cumprir os preceitos jurídicos da
Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), no que me cabe. Especialmente no
que se refere ao desenvolvimento de uma consciência crítica da realidade social
em que estou inserido. Aprendi com intelectuais do quilate de Michel Foucault a
ver as “Micro Penalidades” como parte de um sistema de opressão silencioso que opera
diuturnamente. Foi com esta orientação teórica que cunhei a categoria analítica
“Açoite Acadêmico” para referir estes momentos tristes da cena acadêmica
vivenciada na UFRGS.
O Movimento Negro é um dos movimentos sociais
mais atuantes e aguerridos do cenário social brasileiro contemporâneo. Este
movimento possui um papel fundamental nas conquistas que os afro-descendentes
têm acessado na história recente do país. Foi o que ocorreu, por exemplo, na
época da elaboração do texto constitucional de 1988. Houve uma intensa mobilização
do segmento em torno da defesa dos direitos fundamentais do negro e para que o
texto da nova carta magna assegurasse esses direitos. Portanto, reconhecer as
lideranças deste movimento tem um significado especial para quem trabalha com a
temática ao nível de estudo e pesquisa acadêmica.
A Jornalista Vera Daisy Barcellos é um
exemplo de liderança amplamente conhecida no meio ativista da capital. Vera é Jornalista,
militante do Movimento Negro desde a década de 70, editora da revista Tição.
Atuou por 16 anos no jornal Zero Hora, foi editora responsável pelos projetos
especiais do jornal A Voz da Serra. Assessora de imprensa de Maria Mulher –
Organização de Mulheres Negras/RS.
A acadêmica Vera Lúcia Goulart da Rosa e o
acadêmico Gerson da Silva Bernardes freqüentaram como alunos a disciplina
Afro-descendência e Cidadania no Brasil Contemporâneo. Por que citar estes dois
colegas? Justamente por se tratar de duas importantes lideranças do movimento
negro participativo no Estado do Rio Grande do Sul. Infelizmente este dado não
recebeu o devido destaque durante as atividades da cadeira, sendo que fiquei
sabendo deste importante detalhe apenas no dia 13/05/2015, quando recebemos em
sala de aula a presença de convidado especial.
No encontro ocorrido dia 13/05/2015 a
professora Denise Jardim6 recebeu a visita de Ubirajara Toledo (Coord.
Executivo do Instituto de Assessoria ás Comunidades Remanescentes de Quilombos
– IACOREQ). Ubirajara chegou a sala de aula e a primeira atitude sua foi fazer
uma homenagem (in memoriam) para Júlio Cesar de Melo Pinto que foi assassinado
por integrantes da Brigada Militar na década de oitenta do século passado no
Bairro Partenon, Cidade de Porto Alegre. O caso ficou mundialmente famoso pela
comoção nacional que provocou na sociedade a época do ocorrido, pois se tratava
de um cidadão que sofria de patologia crônica e não tinha nenhuma relação com a
ocorrência policial que a BM atendia
naquele momento. Infelizmente, no mesmo momento em que ocorria um assalto a um
estabelecimento comercial das imediações, Julio Cesar voltava do trabalho e se
juntou aos populares que observavam a ocorrência. Julio teve um “ataque
epilético” caiu no chão, passou a se debater, sangrou e não conseguia se
comunicar. A guarnição da BM ao ver o homem negro com “traços de suspeito”
caído no chão e sangrando correlacionou-o aos autores do crime que havia sido
praticado. Recolheu-o, colocando dentro de uma viatura militar e executou o
trabalhador negro em um terreno baldio próximo a revenda da Fiat na Avenida Cristiano
Fischer. O Caso entrou para a história urbana de Porto Alegre como “O Homem
Errado” e, ainda hoje, provoca comoção em todas as pessoas que estão envolvidas
com o Movimento Negro.
Ao freqüentar o curso de Bacharelado em Ciências
Jurídicas e Sociais, na disciplina de Sociologia Jurídica, foi proposto um
trabalho de campo na área dos direitos humanos. O ministrante da referida
disciplina distribui alguns eixos temáticos entre os alunos. Escolhi o que
abordava a atuação do Ministério Público atuando na defesa dos Direitos
Humanos. Percorri várias comunidades kilombolas entrevistando lideranças que
expunham a sua relação com a defesa dos seus direitos fundamentais. Elegi os
elementos etnográficos colhidos na Comunidade do Kilombo dos Silva (Porto
Alegre/RS) para realizar o referido trabalho. No final da exposição do trabalho
realizado na PUC/RS, conforme pode ser visualizado na imagem anexa a esta
monografia, ofereci uma homenagem pela memória de Júlio Cesar. (Anexo 05)
Após ter feito a homenagem, o palestrante
convidado olhou atentamente os participantes da disciplina e reconheceu entre
os meus colegas dois afro-descentes que militam a mais de trinta anos nas lutas
empunhadas pelo movimento negro do Rio Grande do Sul. Ou seja, eu estava
sentado ao lado, por exemplo, de uma das maiores personalidades do movimento
negro, colega Vera Lúcia Goulart da Rosa, com extenso currículo de trabalho na
defesa das comunidades de afro-descendentes.
A proposta mais interessante explanada entre
os meus colegas fazia referencia a uma vontade de um acadêmico em investigar “o
massacre de jovens negros na periferia da Cidade de Canoas”. Proposta
fantástica, porém delicada, pois envolve o embate da juventude com o aparato
repressivo de Estado que vem, habitualmente, executando diversos jovens não
brancos “suspeitos” de ilícitos penais na periferia das principais cidades
brasileiras. O colega João Batista Rodrigues, segundo o meu ponto de vista, foi
o autor da proposta mais instigante para desenvolver em campo. A referencia para
o colega, oferecido pela professora ministrante da disciplina foi o Relatório
Azul.
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